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Jurisprudência


TJDF APC - 1014027-20150111307049APC

Ementa
APELAÇÕES CÍVEIS. DIREITO DO CONSUMIDOR. DIREITO PROCESSUAL CIVIL. DIREITO REGULATÓRIO. PLANO DE SAÚDE. COBERTURA DE PROCEDIMENTO CIRÚRGICO. URGÊNCIA. APELAÇÃO DA RÉ. RECUSA INJUSTIFICADA DA OPERADORA. PERÍODO DE CARÊNCIA. INAPLICABILIDADE PARA ATENDIMENTOS DE URGÊNCIA E EMERGÊNCIA. ART. 12, V, C E ART. 35-C, AMBOS DA LEI Nº 9.656/98. RESOLUÇÃO NORMATIVA Nº 269, DA ANS. APLICAÇÃO DO CDC. SÚMULA 469 DO STJ. ABUSIVIDADE DA RECUSA AO ATENDIMENTO. DANO MORAL. ESTADO PSICOLÓGICO FRAGILIZADO DA PACIENTE. CONSEQUÊNCIAS QUE EXTRAPOLAM OS EFEITOS DE MERO DESCUMPRIMENTO CONTRATUAL. OCORRÊNCIA.APELAÇÃO DA AUTORA. EXECUÇÃO PROVISÓRIA DE ASTREINTES. FALTA DE INTERESSE-ADEQUAÇÃO. CONVERSÃO DA OBRIGAÇÃO DE FAZER EM PERDAS E DANOS. FALTA DE INTERESSE-UTILIDADE. CONHECIMENTO PARCIAL. QUANTUMREPARATÓRIO A TÍTULO DE DANOS MORAIS. ADEQUAÇÃO A PRECEDENTES. CONDUTA ABUSIVA DE HÁ MUITO RECHAÇADA PELA JURISPRUDÊNCIA. RISCO DE MORTE. MAJORAÇÃO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. BASE DE CÁLCULO. VALOR TOTAL DA CONDENAÇÃO (§ 2º DO ART. 85, CPC/2015). RECURSO DA RÉ CONHECIDO E NÃO PROVIDO. RECURSO DA AUTORA PARCIALMENTE CONHECIDO E PROVIDO. 1. O fato jurídico que deu fundamento ao ajuizamento da presente demanda consiste na recusa da ré em autorizar o procedimento cirúrgico solicitado pela autora, por indicação do seu médico assistente, em razão de ter sido diagnosticada com quadro de cefaléia e parestesias em dimidio direito secundários a hematoma subdural subagudo frontoparietal à esquerda, com compressão do parênquima cerebral subjacente e desvio de 4mm da linha média, mencionando-se o caráter emergencial da medida, sob risco de piora neurológica e até mesmo à vida. 2. Não se questiona a legalidade da cláusula de carência, tendo em vista expressa previsão da Lei nº 9.656/98 (art. 12, V), que, todavia, estipula prazo máximo de 24 horas para o atendimento nos casos de urgência e emergência, sendo obrigatória a cobertura nessas mesmas condições, nos termos do art. 35-C, da mesma lei, além de haver previsão regulamentar que obriga ao atendimento imediato (art. 3º, inciso XIV, da Resolução Normativa nº 269, da ANS). 3. A pretendida exclusão da cobertura nos casos de urgência e emergência, com fundamento em vigência do período de carência, também encontraria óbice contido nas disposições normativas do art. 51, inciso IV, do Diploma Consumerista, aplicável ao caso (Súmula 469/STJ), bem como o disposto no § 1º, inciso II, do mesmo artigo, pois configuraria regramento contratual abusivo apto a restringir obrigação inerente à natureza do contrato, de modo a ameaçar a consecução do seu próprio objeto, isto é, frustrando sua finalidade. 4. Quanto ao dano moral, o fundamento fático narrado pela autora/apelada é hábil a desencadear a consequência jurídica pretendida, uma vez que o desgaste físico e psíquico sofrido por quem estava com a saúde bastante debilitada e necessitando de tratamento médico urgente é substancialmente agravado pela recusa ilegítima do plano de saúde em prestar o serviço para o qual fora contratado, o que extrapola os meros aborrecimentos decorrentes de um simples inadimplemento contratual. 5. O dever de promover a reparação moral decorre da negativa da ré a autorizar o tratamento de saúde necessário à beneficiária do plano de saúde, pois houve relato médico de que se tratava de intervenção cirúrgica em caráter de urgência, sendo evidente que tal recusa, injustificada do ponto de vista do ordenamento jurídico pátrio e segundo a interpretação jurisprudencial já pacificada, violou os interesses extrapatrimoniais da autora/apelada, mais especificamente, atingiu negativamente atributo de sua personalidade atinente à integridade psicológica, o que rende ensejo à compensação pelos danos morais vindicados na inicial. 6. Não há interesse-adequação na postulação formulada no recurso da autora quanto à execução provisória da tutela deferida, pois não compete a este órgão recursal determinar a instauração de incidente de execução da decisão proferida na instância primeira, a qual sequer se manifestou sobre essa matéria. 7. Ademais, o Colendo Superior Tribunal de Justiça, em sede de Recurso Especial repetitivo, firmou a tese de que A multa diária prevista no § 4º do art. 461 do CPC, devida desde o dia em que configurado o descumprimento, quando fixada em antecipação de tutela, somente poderá ser objeto de execução provisória após a sua confirmação pela sentença de mérito e desde que o recurso eventualmente interposto não seja recebido com efeito suspensivo. (STJ. Corte Especial. REsp 1.200.856-RS, Rel. Min. Sidnei Beneti, julgado em 1º/7/2014). 8. Há de se anotar, ainda, que, embora, embora possível o cumprimento provisório da decisão que fixa multa para o cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer (§ 3º do art. 537, CPC/2015), não está dispensada a parte interessada de instaurar o incidente próprio de execução provisória da multa, no juízo adequado, não sendo suficiente o simples pedido de reconhecimento de valor decorrente de alegado descumprimento da decisão que estabeleceu a penalidade. 9. A segunda questão da apelação da autora que não pode ser objeto de conhecimento neste julgamento, também por falta de interesse recursal, agora na modalidade utilidade, diz respeito à alegação de que não houve pronunciamento da sentença sobre o pedido de conversão da obrigação de fazer em perdas e danos. 10. Na medida em que há determinação para que a ré assuma todas as despesas em favor da cobertura dos procedimentos realizados está assegurado o ressarcimento à autora dos custos despendidos com o tratamento, inclusive em relação aos valores de todos os cheques que a própria autora (ou sua genitora) emitiu para o pagamento exigido pelo Hospital Anchieta, tanto assim que, ao fixar a base de cálculo para a incidência dos honorários advocatícios (questão que se verá adiante) o magistrado sentenciante o fez sobre o apreçamento dos procedimentos realizados pelo Hospital Anchieta, a serem oportunamente liquidados. 11. Aindenização por danos morais tem caráter dúplice, vez que deve ensejar a reparação do abalo extrapatrimonial suportado pela parte, sem, contudo, afastar-se do caráter pedagógico-punitivo, com o propósito de inibir a reiteração de condutas similares. Há de ser imposta, sobretudo, com fundamento nos princípios constitucionais da razoabilidade e da proporcionalidade. 12. Ojulgador deve avaliar a dor do ofendido, proporcionando-lhe um conforto material capaz de atenuar o seu sofrimento. Noutro giro, deve mensurar as condições econômicas das partes, a fim de evitar a obtenção de vantagem indevida. Ao mesmo tempo, não pode ser um valor irrisório, pois visa desestimular comportamento descompromissado com a inviolabilidade à intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, ou, de modo geral, aos seus direitos da personalidade, preceitos garantidos constitucionalmente. 13. Nessa perspectiva, analisando todas essas questões, deve-se majorar o valor da reparação pelos danos morais para a quantia de R$ 10.000,00 (dez mil reais), o que melhor se alinha com as condenações que esta Corte de Justiça tem sufragado em casos assemelhados, devendo-se sopesar, sobretudo, que é antiga, abundante e pacífica a jurisprudência tanto desta Corte como da Corte Superior de Justiça, no sentido de que a recusa ao atendimento urgente, sob a alegação de vigência de prazo de carência do plano de saúde, é conduta abusiva, consoante vimos acima, além do fato de que se tratava de paciente com risco de morte, conforme relatório médico. 14. Havendo condenação, com determinação de pagamento de valores, seja a que título for, o montante constituirá a base de cálculo para a incidência dos honorários advocatícios, nos termos do § 2º do art. 85, do Código de Processo Civil, e, no caso, além da condenação ao custeio dos procedimentos médicos (apressamento dos procedimentos realizados pelo Hospital Anchieta), houve a condenação à reparação por danos morais, sobre cujo valor também há de incidir o percentual de honorários advocatícios arbitrados. 15. Recurso da ré conhecido e não provido. Recurso da autora conhecido parcialmente e, nessa parte, provido. Honorários advocatícios majorados para 15% (§ 11 do art. 85, CPC/2015). Unânime.

Data do Julgamento : 19/04/2017
Data da Publicação : 18/05/2017
Órgão Julgador : 4ª TURMA CÍVEL
Relator(a) : ROMULO DE ARAUJO MENDES
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