TJDF APC - 1064602-20160110764437APC
APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO DO CONSUMIDOR. DIREITO PROCESSUAL CIVIL. CONTRATOS DE EMPRÉSTIMO. CONSIGNAÇÃO EM FOLHA DE PAGAMENTO. DÉBITO EM CONTA CORRENTE. LIMITAÇÃO DOS DESCONTOS A 30% DA REMUNERAÇÃO LÍQUIDA. LIMITE LEGAL DE 30% PARA AS CONSIGNAÇÕES EM FOLHA DE PAGAMENTO. APLICAÇÃO DO LIMITE LEGAL, POR ANALOGIA, AOS DÉBITOS EM CONTA CORRENTE. PRECEDENTES DO COLENDO STJ E DESTA EG. CORTE. PRETENSÃO DE APLICAÇÃO DO LIMITE DE 30% AOS DESCONTOS EM FOLHA E AOS DÉBITOS EM CONTA CORRENTE, EM CONJUNTO. DESCABIMENTO. LIMITE DOS DESCONTOS EM CONTA CORRENTE CALCULADO COM BASE NOS RENDIMENTOS SALARIAIS ALI DEPOSITADOS, APÓS A CONSIGNAÇÃO EM FOLHA. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. 1. A demanda envolve a discussão acerca da limitação dos descontos efetuados no salário em decorrência de contratos de empréstimos contraídos junto a instituições financeiras, seja em relação à consignação em folha de pagamento, seja no que concerne aos débitos em conta corrente. 2. A tese da apelante está calcada no entendimento de que a previsão legal de limitação dos descontos consignados em folha de pagamento a 30% do salário líquido do mutuário, conforme previsto no Decreto Federal nº 6.386/2008, deve ser aplicada também aos débitos em conta corrente, sob pena de comprometimento de sua subsistência e de sua família, invocando o princípio da dignidade da pessoa humana, ao passo que o banco apelado sustenta não haver limitação legal para o débito em conta corrente, pugnando pela observância do princípio pacta sunt servanda. 3. Inicialmente, tal como reconhecido na r. sentença recorrida, deve-se registrar que incidem as normas do Código de Defesa do Consumidor - CDC, sendo inegável que a relação jurídica descrita na inicial é de cunho consumerista, pois autora e réu possuem as características que definem consumidor e fornecedor, respectivamente, contidas nos artigos 2º e 3º daquele Diploma Legal. 4. À época da realização dos contratos objetos deste processo, as consignações em folha de pagamento do servidor público federal estavam previstas no art. 45 e seu parágrafo único da Lei Federal 8.112/90, então regulamentados pelo Decreto nº 6.386, de 29 de fevereiro de 2008, antes da edição da Medida Provisória nº 681, de 10 de julho de 2015, convertida na Lei nº 13.172, de 21 de outubro de 2015. 5. O novo texto foi regulamentado pelo Decreto nº 8.690, de 11 de março de 2016, que manteve, basicamente, as mesmas linhas do Decreto anterior, mas trouxe a importante inovação quanto ao limite máximo de descontos, que, conforme já fora definido na Lei 13.172/2015, passou a ser de 35%, sendo 5% exclusivamente para amortização de dívidas com cartão de crédito (despesas e saques). 6. Seja sob a égide da lei e regulamentação anteriores, seja sob o império das novas disposições normativas, tendo em vista que aqui não se discute dívida de cartão de crédito, o limite legal que se deve ter em conta para as consignações em folha corresponde a 30% dos ganhos do consignado, já que o acréscimo de 5% serviu apenas para a amortização de dívidas relativas a cartões de crédito, o que não se aplica à espécie. 7. No âmbito do Colendo Superior Tribunal de Justiça a matéria, embora ainda não decidida em sede de recurso repetitivo, já tem sólido assentamento quanto à aplicação analógica aos débitos em conta corrente do limite legal de 30% referente aos empréstimos consignados em folha, mesmo entendimento que esta Egrégia Corte, em sua maioria, tem acolhido. 8. A apelante insurge-se contra as amortizações de empréstimos tanto em relação às parcelas consignadas em folha quanto em relação às prestações debitadas em sua conta corrente, pretendendo que a limitação de 30% abranja os dois tipos de descontos, ou seja, que a soma das prestações debitadas em folha e na conta corrente não ultrapasse o limite de 30% dos seus rendimentos líquidos. 9. Não há, todavia, como acolher tal pretensão, porquanto isso implicaria alterar o próprio limite legal estabelecido para a margem consignável em folha, já que o limite de 30% deveria comportar também outras prestações, como as decorrentes de empréstimos cuja amortização seja feita por meio de débitos na conta corrente. Assim, uma vez que já tivesse sido atingido aquele limite para as consignações, a consequência seria a inviabilidade completa de o correntista/consignado contrair outro empréstimo com ajuste da amortização feito por débito em conta corrente, além das dificuldades de controle do limite pelo órgão público consignante e pela instituição financeira mutuante. 10. A única solução juridicamente adequada é aquela que resguarda a higidez normativa quanto ao limite de 30% para os empréstimos consignados em folha, cujo controle cabe ao órgão público consignante, ao qual está vinculado o servidor consignado e, ao mesmo tempo, também condiciona os débitos em conta corrente ao mesmo limite, mas o cálculo dessa percentagem deve ser feito tendo como base o restante do salário do correntista depositado na instituição mutuante, ou seja, há o limite de 30% para as consignações em folha de pagamento, tendo como base a remuneração líquida do servidor, e há o limite de 30% para a dedução das prestações em conta corrente, calculados sobre o valor depositado na conta do mutuário. 11. Considerando que o limite legal de 30% das consignações em folha está sendo observado e tendo em conta os fundamentos acima expostos e a jurisprudência do Colendo STJ e desta Eg. Corte, concluimos que o apelo da autora merece parcial provimento, devendo-se reformar a sentença recorrida para determinar ao banco réu que limite os descontos efetuados na conta corrente da autora ao percentual de 30% dos rendimentos salariais ali depositados. 12. Recurso conhecido e parcialmente provido. Sentença parcialmente reformada, para determinar ao réu que limite os descontos na conta corrente da autora a 30% dos rendimentos salariais depositados. Sucumbência recíproca e proporcional, arcando cada parte com metade das custas e dos honorários advocatícios, mantidos em 10% do valor da causa, observando a gratuidade de justiça concedida à autora. Sem honorários recursais.
Ementa
APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO DO CONSUMIDOR. DIREITO PROCESSUAL CIVIL. CONTRATOS DE EMPRÉSTIMO. CONSIGNAÇÃO EM FOLHA DE PAGAMENTO. DÉBITO EM CONTA CORRENTE. LIMITAÇÃO DOS DESCONTOS A 30% DA REMUNERAÇÃO LÍQUIDA. LIMITE LEGAL DE 30% PARA AS CONSIGNAÇÕES EM FOLHA DE PAGAMENTO. APLICAÇÃO DO LIMITE LEGAL, POR ANALOGIA, AOS DÉBITOS EM CONTA CORRENTE. PRECEDENTES DO COLENDO STJ E DESTA EG. CORTE. PRETENSÃO DE APLICAÇÃO DO LIMITE DE 30% AOS DESCONTOS EM FOLHA E AOS DÉBITOS EM CONTA CORRENTE, EM CONJUNTO. DESCABIMENTO. LIMITE DOS DESCONTOS EM CONTA CORRENTE CALCULADO COM BASE NOS RENDIMENTOS SALARIAIS ALI DEPOSITADOS, APÓS A CONSIGNAÇÃO EM FOLHA. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. 1. A demanda envolve a discussão acerca da limitação dos descontos efetuados no salário em decorrência de contratos de empréstimos contraídos junto a instituições financeiras, seja em relação à consignação em folha de pagamento, seja no que concerne aos débitos em conta corrente. 2. A tese da apelante está calcada no entendimento de que a previsão legal de limitação dos descontos consignados em folha de pagamento a 30% do salário líquido do mutuário, conforme previsto no Decreto Federal nº 6.386/2008, deve ser aplicada também aos débitos em conta corrente, sob pena de comprometimento de sua subsistência e de sua família, invocando o princípio da dignidade da pessoa humana, ao passo que o banco apelado sustenta não haver limitação legal para o débito em conta corrente, pugnando pela observância do princípio pacta sunt servanda. 3. Inicialmente, tal como reconhecido na r. sentença recorrida, deve-se registrar que incidem as normas do Código de Defesa do Consumidor - CDC, sendo inegável que a relação jurídica descrita na inicial é de cunho consumerista, pois autora e réu possuem as características que definem consumidor e fornecedor, respectivamente, contidas nos artigos 2º e 3º daquele Diploma Legal. 4. À época da realização dos contratos objetos deste processo, as consignações em folha de pagamento do servidor público federal estavam previstas no art. 45 e seu parágrafo único da Lei Federal 8.112/90, então regulamentados pelo Decreto nº 6.386, de 29 de fevereiro de 2008, antes da edição da Medida Provisória nº 681, de 10 de julho de 2015, convertida na Lei nº 13.172, de 21 de outubro de 2015. 5. O novo texto foi regulamentado pelo Decreto nº 8.690, de 11 de março de 2016, que manteve, basicamente, as mesmas linhas do Decreto anterior, mas trouxe a importante inovação quanto ao limite máximo de descontos, que, conforme já fora definido na Lei 13.172/2015, passou a ser de 35%, sendo 5% exclusivamente para amortização de dívidas com cartão de crédito (despesas e saques). 6. Seja sob a égide da lei e regulamentação anteriores, seja sob o império das novas disposições normativas, tendo em vista que aqui não se discute dívida de cartão de crédito, o limite legal que se deve ter em conta para as consignações em folha corresponde a 30% dos ganhos do consignado, já que o acréscimo de 5% serviu apenas para a amortização de dívidas relativas a cartões de crédito, o que não se aplica à espécie. 7. No âmbito do Colendo Superior Tribunal de Justiça a matéria, embora ainda não decidida em sede de recurso repetitivo, já tem sólido assentamento quanto à aplicação analógica aos débitos em conta corrente do limite legal de 30% referente aos empréstimos consignados em folha, mesmo entendimento que esta Egrégia Corte, em sua maioria, tem acolhido. 8. A apelante insurge-se contra as amortizações de empréstimos tanto em relação às parcelas consignadas em folha quanto em relação às prestações debitadas em sua conta corrente, pretendendo que a limitação de 30% abranja os dois tipos de descontos, ou seja, que a soma das prestações debitadas em folha e na conta corrente não ultrapasse o limite de 30% dos seus rendimentos líquidos. 9. Não há, todavia, como acolher tal pretensão, porquanto isso implicaria alterar o próprio limite legal estabelecido para a margem consignável em folha, já que o limite de 30% deveria comportar também outras prestações, como as decorrentes de empréstimos cuja amortização seja feita por meio de débitos na conta corrente. Assim, uma vez que já tivesse sido atingido aquele limite para as consignações, a consequência seria a inviabilidade completa de o correntista/consignado contrair outro empréstimo com ajuste da amortização feito por débito em conta corrente, além das dificuldades de controle do limite pelo órgão público consignante e pela instituição financeira mutuante. 10. A única solução juridicamente adequada é aquela que resguarda a higidez normativa quanto ao limite de 30% para os empréstimos consignados em folha, cujo controle cabe ao órgão público consignante, ao qual está vinculado o servidor consignado e, ao mesmo tempo, também condiciona os débitos em conta corrente ao mesmo limite, mas o cálculo dessa percentagem deve ser feito tendo como base o restante do salário do correntista depositado na instituição mutuante, ou seja, há o limite de 30% para as consignações em folha de pagamento, tendo como base a remuneração líquida do servidor, e há o limite de 30% para a dedução das prestações em conta corrente, calculados sobre o valor depositado na conta do mutuário. 11. Considerando que o limite legal de 30% das consignações em folha está sendo observado e tendo em conta os fundamentos acima expostos e a jurisprudência do Colendo STJ e desta Eg. Corte, concluimos que o apelo da autora merece parcial provimento, devendo-se reformar a sentença recorrida para determinar ao banco réu que limite os descontos efetuados na conta corrente da autora ao percentual de 30% dos rendimentos salariais ali depositados. 12. Recurso conhecido e parcialmente provido. Sentença parcialmente reformada, para determinar ao réu que limite os descontos na conta corrente da autora a 30% dos rendimentos salariais depositados. Sucumbência recíproca e proporcional, arcando cada parte com metade das custas e dos honorários advocatícios, mantidos em 10% do valor da causa, observando a gratuidade de justiça concedida à autora. Sem honorários recursais.
Data do Julgamento
:
16/11/2017
Data da Publicação
:
05/12/2017
Órgão Julgador
:
4ª TURMA CÍVEL
Relator(a)
:
ROMULO DE ARAUJO MENDES
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