TJCE 0465978-62.2010.8.06.0001
APELAÇÃO CÍVEL. CONTRATO DE FINANCIAMENTO BANCÁRIO. REVISÃO DE CLÁUSULAS. APLICAÇÃO DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. POSSIBILIDADE. JUNTADA DO CONTRATO. INOCORRÊNCIA. INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. REGRA DE INSTRUÇÃO. JUROS REMUNERATÓRIOS. APLICAÇÃO DA TAXA MÉDIA DE MERCADO. POSSIBILIDADE. CAPITALIZAÇÃO MENSAL DE JUROS. EXPRESSA PACTUAÇÃO. NÃO COMPROVAÇÃO. ILEGALIDADE AFASTADA. REPETIÇÃO DE INDÉBITO NA FORMA SIMPLES. APELO DO AUTOR CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. RECURSO DO PROMOVIDO CONHECIDO E DESPROVIDO. SENTENÇA REFORMADA. 1 - O mérito da controvérsia reside na possível abusividade de cláusulas inerentes ao contrato bancário celebrado pelos litigantes, principalmente no que concerne à incidência da taxa de juros remuneratórios, da capitalização mensal de juros, comissão de permanência cumulada com outros encargos, bem como quanto à irresignação contra a condenação em repetição de indébito. 2 - INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. Inexistindo dúvida sobre a natureza jurídica de consumo a caracterizar a relação mantida entre as partes, bem como a aplicabilidade do regramento específico estabelecido pela Lei nº 8.078/90 (Súmula 297 do STJ); insta destacar que o c. Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento no sentido de que a inversão do ônus da prova decorrente de relação consumerista é regra de instrução e não de julgamento (EREsp 422.778/SP, Rel. Ministro João Otávio de Noronha, Rel. p/ Acórdão Ministra Maria Isabel Gallotti, Segunda Seção, julgado em 29/02/2012, DJe 21/06/2012). Com efeito, viável o exame do presente debate nesta instância, pois já formada a tríade processual com oportunidade para a parte promovida apresentar defesa e documentos necessários, notadamente, o contrato em alusão. Cumpre destacar que em sede de decisão interlocutória, a magistrada de primeira instância inverteu o ônus da prova e determinou a juntada do instrumento contratual, sob pena de multa diária. Portanto, se a parte promovida, quem detinha melhores condições de apresentar o instrumento contratual, não o fez, correta a aplicação da inversão do ônus da prova, prevista no art. 6º do CDC, em favor da autora, uma vez incontroverso que as partes celebraram o negócio em questão. 3 - JUROS REMUNERATÓRIOS. Prepondera no âmbito do Superior Tribunal de Justiça o entendimento de que os juros remuneratórios incidentes nos empréstimos bancários são devidos com base na taxa contratada, desde que não haja expressiva dissonância com a média praticada no mercado; caso contrário, restaria por caracterizada a abusividade apta a ser rechaçada, nos termos do art. 51, § 1º do CDC. Assim, sendo efetivamente constatada no caso concreto situação de manifesta abusividade, mediante a incidência de taxa em percentual bem superior à que as demais instituições utilizam, impõe-se a modificação dos juros remuneratórios pactuados pelas partes. Assim, diante da impossibilidade de verificação da taxa contratada em face da ausência do contrato no caderno digital, deve ser mantida a sentença de 1º grau que determinou a aplicação aos juros remuneratórios, a taxa média de mercado praticada em operações análogas. 4 - CAPITALIZAÇÃO MENSAL DE JUROS. Com o advento da Medida Provisória nº 1.963-17, editada em 31 de março de 2000, objeto de reedição sob o nº 2.170-36/01, a capitalização de juros passou a ser acolhida com periodicidade inferior a um ano, desde que seja expressamente prevista no contrato. No caso concreto, diante da ausência do instrumento contratual, imperativo reconhecer a ausência de pactuação, pelo que deve ser mantida a sentença que afastou a cobrança da capitalização mensal de juros. 5 - COMISSÃO DE PERMANÊNCIA. Conforme entendimento jurisprudencial é imperativo considerar nula de pleno direito a aplicação de comissão de permanência acrescida de juros moratórios ou remuneratórios, multa contratual e correção monetária. In casu, dianta da impossibilidade de análise do contrato, imperioso que seja reformada a sentença, destacando que, em caso de inadimplência deve ser cobrada apenas a comissão de permanência, afastando os demais, com a ressalva de que o valor daquela não pode ultrapassar a soma dos encargos remuneratórios e moratórios previstos no contrato. 6 - REPETIÇÃO DE INDÉBITO. No que pertine à Repetição de Indébito, a jurisprudência pátria só determina a devolução em dobro dos valores pagos a maior pelo consumidor no caso de comprovada má-fé da instituição financeira; que, inclusive, não pode ser presumida. Desta feita, inexistindo nos autos a comprovação cabal da má-fé da instituição financeira ré, a restituição do que fora eventualmente pago de forma indeida pelo autor deve ser feita na forma simples. 7 Apelo do autor conhecido e parcialmente provido. Recurso do promovido conhecido e improvido. Sentença reformada.
ACÓRDÃO
Acordam os Desembargadores integrantes da Primeira Câmara de Direito Privado do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, nos autos do Recurso de Apelação nº 0465978-62.2010.8.06.0001, por unanimidade, por uma de suas Turmas, em conhecer dos recursos interpostos para dar parcial provimento ao recurso interposto pelo autor e negar-lhe provimento ao apelo interposto pelo promovido, nos termos do voto do eminente Relator.
Fortaleza, 28 de junho de 2017.
Ementa
APELAÇÃO CÍVEL. CONTRATO DE FINANCIAMENTO BANCÁRIO. REVISÃO DE CLÁUSULAS. APLICAÇÃO DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. POSSIBILIDADE. JUNTADA DO CONTRATO. INOCORRÊNCIA. INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. REGRA DE INSTRUÇÃO. JUROS REMUNERATÓRIOS. APLICAÇÃO DA TAXA MÉDIA DE MERCADO. POSSIBILIDADE. CAPITALIZAÇÃO MENSAL DE JUROS. EXPRESSA PACTUAÇÃO. NÃO COMPROVAÇÃO. ILEGALIDADE AFASTADA. REPETIÇÃO DE INDÉBITO NA FORMA SIMPLES. APELO DO AUTOR CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. RECURSO DO PROMOVIDO CONHECIDO E DESPROVIDO. SENTENÇA REFORMADA. 1 - O mérito da controvérsia reside na possível abusividade de cláusulas inerentes ao contrato bancário celebrado pelos litigantes, principalmente no que concerne à incidência da taxa de juros remuneratórios, da capitalização mensal de juros, comissão de permanência cumulada com outros encargos, bem como quanto à irresignação contra a condenação em repetição de indébito. 2 - INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. Inexistindo dúvida sobre a natureza jurídica de consumo a caracterizar a relação mantida entre as partes, bem como a aplicabilidade do regramento específico estabelecido pela Lei nº 8.078/90 (Súmula 297 do STJ); insta destacar que o c. Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento no sentido de que a inversão do ônus da prova decorrente de relação consumerista é regra de instrução e não de julgamento (EREsp 422.778/SP, Rel. Ministro João Otávio de Noronha, Rel. p/ Acórdão Ministra Maria Isabel Gallotti, Segunda Seção, julgado em 29/02/2012, DJe 21/06/2012). Com efeito, viável o exame do presente debate nesta instância, pois já formada a tríade processual com oportunidade para a parte promovida apresentar defesa e documentos necessários, notadamente, o contrato em alusão. Cumpre destacar que em sede de decisão interlocutória, a magistrada de primeira instância inverteu o ônus da prova e determinou a juntada do instrumento contratual, sob pena de multa diária. Portanto, se a parte promovida, quem detinha melhores condições de apresentar o instrumento contratual, não o fez, correta a aplicação da inversão do ônus da prova, prevista no art. 6º do CDC, em favor da autora, uma vez incontroverso que as partes celebraram o negócio em questão. 3 - JUROS REMUNERATÓRIOS. Prepondera no âmbito do Superior Tribunal de Justiça o entendimento de que os juros remuneratórios incidentes nos empréstimos bancários são devidos com base na taxa contratada, desde que não haja expressiva dissonância com a média praticada no mercado; caso contrário, restaria por caracterizada a abusividade apta a ser rechaçada, nos termos do art. 51, § 1º do CDC. Assim, sendo efetivamente constatada no caso concreto situação de manifesta abusividade, mediante a incidência de taxa em percentual bem superior à que as demais instituições utilizam, impõe-se a modificação dos juros remuneratórios pactuados pelas partes. Assim, diante da impossibilidade de verificação da taxa contratada em face da ausência do contrato no caderno digital, deve ser mantida a sentença de 1º grau que determinou a aplicação aos juros remuneratórios, a taxa média de mercado praticada em operações análogas. 4 - CAPITALIZAÇÃO MENSAL DE JUROS. Com o advento da Medida Provisória nº 1.963-17, editada em 31 de março de 2000, objeto de reedição sob o nº 2.170-36/01, a capitalização de juros passou a ser acolhida com periodicidade inferior a um ano, desde que seja expressamente prevista no contrato. No caso concreto, diante da ausência do instrumento contratual, imperativo reconhecer a ausência de pactuação, pelo que deve ser mantida a sentença que afastou a cobrança da capitalização mensal de juros. 5 - COMISSÃO DE PERMANÊNCIA. Conforme entendimento jurisprudencial é imperativo considerar nula de pleno direito a aplicação de comissão de permanência acrescida de juros moratórios ou remuneratórios, multa contratual e correção monetária. In casu, dianta da impossibilidade de análise do contrato, imperioso que seja reformada a sentença, destacando que, em caso de inadimplência deve ser cobrada apenas a comissão de permanência, afastando os demais, com a ressalva de que o valor daquela não pode ultrapassar a soma dos encargos remuneratórios e moratórios previstos no contrato. 6 - REPETIÇÃO DE INDÉBITO. No que pertine à Repetição de Indébito, a jurisprudência pátria só determina a devolução em dobro dos valores pagos a maior pelo consumidor no caso de comprovada má-fé da instituição financeira; que, inclusive, não pode ser presumida. Desta feita, inexistindo nos autos a comprovação cabal da má-fé da instituição financeira ré, a restituição do que fora eventualmente pago de forma indeida pelo autor deve ser feita na forma simples. 7 Apelo do autor conhecido e parcialmente provido. Recurso do promovido conhecido e improvido. Sentença reformada.
ACÓRDÃO
Acordam os Desembargadores integrantes da Primeira Câmara de Direito Privado do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, nos autos do Recurso de Apelação nº 0465978-62.2010.8.06.0001, por unanimidade, por uma de suas Turmas, em conhecer dos recursos interpostos para dar parcial provimento ao recurso interposto pelo autor e negar-lhe provimento ao apelo interposto pelo promovido, nos termos do voto do eminente Relator.
Fortaleza, 28 de junho de 2017.
Data do Julgamento
:
28/06/2017
Data da Publicação
:
29/06/2017
Classe/Assunto
:
Apelação / Interpretação / Revisão de Contrato
Órgão Julgador
:
1ª Câmara Direito Privado
Relator(a)
:
HERACLITO VIEIRA DE SOUSA NETO
Comarca
:
Fortaleza
Comarca
:
Fortaleza
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