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Jurisprudência


TJDF APC - 1059613-20150111236025APC

Ementa
CONSTITUCIONAL, CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. CAUSA DE PEDIR. ALEGAÇÃO DE ABUSO DO DIREITO DE LITIGAR. USO DO PROCESSO PARA ALCANÇAR OBJETIVO ILEGAL. CONFIGURAÇÃO DA SHAM LITIGATION. ELEMENTO SUBJETIVO. DOLO. INEXISTÊNCIA. OBJETIVO ANTICONCORRENCIAL. AÇÕES POPULARES. EXERCÍCIO REGULAR DO DIREITO. PRETENSÕES ABUSIVAS E DESARRAZOADAS. INEXISTÊNCIA. ABUSO. NÃO CARACTERIZAÇÃO. ALTERAÇÃO DA VERDADE DOS FATOS. INEXISTÊNCIA. ATO ILÍCITO. INOCORRÊNCIA. NÃO DEMONSTRAÇÃO DO FATO CONSTITUTIVO DO DIREITO ALEGADO. DANO MORAL NÃO CONFIGURADO. PRELIMINAR. JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE. PROVA TESTEMUNHAL DESNECESSÁRIA. APREENSÃO DE ELEMENTOS SUBJETIVOS. IRRELEVÂNCIA E IMPERTINÊNCIA. CERCEAMENTO DE DEFESA. INEXISTÊNCIA.PEDIDO INICIAL E RECONVENCIONAL REJEITADOS. HONORÁRIOS RECURSAIS. MAJORAÇÃO DA VERBA ORIGINALMENTE FIXADA. SENTENÇA E APELOS FORMULADOS SOB A ÉGIDE DA NOVA CODIFICAÇÃO PROCESSUAL CIVIL (NCPC, ART. 85, §§ 2º E 11). SENTENÇA MANTIDA. 1. Emergindo a pretensão da alegação de abuso do direito de demandar, ensejando a qualificação da sham litigatione irradiando dano moral à afetada pelo exercício abusivo do direito de ação, o aduzido deve ser materializado mediante prova de natureza exclusivamente documental, porquanto o abuso deve ser materializado mediante comprovação das lides aviadas e cotejo dos argumentos nelas formulados, tornando descabida a produção de prova volvida a aparelhar o formulado, notadamente quando destinada a viabilizar a apreensão do movel subjetivo que norteara a propositura das lides reputadas abusivas, e autorizando o julgamento antecipado da ação sem que haja a qualificação de cerceamento de defesa. 2. Ao Juiz, como destinatário final da prova, é assegurado o poder de dispensar as provas reputadas desnecessárias por já estarem os fatos devidamente aparelhados, consubstanciando o indeferimento de medidas ou dilação probatória inúteis ao desate da lide sob essa moldura expressão do princípio da livre convicção e da autoridade que lhe é resguardada pelo artigo 370 do estatuto processual vigente, não encerando cerceamento de defesa se qualificado que a dilação postulada não era apta a irradiar qualquer subsídio material relevante para o desate do litígio. 3. No ambiente do direito constitucional e processual brasileiro o direito de ação encerra direito e garantia fundamental (CF, art. 5º, XXV), encontrando ressonância, inclusive, na assimilação da teoria da asserção pelo legislador processual, segundo a qual o aviamento da pretensão não tem como premissa a subsistência do direito invocado, mas tão somente que emirja de argumentação apta a irradiá-lo, consubstanciando sua apreensão ou elisão questões a serem resolvidas somente ao final sob a égide do devido processo legal. 4. A sham litigation, teoria originária do direito norte americano, traduz a provocação desarrazoada do Poder Judiciário mediante o ajuizamento de demandas destituídas de qualquer fundamento com o único objetivo, não de a parte ter seu pleito atendido, mas de prejudicar um concorrente direto, reclamando, para a caracterização do fato, a conjugação de precípua de dois requisitos, quais sejam, que a demanda ajuizada seja desprovida de qualquer perspectiva de sucesso e que tenha a finalidade de prejudicar um concorrente. 5. Implicando a sham litigationo uso desvirtuado do direito subjetivo de ação, que é corrompido e desvirtuado da sua gênese, pois manejado para prejudicar um concorrente, e não para perseguir legitimamente direito ostentado pela parte, sua qualificação encontra, no direito brasileiro, ressonância no disposto no artigo 80, inciso III, do estatuto processual, que reputa litigante de má-fé aquele que usa o processo para obter objetivo ilegal. 6. Consubstanciando o direito de ação direito e garantia fundamental, deve ser manejado de forma legítima e no formato do devido processual, exigindo a sistemática processual lealdade processual de todos os atores processuais, alinhavando o artigo 80 do estatuto processual as hipóteses de condutas abusivas que ensejam a qualificação da litigância de má-fé ante o desvirtuamento do manejo das faculdades e dos direitos conferidos a quem litiga, afastando-se a lide dos seus fins e utilidade, corrompendo ilegitimamente o processo, ensejando o desvirtuamento do seu fim teleológico. 7. Aliado à postura processual do litigante, o reconhecimento do abuso do direito de litigar reclama a constatação do elemento subjetivo, à medida em que a má-fé processual equivale à antítese da boa-fé inscrita como dever inerente a todo litigante (CPC, art. 5º), que equivale à boa-fé subjetiva, donde, para a configuração da litigância de má-fé, o litigante deve atuar dolosamente e em contradição com a finalidade do processo, através da violação da verdade e do abuso dos atos processuais, não podendo ser assimilado como corrupção processual o manejo de ações devidamente lastreadas, ainda que o pedido venha a ser ao final refutado. 8. A qualificação da litigância de má-fé sob o prisma de que a parte usa do processo para conseguir o objetivo ilegal de frustrar a livre concorrência, irradiando o fenômeno da sham litigation, a par dos contornos objetivos, somente se qualifica, diante do elemento volitivo indispensável, quando divisada a convicção da parte de alcançar pretensão legalmente repugnada mediante artifícios processuais, não se divisando quando, apesar da pluralidade, as diversas demandas ajuizadas encontram-se genuinamente fundamentadas. 9. Derivando a sham litigation da corrupção do processo com o objetivo deliberado de prejudicar um concorrente direto, ao invés de ser manejado para a realização de direito próprio da parte, aliado à ausência do elemento volitivo subjetivo, não se torna passível de ser reconhecida com base na previsão que repugna a utilização do processo como instrumento para obtenção de objetivo ilegal diante da apreensão de que as ações reputadas abusivas não foram manejadas por concorrentes nem que os autores das pretensões ofereceram suas personalidades simplesmente para o manejo das demandas. 10. A qualificação da litigância de má-fé sob o prisma de que a parte alterara a verdade dos fatos emerge do dever de veracidade contido no dever de lealdade, demandando sua qualificação com a aferição de que a parte, que traz inverdade, tinha ciência de que o fato alegado não era verdadeiro, não se qualificando o mero equívoco como má-fé processual, uma vez que está desprovido de deslealdade e da intenção de prejudicar a parte contrária, e, outrossim, a qualificação da litigância de má-fé sob a imprecação de que o processo fora usado para obtenção de objetivo ilegal não deriva do pedido mediato almejado, mas da subversão do rito processual de forma a desvirtuá-lo do seu desiderato natural (CPC, art. 80, II e III). 11. A caracterização do dano como pressuposto da responsabilidade civil consubstancia verdadeiro truísmo, à medida que, estando plasmada no princípio de que, emergindo do ato comissivo ou omisso praticado por alguém efeito danoso a terceiro, o havido caracteriza-se como ato ilícito, por ter afetado a esfera jurídica do lesado, tornando seu protagonista obrigado a compor os efeitos que irradiara da sua conduta, implicando que, inexistente o fato que, ofendendo a ordem jurídica, encerraria ato ilícito e deflagraria a obrigação indenizatória, não se aperfeiçoa o silogismo indispensável à germinação da obrigação reparatória diante da ausência de nexo causal enlaçando a lesão a fato imputável ao agente reputado protagonista do ilícito (CC, arts. 186 e 927). 12. Editada a sentença e aviado o apelo sob a égide da nova codificação civil, o desprovimento do recurso implica a majoração dos honorários advocatícios originalmente imputados à parte recorrente, porquanto o novo estatuto processual contemplara o instituto dos honorários sucumbenciais recursais, devendo a majoração ser levada a efeito mediante ponderação dos serviços executados na fase recursal pelos patronos da parte exitosa e guardar observância à limitação da verba honorária estabelecida para a fase de conhecimento (NCPC, arts. 85, §§ 2º e 11). 13. Apelações conhecidas e desprovidas. Preliminar rejeitada. Majorados os honorários advocatícios. Unânime.

Data do Julgamento : 08/11/2017
Data da Publicação : 22/11/2017
Órgão Julgador : 1ª TURMA CÍVEL
Relator(a) : TEÓFILO CAETANO
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