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Jurisprudência


TJCE 0077258-32.2009.8.06.0001

Ementa
PENAL E PROCESSO PENAL. APELAÇÃO. HOMICÍDIO CULPOSO NA DIREÇÃO DE VEÍCULO AUTOMOTOR MAJORADO PELA OMISSÃO DE SOCORRO. PLEITO DE ABSOLVIÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. DEMONSTRAÇÃO DA QUEBRA DO DEVER DE CUIDADO OBJETIVO. 1. Condenado à pena de 03 (três) anos e 04 (quatro) meses de detenção pelo cometimento do crime do art. 302 do CTB, o réu interpôs o presente apelo pugnando por sua absolvição, tendo em vista a precariedade das provas, bem como o fato de não ter sido responsável pelo acidente. Diz ainda que houve excesso acusatório na fixação da pena e questiona o valor da indenização imposta. 2. Compulsando os autos, extrai-se que ao contrário do que afirma o recorrente, existem provas suficientes de que foi ele quem deu causa à colisão que ensejou a morte da vítima, visto que depoimentos de testemunhas e o laudo pericial dão conta de que o acusado interceptou a trajetória da moto que era pilotada pelo ofendido, acabando por atingi-la e causar o sinistro. 3. Sobre o argumento de que o acidente ocorreu porque o ofendido bebeu antes dos fatos e vinha, supostamente, em velocidade acima da permitida, fazendo zigue-zague (o que nos faz inferir que a defesa alega a existência de culpa da vítima), ressalto que, primeiramente, a alta velocidade no momento da colisão e a realização de manobras imprudentes por parte da vítima não foram confirmadas nos autos. Ademais, ainda que assim não fosse, tem-se que conforme entendimento jurisprudencial e doutrinário, no Direito Penal não existe a possibilidade de compensação de culpas. Assim, a culpa do agente não pode ser anulada pela eventual culpa da vítima. Precedentes e doutrina. 4. Ressalte-se que, de acordo com a interpretação conjunta dos arts. 34 e 35 do Código de Trânsito Brasileiro, o condutor que queira executar manobra de deslocamento lateral (no caso, o réu) deve, além de sinalizar com antecedência, certificar-se de que poderia realizá-la sem perigo para os demais usuários da via que o seguem, precedem ou vão cruzar com ele, considerando sua posição, sua direção e sua velocidade, o que não foi feito de forma correta, havendo a quebra do dever objetivo de cuidado. 5. Nesta senda, resta assente que o magistrado de piso fundou-se em provas hábeis e suficientes para fundamentar a condenação do recorrente pelo delito de homicídio culposo na direção de veículo automotor. DA ANÁLISE DA DOSIMETRIA DA PENA. NECESSIDADE DE REDIMENSIONAMENTO DA BASILAR E DE DECOTE DA CONDENAÇÃO À REPARAÇÃO DE DANOS. 6. O sentenciante, ao dosar a pena do réu, entendeu como desfavoráveis as consequências do crime e afastou a basilar em 06 (seis) meses do mínimo legal, que é de 2 (dois) anos, uma vez que além de o apelante ter causado a morte do ofendido, o fato gerou sérios danos psicológicos à companheira da vítima, então sobrevivente do acidente, pois a mesma foi obrigada a submeter-se a tratamento médico durante dez meses, após ser acometida por depressão. 7. Ocorre que a morte da vítima não pode ser utilizada como justificativa idônea para elevar a pena, já que é inerente ao próprio tipo penal do art. 302 do Código de Trânsito Brasileiro, sob pena de bis in idem. Ademais, ainda que a companheira da vítima, que sobreviveu ao acidente, tenha narrado a ocorrência de danos psicológicos à sua pessoa, tem-se que tais argumentos não podem servir para exasperar a sanção do réu no que tange ao crime de homicídio culposo, pois além de se referir a outro delito (que é autônomo), a punibilidade do réu no que tange à lesão corporal causada na companheira da vítima fatal foi extinta pela decadência, já que ausente representação da mesma. Precedente STJ. 8. De modo que, não remanescendo traço desfavorável sobre quaisquer dos vetores do art. 59 do Código Penal, diminui-se a pena-base ao mínimo de 02 (dois) anos de detenção. 9. Necessário o reconhecimento da atenuante de confissão espontânea na 2ª fase da dosimetria, já que o acusado assumiu seu envolvimento no acidente em todas as oportunidades em que foi ouvido. Contudo, deixa-se de diminuir a sanção em observância ao teor do enunciado sumular nº 231 do STJ. 10. Mantém-se a elevação de 1/3 na 3ª fase da dosimetria em razão da omissão de socorro do réu que, mesmo não tendo fugido do local, não prestou assistência à vítima. Além disso, eventual morte imediata do ofendido não afasta o dever de prestação de socorro por parte do causador do acidente, pois somente um especialista é capaz de atestar o óbito de alguém nas condições da vítima. Precedentes. TJCE e STJ. 11. Assim, fica a pena definitiva redimensionada de 03 (três) anos e 04 (quatro) meses de detenção para 02 (dois) anos e 08 (oito) meses de detenção. 12. Mantém-se o regime de cumprimento da sanção no aberto, pois a primariedade do réu e o quantum de pena imposto enquadram o caso no art. 33, §2º, 'c' do Código Penal. Permanece também a substituição da pena privativa de liberdade por duas restritivas de direitos, nos termos fixados pelo magistrado a quo. 13. No que tange à pena de suspensão da permissão para dirigir veículo automotor, tem-se que a mesma foi fixada em 1ª instância pelo período de 06 (seis) meses. Contudo, uma vez que a sanção corporal foi diminuída por esta Corte para 2 (dois) anos e 8 (oito) meses de detenção, impõe-se a redução do prazo de suspensão para 02 (dois) meses e 20 (vinte) dias, nos parâmetros do art. 293 do CTB e da jurisprudência desta Câmara Criminal. 14. Deve-se, em observância aos primados do contraditório e da ampla defesa, decotar a condenação à reparação de danos (art. 387, IV do CPP), pois não houve pedido expresso na denúncia, não tendo o julgador sequer informado os parâmetros utilizados para a fixação do quantum. Precedentes. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. ACORDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos de apelação criminal nº 0077258-32.2009.8.06.0001, ACORDAM os desembargadores da 1ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, à unanimidade e em dissonância com o parecer ministerial, em conhecer do recurso de apelação e lhe dar parcial provimento, redimensionando a pena aplicada e decotando a condenação à reparação de danos, nos termos do voto do relator. Fortaleza, 27 de junho de 2017 DESEMBARGADOR MÁRIO PARENTE TEÓFILO NETO Relator

Data do Julgamento : 27/06/2017
Data da Publicação : 27/06/2017
Classe/Assunto : Apelação / Crimes de Trânsito
Órgão Julgador : 1ª Câmara Criminal
Relator(a) : MARIO PARENTE TEÓFILO NETO
Comarca : Fortaleza
Comarca : Fortaleza
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