TJCE 0621849-10.2018.8.06.0000
PENAL. PROCESSO PENAL. HABEAS CORPUS. FURTO. PRISÃO PREVENTIVA. NEGATIVA DE AUTORIA. NECESSIDADE DE REVOLVIMENTO FÁTICO PROBATÓRIO. IMPOSSIBILIDADE. CRIME IMPOSSÍVEL. SUMULA 567 DO STJ. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO DO DECRETO PREVENTIVO. MOTIVAÇÃO IDÔNEA. GARANTIA DE ORDEM PÚBLICA. PACIENTE QUE RESPONDE A OUTRAS AÇÕES PENAIS. SUBSTITUIÇÃO DE PRISÃO PREVENTIVA POR PRISÃO DOMICILIAR. FILHOS MENORES DE 12 ANOS DE IDADE. MITIGAÇÃO DO ENTENDIMENTO EXARADO PELO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. PACIENTE RESPONDE A OUTRAS AÇÕES PENAIS. INSUFICIÊNCIA DA PRISÃO DOMICILIAR. ORDEM PARCIALMENTE CONHECIDA E DENEGADA.
01. Paciente presa preventivamente pela suposta prática de furto, alegando falta de fundamentação na decisão que decretou a prisão preventiva, bem como buscando a concessão da prisão domiciliar por ser genitora de três filhos menores de 12 anos, nos termos do art. 318, inciso V, do CPP; alega ainda a tese de crime impossível pela existência de sistema de vigilância no estabelecimento e negativa de autoria.
02. No que tocam às teses de crime impossível e negativa de autoria tem-se que estas não merecem prosperar. Para tanto, cumpre fazer algumas considerações acerca da natureza jurídica do presente writ, que em verdade, de ação autônoma constitucional cuja natureza marcada por simplicidade e sumariedade, é dotada de procedimento que não admite dilação probatória.
03. Ad argumentandum tantum, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça já pacificou entendimento no sentido de que não configura crime impossível a prática de furto em estabelecimento onde haja sistema de vigilância, configurando tão somente, uma inidoneidade relativa do meio empregado para a prática do crime. Este entendimento fora consolidado no enunciado sumular de nº 567 da Corte Especial.
04. No que toca à desnecessidade dos fundamentos para a manutenção da prisão, a partir da análise dos fundamentos do decreto preventivo, tive que fora fundamentado idoneamente na garantia da ordem pública, uma vez que ressaltou a periculosidade concreta da paciente, que já responde e respondeu por outras práticas delitivas, inclusive por crimes contra o patrimônio. Tal situação denota a inclinação da paciente para o cometimento de crimes o que evidencia sua periculosidade, apta a ensejar idoneamente a manutenção da ordem pública nos termos do art. 312 do Código de Processo Penal.
05. Quanto ao pleito de prisão domiciliar, cabe destacar que com a entrada em vigor da lei 13.257/2016, a qual estabelece conjunto de ações prioritárias que devem ser observadas na primeira infância (0 a 6 anos de idade), mediante "princípios e diretrizes para a formulação e implementação de políticas para a primeira infância em atenção à especificidade e à relevância dos primeiros anos de vida no desenvolvimento infantil e no desenvolvimento do ser humano"(art. 1°), em consonância com o Estatuto da Criança e do Adolescente, alterou a redação do inciso IV do art.318, do CPP, bem como foram acrescentados os incisos V e VI, a fim de adequar a legislação brasileira a um compromisso assumido internacionalmente pelo Brasil nas Regras de Bangkok.
06. Vale destacar que o uso do verbo "poderá", no caput do art. 318, do CPP, não deve ser interpretado com a semântica que lhe dão certos setores da doutrina para os quais seria "dever" do juiz determinar a substituição da prisão preventiva em prisão domiciliar ante a verificação das condições objetivas previstas em lei, caso não fosse assim teria o legislador tornado imperativo o deferimento do benefício, o que não fez. Desta forma o fato de ser mãe, por si só, não basta para a conversão da prisão preventiva em domiciliar, sendo necessário analisar também a conduta e a personalidade da presa, e sobretudo a conveniência e o atendimento ao interesse do menor.
07. Este era o entendimento dominante nos tribunais pátrios, contudo com o julgamento do Habeas Corpus Coletivo impetrado por Todas as mulheres submetidas à prisão cautelar no sistema Penitenciário Nacional, sob º 143641/SP, pela 2ª Turma do Supremo Tribunal Federal, mudou-se essa percepção, vez que esta Turma firmou entendimento pela substituição da prisão preventiva em domiciliar a todas as mulheres presas, gestantes, puérperas ou mães de crianças e deficientes, enquanto perdurar a situação, excetuadas os casos de crimes praticados por elas mediante violência ou grave ameaça, contra seus descendentes, ou, ainda, em situações excepcionalíssimas, as quais deverão ser devidamente fundamentadas pelos juízes que denegaram o pedido, tendo estendido a ordem, de ofício, a todas as mulheres nesta condição.
08. Todavia, após verificação no Sistema CANCUN (Consulta de Antecedentes Criminais Unificada) constatou-se que a paciente responde por outras ações penais sob os nº 0144325-67.2016.8.06.0001, 0153003-13.2012.8.06.0001, 0079566-02.2013.8.06.0001, 0064677-43.2013.8.06.0001, 0160657-51.2012.8.06.0001, 0002626-07.2018.8.06.0167.
09. Diante disso, tem-se que deve haver uma mitigação do entendimento consolidado pelo Supremo Tribunal Federal, pois adotar semelhante interpretação acabaria por impedir um emprego de cautela máxima em determinados casos, quando a prisão preventiva é de imperiosa necessidade, sendo a única medida capaz de tutelar eficientemente a ordem pública, tendo em vista a forte inclinação da paciente para a prática de crimes.
10. Não se pode olvidar para a ideia de que prisão domiciliar albergada em nosso Ordenamento Jurídico Pátrio manifesta-se como uma forma de cumprimento de prisão preventiva em razão de fundamentos humanitários e excepcionais, que possa possibilitar a coexistência do exercício do poder estatal de garantia da ordem pública e/ou econômica, conveniência da instrução criminal ou da lei penal com uma garantia de viés da dignidade humana, quando o acusado, em casos tais, ou de quem dele dependa, assim necessitar.
11. Assim, sopesando, de um lado, o interesse da criança e, de outro, a justificada necessidade de se assegurar a ordem pública em razão da periculosidade de sua genitora, mostra-se inviável o deferimento da prisão domiciliar com base no art. 318, V, do Código de Processo Penal.
12. Ordem parcialmente conhecida e concedida.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os presentes autos de habeas corpus, ACORDAM os desembargadores da 1ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Ceará, à unanimidade, em CONHECER PARCIALMENTE da ordem impetrada, mas para DENEGAR, nos termos do voto do relator.
Fortaleza, 8 de maio de 2018
DESEMBARGADOR MÁRIO PARENTE TEÓFILO NETO
Relator
Ementa
PENAL. PROCESSO PENAL. HABEAS CORPUS. FURTO. PRISÃO PREVENTIVA. NEGATIVA DE AUTORIA. NECESSIDADE DE REVOLVIMENTO FÁTICO PROBATÓRIO. IMPOSSIBILIDADE. CRIME IMPOSSÍVEL. SUMULA 567 DO STJ. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO DO DECRETO PREVENTIVO. MOTIVAÇÃO IDÔNEA. GARANTIA DE ORDEM PÚBLICA. PACIENTE QUE RESPONDE A OUTRAS AÇÕES PENAIS. SUBSTITUIÇÃO DE PRISÃO PREVENTIVA POR PRISÃO DOMICILIAR. FILHOS MENORES DE 12 ANOS DE IDADE. MITIGAÇÃO DO ENTENDIMENTO EXARADO PELO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. PACIENTE RESPONDE A OUTRAS AÇÕES PENAIS. INSUFICIÊNCIA DA PRISÃO DOMICILIAR. ORDEM PARCIALMENTE CONHECIDA E DENEGADA.
01. Paciente presa preventivamente pela suposta prática de furto, alegando falta de fundamentação na decisão que decretou a prisão preventiva, bem como buscando a concessão da prisão domiciliar por ser genitora de três filhos menores de 12 anos, nos termos do art. 318, inciso V, do CPP; alega ainda a tese de crime impossível pela existência de sistema de vigilância no estabelecimento e negativa de autoria.
02. No que tocam às teses de crime impossível e negativa de autoria tem-se que estas não merecem prosperar. Para tanto, cumpre fazer algumas considerações acerca da natureza jurídica do presente writ, que em verdade, de ação autônoma constitucional cuja natureza marcada por simplicidade e sumariedade, é dotada de procedimento que não admite dilação probatória.
03. Ad argumentandum tantum, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça já pacificou entendimento no sentido de que não configura crime impossível a prática de furto em estabelecimento onde haja sistema de vigilância, configurando tão somente, uma inidoneidade relativa do meio empregado para a prática do crime. Este entendimento fora consolidado no enunciado sumular de nº 567 da Corte Especial.
04. No que toca à desnecessidade dos fundamentos para a manutenção da prisão, a partir da análise dos fundamentos do decreto preventivo, tive que fora fundamentado idoneamente na garantia da ordem pública, uma vez que ressaltou a periculosidade concreta da paciente, que já responde e respondeu por outras práticas delitivas, inclusive por crimes contra o patrimônio. Tal situação denota a inclinação da paciente para o cometimento de crimes o que evidencia sua periculosidade, apta a ensejar idoneamente a manutenção da ordem pública nos termos do art. 312 do Código de Processo Penal.
05. Quanto ao pleito de prisão domiciliar, cabe destacar que com a entrada em vigor da lei 13.257/2016, a qual estabelece conjunto de ações prioritárias que devem ser observadas na primeira infância (0 a 6 anos de idade), mediante "princípios e diretrizes para a formulação e implementação de políticas para a primeira infância em atenção à especificidade e à relevância dos primeiros anos de vida no desenvolvimento infantil e no desenvolvimento do ser humano"(art. 1°), em consonância com o Estatuto da Criança e do Adolescente, alterou a redação do inciso IV do art.318, do CPP, bem como foram acrescentados os incisos V e VI, a fim de adequar a legislação brasileira a um compromisso assumido internacionalmente pelo Brasil nas Regras de Bangkok.
06. Vale destacar que o uso do verbo "poderá", no caput do art. 318, do CPP, não deve ser interpretado com a semântica que lhe dão certos setores da doutrina para os quais seria "dever" do juiz determinar a substituição da prisão preventiva em prisão domiciliar ante a verificação das condições objetivas previstas em lei, caso não fosse assim teria o legislador tornado imperativo o deferimento do benefício, o que não fez. Desta forma o fato de ser mãe, por si só, não basta para a conversão da prisão preventiva em domiciliar, sendo necessário analisar também a conduta e a personalidade da presa, e sobretudo a conveniência e o atendimento ao interesse do menor.
07. Este era o entendimento dominante nos tribunais pátrios, contudo com o julgamento do Habeas Corpus Coletivo impetrado por Todas as mulheres submetidas à prisão cautelar no sistema Penitenciário Nacional, sob º 143641/SP, pela 2ª Turma do Supremo Tribunal Federal, mudou-se essa percepção, vez que esta Turma firmou entendimento pela substituição da prisão preventiva em domiciliar a todas as mulheres presas, gestantes, puérperas ou mães de crianças e deficientes, enquanto perdurar a situação, excetuadas os casos de crimes praticados por elas mediante violência ou grave ameaça, contra seus descendentes, ou, ainda, em situações excepcionalíssimas, as quais deverão ser devidamente fundamentadas pelos juízes que denegaram o pedido, tendo estendido a ordem, de ofício, a todas as mulheres nesta condição.
08. Todavia, após verificação no Sistema CANCUN (Consulta de Antecedentes Criminais Unificada) constatou-se que a paciente responde por outras ações penais sob os nº 0144325-67.2016.8.06.0001, 0153003-13.2012.8.06.0001, 0079566-02.2013.8.06.0001, 0064677-43.2013.8.06.0001, 0160657-51.2012.8.06.0001, 0002626-07.2018.8.06.0167.
09. Diante disso, tem-se que deve haver uma mitigação do entendimento consolidado pelo Supremo Tribunal Federal, pois adotar semelhante interpretação acabaria por impedir um emprego de cautela máxima em determinados casos, quando a prisão preventiva é de imperiosa necessidade, sendo a única medida capaz de tutelar eficientemente a ordem pública, tendo em vista a forte inclinação da paciente para a prática de crimes.
10. Não se pode olvidar para a ideia de que prisão domiciliar albergada em nosso Ordenamento Jurídico Pátrio manifesta-se como uma forma de cumprimento de prisão preventiva em razão de fundamentos humanitários e excepcionais, que possa possibilitar a coexistência do exercício do poder estatal de garantia da ordem pública e/ou econômica, conveniência da instrução criminal ou da lei penal com uma garantia de viés da dignidade humana, quando o acusado, em casos tais, ou de quem dele dependa, assim necessitar.
11. Assim, sopesando, de um lado, o interesse da criança e, de outro, a justificada necessidade de se assegurar a ordem pública em razão da periculosidade de sua genitora, mostra-se inviável o deferimento da prisão domiciliar com base no art. 318, V, do Código de Processo Penal.
12. Ordem parcialmente conhecida e concedida.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os presentes autos de habeas corpus, ACORDAM os desembargadores da 1ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Ceará, à unanimidade, em CONHECER PARCIALMENTE da ordem impetrada, mas para DENEGAR, nos termos do voto do relator.
Fortaleza, 8 de maio de 2018
DESEMBARGADOR MÁRIO PARENTE TEÓFILO NETO
Relator
Data do Julgamento
:
08/05/2018
Data da Publicação
:
08/05/2018
Classe/Assunto
:
Habeas Corpus / Furto Qualificado
Órgão Julgador
:
1ª Câmara Criminal
Relator(a)
:
MARIO PARENTE TEÓFILO NETO
Comarca
:
Sobral
Comarca
:
Sobral
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