TJDF APC - 1014525-20150111375009APC
PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. APELAÇÃO CÍVEL. CONVERSÃO DO JULGAMENTO EM DILIGÊNCIA. DESCABIMENTO. OITIVA DE TESTEMUNHAS. DESNECESSIDADE. OCUPAÇÃO IRREGULAR DO SOLO. ÁREA PÚBLICA. CONSTRUÇÃO PRECÁRIA. DESRESPEITO ÀS NORMAS DE EDIFICAÇÃO. CÓDIGO DE EDIFICAÇÕES DO DISTRITO FEDERAL. AGEFIS. INTIMAÇÃO DEMOLITÓRIA. REGULARIDADE DO ATO ADMINISTRATIVO. REGULARIZAÇÃO DA ÁREA E DA CONSTRUÇÃO. DIFERENCIAÇÃO. PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS. SOPESAMENTO. SENTENÇA MANTIDA.1. Discute-se, na espécie, ato da Agência de Fiscalização do Distrito Federal (Agefis) que determinara a imediata demolição de construção erguida pelo autor em imóvel por ele ocupado, imóvel este situado na Região Administrativa do Riacho Fundo, mais precisamente na Colônia Agrícola Sucupira, Chácara 30-A. Trata-se de área irregular, cujas edificações foram todas feitas em descumprimento às normas de ocupação e edificação do solo urbano, muito embora passível de regularização nos termos do Plano Diretor do Distrito Federal;2. A sentença julgou improcedente a pretensão inicial, que visava impedir o ato demolitório, sob o fundamento de a medida estar respaldada pelo Código de Edificações do Distrito Federal e de ser do autor ônus de demonstrar que sua construção é passível de adequação à legislação, o que, todavia, não o fez;3. Rejeita-se o pedido do apelante para que o julgamento seja convertido em diligência (CPC, art. 938, §3°, do CPC), por ser desnecessária a realização de prova testemunhal, pelo fato de as questões controvertidas dizerem respeito à regularidade da edificação realizada pelo autor, bem assim às consequências jurídicas incidentes, acaso demonstrada a irregularidade. A prova testemunhal que objetiva comprovar não se tratar a edificação de obra nova é irrelevante para o julgamento do feito, haja vista que as consequências previstas na legislação de regência não fazem distinção entre obra nova ou velha, além de o próprio demandante confirmar, desde sua petição inicial, que foi surpreendido pelos agentes da Agefis quando realizava uma ampliação da área construída;4. O imóvel objeto dos autos foi edificado pelo demandante sem qualquer licença do poder público, inclusive pela própria ausência do alvará de construção, e assim o foi porque, confessadamente, não possui o autor o título de propriedade da área que ocupa. Tal fato já é bastante, por si só para que se reconheça a higidez e regularidade do ato administrativo, pois inequívoco o despeito às normas de ordem urbanística em especial ao Código de Edificação do Distrito Federal (Lei n° 2.105/98), que em seu art. 51 é expresso em afirmar estar as obras de edificação, em área urbana ou rural, condicionadas à expedição do licenciamento obtido junto à respectiva Administração Regional;5. Inaplicáveis ao caso as medidas preliminares previstas art. 163 do Código de Edificações do DF, quanto à proporcionalidade das sanções, por entender o demandante ser devida, antes da demolição, a oportunidade de regularizar o empreendimento, pelo fato de se tratar de área pública. O próprio diploma legal prevê em seu art. 178 que, se a construção irregular ocorrer em área pública, a demolição deve ser imediata;6. Ainda que se cogitasse da concessão de oportunidade para regularização da obra, o próprio apelante esclarece não dispor dos elementos para viabilizá-la, justamente por ser imprescindível à obtenção do licenciamento o título de propriedade da área, além de ter sido o bem edificado sem a apresentação de qualquer projeto de construção, fato que duplamente impede seja regularizado;7. Faz-se uma diferenciação necessária, para o fim de afastar a confusão feita pelo apelante de que não poderia a Agefis demolir a construção se a área é passível de regularização. A possível regularização da área pública irregularmente ocupada, com a eventual concessão de títulos de propriedade aos ocupantes, não acarreta, por si só, a certeza de que as construções nela edificadas serão preservadas, isto por ser necessário que estas tenham respeitado às normas que lhe são próprias, por exemplo os limites de edificação e a existência de projeto feito por profissional habilitado;8. Constatando a Agefis que o imóvel além de edificado em área pública não obedece às normas de edificação e ocupação do solo urbano, afigura-se hígido seu ato demolitório. Pensar diferente corresponderia a substituir o administrador pelo juiz, em incontestável, e repudiável, inversão das atribuições previstas já na Carta Maior. Além disso, ainda que se concebesse eventual imersão do juiz nos fatores de relevância que legitimaram a expedição do ato administrativo, convém esclarecer que, na espécie, o autor nem mesmo forneceu elementos, mínimos que fossem, a demonstrar que o imóvel, embora erguido em área pública, o foi através de um projeto adequado, feito por profissional habilitado, e com possibilidades concretas de, acaso efetivada a alegada regularização, seria a construção mantida;9. O socorro a princípios constitucionais como forma de sopesamento dos direitos em discussão nos autos não autoriza o acolhimento da pretensão deduzida na inicial, inclusive por ser da própria natureza dos princípios auto grau de abstração, a demandar, portanto, que seu conteúdo seja preenchido conforme a hipótese concreta e, na espécie, não é devido reconhecer a preponderância dos princípios constitucionais intuídos pelo autor como suporte idôneo a deslegitimar uma conduta também pautada em princípios de mesma envergadura. 9.1. O direito constitucional à moradia não se sobrepõe aos princípios da legalidade e eficiência aplicáveis à atuação da administração pública, para o fim de, suprimindo o poder de polícia do administrador público, impedi-lo de demolir construções feitas de maneira irregular, quando a própria legislação aplicável determina a demolição. 9.1. Igualmente, inexiste ofensa à isonomia pelo fato de apenas o imóvel ocupado pelo autor ter sido fiscalizado, quando inúmeras outras edificações, na mesma condição, existem na localidade, por não ser possível reavaliar o critério de fiscalização adotado, nem se impor, a priori e à revelia de planejamento adequado, que o administrador notifique os outros imóveis que, segundo o autor, encontram-se nas mesmas condições. Ao que tudo indica, foi o próprio autor que despertou o interesse da fiscalização quando optou por ampliar sua já precária construção. 9.3. A função social, de igual modo, não pressupõe nem autoriza a ocupação desmedida e desordenada no solo, mesmo porque cumprir a função social da propriedade significa, ao fim e ao cabo, dar-lhe o destino que atenda não só aos interesses imediatos do proprietário, mas também aos da coletividade, os quais, no caso, são ditados pelo respeito às normas legais de ocupação e edificação do solo;10. Recurso conhecido e não provido.
Ementa
PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. APELAÇÃO CÍVEL. CONVERSÃO DO JULGAMENTO EM DILIGÊNCIA. DESCABIMENTO. OITIVA DE TESTEMUNHAS. DESNECESSIDADE. OCUPAÇÃO IRREGULAR DO SOLO. ÁREA PÚBLICA. CONSTRUÇÃO PRECÁRIA. DESRESPEITO ÀS NORMAS DE EDIFICAÇÃO. CÓDIGO DE EDIFICAÇÕES DO DISTRITO FEDERAL. AGEFIS. INTIMAÇÃO DEMOLITÓRIA. REGULARIDADE DO ATO ADMINISTRATIVO. REGULARIZAÇÃO DA ÁREA E DA CONSTRUÇÃO. DIFERENCIAÇÃO. PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS. SOPESAMENTO. SENTENÇA MANTIDA.1. Discute-se, na espécie, ato da Agência de Fiscalização do Distrito Federal (Agefis) que determinara a imediata demolição de construção erguida pelo autor em imóvel por ele ocupado, imóvel este situado na Região Administrativa do Riacho Fundo, mais precisamente na Colônia Agrícola Sucupira, Chácara 30-A. Trata-se de área irregular, cujas edificações foram todas feitas em descumprimento às normas de ocupação e edificação do solo urbano, muito embora passível de regularização nos termos do Plano Diretor do Distrito Federal;2. A sentença julgou improcedente a pretensão inicial, que visava impedir o ato demolitório, sob o fundamento de a medida estar respaldada pelo Código de Edificações do Distrito Federal e de ser do autor ônus de demonstrar que sua construção é passível de adequação à legislação, o que, todavia, não o fez;3. Rejeita-se o pedido do apelante para que o julgamento seja convertido em diligência (CPC, art. 938, §3°, do CPC), por ser desnecessária a realização de prova testemunhal, pelo fato de as questões controvertidas dizerem respeito à regularidade da edificação realizada pelo autor, bem assim às consequências jurídicas incidentes, acaso demonstrada a irregularidade. A prova testemunhal que objetiva comprovar não se tratar a edificação de obra nova é irrelevante para o julgamento do feito, haja vista que as consequências previstas na legislação de regência não fazem distinção entre obra nova ou velha, além de o próprio demandante confirmar, desde sua petição inicial, que foi surpreendido pelos agentes da Agefis quando realizava uma ampliação da área construída;4. O imóvel objeto dos autos foi edificado pelo demandante sem qualquer licença do poder público, inclusive pela própria ausência do alvará de construção, e assim o foi porque, confessadamente, não possui o autor o título de propriedade da área que ocupa. Tal fato já é bastante, por si só para que se reconheça a higidez e regularidade do ato administrativo, pois inequívoco o despeito às normas de ordem urbanística em especial ao Código de Edificação do Distrito Federal (Lei n° 2.105/98), que em seu art. 51 é expresso em afirmar estar as obras de edificação, em área urbana ou rural, condicionadas à expedição do licenciamento obtido junto à respectiva Administração Regional;5. Inaplicáveis ao caso as medidas preliminares previstas art. 163 do Código de Edificações do DF, quanto à proporcionalidade das sanções, por entender o demandante ser devida, antes da demolição, a oportunidade de regularizar o empreendimento, pelo fato de se tratar de área pública. O próprio diploma legal prevê em seu art. 178 que, se a construção irregular ocorrer em área pública, a demolição deve ser imediata;6. Ainda que se cogitasse da concessão de oportunidade para regularização da obra, o próprio apelante esclarece não dispor dos elementos para viabilizá-la, justamente por ser imprescindível à obtenção do licenciamento o título de propriedade da área, além de ter sido o bem edificado sem a apresentação de qualquer projeto de construção, fato que duplamente impede seja regularizado;7. Faz-se uma diferenciação necessária, para o fim de afastar a confusão feita pelo apelante de que não poderia a Agefis demolir a construção se a área é passível de regularização. A possível regularização da área pública irregularmente ocupada, com a eventual concessão de títulos de propriedade aos ocupantes, não acarreta, por si só, a certeza de que as construções nela edificadas serão preservadas, isto por ser necessário que estas tenham respeitado às normas que lhe são próprias, por exemplo os limites de edificação e a existência de projeto feito por profissional habilitado;8. Constatando a Agefis que o imóvel além de edificado em área pública não obedece às normas de edificação e ocupação do solo urbano, afigura-se hígido seu ato demolitório. Pensar diferente corresponderia a substituir o administrador pelo juiz, em incontestável, e repudiável, inversão das atribuições previstas já na Carta Maior. Além disso, ainda que se concebesse eventual imersão do juiz nos fatores de relevância que legitimaram a expedição do ato administrativo, convém esclarecer que, na espécie, o autor nem mesmo forneceu elementos, mínimos que fossem, a demonstrar que o imóvel, embora erguido em área pública, o foi através de um projeto adequado, feito por profissional habilitado, e com possibilidades concretas de, acaso efetivada a alegada regularização, seria a construção mantida;9. O socorro a princípios constitucionais como forma de sopesamento dos direitos em discussão nos autos não autoriza o acolhimento da pretensão deduzida na inicial, inclusive por ser da própria natureza dos princípios auto grau de abstração, a demandar, portanto, que seu conteúdo seja preenchido conforme a hipótese concreta e, na espécie, não é devido reconhecer a preponderância dos princípios constitucionais intuídos pelo autor como suporte idôneo a deslegitimar uma conduta também pautada em princípios de mesma envergadura. 9.1. O direito constitucional à moradia não se sobrepõe aos princípios da legalidade e eficiência aplicáveis à atuação da administração pública, para o fim de, suprimindo o poder de polícia do administrador público, impedi-lo de demolir construções feitas de maneira irregular, quando a própria legislação aplicável determina a demolição. 9.1. Igualmente, inexiste ofensa à isonomia pelo fato de apenas o imóvel ocupado pelo autor ter sido fiscalizado, quando inúmeras outras edificações, na mesma condição, existem na localidade, por não ser possível reavaliar o critério de fiscalização adotado, nem se impor, a priori e à revelia de planejamento adequado, que o administrador notifique os outros imóveis que, segundo o autor, encontram-se nas mesmas condições. Ao que tudo indica, foi o próprio autor que despertou o interesse da fiscalização quando optou por ampliar sua já precária construção. 9.3. A função social, de igual modo, não pressupõe nem autoriza a ocupação desmedida e desordenada no solo, mesmo porque cumprir a função social da propriedade significa, ao fim e ao cabo, dar-lhe o destino que atenda não só aos interesses imediatos do proprietário, mas também aos da coletividade, os quais, no caso, são ditados pelo respeito às normas legais de ocupação e edificação do solo;10. Recurso conhecido e não provido.
Data do Julgamento
:
03/05/2017
Data da Publicação
:
08/05/2017
Órgão Julgador
:
7ª TURMA CÍVEL
Relator(a)
:
GISLENE PINHEIRO
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