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Jurisprudência


TJDF APC - 1011532-20160610109894APC

Ementa
CIVIL. DIREITO DAS COISAS. AÇÃO REIVINDICATÓRIA. DISTINÇÃO ENTRE OS INSTITUTOS DA PRESCRIÇÃO E DA USUCAPIÃO. APLICAÇÃO DAS HIPÓTESES DO ART. 172 DO CÓDIGO CIVIL DE 1916. PROTESTO JUDICIAL POR TERCEIRO. INAPLICABILIDADE COMO CAUSA DE INTERRUPÇÃO DO PRAZO DE POSSE APTO A GERAR A AQUISIÇÃO ORIGINÁRIA DO DOMÍNIO. USUCAPIÃO CONFIGURADA. 1. A proteção da posse pode ocorrer em 3 (três) situações distintas, nos casos de esbulho, turbação ou ameaça. O esbulho ocorre quando o possuidor perde sua posse por ato clandestino, violento ou precário de outrem, privando-o do bem. A turbação é uma limitação parcial à posse, sem que disso decorra sua efetiva perda. Por último, a ameaça consubstancia a potencialidade de uma agressão injusta à situação jurídica ostentada pelo possuidor.2. Os chamados interditos possessórios são subdivididos em reintegração de posse, manutenção de posse e interdito proibitório.3. Além disso, podem ser elencadas outras ações de proteção à posse como a) a nunciação de obra nova, em caso de invasão de prédio alheio, ou em virtude de prejuízo à posse por obra ainda em andamento; b) os embargos de terceiro, na hipótese de esbulho ou turbação por ato judicial em processo no qual o possuidor não é parte; e, finalmente c) a imissão de posse, que é incidente processual cabível, dentre outras, nas ações petitórias, de despejo, desapropriação e execução para entrega de coisa certa.4. No arcabouço das prescrições legais que enunciam as ações de proteção à posse, não encontra abrigo o protesto judicial que, por isso, não pode ser visto como sucedâneo dos interditos possessórios.5. Ressalte-se ainda que o protesto judicial procedido por iniciativa do depositário judicial do imóvel, à época, contra os posseiros, não tem o condão de interromper o lapso temporal gerador da usucapião, pois o beneficiário dessa interrupção é, em tese, o titular do domínio e não o terceiro. Aliás, para a configuração dos respectivos efeitos, são inconfundíveis as figuras da usucapião e da prescrição.6. Com efeito, enquanto que o fato jurídico da prescrição é classificado como ato-fato caducificante, cuja eficácia consiste na criação de prerrogativa ao devedor para neutralizar a pretensão do credor (Pontes de Miranda. Tratado de Direito Privado. Tomo VI, § 662, item 6), a usucapião origina-se de atos-fatos reais (apossamento e exercício da posse), consubstanciando o modo originário de adquirir domínio. Ocorre a prescrição em razão da inércia do sujeito de direito titular do crédito, ou da pretensão, enquanto que a usucapião é o resultado do exercício da posse continuada por certo lapso de tempo (art. 1248, e seguintes, do Código Civil).7. É necessário ter redobrada cautela com a generalizada confusão a respeito dos mencionados institutos, à vista das regras contidas nos artigos 553 e 619, parágrafo único, ambos do Código Civil de 1916 (atuais artigos 1244, 1261 e 1262 do Código Civil de 2002) que, mesmo ao determinarem a aplicação do preceito instituído no art. 172 do Código Civil revogado (atual 1244 do Código Civil de 2002), que trata das hipóteses de prescrição em sentido estrito, não autorizam tomar-se um instituto pelo outro.8. Por isso, embora aplicável a interrupção do prazo para a aquisição do domínio, pela via originária, com a aplicação da norma estatuída no art. 172 do Código Civil de 1916, a admissibilidade do protesto judicial para a finalidade prevista em seus incisos I e II demandaria que o ajuizamento desse protesto fosse procedido diretamente pelo proprietário do imóvel contra o posseiro, com a correspondente citação deste, por analogia ao protesto do credor, titular do direito ao crédito, ao devedor. Por este fundamento, reafirma-se que o protesto formalizado por terceiro interessado, sem demonstrar ser o titular do domínio, não pode ser acatado como modo apto à promoção da interrupção do prazo para a aquisição do bem por usucapião.9. O reconhecimento judicial a respeito da licitude do instrumento particular de aquisição do direito de posse sobre o bem imóvel, com a subsequente regularização cadastral junto ao Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária - INCRA, confirma a posse e o animus domini dos réus.10. Para a configuração da usucapião, é necessário demonstrar o preenchimento de dois elementos básicos, quais sejam a posse e o tempo. Por isso, a aquisição originária da propriedade ou de outro direito real sobre coisa alheia exige a demonstração da posse ininterrupta, com animus domini, sem oposição e no decurso do prazo previsto no Código Civil. Os efeitos da usucapião são a apreensão da propriedade, a retroatividade e a indivisibilidade da coisa julgada.11. A posse é o requisito elementar para a usucapião, mas a posse ad usucapionen deve ser contínua, pacífica e exercida no prazo estipulado. Assim, não pode ter intervalos, vícios, defeitos e questionamentos.12. Outro elemento básico é o tempo, pois para que ocorra a aqisição do domínio, a posse deve durar pelo prazo estipulado em lei. Logo, para qualquer modalidade da usucapião, é necessário o continuatio possessionis, que é o exercício ininterrupto da posse pelo lapso temporal respectivo.13. O Código Civil de 1916 prescreveu as modalidades de usucapião, dividindo-a em ordinária e extraordinária, nos termos dos artigos 550 e 551. Como requisitos inerentes a essas duas modalidades de usucapião, o referido Código prescreveu ser indispensável o exercício da posse mansa, pacífica, inconteste, contínua e com animus domini.14. Apesar de ter sido o Código Civil de 1916 revogado pelo atual codex, essas duas modalidades ainda restam vigentes no ordenamento jurídico, aplicando-se ao caso, aliás, as regras de direito intertemporal dispostas no art. 2028 do Código de Civil de 2002.15. No caso em exame, a norma aplicável à espécie é o Código Civil de 1916, tendo em vista a alegação de posse desde o ano de 1969 e também por já ter transcorrido mais da metade do tempo estabelecido pela lei revogada.16. Como a ação reivindicatória foi ajuizada após o transcurso de 27 (vinte e sete) anos, constata-se ter havido o exercício de posse mansa e pacífica durante todo esse período. Portanto, pode-se dizer que foi preenchida a regra do art. 550 do Código Civil de 1916, restando devidamente cumprido o requisito alusivo ao prazo de 20 (vinte) anos ininterruptos, sem oposição, o que implica no reconhecimento do tempo necessário para a usucapião do imóvel objeto da demanda. Por isso, deve ser acolhida a exceção de usucapião, julgando-se improcedente o pedido reivindicatório.17. Acolhida a preliminar de ilegitimidade ativa da Incorporadora Paranoazinho S.A., com o não conhecimento de sua apelação.18. Apelações dos réus conhecidas e providas.

Data do Julgamento : 19/04/2017
Data da Publicação : 11/05/2017
Órgão Julgador : 5ª TURMA CÍVEL
Relator(a) : ALVARO CIARLINI
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