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Jurisprudência


TJDF APC - 1026018-20160310162537APC

Ementa
CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER E INDENIZAÇÃO DE DANOS MORAIS. CONDOMÍNIO EDILÍCIO. SUSPENSÃO NO FORNECIMENTO DE ÁGUA. CONDÔMINO INADIMPLENTE. ASSEMBLÉIA CONDOMINIAL. AUTONOMIA PRIVADA DA COLETIVIDADE. LIMITAÇÃO: ORDENAMENTO JURÍDICO, DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS. DELIBERAÇÃO ASSEMBLEAR. CONDUTA ARBITRÁRIA E IRREGULAR. COERÇÃO COMO FORMA DE COBRANÇA. ILEGALIDADE PARENTE. EXERCÍIO ARBITRÁRIO DO DIREITO. ATO ILÍCITO PATENTEADO (CC, ARTS. 186 E 188, I). DIREITO FUNDAMENTAL À DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA. DIREITO DE PROPRIEDADE. PREVALÊNCIA. DANO MORAL. SUSPENSÃO DE INSUMO ESSENCIAL. DESCONFORTOS, TRANSTORNOS E HUMILHAÇÃO. CARACTERIZAÇÃO. COMPENSAÇÃO DEVIDA. INICIAL. APTIDÃO TÉCNICA. PEDIDO ADEQUADO E DERIVADO DA FUNDAMENTAÇÃO ALINHAVADA. INVALIDAÇÃO DA DELIBERAÇÃO CONDOMINIAL. DESNECESSIDADE. APTIDÃO. AFIRMAÇÃO. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO. HONORÁRIOS RECURSAIS. MAJORAÇÃO DA VERBA (CPC, ART. 85, §§ 2º e 11). 1. Emoldurando a inicial os fatos e fundamentos içados como lastro passível de aparelhar o direito material invocado e contemplando pedido que deriva linearmente do exposto, ensejando a ilação de que do nela fora alinhado, em cotejo com os documentos apresentados, deriva logicamente a conclusão que estampa, estando, ainda, aparelhada com os documentos indispensáveis ao guarnecimento do aduzido com supedâneo material, não padece de nenhum vício ou lacuna aptos a ensejarem sua qualificação como inepta. 2. Conquanto emergindo o ato reputado ilícito de deliberação assemblear na qual se fiara o condomínio, a pretensão formulada por condômina objetivando a elisão da ilicitude e composição dos efeitos que irradiara não tem como premissa a formulação de pedido volvido à invalidação da decisão tomada em assembléia, pois assiste-a o direito de optar pela formulação de pedido que satisfaz suas expectativas e preserva o direito que vindica sem o alcance genérico aventado pela entidade condominial. 3. As disposições convencionais, destinando-se a pautar internamente o fomento de serviços e utilização das áreas comuns e privativas, preservando a intangibilidade do núcleo condominial, consubstanciam regulação interna particular de natureza estatutária e efeitos irradiantes, alcançando e vinculando todos os condôminos, podendo, inclusive, ensejar restrição a serviços comuns, ao uso das unidades autônomas e ao comportamento dos condôminos, reputando-se legítimas as deliberações assembleares tomadas por decisão da maioria, desde que não exorbitem o que o legislador autoriza (CC, art. 1.333). 4. Conquanto as deliberações assembleares legítimas, tomadas por decisão da maioria dos condôminos que efetivamente participam dos negócios sociais, tenham o condão de obrigar toda a microcomunidade a curvar-se ao decidido, as deliberações assembleares, tangenciando diversos valores que afetam a seara jurídica alheia, estão sujeitas aos limites estabelecidos pelo ordenamento jurídico, notadamente os fundamentos nucleares principiológicos esculpidos na Constituição Federal, devendo, assim, ser coibidos eventuais abusos na normatização privada que lesem princípios basilares do ordenamento jurídico ou bens jurídicos essenciais aos indivíduos. 5. O inadimplemento das taxas condominiais não autoriza o condomínio a restringir o acesso do condômino ao uso e fruição de serviços essenciais que perpassam pela interseção do condomínio, mormente o fornecimento de água à unidade autônoma da titularidade do condômino por não ser alimentada por rede direta e independente, ainda que assim tenha deliberado a assembléia dos condôminos, pois não tem o poder de sobrepor-se ao ordenamento positivado. 6. A suspensão do fornecimento do serviço de água tratada a unidade condominial em razão da inadimplência da titular, ainda que pautada por autorização assemblear, encerra ato ilícito qualificado pelo exercício abusivo do direito que assiste ao condomínio de cobrar da inadimplente, pois, qualificada a inadimplência, deve valer-se dos instrumentos legalmente firmados para perseguição do que o assiste, e não exercitar arbitrariamente o direito que ostenta valendo-se de sua posição de domínio frente à condômina, vindo a suprimir a unidade que lhe pertence de bem essencial, ao invés de cobrar o devido na moldura do estado de direito (CC, arts. 186 e 188, I). 7. A suspensão do fornecimento de água à unidade da titularidade da condômina que incidira em inadimplência, a par de qualificar-se como violação ao direito de propriedade e à dignidade da pessoa humana, qualifica exercício arbitrário das próprias razões por parte condomínio, que, valendo-se da sua posição, maneja instrumentos de coerção e humilhação como forma de cobrança, quando, no estado de direito, ao credor subsistem os mecanismos disponíveis para recuperação dos créditos inadimplidos, 8. A suspensão do serviço de água tratada derivada de conduta abusiva do ente condominial como meio coercitivo de cobrança de despesas condominiais em atraso caracteriza-se como ato ilícito, e, tendo deixado a unidade privativa alcançada pela suspensão integralmente desprovida de água - bem essencial à vida e indispensável ao consumo humano - irradia à condômina vitimada pelo ato irregular aborrecimentos, dissabores, incômodos e transtornos que transcendem meros percalços do cotidiano e enseja-lhe exposição indevida por ter sido o corte do abastecimento sido procedido de forma ostensiva, caracterizando-se como ofensa aos atributos da sua personalidade e aos seus predicados intrínsecos, caracterizando como fato gerador do dano moral. 9. O dano moral, porque afeta diretamente os atributos da personalidade do ofendido, maculando os seus sentimentos e impregnando indelével nódoa na sua existência, ante as ofensas que experimentara no que lhe é mais caro - dignidade, auto-estima, honra, credibilidade, tranqüilidade etc. -, se aperfeiçoa com a simples ocorrência do ato ilícito que se qualifica como sua origem genética, não reclamando sua qualificação que do ocorrido tenha derivado qualquer repercussão no patrimônio material do lesado. 10. A compensação pecuniária devida ao atingido por ofensas de natureza moral deve ser mensurada de forma parcimoniosa e mediante ponderação dos princípios da proporcionalidade, atentando-se para a gravidade dos danos havidos, para o comportamento do ofensor e para a pessoa dos envolvidos no evento, e da razoabilidade, que recomenda que o importe fixado não seja tão excessivo a ponto de ensejar uma alteração na situação financeira dos envolvidos, nem tão inexpressivo que redunde em uma nova mágoa ao ofendido, ensejando sua corroboração se guarda conformação com esses parâmetros. 11. Editada a sentença e aviado o apelo sob a égide da nova codificação processual civil, o desprovimento do recurso implica a majoração dos honorários advocatícios originalmente imputados à parte recorrente, porquanto o novo estatuto processual contemplara o instituto dos honorários sucumbenciais recursais, devendo a majoração ser levada a efeito mediante ponderação dos serviços executados na fase recursal pelos patronos da parte exitosa e guardar observância à limitação da verba honorária estabelecida para a fase de conhecimento (NCPC, arts. 85, §§ 2º e 11). 12. Apelação conhecida e desprovida. Preliminar rejeitada. Majorados os honorários advocatícios impostos à apelante. Unânime.

Data do Julgamento : 21/06/2017
Data da Publicação : 14/07/2017
Órgão Julgador : 1ª TURMA CÍVEL
Relator(a) : TEÓFILO CAETANO
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