TJCE 0773984-34.2000.8.06.0001
ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. REMESSA NECESSÁRIA E APELAÇÃO. DESAPROPRIAÇÃO INDIRETA. PARCIAL APOSSAMENTO DO IMÓVEL PELO MUNICÍPIO DE FORTALEZA. REALIZAÇÃO DE OBRAS PÚBLICAS. OCUPAÇÃO DO ESPAÇO REMANESCENTE POR TERCEIROS EM MOMENTO ANTERIOR À ARREMATAÇÃO DO BEM EM HASTA PÚBLICA PELO AUTOR. PROVA PERICIAL EM HARMONIA COM OS DEMAIS ELEMENTOS DE CONVICÇÃO ASSENTES NOS AUTOS. INDENIZAÇÃO LIMITADA À ÁREA ESBULHADA PELO PODER PÚBLICO. IMPOSTO PREDIAL E TERRITORIAL URBANO (IPTU) INEXIGÍVEL. SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA. HONORÁRIOS RECURSAIS INDEVIDOS. REMESSA NECESSÁRIA E RECURSO VOLUNTÁRIO PARCIALMENTE PROVIDOS.
1- Colhe-se do processo que o Município de Fortaleza se apossou, em meados de 1996, da fração de 52,20% (cinquenta e dois inteiros e vinte décimos por cento) do imóvel descrito na matrícula nº 61.733, para a construção das obras referidas na perícia técnica (ruas, avenidas, praça, ponte e calçadas), época em que também teve início a ocupação irregular do espaço remanescente por terceiros, anteriormente à arrematação do imóvel em hasta pública pelo apelado, em 1999, de modo a não se poder obrigar o ente público que não deu causa às invasões a indenizar a área total da gleba, mas tão somente 6.231,46m2 dos 11.088m2, consoante se infere da prova dos autos (laudo de avaliação pericial, quesitações e audiência de instrução).
2- O laudo pericial avaliou em R$ 290.199,09 (duzentos e noventa mil, cento e noventa e nove reais e nove centavos) a área desapropriada utilizada pelo Município de Fortaleza para as obras públicas e em R$ 158.350,95 (cento e cinquenta e oito mil, trezentos e cinquenta reais e noventa e cinco centavos) a área residual, invadida por populares.
3- A opinião do perito, que em outros tipos de ações tem significado maior ou menor, na ação expropriatória assume capital importância, porque versa sobre o objeto central do processo: a fixação precisa do valor do bem imóvel em causa. O quantum atribuído no laudo pericial
para a área efetivamente usurpada pelo Município de Fortaleza foi estipulado com base em criterioso trabalho do perito, que, utilizando-se do método comparativo, adequado ao caso, apontou-lhe o valor de mercado, inexistindo razão para desconsiderá-lo. A assertiva de que o imóvel expropriado constitui gleba urbanizável não tem influência no cálculo da indenização, pois os espaços reservados a áreas institucionais só poderiam ter essa destinação se tornados bens públicos, em caso de o proprietário decidir lotear a área e diante da aprovação do loteamento pela municipalidade.
4- Não assiste razão ao apelante quanto à exigibilidade do IPTU, porque o apossamento repercute no fato gerador dessa espécie tributária, desde a data em que ocorreu o esbulho pelo ente municipal. É que a propriedade plena pressupõe o domínio, que se subdivide nos poderes de usar, gozar, dispor e reivindicar a coisa. Portanto, in casu, como o imóvel fora invadido, a propriedade como fato gerador do IPTU não é plena, reputando-se tolhido o proprietário das faculdades inerentes ao domínio sobre o imóvel. Tais conclusões tomam ainda maior contorno quando o próprio ente público procedeu à invasão de parcela do imóvel, tendo continuado a fazer os lançamentos da exação, violando, dentre outros princípios, o da razoabilidade, o da boa-fé objetiva e, mais especificamente, o que proíbe o comportamento contraditório (nulli concedictur venire contra factum proprium), isto é, a ninguém é dado fazer valer um poder em contradição com seu comportamento anterior. Precedentes do STJ.
5- Há de ser também modificada a sentença em face da sucumbência recíproca, para condenar o autor (expropriado) em verba honorária arbitrada em 3% (três por cento) do valor da área remanescente (parte decaída do pedido inicial), mantido o percentual de 5% (cinco por cento) em desfavor do ente político (expropriante), porém com base no preço da área efetivamente ocupada pelo Município, considerados o grau de zelo do profissional, o lugar de prestação do serviço, a natureza e importância da causa, o trabalho realizado pelo advogado e o tempo despendido para o seu serviço (§ 2º, incs. I a IV, do art. 85 do CPC), bem como a incúria do ente público em decorrência da perda do prazo para contestar (§ 1º do art. 27 do Dec.-Lei nº 3.365/1941; REsp 1114407/SP - Tema 184, j. em 09/12/2009), sem majoração recursal, em razão do parcial provimento do apelo. Precedente do STJ.
6- Quanto à correção monetária, aos juros de mora e aos compensatórios, consectários da condenação, não cabe reproche à sentença, observado o disposto no Recurso Especial nº 1.495.146/MG, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 22/02/2018, DJe 02/03/2018 - REPETITIVO (Tema 905).
7- Remessa necessária e apelação parcialmente providas.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Desembargadores integrantes da 1ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, por julgamento de Turma e decisão unânime, em conhecer da remessa necessária e do apelo para dar-lhes parcial provimento, nos termos do voto do Relator.
Fortaleza, 23 de julho de 2018
Desembargador FERNANDO LUIZ XIMENES ROCHA
Relator
Ementa
ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. REMESSA NECESSÁRIA E APELAÇÃO. DESAPROPRIAÇÃO INDIRETA. PARCIAL APOSSAMENTO DO IMÓVEL PELO MUNICÍPIO DE FORTALEZA. REALIZAÇÃO DE OBRAS PÚBLICAS. OCUPAÇÃO DO ESPAÇO REMANESCENTE POR TERCEIROS EM MOMENTO ANTERIOR À ARREMATAÇÃO DO BEM EM HASTA PÚBLICA PELO AUTOR. PROVA PERICIAL EM HARMONIA COM OS DEMAIS ELEMENTOS DE CONVICÇÃO ASSENTES NOS AUTOS. INDENIZAÇÃO LIMITADA À ÁREA ESBULHADA PELO PODER PÚBLICO. IMPOSTO PREDIAL E TERRITORIAL URBANO (IPTU) INEXIGÍVEL. SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA. HONORÁRIOS RECURSAIS INDEVIDOS. REMESSA NECESSÁRIA E RECURSO VOLUNTÁRIO PARCIALMENTE PROVIDOS.
1- Colhe-se do processo que o Município de Fortaleza se apossou, em meados de 1996, da fração de 52,20% (cinquenta e dois inteiros e vinte décimos por cento) do imóvel descrito na matrícula nº 61.733, para a construção das obras referidas na perícia técnica (ruas, avenidas, praça, ponte e calçadas), época em que também teve início a ocupação irregular do espaço remanescente por terceiros, anteriormente à arrematação do imóvel em hasta pública pelo apelado, em 1999, de modo a não se poder obrigar o ente público que não deu causa às invasões a indenizar a área total da gleba, mas tão somente 6.231,46m2 dos 11.088m2, consoante se infere da prova dos autos (laudo de avaliação pericial, quesitações e audiência de instrução).
2- O laudo pericial avaliou em R$ 290.199,09 (duzentos e noventa mil, cento e noventa e nove reais e nove centavos) a área desapropriada utilizada pelo Município de Fortaleza para as obras públicas e em R$ 158.350,95 (cento e cinquenta e oito mil, trezentos e cinquenta reais e noventa e cinco centavos) a área residual, invadida por populares.
3- A opinião do perito, que em outros tipos de ações tem significado maior ou menor, na ação expropriatória assume capital importância, porque versa sobre o objeto central do processo: a fixação precisa do valor do bem imóvel em causa. O quantum atribuído no laudo pericial
para a área efetivamente usurpada pelo Município de Fortaleza foi estipulado com base em criterioso trabalho do perito, que, utilizando-se do método comparativo, adequado ao caso, apontou-lhe o valor de mercado, inexistindo razão para desconsiderá-lo. A assertiva de que o imóvel expropriado constitui gleba urbanizável não tem influência no cálculo da indenização, pois os espaços reservados a áreas institucionais só poderiam ter essa destinação se tornados bens públicos, em caso de o proprietário decidir lotear a área e diante da aprovação do loteamento pela municipalidade.
4- Não assiste razão ao apelante quanto à exigibilidade do IPTU, porque o apossamento repercute no fato gerador dessa espécie tributária, desde a data em que ocorreu o esbulho pelo ente municipal. É que a propriedade plena pressupõe o domínio, que se subdivide nos poderes de usar, gozar, dispor e reivindicar a coisa. Portanto, in casu, como o imóvel fora invadido, a propriedade como fato gerador do IPTU não é plena, reputando-se tolhido o proprietário das faculdades inerentes ao domínio sobre o imóvel. Tais conclusões tomam ainda maior contorno quando o próprio ente público procedeu à invasão de parcela do imóvel, tendo continuado a fazer os lançamentos da exação, violando, dentre outros princípios, o da razoabilidade, o da boa-fé objetiva e, mais especificamente, o que proíbe o comportamento contraditório (nulli concedictur venire contra factum proprium), isto é, a ninguém é dado fazer valer um poder em contradição com seu comportamento anterior. Precedentes do STJ.
5- Há de ser também modificada a sentença em face da sucumbência recíproca, para condenar o autor (expropriado) em verba honorária arbitrada em 3% (três por cento) do valor da área remanescente (parte decaída do pedido inicial), mantido o percentual de 5% (cinco por cento) em desfavor do ente político (expropriante), porém com base no preço da área efetivamente ocupada pelo Município, considerados o grau de zelo do profissional, o lugar de prestação do serviço, a natureza e importância da causa, o trabalho realizado pelo advogado e o tempo despendido para o seu serviço (§ 2º, incs. I a IV, do art. 85 do CPC), bem como a incúria do ente público em decorrência da perda do prazo para contestar (§ 1º do art. 27 do Dec.-Lei nº 3.365/1941; REsp 1114407/SP - Tema 184, j. em 09/12/2009), sem majoração recursal, em razão do parcial provimento do apelo. Precedente do STJ.
6- Quanto à correção monetária, aos juros de mora e aos compensatórios, consectários da condenação, não cabe reproche à sentença, observado o disposto no Recurso Especial nº 1.495.146/MG, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 22/02/2018, DJe 02/03/2018 - REPETITIVO (Tema 905).
7- Remessa necessária e apelação parcialmente providas.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Desembargadores integrantes da 1ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, por julgamento de Turma e decisão unânime, em conhecer da remessa necessária e do apelo para dar-lhes parcial provimento, nos termos do voto do Relator.
Fortaleza, 23 de julho de 2018
Desembargador FERNANDO LUIZ XIMENES ROCHA
Relator
Data do Julgamento
:
23/07/2018
Data da Publicação
:
24/07/2018
Classe/Assunto
:
Apelação / Remessa Necessária / Desapropriação
Órgão Julgador
:
1ª Câmara Direito Público
Relator(a)
:
FERNANDO LUIZ XIMENES ROCHA
Comarca
:
Fortaleza
Comarca
:
Fortaleza
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