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Jurisprudência


TJDF APC - 1044803-20150210051286APC

Ementa
CONSUMIDOR. CIVIL. PROCESSUAL CIVIL.AÇÃO INDENIZATÓRIA. ACIDENTE DE TRÂNSITO. PRELIMINAR DE NULIDADE DA SENTENÇA, POR VÍCIO DE FUNDAMENTAÇÃO. REJEIÇÃO. COLISÃO ENTRE VEÍCULOS. ÓBITO DO PAI DOS AUTORES. ACIDENTE DE CONSUMO. CONSUMIDOR BYSTANDER.EXCESSO DE VELOCIDADE POR PARTE DO PREPOSTO DA EMPRESA DE TRANSPORTE DE CARGA. CONSTATAÇÃO. CASO FORTUITO/FORÇA MAIOR. NÃO CONFIGURAÇÃO. RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA. PRESSUPOSTOS PRESENTES. DANO MORAL. MORTE DE ENTE FAMILIAR. PREJUÍZO PRESUMIDO. QUANTUM. MANUTENÇÃO. OBEDIÊNCIA AOS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE. PENSÃO EM FAVOR DOS FILHOS MENORES. CABIMENTO. MATÉRIA INCONTROVERSA. TERMO INICIAL. DATA DO SINISTRO. SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA, MAS NÃO EQUIVALENTE. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. VERBA NÃO ABARCADA PELA APÓLICE. IMPUGNAÇÃO À GRATUIDADE. DESCABIMENTO. RECURSOS DESPROVIDOS. SENTENÇA MANTIDA. HONORÁRIOS RECURSAIS ARBITRADOS. 1. Segundo o Enunciado Administrativo n. 3 do STJ, aos recursos interpostos com fundamento no CPC/2015 (relativos a decisões publicadas a partir de 18 de março de 2016), como é o caso dos autos, devem ser exigidos os requisitos de admissibilidade recursal na forma do novo CPC. Nessa situação, por inteligência do Enunciado Administrativo n. 7 do STJ, é possível o arbitramento de honorários sucumbenciais recursais, com base no art. 85, § 11, do CPC/15. 2. Se, por ocasião da sentença, os assuntos elencados pela parte quedaram devidamente apreciados e rechaçados em 1º Grau, segundo as razões de convencimento do julgador, afasta-se a preliminar de nulidade da decisão, por vício de fundamentação. Meras razões de inconformismo com o direito aplicado e com a avaliação probatória não constituem motivação idônea para amparar o pleito de nulidade da decisão. Preliminar rejeitada. 3. O deslinde da controvérsia cinge-se a aferir a existência ou não de responsabilidade civil da 1ª ré e, conseguintemente, da seguradora litisdenunciada, tendo em vista acidente de trânsito envolvendo a colisão de veículos que ocasionou o óbito do pai dos autores. 4. Da análise dos autos, verifica-se que 1ª ré, como transportadora, presta serviços de forma profissionalizada, encaixando-se no conceito de fornecedora do art. 3º do CDC. Assim, considerando que o acidente de trânsito que ocasionou o óbito do pai dos autores veio a ocorrer durante o exercício de suas atividades, tem-se por aplicável, no tocante à aferição da responsabilidade civil, além dos ditames do CC e do CTB, os arts. 14 e 17 do CDC, que trata da natureza objetiva da responsabilização e equipara a consumidor toda pessoa que possa ser atingida pelas atividades da parte fornecedora (bystanders). 5. Para fins de reparação de danos, basta a comprovação do liame de causalidade entre o defeito do serviço e o evento danoso experimentado pelo ofendido, cuja responsabilidade somente poderá ser afastada/minorada nas hipóteses de caso fortuito/força maior (CC, art. 393), inexistência do defeito (CDC, art. 14, § 3º, I) e/ou culpa exclusiva do ofendido ou de terceiros (CDC, art. 14, § 3º, II). 5.1. Especificamente, nas hipóteses de força maior ou caso fortuito, desaparece o nexo de causalidade entre o evento e o prejuízo experimentado, de forma que não haverá obrigação de indenizar (CC, art. 393). Cuida-se, pois, de situação excludente da responsabilidade civil. 6. Do cotejo dos autos, conforme Ocorrência Policial e Laudo de Perícia Criminal, sobressai evidente a ocorrência do acidente de trânsito, em 29/3/2015, na BR 080, envolvendo colisão entre o veículo conduzido por preposto da 1ª ré (V1 - Scania G420 A4x2, acoplada a semirreboques), o veículo em que estava o pai dos autores (V2 - GM/S10, cor branca), o qual veio a óbito por politraumatismo, ação de instrumento contundente, e um 3º veículo (V3 - GM/S10, cor preta). 6.1. Segundo a conclusão aposta no laudo pericial, a causa determinante para o acidente de trânsito foi a perda do controle da direção por parte do condutor do veículo pertencente à 1ª ré (V1), por motivos que não se pôde precisar materialmente, aliada ao excesso de velocidade em relação às condições topográficas do trecho (curva acentuada à direita), resultando em adentrar as faixas de sentido oposto, tombando e colidindo com a GM/S10 de cor branca conduzida pelo pai dos autores (V2) e com a GM/S10 de cor preta (V3). A carga de cal contida nos semirreboques foi projetada para as caminhonetes atingidas. 6.2. A velocidade estimada da Scania era de 90 Km/h, ou seja, bem superior à velocidade permitida para a via no trecho, que era de 60 Km/h, sinalizada por placas de regulamentação. Ainda que se leve em consideração a margem de 7 km/h de reserva infracional inserta na Resolução n. 396 do CONTRAN, tal peculiaridade não é capaz de afastar o excesso de velocidade desenvolvido por seu preposto, responsável pelo incidente, não havendo falar em caso fortuito/força maior. 6.3. Desse modo, em razão da infringência ao dever de cuidado objetivo, nos termos dos arts. 186, 187, 927, 932, III e 933 do CC, 28, 29, II, 43 e 61 do CTB e 14 e 17 do CDC, evidente a responsabilidade civil objetiva da 1ª ré quanto aos danos advindos do acidente de trânsito que seu preposto deu causa e, conseguintemente, o dever de indenizar, cuja obrigação também recai de forma direta a 2ª ré, na qualidade de litisdenunciada, em razão da relação contratual de seguro, observados os limites pactuados. 7. O dano moral se relaciona diretamente com os prejuízos ocasionados a direitos da personalidade, cuja violação afeta diretamente à dignidade do indivíduo e constitui motivação suficiente para fundamentar uma ação dessa natureza. (CF, art. 5º, V e X; CDC, art. 6º, VI). 7.1. As circunstâncias fáticas narradas são capazes de atentar contra direitos da personalidade, sendo evidente o dano moral in re ipsa experimentado pelos parentes da vítima. A morte de um ente familiar querido, na qualidade de pai dos autores, a toda evidência, desencadeia naturalmente uma sensação dolorosa de fácil e objetiva percepção, dispensada demonstração, notadamente em razão da imprevisibilidade do evento. É o que se chama de danos morais reflexos ou por ricochete. Ou seja, embora o evento danoso tenha afetado determinada pessoa, seus efeitos acabam por atingir, indiretamente, a integridade moral de terceiros (préjudice d'affection). 7.2. O valor dos danos morais deve obedecer a critérios de razoabilidade e proporcionalidade, levando-se em conta, além da necessidade de reparação dos danos sofridos, as circunstâncias do caso, a gravidade do prejuízo, a situação do ofensor, a condição do ofendido e a prevenção de comportamentos futuros análogos. O valor pecuniário não pode ser fonte de obtenção de vantagem indevida (CC, art. 884), mas também não pode ser irrisório, para não fomentar comportamentos irresponsáveis. Normativa da efetiva extensão do dano (CC, art. 944). Nessa ótica, mantém-se o valor dos danos morais, de R$ 40.000,00 para cada autor. 8. Ante a ausência de impugnação recursal, conforme art. 950 do CC, não há controvérsia quanto à necessidade de pagamento de pensão em favor dos autores, na qualidade de filhos e dependentes do de cujus, bem assim no que toca ao valor fixado (16,10% do salário mínimo a cada beneficiário, incluindo 13ª salário e férias) e ao termo final do pensionamento (até que cada beneficiário complete 25 anos). A controvérsia paira tão somente em relação ao termo inicial para pagamento retroativo das parcelas da pensão, em razão da antecipação de tutela e da possibilidade de pagamento em duplicidade. 8.1. O deferimento da antecipação dos efeitos da tutela não esgota a prestação jurisdicional, dada a natureza provisória da medida, devendo ser confirmada por sentença que extingue o feito com julgamento de mérito, como é o caso dos autos. Nesse passo, tem-se por escorreito o termo inicial do pensionamento, qual seja, a data do evento danoso, não havendo falar em alteração sob o pálio de pagamento em duplicidade e de enriquecimento sem causa. Isso porque a r. sentença foi clara ao consignar que o pagamento dessa verba obedecerá ao limite da apólice de seguro e ao abatimento do montante efetivamente já adimplido a esse título, evitando esses efeitos. 9. Da análise universal da demanda, verifica-se que a parte autora logrou êxito em relação à fixação de pensionamento e ao pagamento de danos morais, sagrando-se vencida em relação ao valor pleiteado a título de pensão. Dessa feita, evidencia-se a ocorrência de sucumbência recíproca, mas não equivalente, entre os litigantes, mostrando-se escorreito o rateio efetuado em 1º Grau na demanda principal, à razão de 25% para os autores e de 75% para a 1ª ré (CPC/73, art. 21; CPC/15, art. 86), inexistindo sucumbência mínima capaz de determinar que os primeiros arquem com a totalidade desses encargos. 9.1. Não prospera a alegação da 1ª ré de que caberia à litisdenunciada arcar com a verba honorária e com as despesas processuais arbitradas em seu desfavor, em razão das disposições do contrato de seguro, pois tais encargos não são abarcados pelas coberturas contratadas. 10. Sem guarida a impugnação lacônica à gratuidade de justiça formulada pela 1ª ré, haja vista que o quadro fático probatório dos autos demonstra a impossibilidade dos autores de arcarem com o pagamento das custas do processo sem prejuízo próprio, legitimando a concessão da benesse. A alegação de que os mesmos lograram êxito em relação aos danos morais e que, em razão disso, não poderiam ser beneficiários da gratuidade de justiça, não se presta a esse desiderato (CPC/15, art. 373, II), mesmo porque tal montante ainda não integra a esfera patrimonial de cada um. 11. Preliminar de nulidade da sentença rejeitada. Recursos de apelação conhecidos e desprovidos. Sentença mantida. Honorários recursais fixados.

Data do Julgamento : 06/09/2017
Data da Publicação : 12/09/2017
Órgão Julgador : 6ª TURMA CÍVEL
Relator(a) : ALFEU MACHADO
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