TJCE 1014397-08.2000.8.06.0001
PENAL E PROCESSO PENAL. APELAÇÃO. HOMICÍDIO CULPOSO NA DIREÇÃO DE VEÍCULO AUTOMOTOR. PLEITO DE ABSOLVIÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. DEMONSTRAÇÃO DA QUEBRA DO DEVER DE CUIDADO OBJETIVO.
1. Condenado à pena de 04 (quatro) anos, 01 (um) mês e 15 (quinze) dias de detenção, a defesa busca a absolvição do réu, sob o argumento de que inexistem provas suficientes para um decreto condenatório. Subsidiariamente, requer a diminuição da reprimenda para o mínimo, a alteração do regime inicial de cumprimento desta e a substituição por sanção restritiva de direitos.
2. Compulsando os autos, extrai-se que a culpa na conduta do réu restou devidamente demonstrada, pois além de não possuir habilitação para dirigir, avançou o sinal vermelho e colheu a motocicleta da vítima, agindo, portanto, com imperícia e imprudência.
3. Nesta senda, ainda que o laudo pericial não tenha apresentado conclusão satisfatória, tem-se que considerando a prova oral colhida, resta assente que o magistrado de piso fundou-se em elementos hábeis e suficientes para fundamentar a condenação do recorrente pelo delito de homicídio culposo na direção de veículo automotor, não merecendo a sentença reforma neste ponto.
DA ANÁLISE DA DOSIMETRIA DA PENA. NECESSIDADE DE REDIMENSIONAMENTO. ALTERAÇÃO DO REGIME INICIAL DE CUMPRIMENTO. REDUÇÃO DO VALOR ATINENTE À PRESTAÇÃO PECUNIÁRIA.
4. O sentenciante, ao dosar a pena base, entendeu desfavoráveis ao réu as circunstâncias judiciais da culpabilidade e da personalidade, e por isso afastou a basilar em 09 (nove) meses do mínimo legal, que é de 02 (dois) anos.
5. Retira-se o desvalor atribuído à culpabilidade pois pautado em circunstâncias genéricas.
6. Da mesma forma, não deve subsistir o desvalor atribuído à personalidade. Primeiro porque eventual problema nos freios do automóvel sequer restou comprovado pelo laudo pericial. Segundo porque, ainda que tal problema fosse inconteste, certo é que nem ele, nem o fato de o acusado dirigir há apenas um mês teriam o condão de demonstrar o desprezo do recorrente pelo perigo causado à sociedade, sendo mais uma vez dotada de abstração a justificativa apresentada pelo sentenciante.
7. De modo que, não remanescendo traço desfavorável sobre quaisquer dos vetores do art. 59 do Código Penal, é de se redimensionar a pena base ao patamar mínimo de 02 (dois) anos de detenção.
8. Na 2ª fase da dosimetria, foi reconhecida a agravante do art. 298, I do Código de Trânsito Brasileiro, porém o julgador não informou, concretamente, as razões que fizeram com que a aludida agravante se aplicasse ao caso concreto. Assim, necessária a retirada da mesma.
9. Ainda na 2ª fase, impõe-se o reconhecimento da atenuante de confissão espontânea, pois o réu assumiu que dirigia o veículo que se chocou com a moto, tudo em conformidade com o teor do enunciado sumular nº 545 do Superior Tribunal de Justiça. Contudo, deixa-se de diminuir a sanção, vez que a basilar já se encontra fixada no mínimo legal, consoante Súmula 231 do STJ.
10. Na 3ª fase da dosagem da sanção, a pena foi aumentada em 1/2 porque foi reconhecida a majorante do art. 302, I do CTB. Mantém-se o reconhecimento da aludida causa de aumento, pois ficou comprovado no decorrer do processo que o réu não possuía habilitação para dirigir ao tempo dos fatos. Contudo, impõe-se a alteração do quantum de aumento para o mínimo de 1/3, já que não foi apresentada na sentença fundamentação concreta para fixar fração superior ao piso legal, ficando a reprimenda no montante de 02 (dois) anos e 08 (oito) meses de detenção. Precedentes.
11. Fica a pena definitiva, portanto, para o crime do art. 302, §1º, I do CTB, redimensionada de 04 (quatro) anos, 01 (um) e 15 (quinze) dias de detenção para 02 (dois) anos e 08 (oito) meses de detenção.
12. Observando-se o intervalo do art. 293 do Código de Trânsito Brasileiro, bem como a proporcionalidade com a pena privativa de liberdade, altera-se a pena acessória de suspensão ou proibição de obtenção de CNH para o período de 02 (dois) meses e 20 (vinte) dias. Precedentes.
13. Altera-se o regime inicial de cumprimento de pena para o aberto, pois o quantum de sanção agora imposto enquadra o caso no art. 33, §2º, 'c' do Código Penal, relembrando-se ainda que o réu é primário e não persistiu negativada nenhuma circunstância judicial do art. 59, CP.
14. Permanece a substituição da pena privativa de liberdade por duas restritivas de direitos (prestação pecuniária e prestação de serviço à comunidade), contudo necessário se faz alterar o quantum aplicado à primeira, vez que o julgador determinou o pagamento de R$ 4.000,00 (quatro mil reais), sem qualquer fundamentação para tanto -, razão pela qual se reduz o montante para o mínimo legal, qual seja, um salário-mínimo ao tempo dos fatos, conforme art. 45, §1º do Código Penal. Precedentes.
15. Por fim, deve-se, em observância aos primados do contraditório e da ampla defesa, decotar a condenação à reparação de danos (art. 387, IV do CPP), pois não houve pedido expresso na denúncia, não tendo o julgador sequer informado os parâmetros utilizados para a fixação do quantum. Precedentes.
RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. DE OFÍCIO, REDUZIDO O VALOR DA PRESTAÇÃO PECUNIÁRIA E DECOTADA A CONDENAÇÃO À REPARAÇÃO DE DANOS.
ACORDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos de apelação criminal nº 1014397-08.2000.8.06.0001, ACORDAM os desembargadores da 1ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, à unanimidade, em conhecer do recurso de apelação e lhe dar parcial provimento, redimensionando a pena aplicada e alterando o regime inicial de cumprimento desta. De ofício, fica reduzido o valor da prestação pecuniária e excluída a condenação pela reparação dos danos, mantidas as demais disposições da sentença., nos termos do voto do Relator.
Fortaleza, 24 de abril de 2018
DESEMBARGADOR MÁRIO PARENTE TEÓFILO NETO
Relator
Ementa
PENAL E PROCESSO PENAL. APELAÇÃO. HOMICÍDIO CULPOSO NA DIREÇÃO DE VEÍCULO AUTOMOTOR. PLEITO DE ABSOLVIÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. DEMONSTRAÇÃO DA QUEBRA DO DEVER DE CUIDADO OBJETIVO.
1. Condenado à pena de 04 (quatro) anos, 01 (um) mês e 15 (quinze) dias de detenção, a defesa busca a absolvição do réu, sob o argumento de que inexistem provas suficientes para um decreto condenatório. Subsidiariamente, requer a diminuição da reprimenda para o mínimo, a alteração do regime inicial de cumprimento desta e a substituição por sanção restritiva de direitos.
2. Compulsando os autos, extrai-se que a culpa na conduta do réu restou devidamente demonstrada, pois além de não possuir habilitação para dirigir, avançou o sinal vermelho e colheu a motocicleta da vítima, agindo, portanto, com imperícia e imprudência.
3. Nesta senda, ainda que o laudo pericial não tenha apresentado conclusão satisfatória, tem-se que considerando a prova oral colhida, resta assente que o magistrado de piso fundou-se em elementos hábeis e suficientes para fundamentar a condenação do recorrente pelo delito de homicídio culposo na direção de veículo automotor, não merecendo a sentença reforma neste ponto.
DA ANÁLISE DA DOSIMETRIA DA PENA. NECESSIDADE DE REDIMENSIONAMENTO. ALTERAÇÃO DO REGIME INICIAL DE CUMPRIMENTO. REDUÇÃO DO VALOR ATINENTE À PRESTAÇÃO PECUNIÁRIA.
4. O sentenciante, ao dosar a pena base, entendeu desfavoráveis ao réu as circunstâncias judiciais da culpabilidade e da personalidade, e por isso afastou a basilar em 09 (nove) meses do mínimo legal, que é de 02 (dois) anos.
5. Retira-se o desvalor atribuído à culpabilidade pois pautado em circunstâncias genéricas.
6. Da mesma forma, não deve subsistir o desvalor atribuído à personalidade. Primeiro porque eventual problema nos freios do automóvel sequer restou comprovado pelo laudo pericial. Segundo porque, ainda que tal problema fosse inconteste, certo é que nem ele, nem o fato de o acusado dirigir há apenas um mês teriam o condão de demonstrar o desprezo do recorrente pelo perigo causado à sociedade, sendo mais uma vez dotada de abstração a justificativa apresentada pelo sentenciante.
7. De modo que, não remanescendo traço desfavorável sobre quaisquer dos vetores do art. 59 do Código Penal, é de se redimensionar a pena base ao patamar mínimo de 02 (dois) anos de detenção.
8. Na 2ª fase da dosimetria, foi reconhecida a agravante do art. 298, I do Código de Trânsito Brasileiro, porém o julgador não informou, concretamente, as razões que fizeram com que a aludida agravante se aplicasse ao caso concreto. Assim, necessária a retirada da mesma.
9. Ainda na 2ª fase, impõe-se o reconhecimento da atenuante de confissão espontânea, pois o réu assumiu que dirigia o veículo que se chocou com a moto, tudo em conformidade com o teor do enunciado sumular nº 545 do Superior Tribunal de Justiça. Contudo, deixa-se de diminuir a sanção, vez que a basilar já se encontra fixada no mínimo legal, consoante Súmula 231 do STJ.
10. Na 3ª fase da dosagem da sanção, a pena foi aumentada em 1/2 porque foi reconhecida a majorante do art. 302, I do CTB. Mantém-se o reconhecimento da aludida causa de aumento, pois ficou comprovado no decorrer do processo que o réu não possuía habilitação para dirigir ao tempo dos fatos. Contudo, impõe-se a alteração do quantum de aumento para o mínimo de 1/3, já que não foi apresentada na sentença fundamentação concreta para fixar fração superior ao piso legal, ficando a reprimenda no montante de 02 (dois) anos e 08 (oito) meses de detenção. Precedentes.
11. Fica a pena definitiva, portanto, para o crime do art. 302, §1º, I do CTB, redimensionada de 04 (quatro) anos, 01 (um) e 15 (quinze) dias de detenção para 02 (dois) anos e 08 (oito) meses de detenção.
12. Observando-se o intervalo do art. 293 do Código de Trânsito Brasileiro, bem como a proporcionalidade com a pena privativa de liberdade, altera-se a pena acessória de suspensão ou proibição de obtenção de CNH para o período de 02 (dois) meses e 20 (vinte) dias. Precedentes.
13. Altera-se o regime inicial de cumprimento de pena para o aberto, pois o quantum de sanção agora imposto enquadra o caso no art. 33, §2º, 'c' do Código Penal, relembrando-se ainda que o réu é primário e não persistiu negativada nenhuma circunstância judicial do art. 59, CP.
14. Permanece a substituição da pena privativa de liberdade por duas restritivas de direitos (prestação pecuniária e prestação de serviço à comunidade), contudo necessário se faz alterar o quantum aplicado à primeira, vez que o julgador determinou o pagamento de R$ 4.000,00 (quatro mil reais), sem qualquer fundamentação para tanto -, razão pela qual se reduz o montante para o mínimo legal, qual seja, um salário-mínimo ao tempo dos fatos, conforme art. 45, §1º do Código Penal. Precedentes.
15. Por fim, deve-se, em observância aos primados do contraditório e da ampla defesa, decotar a condenação à reparação de danos (art. 387, IV do CPP), pois não houve pedido expresso na denúncia, não tendo o julgador sequer informado os parâmetros utilizados para a fixação do quantum. Precedentes.
RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. DE OFÍCIO, REDUZIDO O VALOR DA PRESTAÇÃO PECUNIÁRIA E DECOTADA A CONDENAÇÃO À REPARAÇÃO DE DANOS.
ACORDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos de apelação criminal nº 1014397-08.2000.8.06.0001, ACORDAM os desembargadores da 1ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, à unanimidade, em conhecer do recurso de apelação e lhe dar parcial provimento, redimensionando a pena aplicada e alterando o regime inicial de cumprimento desta. De ofício, fica reduzido o valor da prestação pecuniária e excluída a condenação pela reparação dos danos, mantidas as demais disposições da sentença., nos termos do voto do Relator.
Fortaleza, 24 de abril de 2018
DESEMBARGADOR MÁRIO PARENTE TEÓFILO NETO
Relator
Data do Julgamento
:
24/04/2018
Data da Publicação
:
24/04/2018
Classe/Assunto
:
Apelação / Crimes de Trânsito
Órgão Julgador
:
1ª Câmara Criminal
Relator(a)
:
MARIO PARENTE TEÓFILO NETO
Comarca
:
Fortaleza
Comarca
:
Fortaleza
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