TJCE 0864374-59.2014.8.06.0001
CONSTITUCIONAL. PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÕES CÍVEIS. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER. DIREITO A SAÚDE. DEVER DO ESTADO. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DOS ENTES FEDERATIVOS, ART. 23, II, DA CF/88. PRELIMINAR REJEITADA. MÉRITO. PACIENTE PORTADOR DE NEOPLASIA MALIGNA DE PALATO (CID-050) COM CARCINOMA ESPINOCELULAR AVANÇADO. FORNECIMENTO DE ALIMENTAÇÃO ENTERAL. GARANTIA CONSTITUCIONAL. INTELIGÊNCIA DOS ARTS. 6º E 196 DA CF/88. TEORIA DA RESERVA DO POSSÍVEL. INAPLICABILIDADE. MÍNIMO EXISTENCIAL. AUSÊNCIA DE CONDENAÇÃO DO MUNICÍPIO EM HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS COM BASE NA SÚMULA Nº. 421 DO STJ. PROVIDÊNCIA EQUIVOCADA. INEXISTÊNCIA DE CONFUSÃO ENTRE CREDOR E DEVEDOR. INAPLICABILIDADE DO VERBETE SUMULAR EM REFERÊNCIA. HONORÁRIOS DEVIDOS. APRECIAÇÃO EQUITATIVA. RECURSO DO MUNICÍPIO DE FORTALEZA CONHECIDO E DESPROVIDO. APELAÇÃO DA PARTE AUTORA CONHECIDA E PROVIDA. SENTENÇA REFORMADA.
1. Cuida-se de Apelações Cíveis, autuadas sob o nº. 0864374-59.2014.8.06.0001, interposta por ambas as partes, quais sejam: ANTÔNIO CARLOS RIBEIRO FREITAS e MUNICÍPIO DE FORTALEZA, objetivando reforma de Sentença proferida pelo Juízo da 13ª Vara da Fazenda Pública desta Comarca, que nos autos de Ação de Obrigação de fazer ajuizada em desfavor do ente municipal em referência julgou parcialmente procedente o pedido autoral, ratificando a tutela antecipada outrora deferida, no sentido de determinar o fornecimento da alimentação enteral vindicada e de insumos necessários à ministração da dieta (nutrison energy, forticare, frascos, equipos e seringas), observando-se a necessidade de renovação semestral do receituário. No mesmo ato, deixou de condenar o Município de Fortaleza em honorários advocatícios.
2. O art. 23, inciso II, da CF/88, estabelece a competência concorrente da União, Estados e Municípios quanto a saúde e assistência pública, de modo que a responsabilidade entre os integrantes do sistema é solidária. Com efeito, poderá a parte buscar assistência em qualquer dos entes, sendo imposto a cada um deles suprir eventual impossibilidade de fornecimento do outro, vez que se trata de dever constitucional, conjunto e solidário, razão porque afasto a preliminar de ilegitimidade passiva suscitada.
3. Mérito. A Constituição Federal vigente consagrou a saúde não apenas como um bem jurídico digno de tutela constitucional, como também o tratou como um direito fundamental da pessoa humana e um dever de prestação do Estado, mais especificamente em seu art. 6º e 196. Sendo assim, o Estado (lato sensu) não pode se valer de argumentos de natureza financeira e burocrática, como a insuficiência de reservas, na tentativa de se eximir do cumprimento de obrigação constitucionalmente assegurada.
4. No caso em comento (fl. 42/45), o autor foi diagnosticado com neoplasia maligna de palato (CID 050), com carcinoma espinocelular avançado, necessitando, oportunamente, como forma de obter uma melhor resposta no tratamento a qual encontra-se submetido, do fornecimento da alimentação enteral (nutrison energy 1.5, 90 frascos/mês de 500ml, forticare, 60 frascos/mês, assim como insumos, frasco para dieta 180 frascos/mês, equipo 30 unidades/mês e seringa 20ml, 30 unidades/mês).
5. Diante desse contexto, não há dúvida de que a situação do demandante requer cuidados especiais, aliado ao fato que o tratamento pretendido contribuirá para a sua qualidade de vida, motivo pelo qual, entendo que restaram devidamente demonstradas a necessidade de concessão do bem da vida. Não se pode admitir que o portador de doença grave fique sem receber os cuidados médicos essenciais, quando tal garantia se trata de obrigação do poder público, e não de mera faculdade a admitir juízo de conveniência e oportunidade.
6. Quanto ao ônus sucumbencial, é importante ressaltar que é possível a condenação do Município de Fortaleza em favor da Defensoria Pública Estadual, vez que inexiste confusão entre eles. Isso porque a DPE não possui nenhuma vinculação à pessoa jurídica de direito público em referência. Dessa forma, não se aplica a Súmula nº. 421 do Superior Tribunal de Justiça à hipótese.
7. Dito isso, anoto que o CPC/2015 prevê no § 8º do art. 85 que nos casos em que for muito baixo o valor da causa, os honorários devem ser arbitrados de forma equitativa, observados os critérios do § 2º do mesmo dispositivo. Tal regramento pode ser aplicado a contrario sensu, ou seja, em casos em que o valor da causa seja muito elevado, a ponto de configurar exorbitância na fixação do ônus sucumbencial, como na hipótese vertente. Destarte, pelo critério da equidade, fixo a verba honorária em desfavor do Município de Fortaleza no importe de R$2.000,00 (dois mil reais), o que faço respaldada pelo § 8º do art. 85 do diploma processual emergente.
8. Recurso do ente municipal conhecido e desprovido. Apelação da parte autora conhecida e provida.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos das Apelações Cíveis nº. 0864374-59.2014.8.06.0001, em que são partes as acima relacionadas, acordam os Desembargadores que compõem a 1ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, por unanimidade de votos, em conhecer dos recursos, para negar provimento ao apelo da municipalidade, e dar provimento à apelação da parte autora, reformando a sentença do Juízo a quo, nos termos do voto da eminente Relatora, parte integrante deste.
Fortaleza/CE, 29 de janeiro de 2018.
Ementa
CONSTITUCIONAL. PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÕES CÍVEIS. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER. DIREITO A SAÚDE. DEVER DO ESTADO. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DOS ENTES FEDERATIVOS, ART. 23, II, DA CF/88. PRELIMINAR REJEITADA. MÉRITO. PACIENTE PORTADOR DE NEOPLASIA MALIGNA DE PALATO (CID-050) COM CARCINOMA ESPINOCELULAR AVANÇADO. FORNECIMENTO DE ALIMENTAÇÃO ENTERAL. GARANTIA CONSTITUCIONAL. INTELIGÊNCIA DOS ARTS. 6º E 196 DA CF/88. TEORIA DA RESERVA DO POSSÍVEL. INAPLICABILIDADE. MÍNIMO EXISTENCIAL. AUSÊNCIA DE CONDENAÇÃO DO MUNICÍPIO EM HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS COM BASE NA SÚMULA Nº. 421 DO STJ. PROVIDÊNCIA EQUIVOCADA. INEXISTÊNCIA DE CONFUSÃO ENTRE CREDOR E DEVEDOR. INAPLICABILIDADE DO VERBETE SUMULAR EM REFERÊNCIA. HONORÁRIOS DEVIDOS. APRECIAÇÃO EQUITATIVA. RECURSO DO MUNICÍPIO DE FORTALEZA CONHECIDO E DESPROVIDO. APELAÇÃO DA PARTE AUTORA CONHECIDA E PROVIDA. SENTENÇA REFORMADA.
1. Cuida-se de Apelações Cíveis, autuadas sob o nº. 0864374-59.2014.8.06.0001, interposta por ambas as partes, quais sejam: ANTÔNIO CARLOS RIBEIRO FREITAS e MUNICÍPIO DE FORTALEZA, objetivando reforma de Sentença proferida pelo Juízo da 13ª Vara da Fazenda Pública desta Comarca, que nos autos de Ação de Obrigação de fazer ajuizada em desfavor do ente municipal em referência julgou parcialmente procedente o pedido autoral, ratificando a tutela antecipada outrora deferida, no sentido de determinar o fornecimento da alimentação enteral vindicada e de insumos necessários à ministração da dieta (nutrison energy, forticare, frascos, equipos e seringas), observando-se a necessidade de renovação semestral do receituário. No mesmo ato, deixou de condenar o Município de Fortaleza em honorários advocatícios.
2. O art. 23, inciso II, da CF/88, estabelece a competência concorrente da União, Estados e Municípios quanto a saúde e assistência pública, de modo que a responsabilidade entre os integrantes do sistema é solidária. Com efeito, poderá a parte buscar assistência em qualquer dos entes, sendo imposto a cada um deles suprir eventual impossibilidade de fornecimento do outro, vez que se trata de dever constitucional, conjunto e solidário, razão porque afasto a preliminar de ilegitimidade passiva suscitada.
3. Mérito. A Constituição Federal vigente consagrou a saúde não apenas como um bem jurídico digno de tutela constitucional, como também o tratou como um direito fundamental da pessoa humana e um dever de prestação do Estado, mais especificamente em seu art. 6º e 196. Sendo assim, o Estado (lato sensu) não pode se valer de argumentos de natureza financeira e burocrática, como a insuficiência de reservas, na tentativa de se eximir do cumprimento de obrigação constitucionalmente assegurada.
4. No caso em comento (fl. 42/45), o autor foi diagnosticado com neoplasia maligna de palato (CID 050), com carcinoma espinocelular avançado, necessitando, oportunamente, como forma de obter uma melhor resposta no tratamento a qual encontra-se submetido, do fornecimento da alimentação enteral (nutrison energy 1.5, 90 frascos/mês de 500ml, forticare, 60 frascos/mês, assim como insumos, frasco para dieta 180 frascos/mês, equipo 30 unidades/mês e seringa 20ml, 30 unidades/mês).
5. Diante desse contexto, não há dúvida de que a situação do demandante requer cuidados especiais, aliado ao fato que o tratamento pretendido contribuirá para a sua qualidade de vida, motivo pelo qual, entendo que restaram devidamente demonstradas a necessidade de concessão do bem da vida. Não se pode admitir que o portador de doença grave fique sem receber os cuidados médicos essenciais, quando tal garantia se trata de obrigação do poder público, e não de mera faculdade a admitir juízo de conveniência e oportunidade.
6. Quanto ao ônus sucumbencial, é importante ressaltar que é possível a condenação do Município de Fortaleza em favor da Defensoria Pública Estadual, vez que inexiste confusão entre eles. Isso porque a DPE não possui nenhuma vinculação à pessoa jurídica de direito público em referência. Dessa forma, não se aplica a Súmula nº. 421 do Superior Tribunal de Justiça à hipótese.
7. Dito isso, anoto que o CPC/2015 prevê no § 8º do art. 85 que nos casos em que for muito baixo o valor da causa, os honorários devem ser arbitrados de forma equitativa, observados os critérios do § 2º do mesmo dispositivo. Tal regramento pode ser aplicado a contrario sensu, ou seja, em casos em que o valor da causa seja muito elevado, a ponto de configurar exorbitância na fixação do ônus sucumbencial, como na hipótese vertente. Destarte, pelo critério da equidade, fixo a verba honorária em desfavor do Município de Fortaleza no importe de R$2.000,00 (dois mil reais), o que faço respaldada pelo § 8º do art. 85 do diploma processual emergente.
8. Recurso do ente municipal conhecido e desprovido. Apelação da parte autora conhecida e provida.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos das Apelações Cíveis nº. 0864374-59.2014.8.06.0001, em que são partes as acima relacionadas, acordam os Desembargadores que compõem a 1ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, por unanimidade de votos, em conhecer dos recursos, para negar provimento ao apelo da municipalidade, e dar provimento à apelação da parte autora, reformando a sentença do Juízo a quo, nos termos do voto da eminente Relatora, parte integrante deste.
Fortaleza/CE, 29 de janeiro de 2018.
Data do Julgamento
:
29/01/2018
Data da Publicação
:
29/01/2018
Classe/Assunto
:
Apelação / Honorários Advocatícios
Órgão Julgador
:
1ª Câmara Direito Público
Relator(a)
:
LISETE DE SOUSA GADELHA
Comarca
:
Fortaleza
Comarca
:
Fortaleza
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