TJCE 0069843-38.2016.8.06.0167
PENAL E PROCESSO PENAL. APELAÇÃO. LESÃO CORPORAL NO CONTEXTO DA VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E DESOBEDIÊNCIA. PLEITO DE ABSOLVIÇÃO QUANTO AO DELITO DO ART. 330 DO CÓDIGO PENAL. ACOLHIMENTO. ATIPICIDADE.
1. Condenado à pena de 01 (um) ano e 02 (dois) meses de detenção para o delito de lesão corporal e em 04 (quatro) meses de detenção e 30 (trinta) dias-multa para o crime de desobediência, a serem cumpridas em regime inicialmente semiaberto, o réu interpôs o presente apelo sustentando, em síntese, a necessidade absolvição quanto ao delito de desobediência, tendo em vista a atipicidade da sua conduta.
2. Compulsando os autos, extrai-se que a denúncia imputa ao acusado, dentre outras condutas, a prática do crime de desobediência, pois no dia dos fatos o denunciado adentrou na residência da vítima e acabou lesionando-a, desrespeitando a decisão judicial que proibia que se aproximasse da ofendida em distância menor do que 100m.
3. Ocorre que, conforme entendimento firmado pelo Superior Tribunal de Justiça, o delito de desobediência tem natureza subsidiária (observando o princípio da ultima ratio do Direito Penal) e, por isso, só pode ser imputado caso não haja previsão específica de outra consequência jurídica ensejada pelo descumprimento da ordem.
4. Neste contexto, tem-se que conforme dispõe a Lei 11.340/2006, as medidas protetivas de urgência decretadas poderão ser substituídas a qualquer tempo por outras de maior eficácia, bem como poderão ser concedidas outras que se mostrem necessárias para garantir a proteção da ofendida. Há ainda previsão de que pode ser decretada, a qualquer momento do inquérito ou da instrução, a medida de segregação, o que se encontra inclusive em consonância com o teor do art. 313, III do Código de Processo Penal.
5. Assim, uma vez que existem, para alcançar o efetivo cumprimento das medidas protetivas de urgência, alternativas outras que não a imputação do crime de desobediência - a exemplo da própria prisão preventiva -, não há que se falar em infringência ao disposto no art. 330 do Diploma Repressivo, dada a atipicidade da conduta no caso em tela, sendo necessária a absolvição do recorrente quanto ao crime supracitado. Precedentes STJ e TJCE.
ANÁLISE, DE OFÍCIO, DA DOSIMETRIA DA PENA QUANTO AO DELITO DE LESÃO CORPORAL. NECESSIDADE DE REDIMENSIONAMENTO DA BASILAR E DE RETIRADA DA AGRAVANTE DE REINCIDÊNCIA.
6. O magistrado, ao dosar a pena do réu, entendeu como desfavoráveis os vetores do art. 59 do Código Penal referentes aos antecedentes, à personalidade, às circunstâncias do crime e ao comportamento da vítima. Por isso, afastou a basilar em 07 (sete) meses do mínimo legal (que é de três meses).
7. Deve ser atribuído traço neutro aos antecedentes, à personalidade do réu e ao comportamento da vítima, pois foram utilizados elementos inidôneos para exasperar a reprimenda, não havendo registro nos autos de maus antecedentes, ou fundamentação concreta que justifique o desvalor da personalidade. Ademais, importante relembrar que o comportamento da vítima, conforme entendimento do STJ, não pode ser considerado desfavorável ao réu. Precedentes.
8. Mantém-se a negativação das circunstâncias do crime, pois há nuances do caso concreto (modus operandi) que demonstram maior reprovabilidade na ação do acusado.
9. Remanescendo traço negativo sobre apenas um dos vetores do art. 59 do Código Penal, deve a pena-base ser redimensionada para 04 (quatro) meses e 22 (vinte e dois) dias de detenção, observando a mesma proporção aplicada em 1ª instância.
10. Na 2ª fase da dosimetria, foi reconhecida a agravante de reincidência, tendo a sanção do acusado sido elevada em 1/6. Contudo, mais uma vez é de frisar que não há no processo registro de condenação criminal em desfavor do acusado, muito menos hábil a gerar os efeitos da reincidência. Além disso, em consulta ao sistema processual SPROC e após contato telefônico junto à vara na qual tramitou a ação penal, também não foram encontradas informações sobre condenações definitivas possíveis de justificar a aplicação do art. 63 do Código Penal, razão pela qual se decota a referida agravante.
11. Fica a pena definitiva do acusado redimensionada de 01 (um) ano e 02 (dois) meses de detenção para 04 (quatro) meses e 22 (vinte e dois) dias de detenção quanto ao delito de lesão corporal no contexto da violência doméstica, em razão da ausência de causas de aumento ou de diminuição de pena.
12. Mantém-se o regime inicial de cumprimento de pena no semiaberto, pois o quantum de pena imposto e a fixação da pena-base acima do mínimo legal, quando analisados em conjunto, enquadram o caso no art. 33, §2º, 'b' do Código Penal. Precedentes. Correta também a não substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos, bem como a não concessão do sursis da pena, vez que as circunstâncias do delito não recomendam tais procedimentos. Inteligência do art. 44, III e 77, II, ambos do Código Penal.
RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. DE OFÍCIO, REDIMENSIONADA A PENA IMPOSTA QUANTO AO CRIME DE LESÃO CORPORAL.
ACORDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos de apelação criminal nº 0069843-38.2016.8.06.0167, ACORDAM os desembargadores da 1ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, à unanimidade e em consonância com o parecer ministerial, em conhecer do recurso de apelação e dar-lhe provimento. De ofício, fica redimensionada a pena quanto ao crime de lesão corporal, nos termos do voto do relator.
Fortaleza, 11 de julho de 2017
DESEMBARGADOR MÁRIO PARENTE TEÓFILO NETO
Relator
Ementa
PENAL E PROCESSO PENAL. APELAÇÃO. LESÃO CORPORAL NO CONTEXTO DA VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E DESOBEDIÊNCIA. PLEITO DE ABSOLVIÇÃO QUANTO AO DELITO DO ART. 330 DO CÓDIGO PENAL. ACOLHIMENTO. ATIPICIDADE.
1. Condenado à pena de 01 (um) ano e 02 (dois) meses de detenção para o delito de lesão corporal e em 04 (quatro) meses de detenção e 30 (trinta) dias-multa para o crime de desobediência, a serem cumpridas em regime inicialmente semiaberto, o réu interpôs o presente apelo sustentando, em síntese, a necessidade absolvição quanto ao delito de desobediência, tendo em vista a atipicidade da sua conduta.
2. Compulsando os autos, extrai-se que a denúncia imputa ao acusado, dentre outras condutas, a prática do crime de desobediência, pois no dia dos fatos o denunciado adentrou na residência da vítima e acabou lesionando-a, desrespeitando a decisão judicial que proibia que se aproximasse da ofendida em distância menor do que 100m.
3. Ocorre que, conforme entendimento firmado pelo Superior Tribunal de Justiça, o delito de desobediência tem natureza subsidiária (observando o princípio da ultima ratio do Direito Penal) e, por isso, só pode ser imputado caso não haja previsão específica de outra consequência jurídica ensejada pelo descumprimento da ordem.
4. Neste contexto, tem-se que conforme dispõe a Lei 11.340/2006, as medidas protetivas de urgência decretadas poderão ser substituídas a qualquer tempo por outras de maior eficácia, bem como poderão ser concedidas outras que se mostrem necessárias para garantir a proteção da ofendida. Há ainda previsão de que pode ser decretada, a qualquer momento do inquérito ou da instrução, a medida de segregação, o que se encontra inclusive em consonância com o teor do art. 313, III do Código de Processo Penal.
5. Assim, uma vez que existem, para alcançar o efetivo cumprimento das medidas protetivas de urgência, alternativas outras que não a imputação do crime de desobediência - a exemplo da própria prisão preventiva -, não há que se falar em infringência ao disposto no art. 330 do Diploma Repressivo, dada a atipicidade da conduta no caso em tela, sendo necessária a absolvição do recorrente quanto ao crime supracitado. Precedentes STJ e TJCE.
ANÁLISE, DE OFÍCIO, DA DOSIMETRIA DA PENA QUANTO AO DELITO DE LESÃO CORPORAL. NECESSIDADE DE REDIMENSIONAMENTO DA BASILAR E DE RETIRADA DA AGRAVANTE DE REINCIDÊNCIA.
6. O magistrado, ao dosar a pena do réu, entendeu como desfavoráveis os vetores do art. 59 do Código Penal referentes aos antecedentes, à personalidade, às circunstâncias do crime e ao comportamento da vítima. Por isso, afastou a basilar em 07 (sete) meses do mínimo legal (que é de três meses).
7. Deve ser atribuído traço neutro aos antecedentes, à personalidade do réu e ao comportamento da vítima, pois foram utilizados elementos inidôneos para exasperar a reprimenda, não havendo registro nos autos de maus antecedentes, ou fundamentação concreta que justifique o desvalor da personalidade. Ademais, importante relembrar que o comportamento da vítima, conforme entendimento do STJ, não pode ser considerado desfavorável ao réu. Precedentes.
8. Mantém-se a negativação das circunstâncias do crime, pois há nuances do caso concreto (modus operandi) que demonstram maior reprovabilidade na ação do acusado.
9. Remanescendo traço negativo sobre apenas um dos vetores do art. 59 do Código Penal, deve a pena-base ser redimensionada para 04 (quatro) meses e 22 (vinte e dois) dias de detenção, observando a mesma proporção aplicada em 1ª instância.
10. Na 2ª fase da dosimetria, foi reconhecida a agravante de reincidência, tendo a sanção do acusado sido elevada em 1/6. Contudo, mais uma vez é de frisar que não há no processo registro de condenação criminal em desfavor do acusado, muito menos hábil a gerar os efeitos da reincidência. Além disso, em consulta ao sistema processual SPROC e após contato telefônico junto à vara na qual tramitou a ação penal, também não foram encontradas informações sobre condenações definitivas possíveis de justificar a aplicação do art. 63 do Código Penal, razão pela qual se decota a referida agravante.
11. Fica a pena definitiva do acusado redimensionada de 01 (um) ano e 02 (dois) meses de detenção para 04 (quatro) meses e 22 (vinte e dois) dias de detenção quanto ao delito de lesão corporal no contexto da violência doméstica, em razão da ausência de causas de aumento ou de diminuição de pena.
12. Mantém-se o regime inicial de cumprimento de pena no semiaberto, pois o quantum de pena imposto e a fixação da pena-base acima do mínimo legal, quando analisados em conjunto, enquadram o caso no art. 33, §2º, 'b' do Código Penal. Precedentes. Correta também a não substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos, bem como a não concessão do sursis da pena, vez que as circunstâncias do delito não recomendam tais procedimentos. Inteligência do art. 44, III e 77, II, ambos do Código Penal.
RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. DE OFÍCIO, REDIMENSIONADA A PENA IMPOSTA QUANTO AO CRIME DE LESÃO CORPORAL.
ACORDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos de apelação criminal nº 0069843-38.2016.8.06.0167, ACORDAM os desembargadores da 1ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, à unanimidade e em consonância com o parecer ministerial, em conhecer do recurso de apelação e dar-lhe provimento. De ofício, fica redimensionada a pena quanto ao crime de lesão corporal, nos termos do voto do relator.
Fortaleza, 11 de julho de 2017
DESEMBARGADOR MÁRIO PARENTE TEÓFILO NETO
Relator
Data do Julgamento
:
11/07/2017
Data da Publicação
:
11/07/2017
Classe/Assunto
:
Apelação / Violência Doméstica Contra a Mulher
Órgão Julgador
:
1ª Câmara Criminal
Relator(a)
:
MARIO PARENTE TEÓFILO NETO
Comarca
:
Sobral
Comarca
:
Sobral
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