TJCE 0430313-82.2010.8.06.0001
PROCESSO CIVIL E DIREITO DO CONSUMIDOR. APELAÇÃO E RECURSO ADESIVO. OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C COBRANÇA E DANOS MORAIS. NEGATIVA DA OPERADORA DE PLANO DE SAÚDE DA COBERTURA DAS DESPESAS COM EXAMES E PROCEDIMENTOS MÉDICOS DE URGÊNCIA E EMERGÊNCIA. SEGURADA IDOSA. FALECIMENTO DA AUTORA NO CURSO DA DEMANDA. DESPESAS CUSTEADAS PELA PACIENTE. APLICAÇÃO DO CDC À ESPÉCIE. SÚMULA Nº 469 DO STJ. DIREITO À VIDA. DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA. DIREITO AO REEMBOLSO DAS DESPESAS MÉDICAS. DANO MORAL IN RE IPSA. QUANTUM INDENIZATÓRIO FIXADO PELO JUÍZO AD QUEM EM ADEQUAÇÃO ÀS PECULIARIDADES DO CASO CONCRETO E OBSERVADOS OS PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE. JUROS DE MORA. TERMO INICIAL. CITAÇÃO. CORREÇÃO MONETÁRIA A PARTIR DO ARBITRAMENTO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. ADEQUAÇÃO. APELO IMPROVIDO E RECURSO ADESIVO PROVIDO. DECISÃO REFORMADA EM PARTE.
1. Extrai-se do exame dos autos que a parte autora, idosa de 83 anos de idade e usuária da UNIMED, necessitou de ser internada de urgência no Hospital São Mateus. Que operadora de plano de saúde contratada negou a cobertura das despesas referentes a alimentação, exames laboratoriais e de imagem e despesas médicas em procedimento cirúrgico, razão pela qual a demandante teve que arcar com o dispêndio. Assim, postulou a procedência da ação para condenar a ré a restituir o valor de R$ 21.045,14 (vinte e um mil, quarenta e cinco reais e quatorze centavos), assim como a indenização por danos morais sofridos.
2. Decidindo no feito, o Magistrado de Piso julgou parcialmente procedente o pedido autoral, determinando que a demandada proceda o ressarcimento das despesas médico-hospitalares despendidas pela promovente no valor de R$ 21.045,14 (vinte um mil, quarenta e cinco reais e quatorze centavos), devidamente corrigidos e acrescido de correção monetária a partir da recusa da promovida em efetuar o reembolso devido e juros de 1% (um por cento) ao mês, deixando de condenar em danos morais. Condenou, ainda, a suplicada no pagamento das custas processuais e em honorários advocatícios fixados em 20% (vinte por cento) sobre o valor da condenação.
3. DO RECURSO DA UNIMED. Inconformada, a operadora de saúde interpôs recurso de Apelação Cível, alegando que o contrato de assistência à saúde celebrado com a parte apelada, além de adequar-se perfeitamente à legislação, não prevê a cobertura para a realização dos procedimentos médicos de tomografia, eletroencefalograma e fisioterapia, razão pela qual teria negado autorização para tais solicitações; que não possui a obrigação de fornecer à autora autorização para realizar os aludidos procedimentos, tendo em vista que o plano contratado é anterior à Lei 9.656/98; que inexistem cláusulas contratuais abusivas na relação de consumo firmada; necessidade de indicar o dies a quo da incidência de juros moratórios; e a impossibilidade de arbitramento de honorários advocatícios em 20% (vinte por cento) sobre o valor da condenação, pelo que requer a reforma in totum da sentença vergastada.
4. Os contratos de planos de saúde estão submetidos ao Código de Defesa do Consumidor, nos termos da Súmula nº 469 do STJ. O art. 47 do CDC determina a interpretação das cláusulas contratuais de maneira mais favorável ao consumidor.
5. Não há justificativa plausível para a não autorização do tratamento requerido, sobretudo considerando a gravidade da doença e a recomendação médica. Necessidade de proteção à vida, saúde e dignidade da recorrida.
6. Além disso, diante da previsão contratual genérica, característica elementar dos contratos de adesão, não se pode aceitar cláusulas contratuais que excluem a realização de exames e procedimentos médicos necessários e exigíveis diante de um quadro de urgência ou emergência, posto que inquestionável o direito à vida diante de uma previsão contratual firmada em sentido diverso.
7. In casu, resta evidente a existência de contratação do plano de saúde junto à Unimed de Fortaleza, assim como a necessidade de realização do procedimento de urgência/emergência solicitado e negado pela promovida. Tanto é verdade que, logo após a propositura da ação na origem, a autora veio a falecer, tendo por causa da morte a "falência de múltiplos órgãos"(certidão de óbito acostada às fls. 320/322).
8. Desta feita, diante da vasta documentação apresentada, consubstanciada pelos recibos e notas fiscais de fls. 51-85, observo que o valor de R$ 21.045,14 (vinte e um mil, quarenta e cinco reais e quatorze centavos), sendo R$ 11.120,14 (onze mil, cento e vinte reais e quatorze centavos) - despesas dos procedimentos médicos - e R$ 9.925,00 (nove mil novecentos e vinte e cinco reais) - gastos referentes a alimentação, medicação e exames, deve ser ressarcido à parte promovente, uma vez que, diante da emergência e da injusta negativa da parte ré, a autora foi obrigada a desembolsar tais valores.
9. No que tange a argumentativa que o contrato de seguro de saúde foi celebrado antes do advento da Lei nº 9.656/98, ressalto que as previsões nele encerradas devem ser interpretadas à luz e em consonância com as disposições do Código de Defesa do Consumidor.
10. Em conformidade com a jurisprudência pátria, o termo inicial da fluência dos juros de mora é a data da citação.
11. DO RECURSO ADESIVO. Também irresignada, a promovente apelou adesivamente, requerendo a reforma parcial da sentença hostilizada para condenar a parte demandada em dano moral.
12. A negativa indevida de cobertura de tratamento de saúde de urgência e emergência enseja danos morais passíveis de indenização, uma vez que envolve direito fundamental e acarreta inegável abalo extraordinário ao indivíduo em momento de grande fragilidade, atingindo a dignidade da pessoa humana.
13. No caso concreto, a negativa de cobertura extrapolou o mero dissabor dos problemas cotidianos, sendo manifesta a dor, a angústia e o abalo psicológico por que passou a falecida demandante.
14. Na hipótese em apreço, o quantum indenizatório deve ser fixado em observância às peculiaridades do caso concreto e com o fim de assegurar o caráter repressivo e pedagógico da indenização, sem constituir-se elevado bastante para o enriquecimento indevido da parte autora. Assim, a quantia de R$ 8.000,00 (oito mil reais) se afigura razoável e condizente com a realidade.
15. O valor da indenização deve ser acrescido de juros moratórios, fixados em 1% ao mês (arts. 406 do CC c/c art. 161, § 1º, do CTN), a contar da citação, por se tratar de relação contratual, além de correção monetária pelo IGP-M, até a data do efetivo pagamento, a partir do arbitramento, conforme Súmula 362 do STJ.
16. DOS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. No que tange à fixação dos honorários advocatícios, a importância arbitrada em 20% (vinte por cento) sobre o valor da condenação encontra-se em conformidade com os percentuais estipulados pelo art. 20 do CPC, não justificando, portanto, sua redução.
17. Recursos conhecidos, sendo improvido o Apelo e provido o Recurso Adesivo. Decisão reformada parcialmente.
ACÓRDÃO
Acordam os Desembargadores integrantes da Segunda Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, por unanimidade, em conhecer dos recursos para negar provimento ao Apelo da Unimed e dar provimento ao Adesivo, mantendo inalterada a decisão recorrida, tudo de conformidade com o voto da e. Relatora.
Ementa
PROCESSO CIVIL E DIREITO DO CONSUMIDOR. APELAÇÃO E RECURSO ADESIVO. OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C COBRANÇA E DANOS MORAIS. NEGATIVA DA OPERADORA DE PLANO DE SAÚDE DA COBERTURA DAS DESPESAS COM EXAMES E PROCEDIMENTOS MÉDICOS DE URGÊNCIA E EMERGÊNCIA. SEGURADA IDOSA. FALECIMENTO DA AUTORA NO CURSO DA DEMANDA. DESPESAS CUSTEADAS PELA PACIENTE. APLICAÇÃO DO CDC À ESPÉCIE. SÚMULA Nº 469 DO STJ. DIREITO À VIDA. DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA. DIREITO AO REEMBOLSO DAS DESPESAS MÉDICAS. DANO MORAL IN RE IPSA. QUANTUM INDENIZATÓRIO FIXADO PELO JUÍZO AD QUEM EM ADEQUAÇÃO ÀS PECULIARIDADES DO CASO CONCRETO E OBSERVADOS OS PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE. JUROS DE MORA. TERMO INICIAL. CITAÇÃO. CORREÇÃO MONETÁRIA A PARTIR DO ARBITRAMENTO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. ADEQUAÇÃO. APELO IMPROVIDO E RECURSO ADESIVO PROVIDO. DECISÃO REFORMADA EM PARTE.
1. Extrai-se do exame dos autos que a parte autora, idosa de 83 anos de idade e usuária da UNIMED, necessitou de ser internada de urgência no Hospital São Mateus. Que operadora de plano de saúde contratada negou a cobertura das despesas referentes a alimentação, exames laboratoriais e de imagem e despesas médicas em procedimento cirúrgico, razão pela qual a demandante teve que arcar com o dispêndio. Assim, postulou a procedência da ação para condenar a ré a restituir o valor de R$ 21.045,14 (vinte e um mil, quarenta e cinco reais e quatorze centavos), assim como a indenização por danos morais sofridos.
2. Decidindo no feito, o Magistrado de Piso julgou parcialmente procedente o pedido autoral, determinando que a demandada proceda o ressarcimento das despesas médico-hospitalares despendidas pela promovente no valor de R$ 21.045,14 (vinte um mil, quarenta e cinco reais e quatorze centavos), devidamente corrigidos e acrescido de correção monetária a partir da recusa da promovida em efetuar o reembolso devido e juros de 1% (um por cento) ao mês, deixando de condenar em danos morais. Condenou, ainda, a suplicada no pagamento das custas processuais e em honorários advocatícios fixados em 20% (vinte por cento) sobre o valor da condenação.
3. DO RECURSO DA UNIMED. Inconformada, a operadora de saúde interpôs recurso de Apelação Cível, alegando que o contrato de assistência à saúde celebrado com a parte apelada, além de adequar-se perfeitamente à legislação, não prevê a cobertura para a realização dos procedimentos médicos de tomografia, eletroencefalograma e fisioterapia, razão pela qual teria negado autorização para tais solicitações; que não possui a obrigação de fornecer à autora autorização para realizar os aludidos procedimentos, tendo em vista que o plano contratado é anterior à Lei 9.656/98; que inexistem cláusulas contratuais abusivas na relação de consumo firmada; necessidade de indicar o dies a quo da incidência de juros moratórios; e a impossibilidade de arbitramento de honorários advocatícios em 20% (vinte por cento) sobre o valor da condenação, pelo que requer a reforma in totum da sentença vergastada.
4. Os contratos de planos de saúde estão submetidos ao Código de Defesa do Consumidor, nos termos da Súmula nº 469 do STJ. O art. 47 do CDC determina a interpretação das cláusulas contratuais de maneira mais favorável ao consumidor.
5. Não há justificativa plausível para a não autorização do tratamento requerido, sobretudo considerando a gravidade da doença e a recomendação médica. Necessidade de proteção à vida, saúde e dignidade da recorrida.
6. Além disso, diante da previsão contratual genérica, característica elementar dos contratos de adesão, não se pode aceitar cláusulas contratuais que excluem a realização de exames e procedimentos médicos necessários e exigíveis diante de um quadro de urgência ou emergência, posto que inquestionável o direito à vida diante de uma previsão contratual firmada em sentido diverso.
7. In casu, resta evidente a existência de contratação do plano de saúde junto à Unimed de Fortaleza, assim como a necessidade de realização do procedimento de urgência/emergência solicitado e negado pela promovida. Tanto é verdade que, logo após a propositura da ação na origem, a autora veio a falecer, tendo por causa da morte a "falência de múltiplos órgãos"(certidão de óbito acostada às fls. 320/322).
8. Desta feita, diante da vasta documentação apresentada, consubstanciada pelos recibos e notas fiscais de fls. 51-85, observo que o valor de R$ 21.045,14 (vinte e um mil, quarenta e cinco reais e quatorze centavos), sendo R$ 11.120,14 (onze mil, cento e vinte reais e quatorze centavos) - despesas dos procedimentos médicos - e R$ 9.925,00 (nove mil novecentos e vinte e cinco reais) - gastos referentes a alimentação, medicação e exames, deve ser ressarcido à parte promovente, uma vez que, diante da emergência e da injusta negativa da parte ré, a autora foi obrigada a desembolsar tais valores.
9. No que tange a argumentativa que o contrato de seguro de saúde foi celebrado antes do advento da Lei nº 9.656/98, ressalto que as previsões nele encerradas devem ser interpretadas à luz e em consonância com as disposições do Código de Defesa do Consumidor.
10. Em conformidade com a jurisprudência pátria, o termo inicial da fluência dos juros de mora é a data da citação.
11. DO RECURSO ADESIVO. Também irresignada, a promovente apelou adesivamente, requerendo a reforma parcial da sentença hostilizada para condenar a parte demandada em dano moral.
12. A negativa indevida de cobertura de tratamento de saúde de urgência e emergência enseja danos morais passíveis de indenização, uma vez que envolve direito fundamental e acarreta inegável abalo extraordinário ao indivíduo em momento de grande fragilidade, atingindo a dignidade da pessoa humana.
13. No caso concreto, a negativa de cobertura extrapolou o mero dissabor dos problemas cotidianos, sendo manifesta a dor, a angústia e o abalo psicológico por que passou a falecida demandante.
14. Na hipótese em apreço, o quantum indenizatório deve ser fixado em observância às peculiaridades do caso concreto e com o fim de assegurar o caráter repressivo e pedagógico da indenização, sem constituir-se elevado bastante para o enriquecimento indevido da parte autora. Assim, a quantia de R$ 8.000,00 (oito mil reais) se afigura razoável e condizente com a realidade.
15. O valor da indenização deve ser acrescido de juros moratórios, fixados em 1% ao mês (arts. 406 do CC c/c art. 161, § 1º, do CTN), a contar da citação, por se tratar de relação contratual, além de correção monetária pelo IGP-M, até a data do efetivo pagamento, a partir do arbitramento, conforme Súmula 362 do STJ.
16. DOS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. No que tange à fixação dos honorários advocatícios, a importância arbitrada em 20% (vinte por cento) sobre o valor da condenação encontra-se em conformidade com os percentuais estipulados pelo art. 20 do CPC, não justificando, portanto, sua redução.
17. Recursos conhecidos, sendo improvido o Apelo e provido o Recurso Adesivo. Decisão reformada parcialmente.
ACÓRDÃO
Acordam os Desembargadores integrantes da Segunda Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, por unanimidade, em conhecer dos recursos para negar provimento ao Apelo da Unimed e dar provimento ao Adesivo, mantendo inalterada a decisão recorrida, tudo de conformidade com o voto da e. Relatora.
Data do Julgamento
:
03/05/2017
Data da Publicação
:
03/05/2017
Classe/Assunto
:
Apelação / Planos de Saúde
Órgão Julgador
:
2ª Câmara Direito Privado
Relator(a)
:
MARIA DE FÁTIMA DE MELO LOUREIRO
Comarca
:
Fortaleza
Comarca
:
Fortaleza
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