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Jurisprudência


TJDF APC - 1023296-20150110460488APC

Ementa
EMPRESARIAL. CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE RESCISÃO UNILATERAL DE CONTRATO C/C REPARAÇÃO DE DANOS. PRELIMINARES: INTERPOSIÇÃO DE DUAS APELAÇÕES PELA MESMA PARTE. IMPOSSIBILIDADE. PRINCÍPIO DA UNIRRECORRIBILIDADE. NÃO CONHECIMENTO DO SEGUNDO RECURSO. FALSIDADE DOCUMENTAL. PRECLUSÃO. PEDIDO DE INDEFERIMENTO DE PERÍCIA CONTÁBIL. QUESTÃO A SER DIRIMIDA POR OCASIÃO DA LIQUIDAÇÃO DO JULGADO. MÉRITO: AJUSTE VERBAL DE PARCERIA COMERCIAL DE PORTFÓLIO DE LENTES DE CONTATO E SOLUÇÕES DE ASSEPSIA. NATUREZA JURÍDICA DE CONCESSÃO COMERCIAL. CONTRATO ATÍPICO. REGÊNCIA PELAS REGRAS ESTABELECIDAS ENTRE AS PARTES. INCIDÊNCIA DAS NORMAS GERAIS AFETAS AO CONTRATO. EXCLUSIVIDADE NÃO DEMONSTRADA. RUPTURA ABRUPTA DO NEGÓCIO JURÍDICO. AUSÊNCIA DE UM TERMO MÍNIMO PARA AVISO PRÉVIO. ABUSO NO DIREITO DE RESILIÇÃO. MÁCULA À BOA-FÉ OBJETIVA. APLICAÇÃO ANALÓGICA DO ART. 720 DO CC. AVISO PRÉVIO DE 90 DIAS. INDENIZAÇÃO DEVIDA POR ESSE PERÍODO (FATURAMENTO LÍQUIDO). PAGAMENTO DE BONIFICAÇÃO E RESTITUIÇÃO DE LENTES. IMPOSSIBILIDADE. VERBA HONORÁRIA. FIXAÇÃO COM BASE NO VALOR DA CONDENAÇÃO. RECURSO DESPROVIDO. SENTENÇA MANTIDA. HONORÁRIOS RECURSAIS ARBITRADOS. 1. Segundo o Enunciado Administrativo n. 3 do STJ, aos recursos interpostos com fundamento no CPC/2015 (relativos a decisões publicadas a partir de 18 de março de 2016), como é o caso dos autos, devem ser exigidos os requisitos de admissibilidade recursal na forma do novo CPC. Nessa situação, por inteligência do Enunciado Administrativo n. 7 do STJ, é possível o arbitramento de honorários sucumbenciais recursais, com base no art. 85, § 11, do CPC/15. 2. Na análise da admissibilidade recursal, impõe-se a observância do princípio da singularidade, da unicidade ou da unirrecorribilidade, segundo o qual cada decisão judicial deve ser atacada por apenas um único recurso, aquele previsto na legislação processual como adequado à impugnação. 2.1. No particular, a autora interpôs 2 recursos de apelação contra a mesma decisão, o que impede o conhecimento do 2º recurso (fls. 705-720), haja vista o princípio da unirrecorribilidade das decisões, expressão do princípio da preclusão consumativa. 3. Tem-se por preclusa a alegação de falsidade de documento colacionado com a contestação, a qual deveria ter sido realizada no prazo de 10 dias contados da intimação da sua juntada, conforme art. 390 do CPC/73 (atual art. 430 do CPC/15), vigente à época, e não em sede de apelação. 4. Não tendo as partes manifestado interesse em produzir provas em Audiência, não prospera o pedido de indeferimento de perícia contábil deduzido pela autora. Eventual divergência no valor do faturamento líquido da sociedade autora deverá ser dirimida por ocasião da liquidação do julgado, se o caso. 5. A relação obrigacional é pautada pela vontade e integrada pela boa-fé, resguardando o fiel processamento da relação jurídica entabulada mediante a imposição de deveres de conduta a ambos os contratantes (CC, art. 422). A quebra da boa-fé, pela ruptura das obrigações estabelecidas, vulnera a confiança daquele que foi induzido a legítimas expectativas de que o contrato seria realizado de determinada maneira (FARIAS, Cristiano Chaves de.; ROSENVALD, Nelson., in Curso de direito civil: direito dos contratos, 3. ed., 2013, pp. 174-181). 6. No particular, é incontroversa a existência de um contrato verbal entre os litigantes (CPC/15, art. 374, III; CPC/73, art. 334, III), envolvendo portfólio completo de lentes de contato, bem como soluções de assepsia, cujo conjunto probatório evidencia a normalidade do relacionamento empresarial entre 1993 a maio de 2012, ocasião em que a autora recorrente noticia uma ruptura, com o não envio dos produtos, e concorrência desleal mediante a inserção de outro fornecedor no mercado. 6.1. O principal dissenso diz respeito à existência ou não de exclusividade da autora recorrente quanto à parceria comercial firmada com a ré apelada e eventual direito a indenização, tendo em vista a alegação de irregularidade no desfazimento da avença. 6.2. Compulsando os autos, é de se observar que a atividade da autora apelante consistia em solicitar os produtos da ré, que os faturava em seu nome, dirigindo-se aos adquirentes para revendê-los. Ou seja, sua remuneração advinha justamente da diferença entre os preços de compra e da venda com a ré e da alienação aos clientes hospitais, médicos e clínicas. 6.3. A relação jurídica verbal em comento tem aparência de contrato de concessão comercial e, portanto, atípico, motivo pelo qual sua regência dependerá das regras estabelecidas entre as partes, de comum acordo, além das normas gerais afetas aos contratos, sem falar dos princípios inerentes ao direito empresarial. 6.4. Da análise documental, verifica-se que não há prova de que a autora recorrente teria exclusividade no fornecimento dos produtos da ré (CPC/15, art. 373, I; CPC/73, art. 333, I). Independentemente dessa característica, a irregularidade que se nota diz respeito à ruptura abrupta do negócio jurídico de longa duração, sem que fosse previsto um termo mínimo para aviso prévio em caso de resilição. Isso porque, à luz da probidade e da boa-fé objetiva (CC, art. 422 e 425), sem se olvidar do princípio da liberdade contratual, embora não tenha sido celebrado um prazo mínimo para a comunicação da intenção de desfazimento do negócio jurídico, o tempo e a natureza da relação indicavam a necessidade de que tal comunicação fosse realizada em tempo hábil, a fim de que a contratada reorganizasse sua atividade. 6.5. Segundo informado na contestação e na inicial, a relação jurídica das partes perdurou até abril de 2012, ao passo que as comunicações de desfazimento do contrato datam de maio de 2012. Dessa forma, considerando que o desfazimento do contrato se deu de abril para maio de 2012, tem-se por configurado o abuso do direito de resilição (CC, art. 187), motivo pelo qual, em razão da ausência de previsão legal específica, tampouco de convenção contratual, é de se aplicar, por analogia (LINDB, art. 4º), o regramento dos arts. 715 a 720 do CC, que cuidam dos contratos de agência e distribuição, bem assim a dicção do art. 473 do CC, que prevê a possibilidade de reparação material da parte prejudicada com a denúncia repentina do contrato. 6.6. Com fulcro no art. 720 do CC, aplicado por analogia, que aborda a necessidade de aviso prévio da decisão terminativa do negócio jurídico, faz jus a autora à reparação material advinda do abuso no direito de resilição contratual, pelo prazo de 90 dias. Assim, as perdas e danos no caso concreto englobam o que a autora recorrente deixou de faturar durante os meses de maio, junho e julho de 2012 e que teria recebido na hipótese de concessão desse prazo para reorganizar suas atividades antes do fim do negócio jurídico. 6.7. Conquanto a autora tenha pleiteado o pagamento das bonificações de cupons de venda, tal ganho patrimonial era recorrente, de acordo com as alegações das partes, já constando do seu faturamento ordinário. Não há falar, ainda, em devolução dos produtos por ela indicados na inicial, porquanto não há prova de que estes estariam em seu poder. 7. Se a decisão de 1º Grau foi expressa ao disciplinar que o percentual da verba honorária de sucumbência incide sobre o valor da condenação, não prospera o pedido de esclarecimentos da autora quanto a essa questão. 8. O tribunal, ao julgar o recurso, majorará os honorários fixados anteriormente levando em conta o trabalho adicional realizado em grau recursal, observando, conforme o caso, o disposto nos §§ 2º a 6º, sendo-lhe vedado, no cômputo geral da fixação de honorários devidos ao advogado do vencedor, ultrapassar os respectivos limites estabelecidos nos §§ 2º (20%) e 3º para a fase de conhecimento (§ 11, do art. 85, do CPC/2015). Nesse prisma, os honorários foram majorados para 12% do valor da condenação, diferença esta a ser adimplida pela parte autora, haja vista que no mérito recursal não obteve o êxito almejado. 9. Apelação de fls. 705-720 não conhecida, em razão do princípio da unirrecorribilidade e da preclusão consumativa. Recurso de apelação de fls. 686-699 conhecido e desprovido. Sentença mantida. Honorários recursais fixados.

Data do Julgamento : 07/06/2017
Data da Publicação : 03/07/2017
Órgão Julgador : 1ª TURMA CÍVEL
Relator(a) : ALFEU MACHADO
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