TJCE 0426790-62.2010.8.06.0001
PENAL E PROCESSO PENAL. APELAÇÃO. HOMICÍDIO QUALIFICADO. RECURSO DE AMBOS OS RÉUS. JULGAMENTO MANIFESTAMENTE CONTRÁRIO À PROVA DOS AUTOS. INOCORRÊNCIA. DECISÃO DO TRIBUNAL POPULAR COMPROVADA EM SUPORTE FÁTICO-PROBATÓRIO EXISTENTE.
1. Condenados à pena de 15 (quinze) anos de reclusão, pelo delito de homicídio qualificado, os réus interpuseram apelos sustentando que a decisão dos jurados se deu de forma manifestamente contrária à prova dos autos, pois inexistente elemento que apontasse os mesmos como autores do delito. Renan apresentou insurgência, ainda, no que pertine à pena imposta, pleiteando seu redimensionamento. Silas, por sua vez, requereu a concessão dos benefícios da justiça gratuita.
2. Constata-se no processo, claramente, suporte fático-probatório a ensejar a decisão dos jurados de condenar os apelantes nos termos do artigo 121, § 2º, I e IV, CPB, especificamente pela prova oral colhida tanto no inquérito quanto na instrução, vez que há declarações que dão conta de que Silas e Renan eram pessoas envolvidas com o tráfico e que tinham uma rixa com Tostão e Patrícia, tia da vítima, intriga esta que ensejou a realização de ameaças por parte dos réus de que matariam todos os familiares e pessoas envolvidas com seus adversários. Além disso, relatos apontam que estas ameaças foram consumadas, visto que diversas pessoas próximas a Patrícia e Tostão acabaram sendo mortas, incluindo a vítima do presente processo. Tais declarações foram confirmadas pela genitora do ofendido, que narrou em juízo que ouviu comentários de que os réus teriam matado seu filho em razão da intriga que existia entre eles, Tostão e Patrícia.
3. Assim, uma vez que o Tribunal do Júri, órgão competente para julgar crimes dolosos contra a vida, tem liberdade para avaliar o conjunto probatório e atribuir a cada elemento o grau de importância que achar devido, não há que se questionar sobre a validade dos depoimentos testemunhais apresentados, pois o Conselho de Sentença é soberano em suas decisões, descabendo a este órgão de 2ª instância adentrar ao mérito do julgamento e discutir o valor atribuído pelos jurados às provas constantes nos autos.
4. Dessa forma, a decisão vergastada é irretocável e merece permanecer intacta, tendo em vista que não foi verificada a contrariedade do veredicto em relação às provas coligidas nos autos, as quais sustentam a tese acusatória a que se afiliaram os jurados, rejeitando a tese das defesas, sem qualquer vício que ocasione dúvidas quanto à legitimidade e soberania características da decisão do Júri.
RECURSO DO RÉU RENAN RODRIGUES PEREIRA. ERRO OU INJUSTIÇA NO TOCANTE À APLICAÇÃO DA PENA. OCORRÊNCIA. NECESSIDADE DE REDIMENSIONAMENTO DA REPRIMENDA APLICADA. EXTENSÃO AO CORRÉU, DE OFÍCIO. INTELIGÊNCIA DO ART. 580 DO CPP. PEDIDO DE GRATUIDADE DA JUSTIÇA. NÃO CONHECIMENTO.
5. O réu Renan Rodrigues Pereira, em sua apelação, também apresenta insurgência no tocante à pena imposta. Dito isto, tem-se que o juiz presidente, quando da análise das circunstâncias judiciais, considerou desfavoráveis a culpabilidade, a conduta social e os motivos do crime, afastando a pena-base em 02 (dois) anos do mínimo legal, que é de 12 (doze) anos.
6. Sobre a culpabilidade, tem-se que ainda que haja menção, por meio da prova oral, que o executor de alcunha Gago era menor de idade, tal não se mostra suficiente para exasperar a pena-base do réu, vez que essa circunstância diz respeito ao estado de pessoa e, por isso, sua comprovação deve ser realizada mediante prova documental hábil, de acordo com as restrições estabelecidas na lei civil, conforme art. 155, parágrafo único, do CPP.
7. No que tange à conduta social, o julgador afirmou que era desfavorável em virtude de haver relatos de que o réu possuía comportamento desajustado, levando em consideração o fato de ele estar sendo processado por várias outras ações penais, inclusive uma delas por homicídio, que se encontrava em grau de recurso. Ocorre que, conforme enunciado sumular nº 444 do Superior Tribunal de Justiça, inquéritos e ações penais em andamento não podem ser utilizados para exasperar a pena-base, razão pela qual a fundamentação do julgador se mostrou inidônea.
8. Contudo, observando o amplo efeito devolutivo da apelação, tem-se que o fato de haver diversos relatos dando conta de que o acusado era pessoa temida no meio em que vivia, possibilita a manutenção do desvalor da presente vetorial pois, repita-se, esta circunstância refere-se ao comportamento do agente no meio em que vive. Precedentes.
9. Por fim, quanto aos motivos do crime, o julgador afirmou que os mesmos eram torpes, conforme resposta do Conselho de Sentença aos quesitos de fls. 1065. Porém, uma vez que o recorrente foi condenado pelo crime de homicídio com apenas duas qualificadoras, utiliza-se a torpeza para qualificar o delito e retira-se a valoração dada à vetorial dos motivos do crime, para se evitar bis in idem, deixando a aplicação da qualificadora sobejante para a 2ª fase da dosagem da sanção. Precedentes.
10. De modo que, persistindo tom desfavorável sobre apenas um dos vetores do art. 59 do Código Penal (conduta social), medida que se impõe é o redimensionamento da pena-base para o patamar de 12 (doze) anos e 08 (oito) meses de reclusão.
11. Na 2ª fase, mantém-se o agravamento da sanção em 01 (um) ano, mesmo quantum fixado pelo juízo singular, em razão de o crime ter sido cometido mediante recurso que impossibilitou a defesa da vítima, ficando a reprimenda definitiva redimensionada do montante de 15 (quinze) anos de reclusão para o patamar de 13 (treze) anos e 08 (oito) meses de reclusão.
12. Quanto ao regime inicial de cumprimento da pena, deve o mesmo permanecer no inicialmente fechado, tendo em vista a fixação de reprimenda em patamar superior a 08 (oito) anos, em consonância com o art. 33, § 2º, 'a' do Código Penal.
13. Não tendo as mudanças supracitadas se fundado em circunstâncias de caráter exclusivamente pessoal, o redimensionamento da sanção deve ser estendido, de ofício, ao corréu SILAS FERREIRA DE AQUINO, por força do art. 580 do Código de Processo Penal, ficando a reprimenda de ambos, portanto, no montante de 13 (treze) anos e 08 (oito) meses de reclusão. Precedentes.
14. Deixa-se de conhecer o pedido de Silas Ferreira de Aquino referente à concessão dos benefícios da justiça gratuita, já que o entendimento jurisprudencial pátrio é no sentido de que tal pleito é competência do juízo das execuções. Precedentes.
RECURSO DE SILAS FERREIRA DE AQUINO PARCIALMENTE CONHECIDO E IMPROVIDO. APELAÇÃO DE RENAN RODRIGUES PEREIRA CONHECIDA E PARCIALMENTE PROVIDA, ESTENDENDO-SE, DE OFÍCIO, AO CORRÉU SILAS FERREIRA DE AQUINO, A ALTERAÇÃO REALIZADA NAS PENAS.
ACORDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos de apelação criminal nº 0426790-62.2010.8.06.0001, ACORDAM os desembargadores da 1ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, por maioria e em parcial consonância com o parecer ministerial, em conhecer parcialmente do recurso de apelação interposto por Silas Ferreira de Aquino e lhe negar provimento, e em conhecer do recurso protocolado por Renan Rodrigues Pereira e dar-lhe parcial provimento, estendendo, de ofício, ao corréu Silas Ferreira de Aquino, a alteração realizada nas penas, nos termos do voto do Relator Designado.
Fortaleza, 12 de setembro de 2017
DESEMBARGADOR MÁRIO PARENTE TEÓFILO NETO
Relator Designado
Ementa
PENAL E PROCESSO PENAL. APELAÇÃO. HOMICÍDIO QUALIFICADO. RECURSO DE AMBOS OS RÉUS. JULGAMENTO MANIFESTAMENTE CONTRÁRIO À PROVA DOS AUTOS. INOCORRÊNCIA. DECISÃO DO TRIBUNAL POPULAR COMPROVADA EM SUPORTE FÁTICO-PROBATÓRIO EXISTENTE.
1. Condenados à pena de 15 (quinze) anos de reclusão, pelo delito de homicídio qualificado, os réus interpuseram apelos sustentando que a decisão dos jurados se deu de forma manifestamente contrária à prova dos autos, pois inexistente elemento que apontasse os mesmos como autores do delito. Renan apresentou insurgência, ainda, no que pertine à pena imposta, pleiteando seu redimensionamento. Silas, por sua vez, requereu a concessão dos benefícios da justiça gratuita.
2. Constata-se no processo, claramente, suporte fático-probatório a ensejar a decisão dos jurados de condenar os apelantes nos termos do artigo 121, § 2º, I e IV, CPB, especificamente pela prova oral colhida tanto no inquérito quanto na instrução, vez que há declarações que dão conta de que Silas e Renan eram pessoas envolvidas com o tráfico e que tinham uma rixa com Tostão e Patrícia, tia da vítima, intriga esta que ensejou a realização de ameaças por parte dos réus de que matariam todos os familiares e pessoas envolvidas com seus adversários. Além disso, relatos apontam que estas ameaças foram consumadas, visto que diversas pessoas próximas a Patrícia e Tostão acabaram sendo mortas, incluindo a vítima do presente processo. Tais declarações foram confirmadas pela genitora do ofendido, que narrou em juízo que ouviu comentários de que os réus teriam matado seu filho em razão da intriga que existia entre eles, Tostão e Patrícia.
3. Assim, uma vez que o Tribunal do Júri, órgão competente para julgar crimes dolosos contra a vida, tem liberdade para avaliar o conjunto probatório e atribuir a cada elemento o grau de importância que achar devido, não há que se questionar sobre a validade dos depoimentos testemunhais apresentados, pois o Conselho de Sentença é soberano em suas decisões, descabendo a este órgão de 2ª instância adentrar ao mérito do julgamento e discutir o valor atribuído pelos jurados às provas constantes nos autos.
4. Dessa forma, a decisão vergastada é irretocável e merece permanecer intacta, tendo em vista que não foi verificada a contrariedade do veredicto em relação às provas coligidas nos autos, as quais sustentam a tese acusatória a que se afiliaram os jurados, rejeitando a tese das defesas, sem qualquer vício que ocasione dúvidas quanto à legitimidade e soberania características da decisão do Júri.
RECURSO DO RÉU RENAN RODRIGUES PEREIRA. ERRO OU INJUSTIÇA NO TOCANTE À APLICAÇÃO DA PENA. OCORRÊNCIA. NECESSIDADE DE REDIMENSIONAMENTO DA REPRIMENDA APLICADA. EXTENSÃO AO CORRÉU, DE OFÍCIO. INTELIGÊNCIA DO ART. 580 DO CPP. PEDIDO DE GRATUIDADE DA JUSTIÇA. NÃO CONHECIMENTO.
5. O réu Renan Rodrigues Pereira, em sua apelação, também apresenta insurgência no tocante à pena imposta. Dito isto, tem-se que o juiz presidente, quando da análise das circunstâncias judiciais, considerou desfavoráveis a culpabilidade, a conduta social e os motivos do crime, afastando a pena-base em 02 (dois) anos do mínimo legal, que é de 12 (doze) anos.
6. Sobre a culpabilidade, tem-se que ainda que haja menção, por meio da prova oral, que o executor de alcunha Gago era menor de idade, tal não se mostra suficiente para exasperar a pena-base do réu, vez que essa circunstância diz respeito ao estado de pessoa e, por isso, sua comprovação deve ser realizada mediante prova documental hábil, de acordo com as restrições estabelecidas na lei civil, conforme art. 155, parágrafo único, do CPP.
7. No que tange à conduta social, o julgador afirmou que era desfavorável em virtude de haver relatos de que o réu possuía comportamento desajustado, levando em consideração o fato de ele estar sendo processado por várias outras ações penais, inclusive uma delas por homicídio, que se encontrava em grau de recurso. Ocorre que, conforme enunciado sumular nº 444 do Superior Tribunal de Justiça, inquéritos e ações penais em andamento não podem ser utilizados para exasperar a pena-base, razão pela qual a fundamentação do julgador se mostrou inidônea.
8. Contudo, observando o amplo efeito devolutivo da apelação, tem-se que o fato de haver diversos relatos dando conta de que o acusado era pessoa temida no meio em que vivia, possibilita a manutenção do desvalor da presente vetorial pois, repita-se, esta circunstância refere-se ao comportamento do agente no meio em que vive. Precedentes.
9. Por fim, quanto aos motivos do crime, o julgador afirmou que os mesmos eram torpes, conforme resposta do Conselho de Sentença aos quesitos de fls. 1065. Porém, uma vez que o recorrente foi condenado pelo crime de homicídio com apenas duas qualificadoras, utiliza-se a torpeza para qualificar o delito e retira-se a valoração dada à vetorial dos motivos do crime, para se evitar bis in idem, deixando a aplicação da qualificadora sobejante para a 2ª fase da dosagem da sanção. Precedentes.
10. De modo que, persistindo tom desfavorável sobre apenas um dos vetores do art. 59 do Código Penal (conduta social), medida que se impõe é o redimensionamento da pena-base para o patamar de 12 (doze) anos e 08 (oito) meses de reclusão.
11. Na 2ª fase, mantém-se o agravamento da sanção em 01 (um) ano, mesmo quantum fixado pelo juízo singular, em razão de o crime ter sido cometido mediante recurso que impossibilitou a defesa da vítima, ficando a reprimenda definitiva redimensionada do montante de 15 (quinze) anos de reclusão para o patamar de 13 (treze) anos e 08 (oito) meses de reclusão.
12. Quanto ao regime inicial de cumprimento da pena, deve o mesmo permanecer no inicialmente fechado, tendo em vista a fixação de reprimenda em patamar superior a 08 (oito) anos, em consonância com o art. 33, § 2º, 'a' do Código Penal.
13. Não tendo as mudanças supracitadas se fundado em circunstâncias de caráter exclusivamente pessoal, o redimensionamento da sanção deve ser estendido, de ofício, ao corréu SILAS FERREIRA DE AQUINO, por força do art. 580 do Código de Processo Penal, ficando a reprimenda de ambos, portanto, no montante de 13 (treze) anos e 08 (oito) meses de reclusão. Precedentes.
14. Deixa-se de conhecer o pedido de Silas Ferreira de Aquino referente à concessão dos benefícios da justiça gratuita, já que o entendimento jurisprudencial pátrio é no sentido de que tal pleito é competência do juízo das execuções. Precedentes.
RECURSO DE SILAS FERREIRA DE AQUINO PARCIALMENTE CONHECIDO E IMPROVIDO. APELAÇÃO DE RENAN RODRIGUES PEREIRA CONHECIDA E PARCIALMENTE PROVIDA, ESTENDENDO-SE, DE OFÍCIO, AO CORRÉU SILAS FERREIRA DE AQUINO, A ALTERAÇÃO REALIZADA NAS PENAS.
ACORDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos de apelação criminal nº 0426790-62.2010.8.06.0001, ACORDAM os desembargadores da 1ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, por maioria e em parcial consonância com o parecer ministerial, em conhecer parcialmente do recurso de apelação interposto por Silas Ferreira de Aquino e lhe negar provimento, e em conhecer do recurso protocolado por Renan Rodrigues Pereira e dar-lhe parcial provimento, estendendo, de ofício, ao corréu Silas Ferreira de Aquino, a alteração realizada nas penas, nos termos do voto do Relator Designado.
Fortaleza, 12 de setembro de 2017
DESEMBARGADOR MÁRIO PARENTE TEÓFILO NETO
Relator Designado
Data do Julgamento
:
12/09/2017
Data da Publicação
:
14/09/2017
Classe/Assunto
:
Apelação / Homicídio Qualificado
Órgão Julgador
:
1ª Câmara Criminal
Relator(a)
:
MARIO PARENTE TEÓFILO NETO
Comarca
:
Fortaleza
Comarca
:
Fortaleza
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