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Jurisprudência


TJCE 0007407-37.2015.8.06.0051

Ementa
PENAL E PROCESSO PENAL. APELAÇÃO. TRÁFICO ILÍCITO DE ENTORPECENTES E ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO. PEDIDO PARA RECORRER EM LIBERDADE. PREJUDICIALIDADE. 1. Preliminarmente, em relação ao pleito de recorrer em liberdade formulado pelo réu Antônio Luis da Silva, não há mais como apreciá-lo neste momento, uma vez que está sendo julgado o recurso apelatório, algo que torna prejudicada a pretensão do apelante. PLEITO DE ABSOLVIÇÃO EM RAZÃO DA AUSÊNCIA DE PROVA DA MATERIALIDADE. NÃO ACOLHIMENTO. INEXISTÊNCIA DE APREENSÃO DA DROGA. POSSIBILIDADE DE COMPROVAÇÃO DA OCORRÊNCIA DO DELITO POR MEIOS DIVERSOS. AUTORIA QUE TAMBÉM FOI DEVIDAMENTE DEMONSTRADA PELOS ELEMENTOS DE PROVA COLHIDOS. 2. Condenados à pena de 10 (dez) anos, 05 (cinco) meses e 10 (dez) dias de reclusão e 1120 (um mil cento e vinte) dias-multa pelo crime de tráfico ilícito de entorpecentes, e à sanção de 04 (quatro) anos e 01 (um) mês de reclusão e 830 (oitocentos e trinta) dias-multa pelo delito de associação para o tráfico, os réus interpuseram os apelos requerendo, em síntese, suas absolvições em razão da ausência de provas suficientes para a condenação. Subsidiariamente, pleiteiam o redimensionamento das penas e a alteração do regime inicial de cumprimento destas. 3. A ocorrência do crime de tráfico ilícito de entorpecentes, bem como da associação para o tráfico, ao contrário do que afirmam as defesas, restou devidamente comprovada pelo conteúdo da interceptação telefônica, bem como pelo teor dos depoimentos prestados ao longo do processo. 4. In casu, as interceptações realizadas (as quais tiveram uma terceira pessoa como alvo) deram conta de que existia sim o efetivo tráfico e a consequente associação para sua prática entre os recorrentes, conforme fls. 17/34. Ademais, o conteúdo das interceptações foi corroborado por inspetores da polícia civil, conforme depoimentos prestados em juízo. 5. Mencione-se que as interceptações obtiveram sucesso em demonstrar que os réus atuavam em conjunto com um outro indivíduo, o alvo, que estava preso (e que era, inclusive, companheiro de Renata e irmão de Antônio Luis) na venda, guarda e distribuição de entorpecentes. Além disso, a estabilidade e o animus associativo foram sim comprovados no curso do feito, principalmente levando-se em consideração que havia divisão organizada de tarefas entre os membros e que as aludidas interceptações conseguiram captar intenso fluxo de ordens e negociações atinentes à distribuição de entorpecentes em um intervalo de 15 (quinze) dias. Precedentes. 6. Quanto ao tráfico ilícito de drogas, tem-se que também se mostra necessário manter a condenação dos apelantes, pois mesmo não tendo havido a apreensão de entorpecente e a consequente elaboração de laudo pericial, a materialidade restou devidamente demonstrada por outras provas que vieram a substituir o corpo de delito direto, tais como as já citadas interceptações telefônicas e os depoimentos colhidos durante a instrução criminal, que suficientemente demonstraram que os envolvidos tinham droga em depósito e distribuíam a mesma no município e fora dele. Precedentes. 7. Por fim, saliento que o Superior Tribunal de Justiça já decidiu que a aquisição (onde também se enquadra a venda) de entorpecente dispensam a efetiva tradição da coisa, havendo consumação do crime com o mero acerto de preço, ainda que por telefone. Sob este fundamento, uma vez que foram imputadas na sentença as aludidas condutas aos recorrentes (que, por si sós, já caracterizam o tráfico) e tendo em vista que as interceptações e os depoimentos colhidos foram suficientes para demonstrar que existiram as negociações via telefone, entendo por comprovada a materialidade do delito do art. 33 da Lei 11.343/2006. 8. Desta forma, ainda que não tenha havido apreensão de drogas, resta assente que o magistrado de primeiro grau fundou-se em provas hábeis e suficientes para embasar a condenação dos acusados, ora apelantes, de modo que ficou demonstrada, conforme aduzido acima, a materialidade e a autoria delitiva dos crimes de tráfico ilícito de entorpecentes e associação para o tráfico, não havendo, portanto, que se falar em reforma da sentença condenatória neste ponto. ANÁLISE DA DOSIMETRIA DA PENA. 9. O sentenciante, ao dosar as penas, entendeu desfavoráveis, para ambos os réus, as circunstâncias judiciais da culpabilidade, das circunstâncias e das consequências para o crime do art. 33 da Lei 11.343/2006, afastando a basilar em 02 (dois) anos e 10 (dez) meses do mínimo legal (que é de 5 anos). Quanto ao delito do art. 35 do mesmo diploma legal, foram valorados negativamente os vetores da culpabilidade e das consequências do crime, tendo a pena-base sido afastada do mínimo (que é de 3 anos) em 01 (um) ano e 01 (um) mês. CRIME DE TRÁFICO ILÍCITO DE ENTORPECENTES. MANUTENÇÃO DA PENA-BASE CONFORME FIXADO EM 1ª INSTÂNCIA. NECESSIDADE DE RETIRADA DA FRAÇÃO DE AUMENTO REFERENTE À CONTINUIDADE DELITIVA. CRIME ÚNICO, DE AÇÃO MÚLTIPLA. 10. Sobre a culpabilidade, no que tange à reprimenda de Renata, o julgador entendeu que o vetor merecia negativação em razão da natureza das drogas envolvidas na mercancia, principalmente com relação ao crack, o que não merece alteração, já que tal justificativa se mostra idônea, pautada em circunstâncias concretas do delito e no teor do art. 42 da Lei 11.343/2006. 11. Da mesma forma, mantém-se a negativação para a pena de Antônio Luis, já que a alta capilaridade na distribuição do entorpecente e o fato de o acusado fazer tratativas relacionadas ao crime com pessoa presa demonstra maior reprovabilidade na ação. 12. No que tange às circunstâncias do crime, também entendo que o desvalor deve ser mantido, vez que pautado na quantidade de droga negociada – o que foi demonstrado através das interceptações telefônicas – estando os fundamentos também em consonância com o teor do art. 42 da Lei de Drogas. Precedentes. 13. Por fim, sobre as consequências do crime, tem-se que o fato de a droga circular fora do município de Boa Viagem, inclusive para presídios em outras cidades, extrapola os limites do tipo penal, elevando os prejuízos do ato ilícito, justificando a negativação do vetor. Precedentes. 14. De modo que, permanecendo desfavoráveis os três vetores anteriormente negativados e levando-se em consideração o critério majoritariamente utilizado pela doutrina e jurisprudência pátrias, bem como a proibição de reformatio in pejus em recurso exclusivo da defesa, deve ser mantido o quantum da pena-base dos acusados em 07 (sete) anos e 10 (dez) meses de reclusão. 15. Na 2ª fase da dosagem, não foram reconhecidas circunstâncias agravantes ou atenuantes, o que não merece alteração. Na 3ª fase, deixa-se de aplicar a minorante do art. 33, §4º da Lei 11.343/2006, já que os réus também foram condenados nas penas do art. 35 do mesmo Diploma Legal, o que demonstra, por si só, dedicação a atividades criminosas, em consonância com o entendimento da Corte Superior. Precedentes. 16. Ainda na 3ª fase, o magistrado reconheceu o instituto do crime continuado e, considerando a prática de cinco crimes de tráfico ilícito de entorpecentes, elevou a reprimenda em 1/3, já que entendeu que a prática de cada ação contida no caput do art. 33 da Lei de Drogas configurava um novo crime. 17. Ocorre que o entorpecente que estava sendo destinado à venda era o mesmo que estava sendo mantido em depósito e que foi transportado para ser entregue aos destinatários, tendo o próprio sentenciante, por diversas vezes, apontado que os fatos narrados tinham sido praticados no mesmo contexto. Assim, sendo o tráfico crime de ação múltipla, tem-se que ainda que várias condutas do núcleo do art. 33 da Lei de Drogas tenham sido praticadas, restou configurado delito único, razão pela qual se faz necessário retirar o aumento de 1/3 aplicado em 1ª instância. Precedentes. 18. Assim, fica a pena definitiva do crime de tráfico ilícito de entorpecentes, portanto, redimensionada, para ambos os réus, do patamar de 10 (dez) anos, 05 (cinco) meses e 10 (dez) dias de reclusão para 07 (sete) anos e 10 (dez) meses de reclusão. Diminui-se também a pena de multa para 840 (oitocentos e quarenta) dias-multa, à razão de 1/30 do salário-mínimo vigente ao tempo dos fatos. CRIME DE ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO. MANUTENÇÃO DA REPRIMENDA CONFORME FIXADA PELO JUÍZO A QUO. 19. Quanto à associação para o tráfico (art. 35 da Lei 11.343/2006), mantém-se o desvalor atribuído à culpabilidade, já que pautado na natureza das drogas envolvidas, notadamente o "crack", tudo em conformidade com a jurisprudência pátria e com o art. 42 da Lei de Drogas. 20. Mantém-se também a negativação das consequências, pois, conforme já ressaltado, o fato de a droga circular fora do município de Boa Viagem, inclusive para presídios em outras cidades, extrapola os limites do tipo penal. 21. De modo que, permanecendo desfavoráveis os dois vetores negativados em 1º grau, deve ser mantido o quantum da pena-base dos acusados em 04 (quatro) anos e 01 (um) meses de reclusão. 22. Na 2ª e 3ª fases, não foram reconhecidas atenuantes ou agravantes, nem causas de aumento ou de diminuição, o que deve permanecer. 23. Mantém-se a pena definitiva, portanto, quanto ao crime de associação para o tráfico, em 04 (quatro) anos e 01 (um) mês de reclusão para ambos os réus, permanecendo também a pena de multa no patamar de 830 (oitocentos e trinta) dias-multa, conforme aplicado em 1ª instância. 24. Aplicando a regra do concurso material de crimes, fica a pena definitiva redimensionada de 14 (catorze) anos, 06 (seis) meses e 10 (dez) dias de reclusão para 11 (onze) anos e 11 (onze) meses de reclusão. Sobre a multa, fica definitivamente alterada, para os dois recorrentes, de 1950 (um mil, novecentos e cinquenta) para 1670 (um mil, seiscentos e setenta) dias-multa, à razão de 1/30 do salário mínimo vigente ao tempo dos fatos. 25. Quanto ao regime de cumprimento da pena, o magistrado o fixou em inicialmente fechado para ambos os réus, o que se mantém, pois a soma das penas impostas, que resultou em uma condenação superior a 08 (oito) anos de reclusão, bem como a existência de circunstâncias judiciais negativas, enquadra o caso no art. 33, § 2º, 'a' do Código Penal, sem prejuízo de eventual detração a ser realizada pelo juízo das execuções. 26. Deixa-se de substituir a pena privativa de liberdade por restritiva de direitos, tendo em vista o não preenchimento dos requisitos do art. 44, I e III do Código Penal. RECURSO DE ANTÔNIO LUIS DA SILVA PARCIALMENTE CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO, E RECURSO DE RENATA NUNES DE SOUSA CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. ACORDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos de apelação criminal nº 0007407-37.2015.8.06.0051, ACORDAM os desembargadores da 1ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, à unanimidade, em conhecer parcialmente do recurso de Antônio Luíz da Silva e dar-lhe parcial provimento, e em conhecer do recurso de Renata Nunes de Sousa para dar-lhe parcial provimento. Fortaleza, 15 de maio de 2018 DESEMBARGADOR MÁRIO PARENTE TEÓFILO NETO Relator

Data do Julgamento : 15/05/2018
Data da Publicação : 15/05/2018
Classe/Assunto : Apelação / Tráfico de Drogas e Condutas Afins
Órgão Julgador : 1ª Câmara Criminal
Relator(a) : MARIO PARENTE TEÓFILO NETO
Comarca : Boa Viagem
Comarca : Boa Viagem
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