main-banner

Jurisprudência


TJDF APC - 1062460-20110111733823APC

Ementa
DIREITO CIVIL E DO CONSUMIDOR. AÇÃO INDENIZATÓRIA POR DANOS MATERIAIS, ESTÉTICOS E MORAIS. PACIENTE. INTERVENÇÃO CIRÚRGICA. INFECÇÃO POR MICROBACTÉRIA. DEFEITO NA PRESTAÇÃO DOS SERVIÇOS. IMPUTAÇÃO AO ESTABELECIMENTO NO QUAL REALIZADA A CIRURGIA. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. TEORIA DO RISCO DA ATIVIDADE. INFECÇÃO ORIGINÁRIA DO PROCEDIMENTO CIRÚRGICO. ESTERILIZAÇÃO DOS MATERIAIS VIDEO-CIRÚRGICOS. MÉTODO UTILIZADO. RECOMENDAÇÃO DA ANVISA VIGENTE À ÉPOCA. OBSERVÂNCIA. INADEQUAÇÃO DO PROCEDIMENTO (RDC / ANVISA Nº. 08). CONSTATAÇÃO POSTERIOR PELO ÓRGÃO OFICIAL. IRRELEVÂNCIA. LAUDO PERICIAL. CONCLUSÕES. NÃO INFIRMAÇÃO. FALHA NOS SERVIÇOS. ELISÃO. ERRO MÉDICO. CONDUTA NEGLIGENTE. INOCORRÊNCIA. ATO ILÍCITO. INEXISTÊNCIA. INDENIZAÇÃO INDEVIDA. RESPONSABILIZAÇÃO OBJETIVA AFASTADA (CDC, ART. 14, § 3º, I). PEDIDOS REJEITADOS. SENTENÇA PRESERVADA. APELAÇÃO. PRINCÍPIO DA CONGRUÊNCIA. OBSERVÂNCIA. FATOS E FUNDAMENTOS APTOS A APARELHAREM O INCONFORMISMO E ENSEJAREM A REFORMA DA SENTENÇA. CONHECIMENTO DO APELO. PRELIMINAR DE ILEGITIMIDADE RENOVADA EM CONTRARRAZÕES. ARGUIÇÃO RESOLVIDA POR DECISÃO JUDICIAL. AUSÊNCIA DE RECURSO ESPECÍFICO. PRECLUSÃO E COISA JULGADA. APERFEIÇOAMENTO. NÃO CONHECIMENTO. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO. HONORÁRIOS RECURSAIS. MAJORAÇÃO DA VERBA (CPC, ART. 85, §§ 2º e 11). 1. A peça recursal que, atinada com o resolvido originariamente, alinhava argumentação crítica destinada a infirmar o acerto do decidido e obter sua reforma, contemplando, ainda, pedido reformatório coadunado com o provimento monocrático na parte desfavorável ao recorrente, atende às exigências inerentes ao princípio da correlação e ao alinhamento dos fatos e fundamentos aptos a ensejarem a reforma do decisum devolvido a reexame, suprindo os requisitos formais que lhe são exigidos, determinando que o recurso que pauta seja conhecido como expressão do acesso ao duplo grau de jurisdição inerente ao devido processo legal (NCPC, art. 1.010, II, III e IV). 2. Resolvida a arguição preliminar de ilegitimidade, a inércia da parte suscitante defronte o decidido, deixando transcorrer em branco o prazo recursal correlato, enseja o aperfeiçoamento da preclusão sobre a questão, obstando que seja renovada em sede de contrarrazões, pois não traduz instrumento adequado para devolução a reexame de quaisquer questões decididas, destinando-se exclusiva e tão somente a refutar a pretensão reformatória aduzida pela parte contrária, o que compreende, inclusive, as matérias de ordem pública, pois, a despeito da natureza que ostentam, não estão imunes aos efeitos da coisa julgada e da preclusão ao serem transmudadas em questão processual e resolvidas. 3. Conquanto o relacionamento do paciente com o estabelecimento hospitalar no qual lhe é ministrado tratamento ambulatorial ou cirúrgico encarte relação de consumo, a responsabilidade da pessoa jurídica fornecedora dos serviços hospitalares ostenta natureza objetiva sob a modalidade do risco da atividade, não sendo pautada pela teoria do risco integral, emergindo dessa modulação que, imputada a ocorrência de defeito na prestação dos serviços que fomentara a entidade hospitalar decorrente de deficiência da esterilização das instalações e equipamentos que integraram o acervo material colocado à disposição da equipe médica e fora utilizado na execução dos serviços cirúrgicos prestados, a apreensão da sua responsabilidade defronte as intercorrências havidas deve ser efetivada sob o sistema objetivo, conforme o disposto no artigo 14 do CDC. 4. Ostentando a responsabilidade do estabelecimento hospitalar natureza objetiva face aos serviços fomentados ao paciente que é tratado nas suas dependências, a imputação de defeito no fomento dos serviços, ensejando danos ao consumidor, enseja que lhe seja transmitido o encargo de evidenciar que, prestado o serviço, a falha imputada não subsistira ou o dano derivara de culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro, ou seja, ao prestador de serviços é transmitido o encargo de ilidir a falha imprecada aos serviços que fomentara (CDC, art. 14, § 3º). 5. A despeito de atestado por perícia técnica que, submetida a intervenção cirúrgica em ambiente hospitalar, a paciente viera a ser acometida de infecção bacteriana que ensejara a realização de novo procedimento destinado a corrigir as sequelas do processo infeccioso e a penoso tratamento antibiótico, e que, ademais, a origem da contaminação fora proveniente da desinfecção do sítio cirúrgico, não se afigura consoante o sistema da responsabilidade civil objetiva pelo risco da atividade se reputar o nosocômio responsável pelo havido se corroborado pelo experto que a infecção por microbactéria não decorrera da inobservância dos protocolos vigentes à época e recomendados para esterilização química dos instrumentos e materiais vídeo-cirúrgicos utilizados, porquanto importaria a responsabilização do hospital sob o prisma da teoria do risco integral. 6. Inobstante tenha a Agência Nacional de Vigilância Sanitária - ANVISA iniciado procedimento investigativo em razão do surto nacional de infecções causadas pelo mesmo agente bacteriológico (Mycobacterium massilense) e constatada a inadequação do método químico de esterilização dos instrumentos cirúrgicos até então recomendado oficialmente, vindo o órgão, inclusive, a proibi-lo em momento posterior (RDC/ ANVISA nº. 08), o havido não implica a configuração de negligência do estabelecimento hospitalar perante os deveres que lhe estão afetos na adoção de medidas profiláticas de prevenção infecciosa se, à época do procedimento cirúrgico realizado pela paciente acometida da infecção, o método de esterilização utilizado ainda era oficialmente indicado e aceitável. 7. Elidida a tese de que o estabelecimento hospitalar tenha sido negligente na observância dos procedimentos de assepsia sanitária, sobressaindo dos elementos materiais de prova, ao revés, que houvera obediência aos protocolos de higiene hospitalar vigente à época dos fatos, recomendando-se a esterilização dos materiais utilizados em vídeo-cirúrgia por meio químico de imersão, e, ainda, evidenciada a inexistência de qualquer falha na conduta dos profissionais, que realizaram os procedimentos médico-cirúrgicos em conformidade aos conhecimentos técnicos e à literatura médica, resta por afastada a falha imputada aos serviços fomentados, tornando inviável a responsabilização do hospital e da equipe médica, pois infirmado o defeito que lhes fora imprecado, rompendo o nexo de causalidade enlaçando os efeitos experimentados e qualquer ato passível de irradiar a responsabilidade civil (CDC, art. 14, § 3º, I). 8. Cediço que o juiz não está adstrito ao laudo pericial, podendo, consoante legitima o princípio do livre convencimento motivado ou da persuasão racional, formar livremente sua convicção mediante ponderação do conjunto probatório reunido, não se afigurando viável, contudo, desprezar o laudo técnico se não sobejam elementos probatórios desqualificando-o, corroborando o acervo reunido, em cotejo com a literatura técnica especializada, o acerto das assertivas que contempla. 9. Consubstancia verdadeiro truísmo que os pressupostos da responsabilidade civil, de acordo com o estampado nos artigos 186 e 927 do Código Civil, são (i) a caracterização de ato ilícito proveniente de ação ou omissão do agente, (ii) a culpa do agente, (iii) o resultado danoso originário do ato (iv) e o nexo de causalidade enlaçando a conduta ao efeito danoso, emergindo dessas premissas normativas que, não evidenciado o fato gerador que alicerça a pretensão, porquanto ilidido o defeito imputado aos serviços fomentados, restando obstada a apreensão da subsistência do fato constitutivo do direito invocado, o silogismo necessário à germinação da obrigação indenizatória não se aperfeiçoa, determinando a rejeição do pedido formulado na exata tradução da regra inserta no artigo 373, incisos I e II, do NCPC e do regramento contido no artigo 14, § 3º, inciso I, do CDC. 10. Editada a sentença e aviado o apelo sob a égide da nova codificação processual civil, o desprovimento do recurso implica a majoração dos honorários advocatícios originalmente impostos à parte recorrente em ponderação com o resultado obtido e com os serviços realizados no grau recursal, porquanto o novo estatuto processual contemplara o instituto dos honorários recursais, ressalvado que a mensuração da verba deve ser levada a efeito mediante ponderação dos serviços executados na fase recursal pelo patrono da parte exitosa (NCPC, art. 85, §§ 2º e 11). 11. Apelação da autora conhecida e desprovida. Preliminares rejeitadas. Honorários advocatícios recursais fixados. Unânime.

Data do Julgamento : 22/11/2017
Data da Publicação : 04/12/2017
Órgão Julgador : 1ª TURMA CÍVEL
Relator(a) : TEÓFILO CAETANO
Mostrar discussão