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Jurisprudência


TJCE 0621229-32.2017.8.06.0000

Ementa
DIREITO PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE REINTEGRAÇÃO DE POSSE. AGRAVO DE INSTRUMENTO. DEVOLUÇÃO DA MATÉRIA RESTRITA AOS TERMOS DA DECISÃO HOSTILIZADA. NÃO CONHECIMENTO DO RECURSO QUANTO AS MATÉRIAS NÃO CONTEMPLADAS PELO DECISUM. IMÓVEL LEILOADO POR INSTITUIÇÃO FINANCEIRA EM RAZÃO DO INADIMPLEMENTO DO ALIENANTE FIDUCIÁRIO. INCIDÊNCIA DA LEI Nº 9.514/97. PRAZO DE DIREITO MATERIAL. CONTAGEM EM DIAS CORRIDOS (ARTIGO 30, DA LEI Nº 9.514/97). CITAÇÃO REALIZADA PELO APLICATIVO WHATSAAP. NULIDADE. AUSÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL E DE PROVA INEQUÍVOCA DE CIÊNCIA DA INFORMAÇÃO ALI CONTIDA. GARANTIA CONSTITUCIONAL AO DIREITO A AMPLA DEFESA E AO CONTRADITÓRIO. CITAÇÃO SUPRIDA PELO COMPARECIMENTO ESPONTÂNEO DO AGRAVANTE, MEDIANTE A INTERPOSIÇÃO DO AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 0001801-50.2016.8.06.0000, JÁ TRANSITADO EM JULGADO. RECURSO CONHECIDO, EM PARTE E NA PARTE CONHECIDA, PARCIALMENTE PROVIDA. 1. A matéria recursal, passível de conhecimento, cinge-se a irresignação do agravante quanto à contagem do prazo previsto no artigo 30, da Lei Nº 9.514/97(Lei da Alienação Fiduciária) e a sua citação na ação reintegratória através do aplicativo de mensagens Whatsaap. As demais matérias trazidas neste agravo, não comportam conhecimento, contudo, registra-se para evitar a interposição descabida de outros recursos. 2. A irresignação do agravante quanto as condutas dos servidores das Secretarias de Vara da Comarca de Aquiraz/CE, não constitui matéria de Agravo de Instrumento e compete a Corregedoria Geral de Justiça, nos termos do artigo 14, V, do seu Regimento Interno, apurar as Representações contra os mesmos formuladas. Matéria não conhecida. 3. Relativamente a arguição de incompetência do Juízo da 1ª Vara da Comarca de Aquiraz/CE para processar e julgar a Ação de Reintegração de Posse, extrai-se do exame dos fólios que o agravante não suscitou a mencionada incompetência no Juízo a quo, razão pela qual, não pode ser objeto de apreciação pelo Juízo ad quem, sob pena de supressão de instância e ofensa ao princípio do duplo grau de jurisdição. Matéria não conhecida. 4. Quanto à indicação de erros, omissões e contradições, inclusive no que diz respeito a não apreciação da questão prejudicial externa, na decisão do Colegiado que julgou o Agravo de Instrumento Nº 0001801-50.2016.8.06.0000, vislumbra-se do seu exame que o mesmo se encontra transitado em julgado e tais vícios não podem ser objeto de um novo Agravo de Instrumento. Portanto, trata-se de matéria preclusa e não comporta mais recurso. Na hipótese, tais questionamentos poderiam ter sido objeto de Embargos de Declaração, mas não houve a sua interposição. Matéria não conhecida. 5. No que diz respeito a matéria que comporta conhecimento, tem-se que, a mesma é regulada por lei específica (Lei Nº 9.514/97) e relativamente ao prazo para a desocupação de imóveis pelo fiduciário inadimplente, prevê o seu artigo 30, verbis: "É assegurada ao fiduciário, seu cessionário ou sucessores, inclusive o adquirente do imóvel por força do público leilão de que tratam os §§ 1º e 2º do art. 27, a reintegração na posse do imóvel, que será concedida liminarmente, para desocupação em sessenta dias, desde que comprovada, na forma do disposto no art. 26, a consolidação da propriedade em seu nome." (GN). 6. Portanto, o prazo a que se refere a lei específica acima citada é prazo de direito material, de natureza não processual e, portanto, a sua contagem não obedece a normativa prevista no artigo 219 do Código de Processo Civil, uma vez que a mesma regula apenas os prazos processuais. 7. Justifique-se que o prazo material não se confunde com prazo processual, uma vez que prazo processual a doutrina coloca como aqueles prazos fixados em lei ou em decisão judicial que determinam "quando" e "como" devem ocorrer situações jurídicas que geram efeitos processuais; seriam atos que demarcam as fases do processo e o impulsionam para a fase seguinte. Ademais, trata-se de prazo previsto em lei específica e o Código de Processo Civil não derrogou as leis específicas. Assim, a Lei da Alienação Fiduciária se encontra em em pleno vigor. 8. Saliente-se que o Código de Processo Civil de 2015 presta-se a suprir as lacunas das leis processuais - seja por instalar novas hipóteses de incidência (ausência da norma: lacuna normativa), seja por criar novas compreensões no sistema processual (atualizando a construção de normas que não mais correspondiam à realidade social e, também, permitindo soluções processuais mais justas: lacunas ontológicas e axiológicas). 9. Destarte, em se tratando de matéria tratada por lei específica e não havendo manifestação, seja da doutrina ou mesmo da jurisprudência, no sentido da incidência do artigo 219, do CPC à legislação específica; o prazo de 60 (sessenta) dias veiculados no artigo da 30 da Lei Nº 9.514/97, deve ser contado em dias corridos, não incindindo, por consequência, a suspensão em sua contagem, prevista no artigo 30 da Lei da Alienação Fiduciária, prevista na Resolução nº 29/2016 do TJCE e Resolução nº 244/16 do Conselho Nacional de Justiça, uma vez que a matéria tratada nessas resoluções diz respeito aos prazos processuais. 10. Quanto a irresignação relativa a citação via Whatsaap, constata-se da Certidão acostada à fl. 84, que, o meerinho certificou a citação do agravante através do aplicativo de mensagens whatsaap. 11. É cediço, que a citação é um dos atos mais importantes realizados no processo, uma vez que para a sua validade, a citação é indispensável. 12. Sobre a forma de citação impugnada, registre-se que, não obstante o avanço da tecnologia, não se pode afirmar com segurança que as mensagens enviadas pelo mencionado aplicativo sejam lidas pelo titular do número informado pela operadora de telefonia móvel, uma vez que outras pessoas podem ter acesso ao equipamento e "dar por lida" as mensagens e registro nele constante. Além do mais, o titular da linha telefônica, pode ter repassado seu chip para um terceiro ou até sofrido assalto, furto e etc. Assim, considerado que é através do ato citatório que o demandado de qualquer processo tem garantido a ampla defesa e o contraditório, não se pode banalizar a importância da citação e colocar em risco o direito de defesa da parte em razão da facilidade que o aplicativo whatsaap oferece. 13. Com efeito, não havendo garantia de que o titular do número telefônico tenha, pessoalmente, acessado às suas mensagens, não se pode considerar que a mera confirmação de leitura da mensagem representada pela cor azul, seja considerada prova inequívoca de ciência da informação ali contida. 14. É cediço que alguns Tribunais e o próprio Conselho Nacional de Justiça, já manifestou assente, na possibilidade de realização da INTIMAÇÃO da parte, via Whatsaap, com vista a evitar o perecimento do seu direito e após esgotar os meios de intimação previsto em lei, em processos em trâmite nos Juizados Especiais e nas Varas da Justiça do Trabalho. Contudo, a doutrina ainda não se posicionou quanto a possibilidade de utilização desse aplicativo para realizar atos intimatórios e se mostra tímida ao falar sobre o tema. A jurisprudência também não firmou entendimento nesse sentido. 15. Destarte, visando a efetividade das garantias constitucionais relativas ao devido processo legal, a ampla defesa e o contraditório e, considerando que o aplicativo Whatsaap não oferece segurança quanto a efetiva cientificação do teor da mensagem pelo seu destinatário, entendo que a Citação realizada ao agravante através do aplicativo Whatsaap, é nula. 16. Todavia, considerando que o recorrente compareceu espontaneamente ao processo, mediante a interposição do Agravo de Instrumento Nº 0001801-50.2016.8.06.0000, adversando decisão liminar reintegratória nos autos do processo que também deu origem ao presente recurso, considera-se suprida a sua citação, nos moldes do artigo 239, do CPC, no dia da interposição do referido recurso, ou seja, 23 de dezembro de 2016 (Plantão). 17. Recurso conhecido em parte e, na parte conhecida, parcialmente provida. ACORDÃO Acordam os integrantes da Segunda Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, por unanimidade, em conhecer em parte do recurso e na parte conhecida, dar-lhe parcial provimento, em conformidade com o voto da e. Relatora.

Data do Julgamento : 12/07/2017
Data da Publicação : 12/07/2017
Classe/Assunto : Agravo de Instrumento / Posse
Órgão Julgador : 2ª Câmara Direito Privado
Relator(a) : MARIA DE FÁTIMA DE MELO LOUREIRO
Comarca : Aquiraz
Comarca : Aquiraz
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