main-banner

Jurisprudência


TJDF AGI - 904275-20140020314216AGI

Ementa
AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE INVENTÁRIO. DIREITO REAL DE HABITAÇÃO DE CÔNJUGE SUPÉRSTITE. INVENTARIANTE QUE ERA CASADO COM INVENTARIADA, SOB O REGIME DA COMUNHÃO UNIVERSAL DE BENS, COM QUEM CONSTITUIU FAMÍLIA, TEVE 5 (CINCO) FILHOS E JUNTOS ADQUIRIRAM, EM 30 DE OUTUBRO DE 1981, O IMÓVEL OBJETO DO LITIGIO. ARTIGO 1.611§ 2º do CC/1916. ABERTURA DA SUCESSÃO NA VIGÊNCIA DO CC/16. POSTERIOR CONSTITUIÇÃO DE UNIÃO ESTÁVEL. IRRELEVÂNCIA. TEMPUS REGIT ACTUM. AGRAVO PROVIDO. 1. Trata-se de agravo de instrumento contra decisão, em ação de inventário, que determinou ao recorrente o pagamento de aluguéis em razão de ocupação exclusiva de imóvel integrante do espólio. 1.1. O recorrente sustenta fazer jus a direito real de habitação sobre o bem, nos termos do art. 1.611 do CC/1916, apesar de ter constituído união estável após o óbito de sua esposa. 2.Restou incontroverso, até porque expressamente reconhecido pela decisão recorrida, que o inventariante, ora agravante, ocupa o imóvel, com exclusividade, há quase 24 (vinte e quatro) anos. 2.1 Imóvel este adquirido pelo inventariante e sua finada esposa no dia 30 de outubro de 1981, portanto, há 34 (trinta e quatro) anos. 3. Deve o caso ser examinado à luz do Código Civil de 1916, porquanto era a legislação vigente à data da abertura da sucessão (arts. 1.787 do CC/2002 e 1.577 do CC/1916). 3.1 Aplicação do princípio tempus regit actum. 4.O Direito Real de Habitação constitui vertente dos direitos de fruição sobre o bem imóvel alheio, com a particularidade de apresentar exclusiva finalidade de moradia, em caráter personalíssimo e a título gratuito. No âmbito sucessório, o instituto apresenta notório propósito humanitário, ao conferir maior estabilidade econômica e emocional ao cônjuge sobrevivente, autorizando-o a permanecer na antiga morada do casal, mesmo após o falecimento do consorte e ainda que existam outros herdeiros do bem. 5.Atualmente, por força do disposto no artigo 1831 do CC/2002, assegura-se a vitaliciedade de tal benesse, independentemente do regime de bens estabelecido no matrimônio, sob a condição de que o imóvel em questão seja o único da herança destinado à residência familiar. 5.1. Na codificação anterior, aplicável à presente lide, o direito real de habitação não apresentava tamanha abrangência, sua concessão restringia-se àqueles casados sob regime de comunhão universal, e apenas enquanto permanecessem em estado de viuvez. (art. 1611 § 2º do CC/1916). 5.2 Destarte, No Código Civil de 1916, o cônjuge sobrevivente, além de figurar na terceira classe da ordem à vocação hereditária, tinha a proteção complementar do usufruto vidual e do direito real de habitação (art. 1611, §§ 1º e 2º). O direito real de habitação era assegurado ao cônjuge casado pela comunhão universal de bens, em caráter vitalício e enquanto permanecesse viúvo, tendo por objeto o imóvel residencial da família, desde que o único dessa natureza. O usufruto vidual era conferido aos cônjuges casados por outros regimes de bens, que não o da comunhão universal, correspondendo ao usufruto da quarta parte dos bens deixados pelo de cujus, se houvesse filhos, e metade, no caso de herdeiros descendentes (in Código Civil Comentado, 6ª edição, Manole, Coordenador Ministro Cezar Peluso, pág. 2213), havendo ainda a necessidade de se proceder ao registro imobiliário, porque deriva do direito sucessório e não no de família (art. 167, 1, g, Lei 6.015/73). 6. Ficou incontroverso, neste feito,que a casa conserva finalidade habitacional, bem como que o agravante contraiu matrimônio com a de cujus sob o regime de comunhão universal de bens. 7. O Estado civil corresponde à situação da pessoa natural com relação ao matrimônio ou à sociedade conjugal, apresentando-se sob as espécies: solteiro, casado, separado, divorciado e viúvo. 7.1 Não sendo definida a união estável como estado civil, quem assim vive não é obrigado a identificar-se como tal. Não falta com a verdade ao se declarar solteiro, separado, divorciado ou viúvo. (DIAS, Maria Berenice Dias, Direito das Famílias. São Paulo: RT, 2008, p. 162). 7.2 O projeto de Lei 1.779/2003, com a finalidade de definir o estado civil para conviventes continua em trâmite no Parlamento, não podendo o seu teor surtir efeitos jurídicos. 8. Quando o direito real de habitação foi introduzido no Código Civil de 1916, pela Lei 4.121/1962, nem mesmo era reconhecida a união estável como entidade familiar, o que passou a ocorrer apenas após vigência das Leis 8971/1994, 9278/1996 e do art. 226, § 3º da Constituição Federal de 1988. 8.1 Não cumpre ao intérprete ampliar conceitos restritivos de direitos, atribuindo significação extensiva às expressões normativas viver e permanecer viúvo, porquanto à época equivaliam, unicamente, a não constituir novo casamento. 9.Causa estranheza e também perplexidade a exigência por parte dos filhos agravados de que o pai arque com aluguéis para permanecer na casa que ele mesmo adquiriu e onde a família reside desde 1981, não se podendo olvidar, também, que É obrigação da família, da comunidade, da sociedade e do Poder Público assegurar ao idoso, com absoluta prioridade, a efetivação do direito à vida, á saúde, à alimentação, à educação, à cultura, ao esporte, ao lazer, ao trabalho, à cidadania, à liberdade, à dignidade, ao respeito e à convivência familiar e comunitária (art. 3º Lei 10.741/03). 9.1 Cabe ao Poder Judiciário fazer cumprir a lei neste pais. 10. Aliás, ofato de os agravados supostamente passarem por dificuldades financeiras não representa argumento hábil a justificar a imposição da aludida contraprestação pecuniária ao genitor. 11. Decisão reformada. Agravo de instrumento provido.

Data do Julgamento : 28/10/2015
Data da Publicação : 06/11/2015
Órgão Julgador : 2ª TURMA CÍVEL
Relator(a) : JOÃO EGMONT
Mostrar discussão