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Jurisprudência


TJCE 0182080-28.2016.8.06.0001

Ementa
DIREITO CIVIL E CONSUMERISTA. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO. CONTRATO DE FINANCIAMENTO BANCÁRIO GARANTIDO POR ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. ARGUIÇÃO INCIDENTAL DA PRETENSÃO REVISIONAL DAS CLÁUSULAS CONTRATUAIS COMO MATÉRIA DE DEFESA. VIABILIDADE. ALEGAÇÃO DE ILEGALIDADE DAS TAXAS DE JUROS PACTUADAS, DA INCIDÊNCIA DO ANATOCISMO. AUSÊNCIA DE ABUSIVIDADE CONTRATUAL. REGULARIDADE DA NOTIFICAÇÃO EXTRAJUDICIAL. MORA CARACTERIZADA. CONSOLIDAÇÃO DA PROPRIEDADE E POSSE PLENA E EXCLUSIVA DO VEÍCULO EM FAVOR DO CREDOR FIDUCIÁRIO. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. SENTENÇA CONFIRMADA. 1 - Trata-se de apelação interposta contra sentença de procedência proferida na presente ação de busca e apreensão, sob o fundamento de estar caracterizada a mora, com a consolidação da propriedade e da posse plena e exclusiva no patrimônio do banco autor do veículo objeto do contrato de financiamento bancário garantido por alienação fiduciária celebrado entre os litigantes, em razão da ausência de reconhecimento de abusividade contratual alegada pelo consumidor. 2 - É cediço que as hipóteses de inadimplemento ou mora de obrigações contratuais garantidas por alienação fiduciária decorrem do simples vencimento do prazo para pagamento da contraprestação pactuada, cuja comprovação pode ser efetivada por carta registrada com aviso de recebimento, não se exigindo para tanto que a assinatura constante do referido aviso seja a do próprio destinatário. É que, diante da mora ou inadimplemento contratual se deflagra a antecipação do vencimento da dívida; considerando-se, de pleno direito, vencidas todas as obrigações contratuais, independentemente de aviso ou notificação judicial ou extrajudicial, por expressa determinação legal (art. 2º § 3º do Decreto-Lei nº 911/69). 3 - Nesse contexto, uma vez comprovada a mora, o credor (proprietário fiduciário) adquire o direito de postular judicialmente a busca e apreensão do bem alienado fiduciariamente, tanto contra o devedor fiduciante como também contra terceiro que eventualmente possa estar detendo a coisa; referida ação é regulada pelo Decreto-Lei nº 911/69, que estabelece o rito específico às hipóteses de alienação fiduciária em garantia no âmbito do mercado financeiro e de capitais (art. 8º-A), constituindo processo autônomo e independente de qualquer procedimento posterior (art. 3º § 8º). 4 - Assim, torna-se importante considerar que a comprovação da mora constitui pressuposto essencial para o desenvolvimento válido e regular do processo de Busca e Apreensão, conforme se depreende do artigo 3º, caput, do Decreto-Lei nº 911/69, bem como de acordo com o enunciado da Súmula 72 do Superior Tribunal de Justiça. 5 - Contudo, é assegurada ao consumidor a faculdade de litigar a revisão das cláusulas contratuais do pacto em que estipulada a alienação fiduciária do bem, com o propósito de afastar a configuração da mora, principalmente quanto às consequências decorrentes da ação de busca e apreensão; o que pode ocorrer com a declaração judicial da nulidade de encargos abusivos e ilegais pactuados ao período da normalidade contratual, ou seja, aqueles que incidem antes da situação de inadimplência, tais como a taxa de juros remuneratórios aplicada e a prática de anatocismo. 6 - No caso dos autos, o réu arguiu como matéria de defesa a nulidade de cláusulas contratuais, tais como a cobrança de juros extorsivos e a incidência da capitalização mensal de juros sem pactuação expressa. Registra-se que o contrato foi celebrado em 28/08/2015, com taxa de juros de 1,80% ao mês e 23,86% ao ano; portanto, não abusiva em relação à taxa média do mercado para fins de aquisição de veículo por pessoa física, naquele período, conforme parâmetros emitidos pelo Banco Central do Brasil em consulta no site ao Sistema de Gerenciamento de Séries Temporais - SGS, sob os nºs 25471 e 20749, a qual indica os percentuais de 1,86% ao mês e 24,79% ao ano, respectivamente; além de denotar a pactuação da capitalização mensal de juros, posto que firmado após a edição da Medida Provisória nº 1.963-7/2000 e por ser o percentual estipulado por ano superior ao duodécuplo daquele a incidir mensalmente, conforme orientação do Colendo Superior Tribunal de Justiça. Desta feita, inexiste ilegalidade de cobrança de encargos financeiros relativamente ao período de normalidade, circunstância que não têm o condão de afastar a caracterização da mora, de obstar o regular trâmite da presente ação de busca em apreensão, nem de afastar a superveniência do vencimento antecipado do pacto, preconizada pelo art. 2º, § 3º do Decreto-Lei nº 911/69. 7 - Neste contexto, cumpre ressaltar no que pertine especificamente à comprovação do inadimplemento contratual nos presentes autos, que o banco demandante realizou regularmente a notificação extrajudicial do polo réu, consolidando a constituição formal da mora no negócio jurídico em tablado. Assim, diante do efetivo implemento da mora contratual das prestações vencidas, torna-se imperativo o pagamento da integralidade do débito remanescente no prazo legal de cinco dias após realizada a medida liminar de busca e apreensão (art. 3º § 1º do Decreto-Lei nº 911/69), a fim de afastar os efeitos da mora e restituir em favor do fiduciante a posse do bem livre de ônus; haja vista que a purgação da mora deve englobar a totalidade do débito, tanto as parcelas vencidas como as vincendas (art. 3º § 2º do Decreto-Lei nº 911/69); o que, de fato, não ocorreu no presente caso. 8 - Portanto, evidenciando a presença dos requisitos autorizadores da presente ação de busca e apreensão, com a comprovação da mora, pressuposto de constituição válida e regular do feito, impõe-se a confirmação da sentença de 1º grau, que em face da procedência da ação determinou a consolidação da propriedade e da posse plena e exclusiva do veículo no patrimônio do banco autor; que, na hipótese de eventual venda do bem litigioso, deve aplicar o preço obtido no pagamento de seu crédito e das despesas decorrentes e entregar ao réu o saldo apurado, se houver, com a devida prestação de contas, nos termos do art. 2º caput do Decreto-Lei nº 911/69, com a redação dada pela Lei nº 13.043/2014. 9 - Apelação conhecida e desprovida. Sentença confirmada. ACÓRDÃO Acordam os Desembargadores integrantes da Primeira Câmara de Direito Privado do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, nos autos da Apelação nº 0182080-28.2016.8.06.0001, por unanimidade, por uma de suas Turmas, em conhecer da apelação interposta para negar-lhe provimento, nos termos do voto do eminente Relator. Fortaleza, 1º de novembro de 2017.

Data do Julgamento : 01/11/2017
Data da Publicação : 01/11/2017
Classe/Assunto : Apelação / Busca e Apreensão
Órgão Julgador : 1ª Câmara Direito Privado
Relator(a) : HERACLITO VIEIRA DE SOUSA NETO
Comarca : Fortaleza
Comarca : Fortaleza
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