TJDF APC - 1063399-20150310221652APC
DIREITO PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO. AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA EM GARANTIA. RÉU PRESO. CONTESTAÇÃO APRESENTADA PELA CURADORIA ESPECIAL. RESTITUIÇÃO DE PRAZO PARA APRESENTAÇÃO DE NOVA CONTESTAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. PRECLUSÃO CONSUMATIVA. PRELIMINAR DE NULIDADE DA SENTENÇA REJEITADA. TEORIA DO ADIMPLEMENTO SUBSTANCIAL. INAPLICABILIDADE. DECRETO LEI 911/69. LEI ESPECIAL. PAGAMENTO DA INTEGRALIDADE DO DÉBITO. RECURSO PROVIDO. SENTENÇA CASSADA. 1. O processo se constitui de uma sucessão de atos jurídicos destinados a alcançar um fim, que é a prestação da tutela jurisdicional, seja ela favorável ou não aos interesses da parte. Ou seja, é composto de uma estrutura progressiva de preclusões, as quais permitem o desencadeamento das fases processuais de modo a possibilitar uma irreversibilidade. 2. A preclusão indica a perda da faculdade processual, pelo seu não uso dentro do prazo peremptório previsto pela lei (preclusão temporal), ou, pelo fato de já havê-la exercido (preclusão consumativa), ou, ainda, pela prática de ato incompatível com aquele que se pretenda exercitar no processo (preclusão lógica). 2.1 Incasu,houve preclusão consumativa. Apresentada a contestação pela Curadoria Especial, não há que se falar em restituição de prazo para apresentação de nova contestação. Preliminar de nulidade da sentença rejeitada. 3. Nos termos da súmula 381 do STJ é defeso que o órgão julgador revise de ofício todo o contrato e seus encargos, a fim de identificar eventuais abusividades, sendo obrigação da parte interessada definir os contornos objetivos da lide quando da apresentação de sua pretensão. 4. In casu, não tendo o réu reiterados as teses apresentadas na contestação quanto à ausência de mora, ilegalidade da capitalização de juros e da cobrança de tarifa de cadastro e registro de contrato, nas quais restou sucumbente, não há como o julgador se manifestar sobre esse ponto, sob pena de violação aos princípios recursais e de julgamento extra, citra eultra petita. 5. Pela teoria do adimplemento substancial, observado o pagamento significativo do valor do contrato, conserva-se o negócio jurídico, como exceção à regra geral de que o pagamento deve se dar por completo (princípio da integralidade), em observância aos princípios da proporcionalidade, da razoabilidade e da boa-fé contratual, bem como à manutenção e continuidade da avença. 5.1 Paraa configuração do adimplemento substancial são necessários os seguintes pressupostos: a) cumprimento expressivo do contrato; b) prestação realizada que atenda à finalidade do negócio jurídico; c) boa-fé objetiva na execução do contrato; d) preservação do equilíbrio contratual; e) ausência de enriquecimento sem causa e de abuso de direito, de parte a parte. 6. No contrato de financiamento para aquisição de veículo automotor com cláusula alienação fiduciária, a fim de garantir o adimplemento da avença, as partes estipulam uma condição resolutiva segundo a qual o contratante tem a posse e propriedade resolúvel do bem que, desde que não se verifique o inadimplemento contratual, serão consolidadas no seu patrimônio livres do mencionado gravame. Entretanto, constatado o inadimplemento contratual, o credor poderá requerer a resolução do instrumento em questão e a consolidação da posse e da propriedade do bem. 7. O Código Civil, nos artigos 1.361 a 1.368-A, limitou-se a disciplinar a propriedade fiduciária sobre bens móveis infungíveis. Em relação às demais espécies de bem, a propriedade fiduciária sobre eles constituída é disciplinada, cada qual, por lei especial própria para tal propósito. A incidência subsidiária do Código Civil, em relação à propriedade/titularidade fiduciária sobre bens que não sejam móveis infungíveis, regulada por leis especiais, é excepcional, somente se afigurando possível no caso em que o regramento específico apresentar lacunas e a solução ofertada pela lei geral não se contrapuser às especificidades do instituto regulado pela mencionada lei. 8. O Decreto-Lei nº 911/69 estabelece normas processuais acerca das obrigações contratuais garantidas mediante alienação fiduciária e, em seu artigo 3º estabelece a possibilidade do credor, desde que comprovada a mora, requerer a busca e apreensão do bem alienado fiduciariamente, a qual será concedida liminarmente, sendo irrelevante, para isso, qualquer consideração acerca da medida do inadimplemento. 8.1 Além de não tecer qualquer restrição à utilização da ação de busca e apreensão em razão da extensão da mora ou da proporção do inadimplemento, preconizou, expressamente, que a restituição do bem livre de ônus ao devedor fiduciante é condicionada ao pagamento da integralidade da dívida pendente, segundo os valores apresentados pelo credor fiduciário na inicial. 9. É incongruente inviabilizar a utilização da ação de busca e apreensão na hipótese em que o inadimplemento revela-se incontroverso - independentemente de sua extensão -, quando a lei especial de regência expressamente condiciona a possibilidade de o bem ficar com o devedor fiduciário ao pagamento da integralidade da dívida pendente. 10. Tem-se por absolutamente imprópria a invocação da teoria do adimplemento substancial (não prevista em lei, mas que seria um consectário do princípio da boa-fé contratual, insculpido no artigo 422 do Código Civil), como fundamento idôneo a afastar o legítimo direito de ação do credor fiduciário de promover a busca e apreensão do bem, para, valendo-se da garantia fiduciária ajustada, compelir o devedor fiduciante a honrar a sua obrigação inadimplida, tal como lhe confere expressamente a específica lei de regência. 11. Aaplicação da teoria do adimplemento substancial, para obstar a utilização da ação de busca e apreensão, nesse contexto, é um incentivo ao inadimplemento das últimas parcelas contratuais, com o nítido propósito de desestimular o credor - numa avaliação de custo-benefício - de satisfazer seu crédito por outras vias judiciais, menos eficazes, o que, a toda evidência, aparta-se da boa-fé contratual propugnada. 12. Apelação conhecida e desprovida. Sentença mantida.
Ementa
DIREITO PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO. AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA EM GARANTIA. RÉU PRESO. CONTESTAÇÃO APRESENTADA PELA CURADORIA ESPECIAL. RESTITUIÇÃO DE PRAZO PARA APRESENTAÇÃO DE NOVA CONTESTAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. PRECLUSÃO CONSUMATIVA. PRELIMINAR DE NULIDADE DA SENTENÇA REJEITADA. TEORIA DO ADIMPLEMENTO SUBSTANCIAL. INAPLICABILIDADE. DECRETO LEI 911/69. LEI ESPECIAL. PAGAMENTO DA INTEGRALIDADE DO DÉBITO. RECURSO PROVIDO. SENTENÇA CASSADA. 1. O processo se constitui de uma sucessão de atos jurídicos destinados a alcançar um fim, que é a prestação da tutela jurisdicional, seja ela favorável ou não aos interesses da parte. Ou seja, é composto de uma estrutura progressiva de preclusões, as quais permitem o desencadeamento das fases processuais de modo a possibilitar uma irreversibilidade. 2. A preclusão indica a perda da faculdade processual, pelo seu não uso dentro do prazo peremptório previsto pela lei (preclusão temporal), ou, pelo fato de já havê-la exercido (preclusão consumativa), ou, ainda, pela prática de ato incompatível com aquele que se pretenda exercitar no processo (preclusão lógica). 2.1 Incasu,houve preclusão consumativa. Apresentada a contestação pela Curadoria Especial, não há que se falar em restituição de prazo para apresentação de nova contestação. Preliminar de nulidade da sentença rejeitada. 3. Nos termos da súmula 381 do STJ é defeso que o órgão julgador revise de ofício todo o contrato e seus encargos, a fim de identificar eventuais abusividades, sendo obrigação da parte interessada definir os contornos objetivos da lide quando da apresentação de sua pretensão. 4. In casu, não tendo o réu reiterados as teses apresentadas na contestação quanto à ausência de mora, ilegalidade da capitalização de juros e da cobrança de tarifa de cadastro e registro de contrato, nas quais restou sucumbente, não há como o julgador se manifestar sobre esse ponto, sob pena de violação aos princípios recursais e de julgamento extra, citra eultra petita. 5. Pela teoria do adimplemento substancial, observado o pagamento significativo do valor do contrato, conserva-se o negócio jurídico, como exceção à regra geral de que o pagamento deve se dar por completo (princípio da integralidade), em observância aos princípios da proporcionalidade, da razoabilidade e da boa-fé contratual, bem como à manutenção e continuidade da avença. 5.1 Paraa configuração do adimplemento substancial são necessários os seguintes pressupostos: a) cumprimento expressivo do contrato; b) prestação realizada que atenda à finalidade do negócio jurídico; c) boa-fé objetiva na execução do contrato; d) preservação do equilíbrio contratual; e) ausência de enriquecimento sem causa e de abuso de direito, de parte a parte. 6. No contrato de financiamento para aquisição de veículo automotor com cláusula alienação fiduciária, a fim de garantir o adimplemento da avença, as partes estipulam uma condição resolutiva segundo a qual o contratante tem a posse e propriedade resolúvel do bem que, desde que não se verifique o inadimplemento contratual, serão consolidadas no seu patrimônio livres do mencionado gravame. Entretanto, constatado o inadimplemento contratual, o credor poderá requerer a resolução do instrumento em questão e a consolidação da posse e da propriedade do bem. 7. O Código Civil, nos artigos 1.361 a 1.368-A, limitou-se a disciplinar a propriedade fiduciária sobre bens móveis infungíveis. Em relação às demais espécies de bem, a propriedade fiduciária sobre eles constituída é disciplinada, cada qual, por lei especial própria para tal propósito. A incidência subsidiária do Código Civil, em relação à propriedade/titularidade fiduciária sobre bens que não sejam móveis infungíveis, regulada por leis especiais, é excepcional, somente se afigurando possível no caso em que o regramento específico apresentar lacunas e a solução ofertada pela lei geral não se contrapuser às especificidades do instituto regulado pela mencionada lei. 8. O Decreto-Lei nº 911/69 estabelece normas processuais acerca das obrigações contratuais garantidas mediante alienação fiduciária e, em seu artigo 3º estabelece a possibilidade do credor, desde que comprovada a mora, requerer a busca e apreensão do bem alienado fiduciariamente, a qual será concedida liminarmente, sendo irrelevante, para isso, qualquer consideração acerca da medida do inadimplemento. 8.1 Além de não tecer qualquer restrição à utilização da ação de busca e apreensão em razão da extensão da mora ou da proporção do inadimplemento, preconizou, expressamente, que a restituição do bem livre de ônus ao devedor fiduciante é condicionada ao pagamento da integralidade da dívida pendente, segundo os valores apresentados pelo credor fiduciário na inicial. 9. É incongruente inviabilizar a utilização da ação de busca e apreensão na hipótese em que o inadimplemento revela-se incontroverso - independentemente de sua extensão -, quando a lei especial de regência expressamente condiciona a possibilidade de o bem ficar com o devedor fiduciário ao pagamento da integralidade da dívida pendente. 10. Tem-se por absolutamente imprópria a invocação da teoria do adimplemento substancial (não prevista em lei, mas que seria um consectário do princípio da boa-fé contratual, insculpido no artigo 422 do Código Civil), como fundamento idôneo a afastar o legítimo direito de ação do credor fiduciário de promover a busca e apreensão do bem, para, valendo-se da garantia fiduciária ajustada, compelir o devedor fiduciante a honrar a sua obrigação inadimplida, tal como lhe confere expressamente a específica lei de regência. 11. Aaplicação da teoria do adimplemento substancial, para obstar a utilização da ação de busca e apreensão, nesse contexto, é um incentivo ao inadimplemento das últimas parcelas contratuais, com o nítido propósito de desestimular o credor - numa avaliação de custo-benefício - de satisfazer seu crédito por outras vias judiciais, menos eficazes, o que, a toda evidência, aparta-se da boa-fé contratual propugnada. 12. Apelação conhecida e desprovida. Sentença mantida.
Data do Julgamento
:
29/11/2017
Data da Publicação
:
05/12/2017
Órgão Julgador
:
6ª TURMA CÍVEL
Relator(a)
:
ALFEU MACHADO
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