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Jurisprudência


TJDF APC - 1065780-20120111324634APC

Ementa
APELAÇÃO CÍVEL. CRIANÇA E ADOLESCENTE. GUARDA. REVOGAÇÃO. PRELIMINARES. JULGAMENTO ULTRA PETITA. AFASTADA. INÉPCIA DA PETIÇÃO INICIAL. INOCORRÊNCIA. CERCEAMENTO DE DEFESA. NÃO VERIFICAÇÃO. PRIMAZIA DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA. DIREITOS FUNDAMENTAIS. PROTEÇÃO DA CRIANÇA. NÚCLEO ESSENCIAL DA FAMÍLIA. PARENTESCO CIVIL. SOCIOAFETIVIDADE. EUDEMONISTA. ANAPARENTAL. REVOGAÇÃO DA GUARDA. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. DESCABIMENTO. PECULIARIDADES DO CASO CONCRETO. TEORIA DA PERDA DE UMA CHANCE. INOCORRÊNCIA DO DEVER DE REPARAÇÃO. RECURSO PROVIDO. 1. Não há que se falar em julgamento ultra petita quando a sentença for proferida dentro dos limites da lide. 2. Não se verifica a inépcia da petição inicial por violação ao artigo 295 do CPC/73 quando ausente qualquer irregularidade à macular a petição inicial. 3. Cabe ao Juiz dispensar as provas desnecessárias ou inúteis ao julgamento da contenda. A bem da verdade, nesse seu mister, nada mais fez do que rejeitar as diligências que considerava inúteis ou protelatórias, as quais acabariam por prorrogar ainda mais a entrega da tutela jurisdicional por parte do Estado. 4. A primazia da dignidade humana perante todos os institutos jurídicos é uma característica fundamental da Constituição Federal. Ademais, a proteção dos direitos da criança apresenta status de direitos fundamentais, em razão do Decreto nº 99.770/90 que recepcionou no ordenamento jurídico pátrio a 5ª Convenção das Nações Unidas sobre Direitos da Criança. 5. Quando a Carta Magna instituiu o princípio em questão - a primazia da dignidade da pessoa humana - objetivou, principalmente, resguardar a convivência familiar e, consequentemente, dar efetividade ao Princípio da Proteção Integral à Criança, vez que é dever da família, da sociedade e do Estado, com absoluta prioridade, assegurar à criança e ao adolescente, dentre outras coisas, a convivência familiar, colocando-os a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. 6. O interesse da criança é encontrado em várias passagens do Direito Brasileiro, mais especificamente no Direito de Família, pois é princípio basilar e de suma importância neste ramo do direito. Será verificado em todo o estudo que o interesse da criança irá se sobrepor aos interesse dos pais, pois se deve buscar sempre o bem-estar do menor. Tal posição é extremamente sábia e importante, pois é mister que uma sociedade só será equilibrada e bem formada se possuir indivíduos controlados e com boa estrutura, o que é garantido através de uma base familiar e moral (NETO, SEBASTIÃO DE ASSIS; DE JESUS, MARCELO; DE MELO, MARIA IZABEL. Manual de Direito Civil.Volume único. Salvador : Ed. Juspodvm, 2013, pág. 1502). 7. O Enunciado 256 da III jornada de Direito Civil do CJF preconiza que a posse de estado de filho (parentalidade socioafetiva) constitui modalidade de parentesco civil. 8. A doutrina tem elencado que dada a ampliação do núcleo essencial do conceito de família e o posicionamento dos Tribunais Superiores em relação ao tema, é de relevante importância se observar três características basilares, quais sejam: 1) socioafetividade (a família vinculada à afetividade, e não à uma legislação positivista); 2) eudemonista (a família, como grande base da sociedade, possui uma grande função social, que é a realização pessoal e a felicidade de seus membros); 3) anaparental (a família está além dos vínculos técnicos, sendo formada por indivíduos que buscam, através da felicidade mútua, a felicidade comum). 9. Em que pese o peculiar contexto fático dos autos, revela-se importante destacar que não se pode deixar de levar em consideração o melhor interesse da criança e do adolescente, por outro lado, mostra-se de especial relevância analisar o peculiar contexto fático, considerando em especial que a então detentora da guarda da menor contava com idade avançada; que se mudou de cidade para melhor acolher a criança, Jailma; que o filho da anciã adotou a irmã da menor para que os laços familiares fossem preservados, que inclusive era portadora do vírus HIV; que Jailma não atendeu especificamente ao padrão de comportamento esperado pela guardiã, ao contrário dos outros filhos adotados por esta, e considerando ainda que, ao contrário da adoção, a guarda seja perfeitamente revogável. 10. Conforme dogmática do art. 187 do Código Civil, também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes, o que não foi o caso dos autos. 11. A teoria da perda de uma chance se manifesta em situações de responsabilidade contratual e extracontratual, desde que séria e real a possibilidade de êxito, o que afasta qualquer reparação no caso de uma simples esperança subjetiva ou mera expectativa aleatória. De qualquer sorte, não obstante a cizânia conceitual desse instituto, a sua incidência nas relações jurídicas é fonte de compensação pecuniária, acaso existente ato ilícito, o que não foi o caso dos autos. 12. No contexto fático dos autos, considerando que a revogação da guarda se deu em regular processo judicial, sob o manto da ampla defesa e contraditório e que reputou, naquele momento, ser a medida mais cabível e calcado nas estatísticas levantadas pelo Conselho Nacional de Justiça e pelo Cadastro Nacional de Adoção, que militam em desfavor da criança que estivera sob guarda, homenageando o princípio do melhor interesse da criança e do adolescente é de rigor o afastamento da indenização a título de danos morais. 13. Em obediência ao princípio da justa remuneração do trabalho profissional e em atendimento ao artigo 20, § 3º e § 4º, do Código de Processo Civil/73, mantenho a condenação em custas e honorários advocatícios no quantum fixado em sentença, apenas invertendo as custas processuais e as verbas honorárias em favor do apelante, observando-se as disposições da gratuidade da justiça. 14. Recurso provido.

Data do Julgamento : 11/10/2017
Data da Publicação : 18/12/2017
Classe/Assunto : Segredo de Justiça
Órgão Julgador : 5ª TURMA CÍVEL
Relator(a) : SILVA LEMOS
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