TJDF APC - 1064547-20150111390987APC
CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO PAULIANA. ANULAÇÃO DE NEGÓCIO JURÍDICO. FIANÇA LOCATÍCIA. FIADORA. CELEBRAÇÃO DE INSTRUMENTO PARTICULAR DE CESSÃO DE DIREITOS DE IMÓVEL. PRETENSÃO FORMULADA PELO CREDOR PREJUDICADO. INSTRUMENTO FORMALIZADO COM DATA RETROATIVA. ALEGAÇÃO. RECONHECIMENTO DAS FIRMAS DAS CONTRATADAS. FALSIDADE. LEGITIMIDADE ATESTADA PELO TABELIONATO DO QUAL TERIA EMERGIDO O CHANCELAMENTO. SELO DIGITAL INEXISTENTE. AFERIÇÃO. SIMULAÇÃO. NEGÓCIO CONSUMADO EM FRAUDE CONTRA CREDORES. EVIDENCIAÇÃO. IMPUGNAÇÃO DO VALOR DADO À CAUSA. REGRAMENTO VIGORANTE À ÉPOCA. VALOR DO CONTRATO. OBSERVÂNCIA (CPC/73, ART. 259, V). REJEIÇÃO. DECADÊNCIA. PRAZO QUADRIENAL (CC, ART. 178, II). TERMO INICIAL. DATA DA REALIZAÇÃO DO NEGÓCIO. INAPLICABILIDADE. EXCEPCIONALIDADE DO CASO. SIMULAÇÃO DE NEGÓCIO. INSTRUMENTO PARTICULAR ANTEDATADO. CONTRATO PARTICULAR. PRAZO. CONTAGEM DA DATA DA CIÊNCIA DO AUTOR SOBRE A EXISTÊNCIA DO DOCUMENTO. DECADÊNCIA NÃO APERFEIÇOADA. LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ. RÉS. QUALIFICAÇÃO. SUBVERSÃO DA VERDADE E USO DE DOCUMENTO FRAUDADO. CORRUPÇÃO DO PROCESSO. QUALIFICAÇÃO. MULTA. APLICAÇÃO. INDÍCIOS DE PRÁTICA CRIMINOSA. CIENTIFICAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO. IMPOSIÇÃO LEGAL. DETERMINAÇÃO (CPP, ART. 40). HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS RECURSAIS. MAJORAÇÃO DA VERBA ORIGINALMENTE ESTABELECIDA. 1. Tratando-se de ação pauliana destinada à invalidação de negócio jurídico em razão da ocorrência de simulação em fraude contra credores, o valor da causa deve corresponder ao valor do contrato cuja anulação se almeja (CPC/73, art. 259, V; CPC/15, art. 292, II), e não ao valor de mercado atual do bem objeto do negócio, tornando inviável que a impugnação volvida a esse desiderato seja acolhida, mormente quando o valor conferido à ação coincide com o proveito econômico almejado e o importe apontado pelos impugnantes se afigura dissonante do parâmetro legalmente estabelecido. 2. Conquanto o termo inicial do prazo decadencial quadrienal da pretensão destinada à anulação de contrato por erro, dolo ou fraude contra credores seja a data da realização do ato ou da celebração do contato (CC, art, 178, II), se o negócio jurídico imprecado fora concertado via de instrumento particular e a pretensão deriva da alegação de que fora consumado sob fraude, inclusive quanto à data em que fora concertado, o interregno, mediante interpretação sistemática da disposição, flui a partir da ciência da parte autora da pretensão do negócio cuja invalidação é almejada, e não da data aposta no instrumento que o espelha. 3. A fraude contra credores encerra questão de direito material, demandando a subsistência de atos praticados pelo devedor, proprietário de bens ou direitos, a título gratuito ou oneroso, visando prejudicar o credor em tempo futuro, pois ainda não ingressara em juízo e a obrigação que titulariza ativamente ainda não pode ser exigível, donde a qualificação do intuito de prejudicar somente se manifestará quando o devedor já se achar na situação de insolvência, demandando seu reconhecimento a prova da intenção que o movera de prejudicar (eventum damni), o concerto lesivo que enlaçara devedor/alienante e o adquirente (consilium fraudis) e o manejo de ação apropriada (CC, art. 161). 4. Aferido que a devedora/alienante e adquirente, nitidamente imbuídas do objetivo de frustrar o cumprimento de obrigações derivadas de contrato de locação garantido fidejussoriamente pela vendedora/cedente, engendraram, em conluio e imbuídas de má-fé, Instrumento Particular de Cessão de Direitos e Obrigações de Imóvel apontando no instrumento negocial data dissonante àquela em que o ato fora efetivamente praticado visando induzir que fora celebrado em data anterior ao contrato locatício e a desqualificar a situação de insolvência da fiadora perante o credor dos débitos locatícios, resta por configurada a simulação em fraude contra credores, devendo o instrumento contratual - que não passara de mera ficção com o objetivo de simular a existência de um negócio jurídico que efetivamente não fora celebrado -, ser declarado nulo (CC, art. 158). 5. A sistemática processual reclama lealdade processual de todos os atores processuais, alinhavando o artigo 80 do estatuto processual as hipóteses de condutas abusivas que ensejam a qualificação da litigância de má-fé ante o desvirtuamento do manejo das faculdades e dos direitos conferidos a quem litiga, afastando-se a lide dos seus fins e utilidade, corrompendo-se ilegitimamente o processo, ensejando o desvirtuamento do seu fim teleológico. 6. Aliado à postura processual do litigante, o reconhecimento da litigância de má-fé reclama a constatação do elemento subjetivo, à medida que a má-fé processual equivale à antítese de boa-fé inscrita como dever inerente a todo litigante (CPC, art. 5º), que equivale à boa-fé subjetiva, donde, para a configuração da litigância de má-fé, o litigante deve atuar dolosamente e em contradição com a finalidade do processo, através da violação da verdade e do abuso dos atos processuais. 7. A qualificação da litigância de má-fé sob o prisma de que a parte alterara a verdade dos fatos emerge do dever de veracidade contido no dever de lealdade, demandando sua qualificação a aferição de que a parte, que traz a inverdade, tinha ciência de que o fato alegado não era verdadeiro, não se qualificando o mero equívoco como má-fé processual, uma vez que está desprovido de deslealdade e da intenção de prejudicar a parte contrária, e, outrossim, a qualificação da litigância de má-fé sob a imprecação de que o processo fora usado para obtenção de objetivo ilegal não deriva do pedido mediato almejado, mas da subversão do rito processual de forma a desvirtuá-lo do seu desiderato natural (CPC, art. 80, II e III). 8. Aferido que as rés, exorbitando o direito ao exercício do direito à ampla defesa, protagonizaram sistematicamente manobras em contradição à finalidade do processo, subvertendo a verdade no intuito de eximirem-se de obrigação legítima, denunciando que corromperam a finalidade do processo e visaram utilizá-lo com o intuito de angariar proveito econômico indevido, incorrem nas tipificações que ensejam sua qualificação como litigante de má-fé, pois, aliado ao elemento subjetivo que se faz presente, tangenciaram a verdade dos fatos com o intuito de valerem-se do processo para defender negócio jurídico viciado engendrado com o claro objetivo de fraudar os direitos do credor, sujeitando-se, pois, à sanção pecuniária correlata (CPC, arts. 80, II e III, e 81). 9. Divisados indícios de falsidade nos documentos que aparelharam os autos, sobejando dúvidas acerca da legitimidade do código do selo de certificação digital de segurança gerado e aposto no instrumento contratual, agregado ao fato de que o carimbo de reconhecimento de firma dos nomes das subscritoras fora consumado à margem da lei, tendo o tabelionato do qual teria emergido o chancelamento atestado a falta de autenticidade do ato cartorário, o havido, indicando em tese a subsistência de fatos penalmente tipificados, impõe ao Juiz da causa o dever legal de determinar a remessa de peças do processo ao Ministério Público para, diante do apreendido, averiguar o cabimento da deflagração do procedimento inquisitorial cabível (CPP, art. 40). 10. Editada a sentença e aviado o apelo sob a égide da nova codificação processual civil, o desprovimento dum apelo e, em contrapartida, o provimento do recurso da parte que já havia originalmente se sagrado vencedora, implica a majoração dos honorários advocatícios originalmente imputados à parte recorrente que saíra vencida, porquanto o novo estatuto processual contemplara o instituto dos honorários sucumbenciais recursais, devendo a majoração ser levada a efeito mediante ponderação dos serviços executados na fase recursal pelos patronos da parte exitosa e guardar observância à limitação da verba honorária estabelecida para a fase de conhecimento (NCPC, arts. 85, §§ 2º e 11). 11. Apelo do autor conhecido e provido. Apelo das rés conhecido e desprovido. Sentença parcialmente reformada. Preliminar e prejudicial de mérito rejeitadas. Determinada a remessa de peças ao Ministério Público. Majorados os honorários advocatícios impostos às rés apelantes. Unânime.
Ementa
CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO PAULIANA. ANULAÇÃO DE NEGÓCIO JURÍDICO. FIANÇA LOCATÍCIA. FIADORA. CELEBRAÇÃO DE INSTRUMENTO PARTICULAR DE CESSÃO DE DIREITOS DE IMÓVEL. PRETENSÃO FORMULADA PELO CREDOR PREJUDICADO. INSTRUMENTO FORMALIZADO COM DATA RETROATIVA. ALEGAÇÃO. RECONHECIMENTO DAS FIRMAS DAS CONTRATADAS. FALSIDADE. LEGITIMIDADE ATESTADA PELO TABELIONATO DO QUAL TERIA EMERGIDO O CHANCELAMENTO. SELO DIGITAL INEXISTENTE. AFERIÇÃO. SIMULAÇÃO. NEGÓCIO CONSUMADO EM FRAUDE CONTRA CREDORES. EVIDENCIAÇÃO. IMPUGNAÇÃO DO VALOR DADO À CAUSA. REGRAMENTO VIGORANTE À ÉPOCA. VALOR DO CONTRATO. OBSERVÂNCIA (CPC/73, ART. 259, V). REJEIÇÃO. DECADÊNCIA. PRAZO QUADRIENAL (CC, ART. 178, II). TERMO INICIAL. DATA DA REALIZAÇÃO DO NEGÓCIO. INAPLICABILIDADE. EXCEPCIONALIDADE DO CASO. SIMULAÇÃO DE NEGÓCIO. INSTRUMENTO PARTICULAR ANTEDATADO. CONTRATO PARTICULAR. PRAZO. CONTAGEM DA DATA DA CIÊNCIA DO AUTOR SOBRE A EXISTÊNCIA DO DOCUMENTO. DECADÊNCIA NÃO APERFEIÇOADA. LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ. RÉS. QUALIFICAÇÃO. SUBVERSÃO DA VERDADE E USO DE DOCUMENTO FRAUDADO. CORRUPÇÃO DO PROCESSO. QUALIFICAÇÃO. MULTA. APLICAÇÃO. INDÍCIOS DE PRÁTICA CRIMINOSA. CIENTIFICAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO. IMPOSIÇÃO LEGAL. DETERMINAÇÃO (CPP, ART. 40). HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS RECURSAIS. MAJORAÇÃO DA VERBA ORIGINALMENTE ESTABELECIDA. 1. Tratando-se de ação pauliana destinada à invalidação de negócio jurídico em razão da ocorrência de simulação em fraude contra credores, o valor da causa deve corresponder ao valor do contrato cuja anulação se almeja (CPC/73, art. 259, V; CPC/15, art. 292, II), e não ao valor de mercado atual do bem objeto do negócio, tornando inviável que a impugnação volvida a esse desiderato seja acolhida, mormente quando o valor conferido à ação coincide com o proveito econômico almejado e o importe apontado pelos impugnantes se afigura dissonante do parâmetro legalmente estabelecido. 2. Conquanto o termo inicial do prazo decadencial quadrienal da pretensão destinada à anulação de contrato por erro, dolo ou fraude contra credores seja a data da realização do ato ou da celebração do contato (CC, art, 178, II), se o negócio jurídico imprecado fora concertado via de instrumento particular e a pretensão deriva da alegação de que fora consumado sob fraude, inclusive quanto à data em que fora concertado, o interregno, mediante interpretação sistemática da disposição, flui a partir da ciência da parte autora da pretensão do negócio cuja invalidação é almejada, e não da data aposta no instrumento que o espelha. 3. A fraude contra credores encerra questão de direito material, demandando a subsistência de atos praticados pelo devedor, proprietário de bens ou direitos, a título gratuito ou oneroso, visando prejudicar o credor em tempo futuro, pois ainda não ingressara em juízo e a obrigação que titulariza ativamente ainda não pode ser exigível, donde a qualificação do intuito de prejudicar somente se manifestará quando o devedor já se achar na situação de insolvência, demandando seu reconhecimento a prova da intenção que o movera de prejudicar (eventum damni), o concerto lesivo que enlaçara devedor/alienante e o adquirente (consilium fraudis) e o manejo de ação apropriada (CC, art. 161). 4. Aferido que a devedora/alienante e adquirente, nitidamente imbuídas do objetivo de frustrar o cumprimento de obrigações derivadas de contrato de locação garantido fidejussoriamente pela vendedora/cedente, engendraram, em conluio e imbuídas de má-fé, Instrumento Particular de Cessão de Direitos e Obrigações de Imóvel apontando no instrumento negocial data dissonante àquela em que o ato fora efetivamente praticado visando induzir que fora celebrado em data anterior ao contrato locatício e a desqualificar a situação de insolvência da fiadora perante o credor dos débitos locatícios, resta por configurada a simulação em fraude contra credores, devendo o instrumento contratual - que não passara de mera ficção com o objetivo de simular a existência de um negócio jurídico que efetivamente não fora celebrado -, ser declarado nulo (CC, art. 158). 5. A sistemática processual reclama lealdade processual de todos os atores processuais, alinhavando o artigo 80 do estatuto processual as hipóteses de condutas abusivas que ensejam a qualificação da litigância de má-fé ante o desvirtuamento do manejo das faculdades e dos direitos conferidos a quem litiga, afastando-se a lide dos seus fins e utilidade, corrompendo-se ilegitimamente o processo, ensejando o desvirtuamento do seu fim teleológico. 6. Aliado à postura processual do litigante, o reconhecimento da litigância de má-fé reclama a constatação do elemento subjetivo, à medida que a má-fé processual equivale à antítese de boa-fé inscrita como dever inerente a todo litigante (CPC, art. 5º), que equivale à boa-fé subjetiva, donde, para a configuração da litigância de má-fé, o litigante deve atuar dolosamente e em contradição com a finalidade do processo, através da violação da verdade e do abuso dos atos processuais. 7. A qualificação da litigância de má-fé sob o prisma de que a parte alterara a verdade dos fatos emerge do dever de veracidade contido no dever de lealdade, demandando sua qualificação a aferição de que a parte, que traz a inverdade, tinha ciência de que o fato alegado não era verdadeiro, não se qualificando o mero equívoco como má-fé processual, uma vez que está desprovido de deslealdade e da intenção de prejudicar a parte contrária, e, outrossim, a qualificação da litigância de má-fé sob a imprecação de que o processo fora usado para obtenção de objetivo ilegal não deriva do pedido mediato almejado, mas da subversão do rito processual de forma a desvirtuá-lo do seu desiderato natural (CPC, art. 80, II e III). 8. Aferido que as rés, exorbitando o direito ao exercício do direito à ampla defesa, protagonizaram sistematicamente manobras em contradição à finalidade do processo, subvertendo a verdade no intuito de eximirem-se de obrigação legítima, denunciando que corromperam a finalidade do processo e visaram utilizá-lo com o intuito de angariar proveito econômico indevido, incorrem nas tipificações que ensejam sua qualificação como litigante de má-fé, pois, aliado ao elemento subjetivo que se faz presente, tangenciaram a verdade dos fatos com o intuito de valerem-se do processo para defender negócio jurídico viciado engendrado com o claro objetivo de fraudar os direitos do credor, sujeitando-se, pois, à sanção pecuniária correlata (CPC, arts. 80, II e III, e 81). 9. Divisados indícios de falsidade nos documentos que aparelharam os autos, sobejando dúvidas acerca da legitimidade do código do selo de certificação digital de segurança gerado e aposto no instrumento contratual, agregado ao fato de que o carimbo de reconhecimento de firma dos nomes das subscritoras fora consumado à margem da lei, tendo o tabelionato do qual teria emergido o chancelamento atestado a falta de autenticidade do ato cartorário, o havido, indicando em tese a subsistência de fatos penalmente tipificados, impõe ao Juiz da causa o dever legal de determinar a remessa de peças do processo ao Ministério Público para, diante do apreendido, averiguar o cabimento da deflagração do procedimento inquisitorial cabível (CPP, art. 40). 10. Editada a sentença e aviado o apelo sob a égide da nova codificação processual civil, o desprovimento dum apelo e, em contrapartida, o provimento do recurso da parte que já havia originalmente se sagrado vencedora, implica a majoração dos honorários advocatícios originalmente imputados à parte recorrente que saíra vencida, porquanto o novo estatuto processual contemplara o instituto dos honorários sucumbenciais recursais, devendo a majoração ser levada a efeito mediante ponderação dos serviços executados na fase recursal pelos patronos da parte exitosa e guardar observância à limitação da verba honorária estabelecida para a fase de conhecimento (NCPC, arts. 85, §§ 2º e 11). 11. Apelo do autor conhecido e provido. Apelo das rés conhecido e desprovido. Sentença parcialmente reformada. Preliminar e prejudicial de mérito rejeitadas. Determinada a remessa de peças ao Ministério Público. Majorados os honorários advocatícios impostos às rés apelantes. Unânime.
Data do Julgamento
:
29/11/2017
Data da Publicação
:
11/12/2017
Órgão Julgador
:
1ª TURMA CÍVEL
Relator(a)
:
TEÓFILO CAETANO
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