TJCE 0218152-19.2013.8.06.0001
DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. AÇÃO ORDINÁRIA COM PEDIDO LIMINAR. PLANO DE SAÚDE. ADEQUAÇÃO DE FAIXA ETÁRIA. VALOR DA MENSALIDADE REAJUSTADO EM 300% (TREZENTOS POR CENTO). IMPOSSIBILIDADE DE READEQUAÇÕES EXORBITANTES. ABUSIVIDADE CONFIGURADA. APLICAÇÃO DO REAJUSTE DETERMINADO PELA AGÊNCIA NACIONAL DE SAÚDE (ANS). MODELO DE AUTOGESTÃO. INAPLICABILIDADE DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. PRECEDENTE DO STJ E TJCE. ÔNUS DO AUTOR NA COMPROVAÇÃO DOS FATOS CONSTITUTIVOS DO DIREITO (ART. 373, I, CPC). PRINCÍPIO DA PROBIDADE E BOA-FÉ CONTRATUAL (ART. 422 CC). EXISTÊNCIA DOS VÍCIOS (OMISSÃO E CONTRADIÇÃO) ELENCADOS NOS INCISOS DO ART. 1.022 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO, APENAS PARA DECLARAR A INAPLICABILIDADE DO CDC AO PRESENTE CASO. ENTENDIMENTO MANTIDO NOS DEMAIS TERMOS, SEGUINDO O QUE PRECEITUA O CÓDIGO CIVIL BRASILEIRO.
I - Cuida-se de Embargos de Declaração, interpostos por GEAP FUNDAÇÃO DE SEGURIDADE SOCIAL, em face do acórdão de fls. 580/890, que julgou improcedente o recurso apelatório interposto pela embargante, em desfavor de ANTONIO BEZERRA DA COSTA, por votação unânime, mantendo in totum a sentença combatida, que julgou parcialmente procedente o pleito autoral, declarando a nulidade da cláusula que autoriza a cobrança de reajuste unilateral devido à mudança da faixa etária, restabelecendo o contrato firmado inicialmente, devendo incidir a partir de junho de 2012 os reajustes da Variação dos Custos Médico-Hospitalares e ANS. Condenou o promovido (Geap) a ressarcir, em dobro, os valores indevidamente cobrados, bem como fixou honorários e custas processuais de forma recíproca, nos termos do art. 86 do CPC/15.
II - Consoante o art. 1.022, da Lei nº 13.105/15 (Código de Processo Civil de 2015), são cabíveis embargos de declaração contra qualquer decisão judicial para: I - esclarecer obscuridade ou eliminar contradição; II - suprir omissão de ponto ou questão sobre o qual devia se pronunciar o juiz de ofício ou a requerimento; III - corrigir erro material.
III - In casu, a embargante, GEAP FUNDAÇÃO DE SEGURIDADE SOCIAL, alegou que o acórdão que manteve a sentença do juízo a quo está, salvo melhor entendimento, contraditório e omisso nos seguintes pontos: I Aplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor; II Forma de custeio do plano de saúde na modalidade de autogestão; III - Impossibilidade de devolução de valores, visto que cobrados de forma devida.
IV - Valioso ressaltar, que o plano de saúde da GEAP, é pessoa jurídica de direito privado, sem fins lucrativos, funcionando na modalidade de autogestão, onde a assistência à saúde é fornecida com exclusividade para um determinado público de beneficiários, não sendo ofertado livremente para a coletividade. Desta forma, os próprios usuários do plano gerenciam a entidade, tomando todas as decisões que são operacionalizadas pela Diretoria Executiva, tudo em conformidade com o Estatuto Social próprio de cada entidade. Assim, pela ausência de comercialização do plano de saúde da embargante, inexiste a aplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor, por não ser vislumbrada a presença de relação de consumo, tudo em conformidade com o atual entendimento do STJ.
V - O Código de Processo Civil de 2015 estabelece, em seu art. 373, a distribuição do ônus da prova, conforme a posição processual que cada parte assume. O polo ativo compete provar a constituição do direito pretendido e, o polo passivo, a prova do fato impeditivo, modificativo e extintivo do direito alegado ao autor.
VI - Analisando a documentação apresentada, verifica-se que o recorrido (ANTONIO BEZERRA DA COSTA) suportou uma significativa variação no preço da mensalidade. Como se pode notar, o valor variou bem acima do percentual de reajuste autorizado pela ANS para o período. Portanto, como bem ressaltou o nobre Magistrado sentenciante, o reajuste encontra-se muito além do que foi regulamentado pela ANS para o período em discussão, sendo o índice apontado de 7,93% (sete vírgula noventa e três por cento). Destarte, embora os reajustes estejam respaldados pela deliberação do conselho de administração, como alegado pela operadora do plano de saúde, deve ser levado em consideração o percentual sugerido pela ANS para o período que foi calculado, de acordo com os critérios legais, e um aumento superior a esse, em tese, configura abusividade, rechaçado pelo Poder Judiciário.
VII - O Código Civil brasileiro, em seu art. 421, estabelece que "a liberdade de contratar será exercida em razão e nos limites da função social do contrato", complementando, o art. 422 estipula que ambas as partes estão obrigadas a guardar "os princípios de probidade e boa-fé". In casu, verifica-se que o aumento inesperado e desproporcional ocorrido, fere a qualquer princípio de probidade de boa-fé na relação contratual, colocando as partes em patente desigualdade, descumprindo, com isso, a função social do instrumento particular.
VIII - A não especificação, pela Agência Nacional de Saúde (ANS), de limitação dos reajustes para contratos de autogestão (coletivos), não significa que os usuários ficarão a merce do livre entendimento e ditames da prestadora de serviço, não sendo a não aplicabilidade do CDC ao presente caso, fato que mudará o entendimento final desta Relatoria quanto ao aumento exorbitante das parcelas, bem como o dever de devolução dos valores indevidamente cobrados, nos moldes do art. 876 do Código Civil.
IX - Com relação ao prequestionamento, registre-se que a não manifestação expressa de dispositivos legais não impede o conhecimento de eventual recurso especial, pois, consoante entendimento do Superior Tribunal de Justiça, não é necessária a menção expressa de artigos de lei para estar configurado o prequestionamento da matéria.
X Recurso conhecido e parcialmente provido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os presentes Embargos Declaratórios em Apelação Cível nº 0186124-95.2013.8.06.0001/50000, acordam os DESEMBARGADORES MEMBROS DA TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO DESTE EGRÉGIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO CEARÁ, por unanimidade, em CONHECER DOS ACLARATÓRIOS, PARA DAR-LHES PARCIAL PROVIMENTO, por verificar os vícios de compreensão relacionados no art. 1.022, do Código de Processo Civil de 2015 (omissão e contradição), apenas para declarar inaplicável o Código de Defesa do Consumidor aos contratos de plano de saúde de modalidade de autogestão, mantendo o entendimento de reajuste e obrigatoriedade de devolução dos valores indevidamente cobrados, tudo em conformidade com o que estabelece o Código Civil Brasileiro.
MARIA VILAUBA FAUSTO LOPES
Desembargadora Relatora
Ementa
DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. AÇÃO ORDINÁRIA COM PEDIDO LIMINAR. PLANO DE SAÚDE. ADEQUAÇÃO DE FAIXA ETÁRIA. VALOR DA MENSALIDADE REAJUSTADO EM 300% (TREZENTOS POR CENTO). IMPOSSIBILIDADE DE READEQUAÇÕES EXORBITANTES. ABUSIVIDADE CONFIGURADA. APLICAÇÃO DO REAJUSTE DETERMINADO PELA AGÊNCIA NACIONAL DE SAÚDE (ANS). MODELO DE AUTOGESTÃO. INAPLICABILIDADE DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. PRECEDENTE DO STJ E TJCE. ÔNUS DO AUTOR NA COMPROVAÇÃO DOS FATOS CONSTITUTIVOS DO DIREITO (ART. 373, I, CPC). PRINCÍPIO DA PROBIDADE E BOA-FÉ CONTRATUAL (ART. 422 CC). EXISTÊNCIA DOS VÍCIOS (OMISSÃO E CONTRADIÇÃO) ELENCADOS NOS INCISOS DO ART. 1.022 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO, APENAS PARA DECLARAR A INAPLICABILIDADE DO CDC AO PRESENTE CASO. ENTENDIMENTO MANTIDO NOS DEMAIS TERMOS, SEGUINDO O QUE PRECEITUA O CÓDIGO CIVIL BRASILEIRO.
I - Cuida-se de Embargos de Declaração, interpostos por GEAP FUNDAÇÃO DE SEGURIDADE SOCIAL, em face do acórdão de fls. 580/890, que julgou improcedente o recurso apelatório interposto pela embargante, em desfavor de ANTONIO BEZERRA DA COSTA, por votação unânime, mantendo in totum a sentença combatida, que julgou parcialmente procedente o pleito autoral, declarando a nulidade da cláusula que autoriza a cobrança de reajuste unilateral devido à mudança da faixa etária, restabelecendo o contrato firmado inicialmente, devendo incidir a partir de junho de 2012 os reajustes da Variação dos Custos Médico-Hospitalares e ANS. Condenou o promovido (Geap) a ressarcir, em dobro, os valores indevidamente cobrados, bem como fixou honorários e custas processuais de forma recíproca, nos termos do art. 86 do CPC/15.
II - Consoante o art. 1.022, da Lei nº 13.105/15 (Código de Processo Civil de 2015), são cabíveis embargos de declaração contra qualquer decisão judicial para: I - esclarecer obscuridade ou eliminar contradição; II - suprir omissão de ponto ou questão sobre o qual devia se pronunciar o juiz de ofício ou a requerimento; III - corrigir erro material.
III - In casu, a embargante, GEAP FUNDAÇÃO DE SEGURIDADE SOCIAL, alegou que o acórdão que manteve a sentença do juízo a quo está, salvo melhor entendimento, contraditório e omisso nos seguintes pontos: I Aplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor; II Forma de custeio do plano de saúde na modalidade de autogestão; III - Impossibilidade de devolução de valores, visto que cobrados de forma devida.
IV - Valioso ressaltar, que o plano de saúde da GEAP, é pessoa jurídica de direito privado, sem fins lucrativos, funcionando na modalidade de autogestão, onde a assistência à saúde é fornecida com exclusividade para um determinado público de beneficiários, não sendo ofertado livremente para a coletividade. Desta forma, os próprios usuários do plano gerenciam a entidade, tomando todas as decisões que são operacionalizadas pela Diretoria Executiva, tudo em conformidade com o Estatuto Social próprio de cada entidade. Assim, pela ausência de comercialização do plano de saúde da embargante, inexiste a aplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor, por não ser vislumbrada a presença de relação de consumo, tudo em conformidade com o atual entendimento do STJ.
V - O Código de Processo Civil de 2015 estabelece, em seu art. 373, a distribuição do ônus da prova, conforme a posição processual que cada parte assume. O polo ativo compete provar a constituição do direito pretendido e, o polo passivo, a prova do fato impeditivo, modificativo e extintivo do direito alegado ao autor.
VI - Analisando a documentação apresentada, verifica-se que o recorrido (ANTONIO BEZERRA DA COSTA) suportou uma significativa variação no preço da mensalidade. Como se pode notar, o valor variou bem acima do percentual de reajuste autorizado pela ANS para o período. Portanto, como bem ressaltou o nobre Magistrado sentenciante, o reajuste encontra-se muito além do que foi regulamentado pela ANS para o período em discussão, sendo o índice apontado de 7,93% (sete vírgula noventa e três por cento). Destarte, embora os reajustes estejam respaldados pela deliberação do conselho de administração, como alegado pela operadora do plano de saúde, deve ser levado em consideração o percentual sugerido pela ANS para o período que foi calculado, de acordo com os critérios legais, e um aumento superior a esse, em tese, configura abusividade, rechaçado pelo Poder Judiciário.
VII - O Código Civil brasileiro, em seu art. 421, estabelece que "a liberdade de contratar será exercida em razão e nos limites da função social do contrato", complementando, o art. 422 estipula que ambas as partes estão obrigadas a guardar "os princípios de probidade e boa-fé". In casu, verifica-se que o aumento inesperado e desproporcional ocorrido, fere a qualquer princípio de probidade de boa-fé na relação contratual, colocando as partes em patente desigualdade, descumprindo, com isso, a função social do instrumento particular.
VIII - A não especificação, pela Agência Nacional de Saúde (ANS), de limitação dos reajustes para contratos de autogestão (coletivos), não significa que os usuários ficarão a merce do livre entendimento e ditames da prestadora de serviço, não sendo a não aplicabilidade do CDC ao presente caso, fato que mudará o entendimento final desta Relatoria quanto ao aumento exorbitante das parcelas, bem como o dever de devolução dos valores indevidamente cobrados, nos moldes do art. 876 do Código Civil.
IX - Com relação ao prequestionamento, registre-se que a não manifestação expressa de dispositivos legais não impede o conhecimento de eventual recurso especial, pois, consoante entendimento do Superior Tribunal de Justiça, não é necessária a menção expressa de artigos de lei para estar configurado o prequestionamento da matéria.
X Recurso conhecido e parcialmente provido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os presentes Embargos Declaratórios em Apelação Cível nº 0186124-95.2013.8.06.0001/50000, acordam os DESEMBARGADORES MEMBROS DA TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO DESTE EGRÉGIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO CEARÁ, por unanimidade, em CONHECER DOS ACLARATÓRIOS, PARA DAR-LHES PARCIAL PROVIMENTO, por verificar os vícios de compreensão relacionados no art. 1.022, do Código de Processo Civil de 2015 (omissão e contradição), apenas para declarar inaplicável o Código de Defesa do Consumidor aos contratos de plano de saúde de modalidade de autogestão, mantendo o entendimento de reajuste e obrigatoriedade de devolução dos valores indevidamente cobrados, tudo em conformidade com o que estabelece o Código Civil Brasileiro.
MARIA VILAUBA FAUSTO LOPES
Desembargadora Relatora
Data do Julgamento
:
04/04/2018
Data da Publicação
:
04/04/2018
Classe/Assunto
:
Embargos de Declaração / Planos de Saúde
Órgão Julgador
:
3ª Câmara Direito Privado
Relator(a)
:
MARIA VILAUBA FAUSTO LOPES
Comarca
:
Fortaleza
Comarca
:
Fortaleza
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