TJDF APC - 1010024-20140111941723APC
APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO ADMINISTRATIVO. DIREITO CIVIL. DIREITO PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE CUMULADA COM COBRANÇA (DANOS MATERIAIS E MORAIS). CONTRATO DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL FIRMADO COM A TERRACAP. LOTEAMENTO NA EXPANSÃO DO GUARÁ II. APELAÇÃO DOS AUTORES. EXTINÇÃO PARCIAL DO FEITO POR PERDA DO INTERESSE DE AGIR EM DECORRÊNCIA DO DISTRATO (NULIDADE DO NEGÓCIO, CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA). INOCORRÊNCIA. SENTENÇA REFORMADA. ANÁLISE DO MÉRITO (ART. 1013, § 3º, I, CPC/2015). DECLARAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE DA LEI COMPLEMENTAR DISTRITAL 733/2006. PLANO DIRETOR LOCAL DO GUARÁ. ÓBICE PARA OS ADQUIRENTES CONSTRUÍREM. EDITAL DE LICITAÇÃO POSTERIOR À DECLARAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE. OMISSÃO NO EDITAL. BOA-FÉ OBJETIVA. DEVER ANEXO DE INFORMAÇÃO. DESCUMPRIMENTO DE NORMA EDITALÍCIA PELA VENDEDORA. IMPLANTAÇÃO DE INFRAESTRUTURA BÁSICA NO PRAZO DE 4 ANOS. RECONHECIMENTO DO INADIMPLEMENTO NO BOJO DO PROCESSO ADMINISTRATIVO. CIRCUNSTÂNCIAS QUE NÃO DETERMINAM A NULIDADE DO NEGÓCIO SUBJACENTE DE COMPRA E VENDA E DO DISTRATO RESPECTIVO. RECONHECIMENTO, TODAVIA, DE DIREITOS PARA ALÉM DOS CONTEMPLADOS NO DISTRATO. CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA SOBRE OS VALORES PAGOS. CABIMENTO. COMPLEMENTAÇÃO DE DANOS MATERIAIS. DANOS MORAIS. INADIMPLEMENTO CONTRATUAL. INEXISTÊNCIA DE REFLEXOS VIOLADORES DOS DIREITOS DA PERSONALIDADE. DESCABIMENTO. APELAÇÃO DA RÉ. PREJUÍZO PARCIAL (DANOS MATERIAIS). HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. EMPRESA PÚBLICA. APLICAÇÃO DO ART. 20, § 3º, CPC/1973. CORREÇÃO DO JULGADO RECORRIDO. RECURSO DOS AUTORES CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. RECURSO DA RÉ PARCIALMENTE CONHECIDO E, NESSA PARTE, NÃO PROVIDO. 1. A sentença recorrida declarou ter havido perda do interesse processual quanto aos pedidos contidos nas alíneas d e f da petição inicial (declaração de nulidade do negócio jurídico e do distrato, bem como aplicação de juros de mora e correção monetária sobre o valor a ser restituído). 2. Têm razão os autores quanto à persistência do interesse processual em relação às mencionadas pretensões, vez que, do distrato então firmado pelas partes em litígio não se vislumbra tenham sido alcançados aqueles pleitos, o que, forçosamente, nos leva à conclusão de que, data vênia, laborou em equívoco a magistrada sentenciante ao extinguir o feito sem resolução do mérito em relação àqueles pedidos, com fundamento do art. 267, VI, do Código de Processo Civil de 1973. 3. Incidência do disposto no § 3º, inciso I do art. 1013, combinado com o art. 485, VI, todos do Novo Código de Processo Civil, para afastar a extinção do feito naqueles termos e ingressar no mérito dos pedidos cujo interesse se declarou, na instância a quo, inexistente. 4. É incontroverso nos autos que a declaração de inconstitucionalidade da Lei Complementar 733/2006, que aprovou o Plano Diretor Local do Guará, ocorreu em 21/06/2011, com publicação do Acórdão respectivo em 01/03/2012, portanto, antes da publicação do Edital nº 04/2012, verificada em 31/05/2012, que veiculou a abertura do processo licitatório por meio do qual os autores adquiriram o lote de terras nº 3, Conjunto B, da SRIA QE 52, do Guará II, enquanto a escritura pública de compra e venda respectiva foi firmada em 06/09/2012. 5. Também ficou demonstrado nos autos que no edital não constou a informação quanto à ação judicial e quanto à pré-existente declaração de inconstitucionalidade proferida pelo TJDFT, bem como que houve descumprimento da norma editalícia relativa à obrigação de implantação da infraestrutura básica no prazo de 4 anos da obtenção da licença de instalação, fato que fora reconhecido pela própria Advocacia-Geral da TERRACAP, que recomendou a rescisão amigável da venda, com a devolução dos valores pagos 6. Todos esses fatos, ainda que os consideremos ilícitos contratuais da empresa pública alienante, não geram nulidade do negócio jurídico com fundamento em ilicitude, impossibilidade ou indeterminação do objeto contratado (art. 166, II, do Código Civil), que diz respeito a imóvel inserido em parcelamento devidamente regularizado, com registro imobiliário regular no cartório de imóveis competente, consoante se verifica da própria certidão de matrícula do imóvel e da escritura pública de compra e venda, tampouco representaria vício de forma defesa em lei o fato de ter havido omissão no documento editalício quanto à informação da ação judicial que tinha por pretensão a declaração de inconstitucionalidade do PDL do Guará. 7. Não obstante tal circunstância remeta a um descumprimento do dever anexo de informação, que decorre do princípio da boa-fé objetiva, não constitui invalidade reflexa na efetivação da transação operada por meio da escritura de compra e venda em questão, haja vista que esta se revestiu de todas as formalidades legais previstas para o negócio jurídico consubstanciado naquela escritura. 8. As irregularidades apontadas pelos apelantes, contudo, conquanto não constituam causa de nulidade do negócio jurídico firmado pelas partes, não estão infensas a consequências jurídicas de outra ordem, quais sejam, as que geram causa suficiente para a rescisão do avençado, que, na espécie, se operou por meio do distrato ou, nos termos do que preceitua a Lei 8.666/93, por rescisão amigável (art. 79. II). 9. Apretensão de nulidade do distrato não pode ser acolhida, haja vista que os recorrentes, apesar de alegarem que em momento algum tiveram a oportunidade de compor ou negociar qualquer espécie de transação, não comprovaram qualquer vício de consentimento ou outra invalidade na realização da rescisão operada por meio daquele distrato. 10. Isso não impede, contudo, conforme já indicado anteriormente, que possam ser apreciados os pedidos relativos a direitos não contemplados no distrato, quer porque, em parte, decorrem indiretamente dos próprios termos da rescisão amigável, quer porque fundados em causas que, embora ligadas à avença primitiva (compra e venda), dela não dependem para se estabelecer um liame entre a conduta e o dever de indenizar/reparar eventuais danos causados ao contratante adquirente, que não estão impedidos de reclamarem outros direitos a que não renunciaram expressamente por ocasião do distrato. 11. A alegação da ré de que desconhecia a demanda judicial e a própria declaração de inconstitucionalidade da Lei Complementar 733/2006 não pode servir como escusa para afastar as consequências dessa omissão, já que, como empresa pública cuja missão é, precipuamente, a venda do patrimônio imobiliário público, sendo integrante da Administração Indireta do Distrito Federal, é ínsito às suas atribuições institucionais, se pretende atuar com responsabilidade nas negociações dos lotes que leva à venda, cercar-se de todas as informações relevantes acerca dos bens que gerencia e aliena. 12. Não apenas isso, a ré também incorreu em explícito descumprimento da norma editalícia que previa a instalação da infraestrutura básica, no prazo de 4 anos a partir da Licença de Instalação (expedida pelo IBRAM), prazo este que expirou em fevereiro de 2013, dado que aquela licença fora obtida em fevereiro de 2009, como se constata da manifestação do Advogado Geral da TERRACAP no bojo do processo administrativo relativo ao negócio jurídico objeto desta demanda. 13. Não restam dúvidas de que houve inadimplemento da ré quanto às suas obrigações, o que municia os autores/adquirentes de legítimos fundamentos para requererem e obterem as reparações devidas, para além do que ficou consignado na rescisão amigável ou distrato, a fim de verem restaurada, plenamente, a situação que detinham antes da realização do negócio que buscaram desfazer tão logo tomaram conhecimento dos problemas que causavam as obstruções à regular fruição do bem que adquiriram. 14. Sem previsão contratual quanto ao índice de correção monetária a ser aplicado sobre o montante a ser devolvido aos adquirentes de imóveis, no caso de rescisão/resilição da avença, esta Corte tem aplicado o INPC (Índice Nacional de Preços ao Consumidor), seja nos contratos administrativos de que participe a TERRACAP, seja nos contratos imobiliários com o setor privado atinentes a relações de consumo, por refletir a restauração do poder de compra da moeda com maior acuidade. 15. Os juros moratórios são decorrência do descumprimento de uma obrigação contratual ou consequência do dever de reparar os efeitos de algum ilícito de qualquer ordem, funcionando como uma espécie de pena pelo inadimplemento contratual e estímulo ao cumprimento mais célere do que assumido na avença ou pela violação de um dever jurídico extracontratual (responsabilidade civil aquiliana), tornando mais gravosas, para o devedor, as conseqüências do inadimplemento contratual ou do ilícito extracontratual à medida que deflui o tempo sem a satisfação da obrigação. 16. No caso, é plenamente devida a sua aplicação, vez que se registrou, por parte da ré, efetivo descumprimento de obrigação contratual, como aliás fora reconhecido pela TERRACAP no bojo do próprio processo administrativo que cuidou da negociação em questão e no qual foi feito o pedido de desfazimento do negócio pelos autores/adquirentes, já em 28/02/2013. 17. Não se mostra pertinente, contudo, a incidência dos juros moratórios desde o desembolso de cada parcela de amortização do débito, como pretendem os autores, com fundamento no art. 398, do Código Civil e verbete sumular 54/STJ, ou com espeque nos artigos 395 e 396 do mesmo Diploma Legal 18. Sabemos que os juros moratórios, em caso de responsabilidade contratual, fluem a partir do vencimento da obrigação, para as obrigações líquidas (art. 397, caput, do Código Civil), a chamada mora ex re, e, tratando-se de obrigação ilíquida, a chamada mora ex persona, regra geral, correm a partir da citação (art. 405, do Código Civil), podendo fluir, todavia, a partir do implemento de interpelação judicial ou extrajudicial, nos termos do parágrafo único do art. 397, do Código Civil 19. Na espécie, a mora da ré deve ser reconhecida a partir da comunicação dos apelantes quanto à pretensão de desfazimento do negócio, ocorrida em 28/02/2013, como já referido, até porque a própria ré reconhecera, no bojo do processo administrativo relativo ao negócio jurídico firmado pelas partes que aqui contendem, que estava inadimplente com suas obrigações contratuais, afastando-se a regra geral de constituição em mora somente com a citação. 20. Os apelantes têm razão também quanto ao pedido de complementação dos danos materiais, pois o pagamento do valor de R$ 942,10 corresponde a despesas cartorárias (escritura no valor de R$ 863,70 e duas certidões, no valor de R$ 78,40), que foram devidamente comprovadas nos autos, conforme documentos de fls. 87 e 88. 21. Nem toda ordem de abalo psíquico ou perturbação emocional é apta a configurar dano moral, porque este não há de confundir-se com os percalços, aborrecimentos e alterações momentâneas ou tênues do normal estado psicológico, sob pena de banalizar-se e desvirtuar-se a concepção e finalidade de tão destacado instituto jurídico. 22. Não gera dano moral o só fato de os autores terem experimentado situações desagradáveis ou decepções decorrentes do inadimplemento contratual aqui discutido, como a venda do outro imóvel que possuíam, até mesmo porque parcela do dinheiro fora utilizada para quitação do saldo devedor do imóvel que adquiriram da ré, bem como o fato de terem alugado outro imóvel para acompanharem as obras no lote adquirido. 23. Nessa perspectiva, para além dos percalços advindos diretamente do próprio inadimplemento contratual, para a configuração do dano moral seria necessário que se desencadeassem, a partir desse fato, maiores conseqüências de ordem imaterial, é dizer, a ocorrência de um fato secundário desabonador da honra, da imagem ou lesivo a qualquer outro atributo da personalidade da pretensa vítima, o que não se verificou na espécie. 24. Aquestão referente à responsabilidade da ré, com o seu conseqüente dever de indenizar os danos materiais suportados pelos autores já foi devidamente analisada, do que resulta o reconhecimento, no ponto, de que está prejudicada a apelação da ré, restando a análise somente da pretensão de modificação do parâmetro legal para a incidência dos honorários advocatícios. 25. O art. 20, § 4º do CPC/1973 menciona Fazenda Pública, o que abarca apenas o próprio Ente Político, no caso, o Distrito Federal, suas autarquias e fundações públicas, não se inserindo, pois, no seu campo de incidência, as empresas públicas, pessoas jurídicas de direito privado, como a TERRACAP 26. Mesmo que fosse o caso de mudar o fundamento legal para a fixação dos honorários advocatícios, com aplicação do § 4º do art. 20, CPC/1973, ou seja, fixando-se os honorários por equidade, encontraríamos valor similar ao que constou da sentença recorrida, ainda que não se fizesse referência a um valor dentro da faixa percentual referida no § 3º do mesmo dispositivo legal. 27. Apelação dos autores conhecida e parcialmente provida. Apelação da ré prejudicada em parte e, na parte conhecida, não provida.
Ementa
APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO ADMINISTRATIVO. DIREITO CIVIL. DIREITO PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE CUMULADA COM COBRANÇA (DANOS MATERIAIS E MORAIS). CONTRATO DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL FIRMADO COM A TERRACAP. LOTEAMENTO NA EXPANSÃO DO GUARÁ II. APELAÇÃO DOS AUTORES. EXTINÇÃO PARCIAL DO FEITO POR PERDA DO INTERESSE DE AGIR EM DECORRÊNCIA DO DISTRATO (NULIDADE DO NEGÓCIO, CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA). INOCORRÊNCIA. SENTENÇA REFORMADA. ANÁLISE DO MÉRITO (ART. 1013, § 3º, I, CPC/2015). DECLARAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE DA LEI COMPLEMENTAR DISTRITAL 733/2006. PLANO DIRETOR LOCAL DO GUARÁ. ÓBICE PARA OS ADQUIRENTES CONSTRUÍREM. EDITAL DE LICITAÇÃO POSTERIOR À DECLARAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE. OMISSÃO NO EDITAL. BOA-FÉ OBJETIVA. DEVER ANEXO DE INFORMAÇÃO. DESCUMPRIMENTO DE NORMA EDITALÍCIA PELA VENDEDORA. IMPLANTAÇÃO DE INFRAESTRUTURA BÁSICA NO PRAZO DE 4 ANOS. RECONHECIMENTO DO INADIMPLEMENTO NO BOJO DO PROCESSO ADMINISTRATIVO. CIRCUNSTÂNCIAS QUE NÃO DETERMINAM A NULIDADE DO NEGÓCIO SUBJACENTE DE COMPRA E VENDA E DO DISTRATO RESPECTIVO. RECONHECIMENTO, TODAVIA, DE DIREITOS PARA ALÉM DOS CONTEMPLADOS NO DISTRATO. CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA SOBRE OS VALORES PAGOS. CABIMENTO. COMPLEMENTAÇÃO DE DANOS MATERIAIS. DANOS MORAIS. INADIMPLEMENTO CONTRATUAL. INEXISTÊNCIA DE REFLEXOS VIOLADORES DOS DIREITOS DA PERSONALIDADE. DESCABIMENTO. APELAÇÃO DA RÉ. PREJUÍZO PARCIAL (DANOS MATERIAIS). HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. EMPRESA PÚBLICA. APLICAÇÃO DO ART. 20, § 3º, CPC/1973. CORREÇÃO DO JULGADO RECORRIDO. RECURSO DOS AUTORES CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. RECURSO DA RÉ PARCIALMENTE CONHECIDO E, NESSA PARTE, NÃO PROVIDO. 1. A sentença recorrida declarou ter havido perda do interesse processual quanto aos pedidos contidos nas alíneas d e f da petição inicial (declaração de nulidade do negócio jurídico e do distrato, bem como aplicação de juros de mora e correção monetária sobre o valor a ser restituído). 2. Têm razão os autores quanto à persistência do interesse processual em relação às mencionadas pretensões, vez que, do distrato então firmado pelas partes em litígio não se vislumbra tenham sido alcançados aqueles pleitos, o que, forçosamente, nos leva à conclusão de que, data vênia, laborou em equívoco a magistrada sentenciante ao extinguir o feito sem resolução do mérito em relação àqueles pedidos, com fundamento do art. 267, VI, do Código de Processo Civil de 1973. 3. Incidência do disposto no § 3º, inciso I do art. 1013, combinado com o art. 485, VI, todos do Novo Código de Processo Civil, para afastar a extinção do feito naqueles termos e ingressar no mérito dos pedidos cujo interesse se declarou, na instância a quo, inexistente. 4. É incontroverso nos autos que a declaração de inconstitucionalidade da Lei Complementar 733/2006, que aprovou o Plano Diretor Local do Guará, ocorreu em 21/06/2011, com publicação do Acórdão respectivo em 01/03/2012, portanto, antes da publicação do Edital nº 04/2012, verificada em 31/05/2012, que veiculou a abertura do processo licitatório por meio do qual os autores adquiriram o lote de terras nº 3, Conjunto B, da SRIA QE 52, do Guará II, enquanto a escritura pública de compra e venda respectiva foi firmada em 06/09/2012. 5. Também ficou demonstrado nos autos que no edital não constou a informação quanto à ação judicial e quanto à pré-existente declaração de inconstitucionalidade proferida pelo TJDFT, bem como que houve descumprimento da norma editalícia relativa à obrigação de implantação da infraestrutura básica no prazo de 4 anos da obtenção da licença de instalação, fato que fora reconhecido pela própria Advocacia-Geral da TERRACAP, que recomendou a rescisão amigável da venda, com a devolução dos valores pagos 6. Todos esses fatos, ainda que os consideremos ilícitos contratuais da empresa pública alienante, não geram nulidade do negócio jurídico com fundamento em ilicitude, impossibilidade ou indeterminação do objeto contratado (art. 166, II, do Código Civil), que diz respeito a imóvel inserido em parcelamento devidamente regularizado, com registro imobiliário regular no cartório de imóveis competente, consoante se verifica da própria certidão de matrícula do imóvel e da escritura pública de compra e venda, tampouco representaria vício de forma defesa em lei o fato de ter havido omissão no documento editalício quanto à informação da ação judicial que tinha por pretensão a declaração de inconstitucionalidade do PDL do Guará. 7. Não obstante tal circunstância remeta a um descumprimento do dever anexo de informação, que decorre do princípio da boa-fé objetiva, não constitui invalidade reflexa na efetivação da transação operada por meio da escritura de compra e venda em questão, haja vista que esta se revestiu de todas as formalidades legais previstas para o negócio jurídico consubstanciado naquela escritura. 8. As irregularidades apontadas pelos apelantes, contudo, conquanto não constituam causa de nulidade do negócio jurídico firmado pelas partes, não estão infensas a consequências jurídicas de outra ordem, quais sejam, as que geram causa suficiente para a rescisão do avençado, que, na espécie, se operou por meio do distrato ou, nos termos do que preceitua a Lei 8.666/93, por rescisão amigável (art. 79. II). 9. Apretensão de nulidade do distrato não pode ser acolhida, haja vista que os recorrentes, apesar de alegarem que em momento algum tiveram a oportunidade de compor ou negociar qualquer espécie de transação, não comprovaram qualquer vício de consentimento ou outra invalidade na realização da rescisão operada por meio daquele distrato. 10. Isso não impede, contudo, conforme já indicado anteriormente, que possam ser apreciados os pedidos relativos a direitos não contemplados no distrato, quer porque, em parte, decorrem indiretamente dos próprios termos da rescisão amigável, quer porque fundados em causas que, embora ligadas à avença primitiva (compra e venda), dela não dependem para se estabelecer um liame entre a conduta e o dever de indenizar/reparar eventuais danos causados ao contratante adquirente, que não estão impedidos de reclamarem outros direitos a que não renunciaram expressamente por ocasião do distrato. 11. A alegação da ré de que desconhecia a demanda judicial e a própria declaração de inconstitucionalidade da Lei Complementar 733/2006 não pode servir como escusa para afastar as consequências dessa omissão, já que, como empresa pública cuja missão é, precipuamente, a venda do patrimônio imobiliário público, sendo integrante da Administração Indireta do Distrito Federal, é ínsito às suas atribuições institucionais, se pretende atuar com responsabilidade nas negociações dos lotes que leva à venda, cercar-se de todas as informações relevantes acerca dos bens que gerencia e aliena. 12. Não apenas isso, a ré também incorreu em explícito descumprimento da norma editalícia que previa a instalação da infraestrutura básica, no prazo de 4 anos a partir da Licença de Instalação (expedida pelo IBRAM), prazo este que expirou em fevereiro de 2013, dado que aquela licença fora obtida em fevereiro de 2009, como se constata da manifestação do Advogado Geral da TERRACAP no bojo do processo administrativo relativo ao negócio jurídico objeto desta demanda. 13. Não restam dúvidas de que houve inadimplemento da ré quanto às suas obrigações, o que municia os autores/adquirentes de legítimos fundamentos para requererem e obterem as reparações devidas, para além do que ficou consignado na rescisão amigável ou distrato, a fim de verem restaurada, plenamente, a situação que detinham antes da realização do negócio que buscaram desfazer tão logo tomaram conhecimento dos problemas que causavam as obstruções à regular fruição do bem que adquiriram. 14. Sem previsão contratual quanto ao índice de correção monetária a ser aplicado sobre o montante a ser devolvido aos adquirentes de imóveis, no caso de rescisão/resilição da avença, esta Corte tem aplicado o INPC (Índice Nacional de Preços ao Consumidor), seja nos contratos administrativos de que participe a TERRACAP, seja nos contratos imobiliários com o setor privado atinentes a relações de consumo, por refletir a restauração do poder de compra da moeda com maior acuidade. 15. Os juros moratórios são decorrência do descumprimento de uma obrigação contratual ou consequência do dever de reparar os efeitos de algum ilícito de qualquer ordem, funcionando como uma espécie de pena pelo inadimplemento contratual e estímulo ao cumprimento mais célere do que assumido na avença ou pela violação de um dever jurídico extracontratual (responsabilidade civil aquiliana), tornando mais gravosas, para o devedor, as conseqüências do inadimplemento contratual ou do ilícito extracontratual à medida que deflui o tempo sem a satisfação da obrigação. 16. No caso, é plenamente devida a sua aplicação, vez que se registrou, por parte da ré, efetivo descumprimento de obrigação contratual, como aliás fora reconhecido pela TERRACAP no bojo do próprio processo administrativo que cuidou da negociação em questão e no qual foi feito o pedido de desfazimento do negócio pelos autores/adquirentes, já em 28/02/2013. 17. Não se mostra pertinente, contudo, a incidência dos juros moratórios desde o desembolso de cada parcela de amortização do débito, como pretendem os autores, com fundamento no art. 398, do Código Civil e verbete sumular 54/STJ, ou com espeque nos artigos 395 e 396 do mesmo Diploma Legal 18. Sabemos que os juros moratórios, em caso de responsabilidade contratual, fluem a partir do vencimento da obrigação, para as obrigações líquidas (art. 397, caput, do Código Civil), a chamada mora ex re, e, tratando-se de obrigação ilíquida, a chamada mora ex persona, regra geral, correm a partir da citação (art. 405, do Código Civil), podendo fluir, todavia, a partir do implemento de interpelação judicial ou extrajudicial, nos termos do parágrafo único do art. 397, do Código Civil 19. Na espécie, a mora da ré deve ser reconhecida a partir da comunicação dos apelantes quanto à pretensão de desfazimento do negócio, ocorrida em 28/02/2013, como já referido, até porque a própria ré reconhecera, no bojo do processo administrativo relativo ao negócio jurídico firmado pelas partes que aqui contendem, que estava inadimplente com suas obrigações contratuais, afastando-se a regra geral de constituição em mora somente com a citação. 20. Os apelantes têm razão também quanto ao pedido de complementação dos danos materiais, pois o pagamento do valor de R$ 942,10 corresponde a despesas cartorárias (escritura no valor de R$ 863,70 e duas certidões, no valor de R$ 78,40), que foram devidamente comprovadas nos autos, conforme documentos de fls. 87 e 88. 21. Nem toda ordem de abalo psíquico ou perturbação emocional é apta a configurar dano moral, porque este não há de confundir-se com os percalços, aborrecimentos e alterações momentâneas ou tênues do normal estado psicológico, sob pena de banalizar-se e desvirtuar-se a concepção e finalidade de tão destacado instituto jurídico. 22. Não gera dano moral o só fato de os autores terem experimentado situações desagradáveis ou decepções decorrentes do inadimplemento contratual aqui discutido, como a venda do outro imóvel que possuíam, até mesmo porque parcela do dinheiro fora utilizada para quitação do saldo devedor do imóvel que adquiriram da ré, bem como o fato de terem alugado outro imóvel para acompanharem as obras no lote adquirido. 23. Nessa perspectiva, para além dos percalços advindos diretamente do próprio inadimplemento contratual, para a configuração do dano moral seria necessário que se desencadeassem, a partir desse fato, maiores conseqüências de ordem imaterial, é dizer, a ocorrência de um fato secundário desabonador da honra, da imagem ou lesivo a qualquer outro atributo da personalidade da pretensa vítima, o que não se verificou na espécie. 24. Aquestão referente à responsabilidade da ré, com o seu conseqüente dever de indenizar os danos materiais suportados pelos autores já foi devidamente analisada, do que resulta o reconhecimento, no ponto, de que está prejudicada a apelação da ré, restando a análise somente da pretensão de modificação do parâmetro legal para a incidência dos honorários advocatícios. 25. O art. 20, § 4º do CPC/1973 menciona Fazenda Pública, o que abarca apenas o próprio Ente Político, no caso, o Distrito Federal, suas autarquias e fundações públicas, não se inserindo, pois, no seu campo de incidência, as empresas públicas, pessoas jurídicas de direito privado, como a TERRACAP 26. Mesmo que fosse o caso de mudar o fundamento legal para a fixação dos honorários advocatícios, com aplicação do § 4º do art. 20, CPC/1973, ou seja, fixando-se os honorários por equidade, encontraríamos valor similar ao que constou da sentença recorrida, ainda que não se fizesse referência a um valor dentro da faixa percentual referida no § 3º do mesmo dispositivo legal. 27. Apelação dos autores conhecida e parcialmente provida. Apelação da ré prejudicada em parte e, na parte conhecida, não provida.
Data do Julgamento
:
05/04/2017
Data da Publicação
:
05/05/2017
Classe/Assunto
:
Segredo de Justiça
Órgão Julgador
:
1ª TURMA CÍVEL
Relator(a)
:
ROMULO DE ARAUJO MENDES
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