TJDF APC - 1026524-20140111659636APC
APELAÇÕES CÍVEIS. DIREITO ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA MOVIDA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO. CONTRATOS DA SECRETARIA DE SAÚDE DO DISTRITO FEDERAL CUJA LICITUDE ESTÁ SENDO CONTESTADA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO EM OUTRAS DEMANDAS. DECISÕES JUDICIAIS E ADMINISTRATIVAS QUE OBSTARAM OU CONDICIONARAM O PAGAMENTO DOS VALORES RELATIVOS À EXECUÇÃO DOS CONTRATOS. DECISÃO DO TRIBUNAL DE CONTAS DO DISTRITO FEDERAL. DECISÃO DA PRESIDÊNCIA DESTA CORTE EM SEDE DE SUSPENSÃO DE SEGURANÇA. DELIMITAÇÃO DO OBJETO DA DEMANDA. AFASTAMENTO DE QUESTÕES E CONSEQUÊNCIAS LEGAIS DISCUTIDAS EM OUTROS PROCESSOS. APELAÇÃO 1 (1º RÉU). PRELIMINAR DE NULIDADE DA SENTENÇA. ALEGAÇÃO DE FUNDAMENTO NÃO APONTADO PELO AUTOR NA INICIAL. MERA CONCLUSÃO DO MAGISTRADO ACERCA DOS FATOS. REJEIÇÃO. MÉRITO. GESTOR. SUBSECRETÁRIO DE ADMINISTRAÇÃO GERAL DA SES/DF (ORDENADOR DE DESPESAS). AUTORIZAÇÃO DE PAGAMENTOS EM DESCONFORMIDADE COM DETERMINAÇÃO JUDICIAL E DO TCDF. ESCUSA EM ORIENTAÇÃO DA ASSESSORIA JURÍDICA. DESCABIMENTO. DECISÕES JUDICIAIS CLARAS QUANTO AO ALCANCE. INTERPRETAÇÃO ESDRÚXULA. CIÊNCIA QUANTO ÀS VEDAÇÕES. CONDUTA ÍMPROBA AMOLDADA AO ART. 11, CAPUT E INCISOS I E II, DA LEI 8.249/92. SANÇÕES DO ART. 12, III, DA MESMA LEI. APELAÇÃO 2 (MINISTÉRIO PÚBLICO). PRELIMINARES ALEGADAS EM CONTRARRAZÕES DO 1º RÉU. CONTINÊNCIA E ILEGITIMIDADE PASSIVA. NÃO CONHECIMENTO. MÉRITO. OBJETO. APURAÇÃO DE ATOS ÍMPROBOS CONSISTENTES EM DESCUMPRIMENTO DE DECISÕES JUDICIAIS E DO TRIBUNAL DE CONTAS DO DISTRITO FEDERAL. NULIDADE DOS CONTRATOS E DANO AO ERÁRIO. DISCUSSÃO EM OUTROS PROCESSOS. RESTRITO O OBJETO DA DEMANDA À ANÁLISE DO DESCUMPRIMENTO DAS DECISÕES JUDICIAIS E DO TRIBUNAL DE CONTAS, NÃO SE VERIFICA A CONFIGURAÇÃO DOS ATOS ÍMPROBOS DESCRITOS NO ART. 10 DA LEI 8.249/92 (DANO AO ERÁRIO). SOBEJAMENTE DEMONSTRADAS, CONTUDO, AS CONDUTAS ÍMPROBAS DELINEADAS NO ART. 11 DA LIA (OFENSA AOS PRINCÍPIOS DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA). MANUTENÇÃO DAS SANÇÕES APLICADAS AO ORDENADOR DE DESPESAS (SUBSECRETÁRIO DE ADMINISTRAÇÃO GERAL DA SES/DF) PELA SENTENÇA RECORRIDA (ART. 12, III). ASSESSOR/CONSULTOR JURÍDICO/ADVOGADO PÚBLICO (CHEFE DA ASSESSORIA JURÍDICO-LEGISLATIVA DA SES/DF). NOTAS TÉCNICAS/PARECERES. INTERPRETAÇÃO ABSURDA DA DECISÃO JUDICIAL. DESCONSIDERAÇÃO DA DECISÃO CAUTELAR PROFERIDA PELO TRIBUNAL DE CONTAS LOCAL. RESPONSABILIDADE PESSOAL DO PARECERISTA QUANDO INCIDE EM CULPA (EM SENTIDO LATO) OU ATUA COM ERRO GROSSEIRO E INESCUSÁVEL OU DE MÁ-FÉ. PRECEDENTES DO STF. CONJUGAÇÃO DE ATOS DO GESTOR E DO ASSESSOR JURÍDICO COM O FIM DE LIBERAÇÃO DE PAGAMENTOS EM DESCONSIDERAÇÃO DE DECISÕES JUDICIAIS E DO TRIBUNAL DE CONTAS. APLICAÇÃO DAS MESMAS SANÇÕES (ART. 12, III, DA LEI 8.249/92). SECRETÁRIO INTERINO DE SAÚDE. IMPUTAÇÃO DE ATO ÍMPROBO POR TER AUTORIZADO A PRORROGAÇÃO DO CONTRATO E POR NÃO TER ADOTADO PROVIDÊNCIAS. PRORROGAÇÃO. PREVISÃO CONTRATUAL. DISCUSSÃO RELACIONADA A QUESTÕES OBJETO DE OUTRA DEMANDA. NÃO VINCULAÇÃO COM A AUTORIZAÇÃO IRREGULAR DOS PAGAMENTOS. OMISSÃO. AFIRMAÇÃO GENÉRICA. RESPONSABILIDADE OBJETIVA POR ATO DE IMPROBIDADE. IMPOSSIBILIDADE. AUTONOMIA DO SUBSECRETÁRIO DE ADMINISTRAÇÃO GERAL PARA AUTORIZAÇÃO DOS PAGAMENTOS. NÃO ACOLHIMENTO DA PRETENSÃO CONDENATÓRIA DO MINISTÉRIO PÚBLICO, QUANTO AO REFERIDO RÉU. EMPRESA CONTRATADA. EXTRANEUS BENEFICIÁRIO DOS ATOS ÍMPROBOS (ART. 3º DA LEI DE IMPROBIDADE). RECONHECIMENTO DA RESPONSABILIDADE, A DESPEITO DE NÃO SE DISCUTIR NESTE FEITO A LICITUDE OU NÃO DA CONTRATAÇÃO OU DANO AO ERÁRIO. CIÊNCIA QUANTO AOS PAGAMENTOS INDEVIDOS. IMPOSIÇÃO DA SANÇÃO CABÍVEL. APELAÇÃO DO RÉU DESPROVIDA, MANTENDO-SE A CONDENAÇÃO DO PRIMEIRO RÉU. APELAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO PROVIDA PARCIALMENTE, PARA CONDENAR OS 3º E 4º RÉUS NAS SANÇÕES POR IMPROBIDADE. 1. Delimitação do objeto.1.1. Esta ação civil de improbidade administrativa apura o descumprimento de ordens judiciais, emanadas do processo nº 2014.01.1.03576-9 e da Suspensão de Segurança nº 2014.00.2.010858-2, no bojo dos quais haviam sido implementadas restrições ao pagamento dos contratos nº 161/12 e 173/13 - SES/DF, bem como a desobediência a ordem de caráter administrativo oriunda do Tribunal de Contas do Distrito Federal.1.2. Não há reparos a se fazer na constatação do magistrado sentenciante de que a regularidade da contratação e a defesa do Erário estão sendo apuradas nos autos dos processos nº 2014.01.1.003576-9 e 2014.01.1.020680-6, inclusive com o arresto judicial de parte dos valores supostamente devidos pelos Contratos nº 161/12 e 173/13 - a SES/DF e prorrogações no primeiro mencionado e de que as discussões relativas à licitação (adesão à ata de registro de preço do RJ, necessidade de concorrência, prorrogação sem autorização contratual etc.), são objeto de outros processos inclusive dano ao erário.3. Apelação do Primeiro Réu.3.1. Preliminar de Nulidade da Sentença.3.1.1. Não constitui causa de nulidade da sentença a mera construção de reforço argumentativo utilizado pelo magistrado, extraindo conclusão da própria narrativa contida na inicial e dos elementos probatórios que entendeu suficientes para a condenação imposta ao apelante.3.1.2. Na medida em que a sentença deduziu fundamentos pelos quais entendia ter havido as ilegalidades e irregularidades nos pagamentos efetuados à empresa contratada, chegar-se à assertiva de que tal circunstância constituiu privilégio está longe de representar inovação de fundamento ou causa de pedir em relação ao que deduzido na inicial, constituindo tão-somente decorrência lógica do acolhimento do verdadeiro fundamento que sustenta a sentença, isto é, a conclusão do julgador de que houve a realização de pagamentos em descumprimento de ordens judiciais e de decisão do Tribunal de Contas. Preliminar rejeitada.3.2.Mérito.3.2.1. Quando da realização do pagamento do valor de R$ 823.151, no dia 31/01/2014, embora já estivesse revogada a decisão judicial de caráter cautelar proferida no dia 13/01/2014 (processo nº 2014.01.1.003576-9), a qual suspendera todo e qualquer pagamento à empresa ré, estava em pleno vigor a decisão proferida no dia 27/01/2014, no mesmo processo, que substituiu aquela primeira, tendo determinado que metade dos valores dos Contratos 161/12 e 173/13 - SES/DF a ser repassados para a empresa Metalúrgica Valença fossemdepositados em Juízo.3.2.2. Em que pese a manifestação da assessoria jurídica, em interpretação absolutamente esdrúxula acerca do alcance da decisão judicial proferida no dia 27/01/2014, cabe recordar que o recorrente era o gestor e o ordenador de despesas, tendo autorizado o pagamento à empresa contratada em manifesta contrariedade àquela determinação judicial, da qual tinha pleno conhecimento e cujo teor não suscita qualquer espaço para dúvidas interpretativas, daí o reconhecimento do dolo, porquanto não estava diante de um parecer vinculante da assessoria jurídica e o poder decisório estava em suas mãos, na qualidade de ordenador da despesa.3.2.3. Também em relação aos pagamentos ocorridos nos dias 19, 24 e 25 de junho de 2014, um montante de mais de 8,5 milhões, houve descumprimento da decisão proferida pelo então Presidente desta Corte na Suspensão de Segurança nº 2014.00.2.010858-2, porque, embora não houvesse impedimento de pagamento da totalidade dos valores devidos pelas obras em andamento, foi estabelecido o limite de 75%, condicionado o pagamento, ainda, à apresentação, ao juiz da causa e com oitiva do Ministério Público, do cronograma físico financeiro respectivo, o que foi solenemente ignorado pelo réu/recorrente.3.2.4. De igual forma, desconsiderou o recorrente a decisão cautelar (Decisão Singular nº 154/2014) emanada do Tribunal de Contas do Distrito Federal, no dia 29/02/2014, que determinou à SES/DF que fossem suspensos cautelarmente os pagamentos referentes ao(s) contrato(s) decorrente(s) do Pregão Eletrônico por Ata de Registro de Preços nº 170/2012 - SES, até ulterior deliberação da Corte de Contas, decisão cujos efeitos vigoraram até o dia 14 de outubro de 2014.3.2.5. Adefesa do recorrente repete estratégia que é praticamente rotina dos administradores/gestores quando são chamados à responsabilização pelos atos danosos que tenham praticado contra a Administração Pública, ou em detrimento do erário: buscam isentar-se de culpa ou dolo pelas condutas que lhes são imputadas ao argumento de que as realizaram com esteio em parecer jurídico.3.2.6. Além da autorização dos pagamentos acima referidos, o recorrente também assinou despacho, em 18/16/2014, em que autorizou o empenho de R$ 10.000.000,00 (dez milhões de reais) e, no dia 23/07/2014, autorizou a emissão de nota de empenho, liquidação e pagamento de mais de R$ 23.000.000,00 (vinte e três milhões de reais), documento emitido no mesmo dia, só não vindo a se efetivar o pagamento por conta de determinação da Casa Civil, que não permitiu a destinação dos recursos para a Secretaria de Saúde. 3.2.7.Também não aproveita ao recorrente o fato de haver parecer jurídico e técnico favorável à contratação. Tais pareceres não são vinculantes ao gestor, o que não significa ausência de responsabilidade daqueles que os firmam. Tem o administrador obrigação de examinar a correção dos pareceres, até mesmo para corrigir eventuais disfunções na administração (Tribunal de Contas da União. Plenário. Acórdão n. 939/2010. Processo n. TC 007.117/2010-8. Relator: min. Benjamin Zymler. DJ, 13 maio 2010. Decisão publicada: 13 maio 2010).3.2.8. Diante desse contexto de clara afronta às decisões judiciais e do Tribunal de Contas, inarredável a conclusão do magistrado sentenciante no sentido de que As condutas revelam o elemento anímico do dolo, pois evidenciam a intenção de pagamento mesmo diante da determinação expressa em sentido contrário. O pagamento dos valores devidos à Metalúrgica Valença eram acompanhados bem de perto por todas as partes envolvidas, pois já havia ocorrido a judicialização e a concessão de liminares em diversas instâncias judiciais e administrativas, mostrando-se, ainda, inverossímeis as alegações de que os dispêndios foram oriundos de mera atuação administrativa, como se fosse do cotidiano a liberação de pagamentos milionários em manifesta desobediência à ordem judicial.3.2.9. As sanções foram fixadas com razoabilidade e proporcionalidade verificando-se que, quanto às penas que permitem a gradação temporal ou numérica, ou seja, o pagamento de multa civil e o tempo de suspensão dos direitos políticos, o magistrado estabeleceu as sanções próxima do mínimo legal, para a primeira, e no mínimo legal em relação à segunda, conforme se constata da leitura do art. 12, inc. III, da Lei 8.249/92, impondo-se o desprovimento do apelo do 1º réu.4. Apelação do Ministério Público.4.1. Preliminares.4.1.1. Continência. Matéria não levada ao conhecimento do juízo a quo. Omissão que, além de tornar preclusa a questão, impede o conhecimento da matéria nesta sede recursal, sob pena de supressão de instância, havendo incidência, ademais, do verbete sumular nº 235/STJ, por analogia (A conexão não determina a reunião dos processos se um deles já foi julgado), vez que já houve o julgamento de dois dos processos em relação aos quais se invocou a ocorrência de continência e constatação de que eventual constatação da ocorrência de continência não determinaria a suspensão dos processos, como pretendido pelo réu/recorrido, mas a reunião para julgamento conjunto (art. 105, CPC/1973). Preliminar não conhecida.4.1.2. Ilegitimidade Passiva do 1º Réu. Conforme registrado na sentença recorrida, trata-se de questão anteriormente decidida por ocasião do recebimento da inicial, tendo o réu interposto o Agravo de Instrumento ao qual foi negado provimento, com decisão transitada em julgado em 31/03/2016. Nesse passo, mostra-se, evidentemente, incabível o reexame dessa matéria. Preliminar não conhecida.4.2. Mérito. Análise da ocorrência de atos ímprobos resultantes de descumprimento de decisões judiciais e do Tribunal de Contas do Distrito Federal, que obstaram ou impuseram restrições à Secretaria de Saúde do Distrito Federal para a realização de pagamentos à empresa Metalúrgica Valença Indústria e Comércio Ltda, em decorrência dos contratos firmados a partir do Pregão Eletrônico por Ata de Registro de Preços nº 170/2012 - SES/DF, ou seja, os contratos nº 161/12 e 173/13.4.2.1. A efetiva existência ou não de dano ao erário depende do acolhimento ou não da tese ministerial acerca da existência de ilegalidades ocorridas nos contratos nº 161/12 e 173/13, firmados a partir da publicação do Edital de Pregão Eletrônico nº 170/2012 - SES/DF, em relação aos quais alegou o Parquet diversos vícios, além de superfaturamento, havendo pedido de declaração de nulidade daquelas avenças, questões que são objeto de outras demandas.4.2.2. Restringindo-se o objeto da causa à análise do pagamento dos contratos em desobediência a determinações judiciais e do Tribunal de Contas, não se verifica a perfeita adequação típica dos atos praticados pelos recorridos nas hipóteses descritas no art. 10 da Lei de Improbidade, vez que a liberação de verba pública de forma irregular, tal como ocorreu, não implica o reconhecimento de ilicitude na origem ou na execução dos contratos, ou reconhecimento de sobrepreço, com o que se concluiria pela existência de efetivo prejuízo ao erário e a conseqüente necessidade de ressarcimento, mas essas questões estão postas em outra demanda e dependem do reconhecimento dos ilícitos apontados pelo Parquet nos contratos 161/2012 e 173/2013 - SES/DF, juízo que aqui não se realizará 4.2.3. De outro lado, sobejamente demonstrado nos autos, tal como reconheceu o magistrado sentenciante, que a conduta do primeiro réu (Secretário de Administração Geral da SES/DF) violou flagrantemente os deveres da honestidade, legalidade e lealdade às instituições, configurando, sem sombra de dúvidas, conduta ímproba, nos termos art. 11, caput, incisos I e II da Lei 8.429/1992, o que reclama como conseqüência a aplicação das sanções previstas no art. 12, inciso III do mesmo Diploma Legal, cumulativamente, ressalvada a pena de ressarcimento integral do dano, pelas razões expostas antes.4.2.4. O terceiro réu (Assessor Chefe da Consultoria Jurídica) não estava diante de decisão judicial de complexa compreensão ou em relação à qual se pudessem aplicar diferentes interpretações, logicamente ou razoavelmente aceitáveis, caso em que o parecer não poderia sofrer mais do que críticas em função de eventual debilidade jurídica da peça, estando intangível a quaisquer efeitos negativos em face do subscritor, do ponto de vista da responsabilidade civil, administrativa e criminal.4.2.5. No caso da manifestação técnica (Despacho 155/2014 - AJL/SES) que subsidiou o ato do gestor quanto ao pagamento realizado no dia 31/01/2014, diante da clara afronta aos termos do objeto da interpretação (a decisão judicial que determinou o depósito em juízo de metade dos valores a serem pagos à contratada), fica evidente a intenção do apelado de burlar os efeitos da decisão judicial, abrindo o caminho para a autorização do dispêndio pelo gestor.4.2.6. Quanto aos demais pagamentos (Ordens Bancárias dos dias 19, 24 e 25/junho/2014), houve manifestação do Assessor Jurídico, com omissão dos termos da decisão proferida pelo Presidente desta Corte nos autos da Suspensão de Segurança nº 2014.00.2.010858-2 (limitação dos pagamentos a 75% das obras em andamento, com autorização do juízo), quanto à necessidade de apresentação ao Juízo do cronograma físico-financeiro, além de se ter ignorado por completo a decisão cautelar proferida pelo Tribunal de Contas Distrital no dia 29/02/2014 (Decisão Singular nº 154/2014), cujos efeitos perduraram até a decisão do mesmo Tribunal editada no dia 14 de outubro de 2014.4.2.7. Conforme se depreende da análise da jurisprudência consolidada do STF sobre o tema, destacando-se os Acórdãos MS nº 24.073-3/DF MS n° 24.631/DF e MS nº 24.584/DF, verifica-se que aquela Corte entende possível a responsabilização do parecerista, de forma solidária com o gestor público, nos casos em que fique caracterizado erro grave, inescusável, ou ato ou omissão praticada com culpa em sentido largo, além de ter firmado a orientação de que o advogado/procurador/consultor público pode ser chamado a dar explicações de seus atos perante o Tribunal de Contas.4.2.8. O advogado público (procurador/consultor jurídico) não tem, assim como qualquer outro agente público, proteção ampla e irrestrita quanto aos atos praticados no exercício do seu ofício, devendo responder pelos danos ou ilícitos que deles advierem, quando suas manifestações consistirem em atuação abusiva, dolo ou erro grave e inescusável, o que, a nosso juízo, segundo a análise cuidadosa e detida dos autos, ficou demonstrado em relação à conduta do terceiro réu, havendo subsunção à hipótese de improbidade administrativa prevista no art. 11, caput, e incisos I e II da Lei 8.112/92, tal como se verificou em relação ao primeiro réu, o que induz à aplicação das mesmas sanções descritas no art. 12, III, nas mesmas proporções, dada a conjugação dos atos praticados pelos referidos réus.4.2.9. Quanto à apontada responsabilidade do segundo réu (Secretário Interino de Saúde) face à autorização para prorrogação contratual e alegada omissão quanto às irregularidades anota-se que a questão da legalidade ou não da prorrogação contratual envolve outras questões que são discutidas em outra demanda, relacionando-se com o debate acerca do objeto contratual, mais precisamente, diz respeito a saber se se trata de obra de engenharia, como afirma o Ministério Público, ou fornecimento de bens.4.2.10. A alegação genérica de omissão não pode levar, por si só, o agente público a responder por ato ímprobo, sob pena de admitir-se uma responsabilização objetiva, o que não é compatível com o regime legal disposto na Lei 8.249/92, tampouco com a doutrina e a jurisprudência, devendo-se consignar, ademais, a autonomia do Subsecretário de Administração Geral para a prática dos atos de dispêndio dos recursos do Fundo de Saúde, não tendo havido a demonstração de qualquer ato atribuível ao recorrido por meio do qual tenha concorrido diretamente para a realização dos pagamentos contestados nesta demanda.4.2.11. A participação do recorrido em reuniões com membros do MPDFT e do MPC/DF, em que teria defendido a liberação de recursos em favor da empresa contratada demonstraria, de fato, a intenção de reverter as decisões protetivas ao erário e sua ciência quanto à existência das decisões impeditivas de pagamento, mas não revela qualquer ilicitude, tampouco comprova que tenha corroborado os atos do Subsecretário de Administração Geral da Secretaria de Saúde, o réu Túlio Roriz, quanto à autorização dos pagamentos.4.2.12. O terceiro, ou extraneus, mesmo pessoa jurídica, pode responder por ato de improbidade administrativa quando tenha concorrido ou se beneficiado do ilícito, na forma do art. 3º da Lei 8.249/92.4.2.13. No caso, a empresa contratada, a despeito de não se discutir neste feito a licitude ou não da contratação ou a ocorrência ou não de dano ao erário, acabou por ser a beneficiária dos recursos que lhe foram destinados pelas ordens bancárias realizadas nos dias 31/01/2014 e 19, 24 e 25 de junho de 2014, numerário que lhe foi assegurado em desconformidade com decisões proferidas nos âmbitos judicial e administrativo (TCDF), cabendo lembrar que, nos termos do art. 21, caput e inciso I, da Lei de Improbidade, a aplicação das sanções nela previstas independe da efetiva ocorrência de dano ao patrimônio público, salvo quanto à pena de ressarcimento.4.2.14. É patente o conhecimento da empresa ré quanto às proibições de pagamento ou quanto às condicionantes feitas para a sua ocorrência, tendo em vista que a contratada é parte no processo 2014.01.1.003576-9, tendo sido intimada de todas as decisões por meio de publicação no DJe, além de ser parte no processo junto ao Tribunal de Contas do Distrito Federal e de ter, obviamente, acesso ao processo administrativo relativo ao contrato 161/2012, no corpo do qual formulou os pedidos de pagamento das obras realizadas.4.2.15. Feito o juízo de compatibilidade das sanções previstas no art. 12, III, da LIA com a natureza da pessoa jurídica, resta como sanção aplicável à empresa recorrida tão-somente a proibição de contratar com o Poder Público, ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de três anos.5. Apelação do primeiro réu conhecida, rejeitando-se a preliminar e, no mérito, improvida; Apelação do Ministério Público conhecida, não se conhecendo das preliminares alegadas nas contrarrazões do primeiro réu e, no mérito, parcialmente provida, para reformar parcialmente a sentença recorrida e condenar o terceiro e quarto réus por atos de improbidade administrativa, na forma do art. 11 da Lei 8.249/92, com as sanções do art. 12, III, segundo especificação contida no dispositivo deste julgado.
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APELAÇÕES CÍVEIS. DIREITO ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA MOVIDA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO. CONTRATOS DA SECRETARIA DE SAÚDE DO DISTRITO FEDERAL CUJA LICITUDE ESTÁ SENDO CONTESTADA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO EM OUTRAS DEMANDAS. DECISÕES JUDICIAIS E ADMINISTRATIVAS QUE OBSTARAM OU CONDICIONARAM O PAGAMENTO DOS VALORES RELATIVOS À EXECUÇÃO DOS CONTRATOS. DECISÃO DO TRIBUNAL DE CONTAS DO DISTRITO FEDERAL. DECISÃO DA PRESIDÊNCIA DESTA CORTE EM SEDE DE SUSPENSÃO DE SEGURANÇA. DELIMITAÇÃO DO OBJETO DA DEMANDA. AFASTAMENTO DE QUESTÕES E CONSEQUÊNCIAS LEGAIS DISCUTIDAS EM OUTROS PROCESSOS. APELAÇÃO 1 (1º RÉU). PRELIMINAR DE NULIDADE DA SENTENÇA. ALEGAÇÃO DE FUNDAMENTO NÃO APONTADO PELO AUTOR NA INICIAL. MERA CONCLUSÃO DO MAGISTRADO ACERCA DOS FATOS. REJEIÇÃO. MÉRITO. GESTOR. SUBSECRETÁRIO DE ADMINISTRAÇÃO GERAL DA SES/DF (ORDENADOR DE DESPESAS). AUTORIZAÇÃO DE PAGAMENTOS EM DESCONFORMIDADE COM DETERMINAÇÃO JUDICIAL E DO TCDF. ESCUSA EM ORIENTAÇÃO DA ASSESSORIA JURÍDICA. DESCABIMENTO. DECISÕES JUDICIAIS CLARAS QUANTO AO ALCANCE. INTERPRETAÇÃO ESDRÚXULA. CIÊNCIA QUANTO ÀS VEDAÇÕES. CONDUTA ÍMPROBA AMOLDADA AO ART. 11, CAPUT E INCISOS I E II, DA LEI 8.249/92. SANÇÕES DO ART. 12, III, DA MESMA LEI. APELAÇÃO 2 (MINISTÉRIO PÚBLICO). PRELIMINARES ALEGADAS EM CONTRARRAZÕES DO 1º RÉU. CONTINÊNCIA E ILEGITIMIDADE PASSIVA. NÃO CONHECIMENTO. MÉRITO. OBJETO. APURAÇÃO DE ATOS ÍMPROBOS CONSISTENTES EM DESCUMPRIMENTO DE DECISÕES JUDICIAIS E DO TRIBUNAL DE CONTAS DO DISTRITO FEDERAL. NULIDADE DOS CONTRATOS E DANO AO ERÁRIO. DISCUSSÃO EM OUTROS PROCESSOS. RESTRITO O OBJETO DA DEMANDA À ANÁLISE DO DESCUMPRIMENTO DAS DECISÕES JUDICIAIS E DO TRIBUNAL DE CONTAS, NÃO SE VERIFICA A CONFIGURAÇÃO DOS ATOS ÍMPROBOS DESCRITOS NO ART. 10 DA LEI 8.249/92 (DANO AO ERÁRIO). SOBEJAMENTE DEMONSTRADAS, CONTUDO, AS CONDUTAS ÍMPROBAS DELINEADAS NO ART. 11 DA LIA (OFENSA AOS PRINCÍPIOS DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA). MANUTENÇÃO DAS SANÇÕES APLICADAS AO ORDENADOR DE DESPESAS (SUBSECRETÁRIO DE ADMINISTRAÇÃO GERAL DA SES/DF) PELA SENTENÇA RECORRIDA (ART. 12, III). ASSESSOR/CONSULTOR JURÍDICO/ADVOGADO PÚBLICO (CHEFE DA ASSESSORIA JURÍDICO-LEGISLATIVA DA SES/DF). NOTAS TÉCNICAS/PARECERES. INTERPRETAÇÃO ABSURDA DA DECISÃO JUDICIAL. DESCONSIDERAÇÃO DA DECISÃO CAUTELAR PROFERIDA PELO TRIBUNAL DE CONTAS LOCAL. RESPONSABILIDADE PESSOAL DO PARECERISTA QUANDO INCIDE EM CULPA (EM SENTIDO LATO) OU ATUA COM ERRO GROSSEIRO E INESCUSÁVEL OU DE MÁ-FÉ. PRECEDENTES DO STF. CONJUGAÇÃO DE ATOS DO GESTOR E DO ASSESSOR JURÍDICO COM O FIM DE LIBERAÇÃO DE PAGAMENTOS EM DESCONSIDERAÇÃO DE DECISÕES JUDICIAIS E DO TRIBUNAL DE CONTAS. APLICAÇÃO DAS MESMAS SANÇÕES (ART. 12, III, DA LEI 8.249/92). SECRETÁRIO INTERINO DE SAÚDE. IMPUTAÇÃO DE ATO ÍMPROBO POR TER AUTORIZADO A PRORROGAÇÃO DO CONTRATO E POR NÃO TER ADOTADO PROVIDÊNCIAS. PRORROGAÇÃO. PREVISÃO CONTRATUAL. DISCUSSÃO RELACIONADA A QUESTÕES OBJETO DE OUTRA DEMANDA. NÃO VINCULAÇÃO COM A AUTORIZAÇÃO IRREGULAR DOS PAGAMENTOS. OMISSÃO. AFIRMAÇÃO GENÉRICA. RESPONSABILIDADE OBJETIVA POR ATO DE IMPROBIDADE. IMPOSSIBILIDADE. AUTONOMIA DO SUBSECRETÁRIO DE ADMINISTRAÇÃO GERAL PARA AUTORIZAÇÃO DOS PAGAMENTOS. NÃO ACOLHIMENTO DA PRETENSÃO CONDENATÓRIA DO MINISTÉRIO PÚBLICO, QUANTO AO REFERIDO RÉU. EMPRESA CONTRATADA. EXTRANEUS BENEFICIÁRIO DOS ATOS ÍMPROBOS (ART. 3º DA LEI DE IMPROBIDADE). RECONHECIMENTO DA RESPONSABILIDADE, A DESPEITO DE NÃO SE DISCUTIR NESTE FEITO A LICITUDE OU NÃO DA CONTRATAÇÃO OU DANO AO ERÁRIO. CIÊNCIA QUANTO AOS PAGAMENTOS INDEVIDOS. IMPOSIÇÃO DA SANÇÃO CABÍVEL. APELAÇÃO DO RÉU DESPROVIDA, MANTENDO-SE A CONDENAÇÃO DO PRIMEIRO RÉU. APELAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO PROVIDA PARCIALMENTE, PARA CONDENAR OS 3º E 4º RÉUS NAS SANÇÕES POR IMPROBIDADE. 1. Delimitação do objeto.1.1. Esta ação civil de improbidade administrativa apura o descumprimento de ordens judiciais, emanadas do processo nº 2014.01.1.03576-9 e da Suspensão de Segurança nº 2014.00.2.010858-2, no bojo dos quais haviam sido implementadas restrições ao pagamento dos contratos nº 161/12 e 173/13 - SES/DF, bem como a desobediência a ordem de caráter administrativo oriunda do Tribunal de Contas do Distrito Federal.1.2. Não há reparos a se fazer na constatação do magistrado sentenciante de que a regularidade da contratação e a defesa do Erário estão sendo apuradas nos autos dos processos nº 2014.01.1.003576-9 e 2014.01.1.020680-6, inclusive com o arresto judicial de parte dos valores supostamente devidos pelos Contratos nº 161/12 e 173/13 - a SES/DF e prorrogações no primeiro mencionado e de que as discussões relativas à licitação (adesão à ata de registro de preço do RJ, necessidade de concorrência, prorrogação sem autorização contratual etc.), são objeto de outros processos inclusive dano ao erário.3. Apelação do Primeiro Réu.3.1. Preliminar de Nulidade da Sentença.3.1.1. Não constitui causa de nulidade da sentença a mera construção de reforço argumentativo utilizado pelo magistrado, extraindo conclusão da própria narrativa contida na inicial e dos elementos probatórios que entendeu suficientes para a condenação imposta ao apelante.3.1.2. Na medida em que a sentença deduziu fundamentos pelos quais entendia ter havido as ilegalidades e irregularidades nos pagamentos efetuados à empresa contratada, chegar-se à assertiva de que tal circunstância constituiu privilégio está longe de representar inovação de fundamento ou causa de pedir em relação ao que deduzido na inicial, constituindo tão-somente decorrência lógica do acolhimento do verdadeiro fundamento que sustenta a sentença, isto é, a conclusão do julgador de que houve a realização de pagamentos em descumprimento de ordens judiciais e de decisão do Tribunal de Contas. Preliminar rejeitada.3.2.Mérito.3.2.1. Quando da realização do pagamento do valor de R$ 823.151, no dia 31/01/2014, embora já estivesse revogada a decisão judicial de caráter cautelar proferida no dia 13/01/2014 (processo nº 2014.01.1.003576-9), a qual suspendera todo e qualquer pagamento à empresa ré, estava em pleno vigor a decisão proferida no dia 27/01/2014, no mesmo processo, que substituiu aquela primeira, tendo determinado que metade dos valores dos Contratos 161/12 e 173/13 - SES/DF a ser repassados para a empresa Metalúrgica Valença fossemdepositados em Juízo.3.2.2. Em que pese a manifestação da assessoria jurídica, em interpretação absolutamente esdrúxula acerca do alcance da decisão judicial proferida no dia 27/01/2014, cabe recordar que o recorrente era o gestor e o ordenador de despesas, tendo autorizado o pagamento à empresa contratada em manifesta contrariedade àquela determinação judicial, da qual tinha pleno conhecimento e cujo teor não suscita qualquer espaço para dúvidas interpretativas, daí o reconhecimento do dolo, porquanto não estava diante de um parecer vinculante da assessoria jurídica e o poder decisório estava em suas mãos, na qualidade de ordenador da despesa.3.2.3. Também em relação aos pagamentos ocorridos nos dias 19, 24 e 25 de junho de 2014, um montante de mais de 8,5 milhões, houve descumprimento da decisão proferida pelo então Presidente desta Corte na Suspensão de Segurança nº 2014.00.2.010858-2, porque, embora não houvesse impedimento de pagamento da totalidade dos valores devidos pelas obras em andamento, foi estabelecido o limite de 75%, condicionado o pagamento, ainda, à apresentação, ao juiz da causa e com oitiva do Ministério Público, do cronograma físico financeiro respectivo, o que foi solenemente ignorado pelo réu/recorrente.3.2.4. De igual forma, desconsiderou o recorrente a decisão cautelar (Decisão Singular nº 154/2014) emanada do Tribunal de Contas do Distrito Federal, no dia 29/02/2014, que determinou à SES/DF que fossem suspensos cautelarmente os pagamentos referentes ao(s) contrato(s) decorrente(s) do Pregão Eletrônico por Ata de Registro de Preços nº 170/2012 - SES, até ulterior deliberação da Corte de Contas, decisão cujos efeitos vigoraram até o dia 14 de outubro de 2014.3.2.5. Adefesa do recorrente repete estratégia que é praticamente rotina dos administradores/gestores quando são chamados à responsabilização pelos atos danosos que tenham praticado contra a Administração Pública, ou em detrimento do erário: buscam isentar-se de culpa ou dolo pelas condutas que lhes são imputadas ao argumento de que as realizaram com esteio em parecer jurídico.3.2.6. Além da autorização dos pagamentos acima referidos, o recorrente também assinou despacho, em 18/16/2014, em que autorizou o empenho de R$ 10.000.000,00 (dez milhões de reais) e, no dia 23/07/2014, autorizou a emissão de nota de empenho, liquidação e pagamento de mais de R$ 23.000.000,00 (vinte e três milhões de reais), documento emitido no mesmo dia, só não vindo a se efetivar o pagamento por conta de determinação da Casa Civil, que não permitiu a destinação dos recursos para a Secretaria de Saúde. 3.2.7.Também não aproveita ao recorrente o fato de haver parecer jurídico e técnico favorável à contratação. Tais pareceres não são vinculantes ao gestor, o que não significa ausência de responsabilidade daqueles que os firmam. Tem o administrador obrigação de examinar a correção dos pareceres, até mesmo para corrigir eventuais disfunções na administração (Tribunal de Contas da União. Plenário. Acórdão n. 939/2010. Processo n. TC 007.117/2010-8. Relator: min. Benjamin Zymler. DJ, 13 maio 2010. Decisão publicada: 13 maio 2010).3.2.8. Diante desse contexto de clara afronta às decisões judiciais e do Tribunal de Contas, inarredável a conclusão do magistrado sentenciante no sentido de que As condutas revelam o elemento anímico do dolo, pois evidenciam a intenção de pagamento mesmo diante da determinação expressa em sentido contrário. O pagamento dos valores devidos à Metalúrgica Valença eram acompanhados bem de perto por todas as partes envolvidas, pois já havia ocorrido a judicialização e a concessão de liminares em diversas instâncias judiciais e administrativas, mostrando-se, ainda, inverossímeis as alegações de que os dispêndios foram oriundos de mera atuação administrativa, como se fosse do cotidiano a liberação de pagamentos milionários em manifesta desobediência à ordem judicial.3.2.9. As sanções foram fixadas com razoabilidade e proporcionalidade verificando-se que, quanto às penas que permitem a gradação temporal ou numérica, ou seja, o pagamento de multa civil e o tempo de suspensão dos direitos políticos, o magistrado estabeleceu as sanções próxima do mínimo legal, para a primeira, e no mínimo legal em relação à segunda, conforme se constata da leitura do art. 12, inc. III, da Lei 8.249/92, impondo-se o desprovimento do apelo do 1º réu.4. Apelação do Ministério Público.4.1. Preliminares.4.1.1. Continência. Matéria não levada ao conhecimento do juízo a quo. Omissão que, além de tornar preclusa a questão, impede o conhecimento da matéria nesta sede recursal, sob pena de supressão de instância, havendo incidência, ademais, do verbete sumular nº 235/STJ, por analogia (A conexão não determina a reunião dos processos se um deles já foi julgado), vez que já houve o julgamento de dois dos processos em relação aos quais se invocou a ocorrência de continência e constatação de que eventual constatação da ocorrência de continência não determinaria a suspensão dos processos, como pretendido pelo réu/recorrido, mas a reunião para julgamento conjunto (art. 105, CPC/1973). Preliminar não conhecida.4.1.2. Ilegitimidade Passiva do 1º Réu. Conforme registrado na sentença recorrida, trata-se de questão anteriormente decidida por ocasião do recebimento da inicial, tendo o réu interposto o Agravo de Instrumento ao qual foi negado provimento, com decisão transitada em julgado em 31/03/2016. Nesse passo, mostra-se, evidentemente, incabível o reexame dessa matéria. Preliminar não conhecida.4.2. Mérito. Análise da ocorrência de atos ímprobos resultantes de descumprimento de decisões judiciais e do Tribunal de Contas do Distrito Federal, que obstaram ou impuseram restrições à Secretaria de Saúde do Distrito Federal para a realização de pagamentos à empresa Metalúrgica Valença Indústria e Comércio Ltda, em decorrência dos contratos firmados a partir do Pregão Eletrônico por Ata de Registro de Preços nº 170/2012 - SES/DF, ou seja, os contratos nº 161/12 e 173/13.4.2.1. A efetiva existência ou não de dano ao erário depende do acolhimento ou não da tese ministerial acerca da existência de ilegalidades ocorridas nos contratos nº 161/12 e 173/13, firmados a partir da publicação do Edital de Pregão Eletrônico nº 170/2012 - SES/DF, em relação aos quais alegou o Parquet diversos vícios, além de superfaturamento, havendo pedido de declaração de nulidade daquelas avenças, questões que são objeto de outras demandas.4.2.2. Restringindo-se o objeto da causa à análise do pagamento dos contratos em desobediência a determinações judiciais e do Tribunal de Contas, não se verifica a perfeita adequação típica dos atos praticados pelos recorridos nas hipóteses descritas no art. 10 da Lei de Improbidade, vez que a liberação de verba pública de forma irregular, tal como ocorreu, não implica o reconhecimento de ilicitude na origem ou na execução dos contratos, ou reconhecimento de sobrepreço, com o que se concluiria pela existência de efetivo prejuízo ao erário e a conseqüente necessidade de ressarcimento, mas essas questões estão postas em outra demanda e dependem do reconhecimento dos ilícitos apontados pelo Parquet nos contratos 161/2012 e 173/2013 - SES/DF, juízo que aqui não se realizará 4.2.3. De outro lado, sobejamente demonstrado nos autos, tal como reconheceu o magistrado sentenciante, que a conduta do primeiro réu (Secretário de Administração Geral da SES/DF) violou flagrantemente os deveres da honestidade, legalidade e lealdade às instituições, configurando, sem sombra de dúvidas, conduta ímproba, nos termos art. 11, caput, incisos I e II da Lei 8.429/1992, o que reclama como conseqüência a aplicação das sanções previstas no art. 12, inciso III do mesmo Diploma Legal, cumulativamente, ressalvada a pena de ressarcimento integral do dano, pelas razões expostas antes.4.2.4. O terceiro réu (Assessor Chefe da Consultoria Jurídica) não estava diante de decisão judicial de complexa compreensão ou em relação à qual se pudessem aplicar diferentes interpretações, logicamente ou razoavelmente aceitáveis, caso em que o parecer não poderia sofrer mais do que críticas em função de eventual debilidade jurídica da peça, estando intangível a quaisquer efeitos negativos em face do subscritor, do ponto de vista da responsabilidade civil, administrativa e criminal.4.2.5. No caso da manifestação técnica (Despacho 155/2014 - AJL/SES) que subsidiou o ato do gestor quanto ao pagamento realizado no dia 31/01/2014, diante da clara afronta aos termos do objeto da interpretação (a decisão judicial que determinou o depósito em juízo de metade dos valores a serem pagos à contratada), fica evidente a intenção do apelado de burlar os efeitos da decisão judicial, abrindo o caminho para a autorização do dispêndio pelo gestor.4.2.6. Quanto aos demais pagamentos (Ordens Bancárias dos dias 19, 24 e 25/junho/2014), houve manifestação do Assessor Jurídico, com omissão dos termos da decisão proferida pelo Presidente desta Corte nos autos da Suspensão de Segurança nº 2014.00.2.010858-2 (limitação dos pagamentos a 75% das obras em andamento, com autorização do juízo), quanto à necessidade de apresentação ao Juízo do cronograma físico-financeiro, além de se ter ignorado por completo a decisão cautelar proferida pelo Tribunal de Contas Distrital no dia 29/02/2014 (Decisão Singular nº 154/2014), cujos efeitos perduraram até a decisão do mesmo Tribunal editada no dia 14 de outubro de 2014.4.2.7. Conforme se depreende da análise da jurisprudência consolidada do STF sobre o tema, destacando-se os Acórdãos MS nº 24.073-3/DF MS n° 24.631/DF e MS nº 24.584/DF, verifica-se que aquela Corte entende possível a responsabilização do parecerista, de forma solidária com o gestor público, nos casos em que fique caracterizado erro grave, inescusável, ou ato ou omissão praticada com culpa em sentido largo, além de ter firmado a orientação de que o advogado/procurador/consultor público pode ser chamado a dar explicações de seus atos perante o Tribunal de Contas.4.2.8. O advogado público (procurador/consultor jurídico) não tem, assim como qualquer outro agente público, proteção ampla e irrestrita quanto aos atos praticados no exercício do seu ofício, devendo responder pelos danos ou ilícitos que deles advierem, quando suas manifestações consistirem em atuação abusiva, dolo ou erro grave e inescusável, o que, a nosso juízo, segundo a análise cuidadosa e detida dos autos, ficou demonstrado em relação à conduta do terceiro réu, havendo subsunção à hipótese de improbidade administrativa prevista no art. 11, caput, e incisos I e II da Lei 8.112/92, tal como se verificou em relação ao primeiro réu, o que induz à aplicação das mesmas sanções descritas no art. 12, III, nas mesmas proporções, dada a conjugação dos atos praticados pelos referidos réus.4.2.9. Quanto à apontada responsabilidade do segundo réu (Secretário Interino de Saúde) face à autorização para prorrogação contratual e alegada omissão quanto às irregularidades anota-se que a questão da legalidade ou não da prorrogação contratual envolve outras questões que são discutidas em outra demanda, relacionando-se com o debate acerca do objeto contratual, mais precisamente, diz respeito a saber se se trata de obra de engenharia, como afirma o Ministério Público, ou fornecimento de bens.4.2.10. A alegação genérica de omissão não pode levar, por si só, o agente público a responder por ato ímprobo, sob pena de admitir-se uma responsabilização objetiva, o que não é compatível com o regime legal disposto na Lei 8.249/92, tampouco com a doutrina e a jurisprudência, devendo-se consignar, ademais, a autonomia do Subsecretário de Administração Geral para a prática dos atos de dispêndio dos recursos do Fundo de Saúde, não tendo havido a demonstração de qualquer ato atribuível ao recorrido por meio do qual tenha concorrido diretamente para a realização dos pagamentos contestados nesta demanda.4.2.11. A participação do recorrido em reuniões com membros do MPDFT e do MPC/DF, em que teria defendido a liberação de recursos em favor da empresa contratada demonstraria, de fato, a intenção de reverter as decisões protetivas ao erário e sua ciência quanto à existência das decisões impeditivas de pagamento, mas não revela qualquer ilicitude, tampouco comprova que tenha corroborado os atos do Subsecretário de Administração Geral da Secretaria de Saúde, o réu Túlio Roriz, quanto à autorização dos pagamentos.4.2.12. O terceiro, ou extraneus, mesmo pessoa jurídica, pode responder por ato de improbidade administrativa quando tenha concorrido ou se beneficiado do ilícito, na forma do art. 3º da Lei 8.249/92.4.2.13. No caso, a empresa contratada, a despeito de não se discutir neste feito a licitude ou não da contratação ou a ocorrência ou não de dano ao erário, acabou por ser a beneficiária dos recursos que lhe foram destinados pelas ordens bancárias realizadas nos dias 31/01/2014 e 19, 24 e 25 de junho de 2014, numerário que lhe foi assegurado em desconformidade com decisões proferidas nos âmbitos judicial e administrativo (TCDF), cabendo lembrar que, nos termos do art. 21, caput e inciso I, da Lei de Improbidade, a aplicação das sanções nela previstas independe da efetiva ocorrência de dano ao patrimônio público, salvo quanto à pena de ressarcimento.4.2.14. É patente o conhecimento da empresa ré quanto às proibições de pagamento ou quanto às condicionantes feitas para a sua ocorrência, tendo em vista que a contratada é parte no processo 2014.01.1.003576-9, tendo sido intimada de todas as decisões por meio de publicação no DJe, além de ser parte no processo junto ao Tribunal de Contas do Distrito Federal e de ter, obviamente, acesso ao processo administrativo relativo ao contrato 161/2012, no corpo do qual formulou os pedidos de pagamento das obras realizadas.4.2.15. Feito o juízo de compatibilidade das sanções previstas no art. 12, III, da LIA com a natureza da pessoa jurídica, resta como sanção aplicável à empresa recorrida tão-somente a proibição de contratar com o Poder Público, ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de três anos.5. Apelação do primeiro réu conhecida, rejeitando-se a preliminar e, no mérito, improvida; Apelação do Ministério Público conhecida, não se conhecendo das preliminares alegadas nas contrarrazões do primeiro réu e, no mérito, parcialmente provida, para reformar parcialmente a sentença recorrida e condenar o terceiro e quarto réus por atos de improbidade administrativa, na forma do art. 11 da Lei 8.249/92, com as sanções do art. 12, III, segundo especificação contida no dispositivo deste julgado.
Data do Julgamento
:
14/06/2017
Data da Publicação
:
17/07/2017
Órgão Julgador
:
1ª TURMA CÍVEL
Relator(a)
:
ROMULO DE ARAUJO MENDES
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