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Jurisprudência


TJDF APC - 1006920-20150111429006APC

Ementa
APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO ADMINISTRATIVO. CONCURSO PÚBLICO PARA INGRESSO NA CARREIRA DE DELEGADO DA POLÍCIA MILITAR DO DISTRITO FEDERAL. PROVA DISCURSIVA. QUESTÃO CUJO CONTEÚDO NÃO ENCONTRA CORRESPONDÊNCIA NO PROGRAMA PREVISTO NO EDITAL. INVASÃO DO MÉRITO ADMINISTRATIVO. INOCORRÊNCIA. ASPECTO FORMAL DO ATO ADMINISTRATIVO. LEI DISTRITAL 4.949/2012. OBSERVÂNCIA. JUÍZO DE COMPATIBILIDADE DO CONTEÚDO COBRADO NA PROVA COM O PROGRAMA EDITALÍCIO. POSSIBILIDADE. PRECEDENTES. APELAÇÃO CONHECIDA E PROVIDA PARA REFORMAR A SENTENÇA RECORRIDA, JULGANDO PROCEDENTE O PEDIDO DECLINADO NA INICIAL. INVERSÃO DOS ÔNUS SUCUMBENCIAIS E FIXAÇÃO DE HONORÁRIOS RECURSAIS. 1. A pretensão autoral volta-se contra a Questão 1, item b da prova discursiva a que se submeteu após aprovação na primeira fase (prova objetiva) no concurso para o cargo de Delegado da Polícia Civil do Distrito Federal, certame regido pelo Edital nº 01 - PCDF - DELEGADO, de 31 de dezembro de 2014, alegando que matéria cobrada na referida questão do concurso estaria fora do conteúdo programático previsto no Edital respectivo, padecendo a questão, por conseguinte, de vício de legalidade, devendo ser anulada para o fim de se lhe atribuir os pontos respectivos, com o que galgaria a fase seguinte no certame. 2. A irresignação do Apelado assentasse no fundamento de que o Índice de Massa Corpórea é critério que ofenderia a razoabilidade/proporcionalidade, vez que possui elevada massa muscular e estrutura óssea avantajada, o que distorceria a medição verificada, ademais de ter o Apelado sido aprovado no exame de aptidão física, o que demonstraria aptidão antropométrica para o exercício da função de policial militar; 3.O magistrado sentenciante entendeu que a matéria cobrada (princípio da justeza ou da conformidade funcional) na questão objurgada pelo Apelante estaria inserida no Edital, no programa de Direito Constitucional, item 2.3, ou seja, tratar-se-ia de conteúdo afeto ao tópico Normas Constitucionais 4. Contudo, não é essa a conclusão a que se chega quando se analisam os diversos manuais ou cursos de Direito Constitucional publicados no país, nos quais vemos que a divisão dos conteúdos traz, em capítulos totalmente distintos, os temas relativos a Normas Constitucionais e aqueles relativos à Interpretação da Constituição ou à Hermenêutica Constitucional, aqui se inserindo a abordagem dos princípios interpretativos, entre os quais o da justeza ou conformidade funcional, cujo conhecimento foi cobrado na Questão 1, item b, impugnada pelo autor/apelante. 5. O que se verifica é que os livros de Direito Constitucional trazem, como matérias abordadas no capítulo relativo a Normas Constitucionais (Teoria da Norma Constitucional ou Classificação das Normas Constitucionais) os temas relativos à classificação das normas constitucionais (quanto à eficácia, quanto à espécie etc.), enquanto no capítulo referente à Interpretação da Constituição ou Hermenêutica Constitucional se abordam temas relativos aos métodos e princípios de interpretação da Constituição. 6. O Princípio da Justeza ou da Conformidade Funcional se encontra entre os princípios de interpretação da Constituição, ao lado, entre outros, dos princípios da unidade da constituição, do efeito integrador, da concordância prática, da força normativa etc. 7. Dúvidas não há, portanto, de que o assunto cobrado na questão impugnada pelo autor/apelante, ou seja, o princípio da justeza ou conformidade funcional, se insere no conteúdo de Direito Constitucional, sendo tratado, pela doutrina constitucional, topologicamente dentro da Interpretação Constitucional, matéria na qual se estudam os métodos e princípios de interpretação da constituição, o que não se confunde com as matérias que são contempladas pelos constitucionalistas na abordagem do tópico relativo às Normas Constitucionais (aplicabilidade das normas ou teoria geral das normas constitucionais), como, data venia, equivocadamente entendeu o magistrado sentenciante. 8. ALei Distrital nº 4.949/2012, que disciplina a realização de concursos públicos no âmbito da Administração direta, autárquica e fundacional do Distrito Federal, veio a lume apenas tornar positivada no ordenamento jurídico Distrital o princípio da vinculação ao edital, já consagrado na doutrina administrativista e em outras leis (como a Lei 8.666/93), que enlaça tanto o Poder Público, pelo órgão que realiza a seleção, como a pessoa jurídica eventualmente contratada para a organização do certame e aplicação das provas, e, evidentemente, o próprio candidato ao cargo disputado. 9. Aqui não se trata de invasão do mérito do ato administrativo, que está atrelado, quanto ao tema dos concursos públicos, à eleição dos critérios de avaliação (como a confecção do conteúdo programático e a submissão do candidato a outros exames, além do intelectual), atuação, por evidente, que também deve obediência à legalidade, bem como não se está diante de reavaliação dos critérios empregados pela banca examinadora para a correção da prova do candidato, mas se cuida de aferir a observância dos próprios parâmetros que regem o certame e foram dispostos no edital respectivo, cuja obediência se impõe a todos. 10. Ao Poder Judiciário não é dado substituir a banca examinadora de concurso público na avaliação ou reavaliação das respostas e das notas atribuídas ao candidato, sendo vedado ao julgador, portanto, interferir nos critérios de correção de provas, a menos que se esteja diante de ilegalidade manifesta ou desrespeito às próprias regras editalícias, como ocorre no caso de inobservância da compatibilidade do conteúdo das questões aplicadas com o conteúdo programático previsto no edital respectivo, o que está configurado no caso dos autos. 11. Precedentes desta Corte, do Colendo Superior Tribunal de Justiça e da Corte Suprema, que, em julgamento de Recurso Extraordinário com repercussão geral, firmou a mesma tese que estamos a expor, consignando que Não compete ao Poder Judiciário, no controle de legalidade, substituir banca examinadora para avaliar respostas dadas pelos candidatos e notas a elas atribuídas, mas excepcionando a possibilidade de proceder-se a um juízo de compatibilidade do conteúdo das questões do concurso com o previsto no edital do certame. (RE 632853, Relator o Em. Min. Gilmar Mendes, Tribunal Pleno, julgado em 23/04/2015, DJe-125, divulgado em 26/06/2015, publicado em 29/06/2015). 12. Édisso que se cuida no caso dos autos, porquanto não é possível encaixar o princípio da justeza ou conformidade funcional, cobrado na Questão 1, item b, da prova discursiva, em qualquer dos tópicos do programa de Direito Constitucional previsto no Edital do concurso, isso pela singela razão de que aquele princípio está estritamente vinculado ao ponto Interpretação da Constituição ou Hermenêutica Constitucional, que engloba os princípios de interpretação da constituição e os métodos hermenêuticos consagrados pela doutrina constitucionalista, conteúdo que não está disposto na lei do certame 13. Apretensão autoral deve ser acolhida, haja vista que a questão impugnada padece de invalidade, devendo ser anulada e, por conseguinte, devem ser atribuídos os pontos respectivos ao autor/apelante, de modo que, alcançando pontuação para prosseguir no certame, avance para as demais fases previstas, nas quais, obviamente, deverá obter aprovação, a fim de que, sendo aprovado dentro do número de vagas previstas, seja submetido ao Curso de Formação Policial e, uma vez logrando êxito neste, seja nomeado e empossado no cargo de Delegado da Polícia Civil do Distrito Federal 14. Apelação Cível conhecida e provida, reformando-se a sentença recorrida para julgar procedente o pedido deduzido na inicial, com inversão dos ônus sucumbenciais, nos mesmos termos previstos na sentença recorrida (§§ 3º e 5º do art. 85 do CPC), e acréscimo de honorários recursais (§ do art. 85 do CPC).

Data do Julgamento : 22/03/2017
Data da Publicação : 04/04/2017
Órgão Julgador : 4ª TURMA CÍVEL
Relator(a) : ROMULO DE ARAUJO MENDES
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