main-banner

Jurisprudência


TJDF APC - 1029340-20100112322509APC

Ementa
CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. CONSUMIDOR. AÇÃO INDENIZATÓRIA. MENOR. INTERNAÇÃO EM UTI COM DIAGNÓSTICO DE PNEUMONIA. PARADA CARDIORRESPIRATÓRIA. ATRASO NA CONSTATAÇÃO POR PARTE DA EQUIPE DE ENFERMAGEM. DANOS NEUROLÓGICOS DE NATUREZA GRAVE, TOTAL E PERMANENTEMENTE LIMITANTE DA CRIANÇA. LAUDO PERICIAL. PRESUNÇÃO DE IMPARCIALIDADE. RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA DO HOSPITAL. PRESSUPOSTOS PRESENTES. DANO MORAL. CONFIGURAÇÃO. QUANTUM. REDUÇÃO. OBEDIÊNCIA AOS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE. ADSTRIÇÃO À NORMATIVA DA EFETIVA EXTENSÃO DO DANO. DANOS MATERIAIS. AUSÊNCIA DE IMPUGNAÇÃO RECURSAL. MANUTENÇÃO. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. SENTENÇA REFORMADA EM PARTE. HONORÁRIOS RECURSAIS FIXADOS. 1. Segundo o Enunciado Administrativo n. 3 do STJ, aos recursos interpostos com fundamento no CPC/2015 (relativos a decisões publicadas a partir de 18 de março de 2016), como é o caso dos autos, devem ser exigidos os requisitos de admissibilidade recursal na forma do novo CPC. Nessa situação, por inteligência do Enunciado Administrativo n. 7 do STJ, é possível o arbitramento de honorários sucumbenciais recursais, com base no art. 85, § 11, do CPC/15. 2. A atividade do médico é essencialmente de meio e não de resultado, tendo por finalidade a prestação de cuidados contenciosos e atentos. O médico aceita a incumbência de tratar o paciente, e assume a responsabilidade pelo tratamento que administra, exigindo-se dele a aplicação e o conhecimento adequado das técnicas usuais disponíveis. Reclama-se o exercício da melhor maneira possível, constatando-se a necessária e normal diligência para a profissão, mesmo que não conseguido o resultado almejado (RIZZARDO, Arnaldo., in Responsabilidade civil, 2011, pp. 320-322). 3. A responsabilidade do hospital, em regra, é objetiva, fundada na teoria do risco da atividade, conforme art. 14 do CDC e arts. 186, 187, 927 e 932, III, do CC. Em tais casos, para fins de responsabilização, faz-se necessário demonstrar a falha de serviço cuja atribuição lhe é afeta e a relação de causalidade entre esta e o resultado lesivo alegado, como é o caso dos autos (regularidade ou não na atuação da equipe de enfermagem). 4. No particular, verifica-se que o autor, com diagnóstico de pneumonia, encontrava-se em estado grave, tendo sido encaminhado à UTI do hospital réu em 11/10/2009 e lá permanecido por 3 meses sob a monitoração da equipe de enfermagem. 4.1. No dia 14/10/2009, observa-se que o monitor que demonstrava os sinais vitais do menor apitou de madrugada, razão pela qual seu genitor chamou a equipe de enfermagem, ocasião em que foi informado que estava tudo bem com a criança. Passados 3 minutos, o monitor novamente sinalizou o alarme e o genitor do autor novamente procurou pela equipe de enfermagem que, diante da gravidade do quadro, informou a médica plantonista. 4.2. Segundo o laudo pericial, diante da severidade do quadro clínico apresentado pelo autor em ambiente de UTI, seria esperável e exigível que, na vigência da parada cardiorrespiratória, o atendimento de ressuscitação fosse iniciado de forma rápida. Nesse passo, considerando o histórico de higidez do paciente antes da internação e a resolução posterior do processo infeccioso respiratório, computa-se mais provável que as sequelas neurológicas do menor Lucas tenham como causa mais direta o estado de anóxia cerebral advindo do colapso circulatório (PCR) não rapidamente revertido. Em outras palavras, não se pode afirmar indubitavelmente que houve atraso na constatação da PCR; porém, o conjunto de dados indica ser isso mais consideravelmente provável que o contrário. 4.3. A prova técnica consignou que o cérebro normalmente se recupera sem maiores sequelas em até 4-6 minutos de parada cardiorrespiratória sem atendimento, ressalvada situações excepcionais, tempo este que foi ultrapassado na espécie. Assim, diante do atraso por parte da equipe de enfermagem em constatar o problema que acometia o autor, a despeito do alarme emitido pela máquina, e demora ainda em acionar a médica plantonista, tem-se por configurados os pressupostos da responsabilidade civil objetiva do hospital. 4.4. É certo que, por força do art. 479 do CPC/15, antigo art. 436 do CPC/73, não está o juízo adstrito às conclusões da perícia, mas também é certo que a matéria é essencialmente técnica, inexistindo incongruência nos relatos do profissional responsável. Ao fim e ao cabo, por se encontrar equidistante dos interesses em litígio, milita em favor do laudo pericial realizado em juízo a presunção de imparcialidade, a qual não é afastada tão somente pelo fato de as suas conclusões irem de encontro aos fundamentos do apelo. 5. O dano moral se relaciona diretamente com os prejuízos ocasionados a direitos da personalidade, cuja violação afeta diretamente à dignidade do indivíduo e constitui motivação suficiente para fundamentar uma ação dessa natureza (CF, art. 5º, V e X; CDC, art. 6º, VI). 5.1. Na espécie, o dano moral é evidente (presumido), pois o autor possui sequelas irreversíveis (não fala, não anda, não enxerga, não deglute e é alimentado por gastrostomia, dependendo de terceiros para sua sobrevivência) com nexo na demora no atendimento prestado pelo hospital réu. 6. A quantificação dos danos morais deve obedecer a critérios de razoabilidade e proporcionalidade, levando-se em conta, além da necessidade de compensação dos danos sofridos, as circunstâncias do caso, a gravidade do prejuízo, a situação do ofensor (instituição hospitalar) e a prevenção de comportamentos futuros análogos. Normativa da efetiva extensão do dano (CC, art. 944). 6.1. In casu, a demora na constatação do problema do autor foi a causa provável das sequelas permanentes e irreversíveis que lhe acometeram. Todavia, não se pode precisar com certeza absoluta que, acaso o procedimento de reanimação fosse tempestivo, tais consequências seriam inexistentes. Daí porque, na espécie, vislumbra-se necessária a redução da quantificação para R$ 100.000,00, que melhor atende às peculiaridades do caso concreto e às finalidades do instituto, sem desvirtuar dos precedentes deste TJDFT. 7. É de se manter hígida a condenação do hospital réu ao pagamento dos danos materiais (R$ 1.097,89 e pensão vitalícia de 3 salários mínimos), os quais não foram objeto de impugnação recursal. 8. O tribunal, ao julgar o recurso, majorará os honorários fixados anteriormente levando em conta o trabalho adicional realizado em grau recursal, observando, conforme o caso, o disposto nos §§ 2º a 6º, sendo-lhe vedado, no cômputo geral da fixação de honorários devidos ao advogado do vencedor, ultrapassar os respectivos limites estabelecidos nos §§ 2º (20%) e 3º para a fase de conhecimento (§ 11 do art. 85 do CPC/2015). Nesse prisma, os honorários de 1º Grau foram majorados para 12% sobre o valor da condenação. 9. Recurso conhecido e parcialmente provido para reduzir o valor dos danos morais. Demais termos da sentença mantidos, inclusive quanto à sucumbência. Honorários recursais fixados.

Data do Julgamento : 05/07/2017
Data da Publicação : 11/07/2017
Órgão Julgador : 6ª TURMA CÍVEL
Relator(a) : ALFEU MACHADO
Mostrar discussão