TJDF APC - 1067045-20130110433778APC
DIREITO ADMINISTRATIVO. DIREITO CIVIL. DIREITO PROCESSUAL CIVIL. RECURSO INTERPOSTO NA VIGÊNCIA DO CPC/1973. APLICAÇÃO DO ENUNCIADO ADMINISTRATIVO 2 DO C. STJ. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE REPARAÇÃO DE DANOS. BANCO DE BRASÍLIA - BRB. PRELIMINARES: GRATUIDADE DE JUSTIÇA. PESSOA JURÍDICA. IMPOSSIBILIDADE DE ARCAR COM OS ENCARGOS PROCESSUAIS. SÚMULA 481/STJ. NECESSIDADE DE COMPROVAÇÃO. INÉPCIA DA EXORDIAL. NÃO OCORRÊNCIA. MÉRITO: PESSOA JURÍDICA. APLICAÇÃO DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. TEORIA FINALISTA. TARIFA DE CONSULTA DE SALDO. PROCESSAMENTO E REPROCESSAMENTO (RESPECAGEM). COBRANÇA. NECESSIDADE DE COINCIDÊNCIA COM O ENVIO DO CRÉDITO À EMPRESA CONTRATANTE. CLÁUSULA CONTRATUAL EXPRESSA. COBRANÇA INDEPENDENTE. ABUSO DE DIREITO POR PARTE DO BRB. OCORRÊNCIA. VIOLAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DA BOA-FÉ, DA TRANSPARÊNCIA, DA LEALDADE E DA CONFIANÇA. DESRESPEITO AO PACTA SUNT SERVANDA. NECESSIDADE DE DEVOLUÇÃO DOS VALORES. REPETIÇÃO DE INDÉBITO EM DOBRO. IMPOSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE MÁ-FÉ. JUROS MORATÓRIOS. TERMO INICIAL. DATA DE CADA COBRANÇA INDEVIDA. APELO PARCIALMENTE PROVIDO. SENTENÇA PARCIALMENTE REFORMADA. 1. Faz jus ao benefício da justiça gratuita a pessoa jurídica com ou sem fins lucrativos que demonstrar sua impossibilidade de arcar com os encargos processuais (STJ, Súmula 481). 2.É necessário que a parte apelada comprove concretamente o direito a gratuidade de justiça. Ainda que a empresa apelada alegue estar com dificuldades financeiras, tal argumento - por si só - não é apto a autorizar o deferimento deste benefício legal de modo automático. 3. Não há que se falar em inépcia da petição inicial vez que a exordial formulada obedece às condições da ação e aos pressupostos processuais de constituição e desenvolvimento válido do processo, na medida em que a parte autora requer a interpretação das cláusulas contidas no instrumento contratual, em especial a compreensão do parágrafo terceiro da Cláusula Quinta, sobretudo no que diz respeito ao momento da cobrança pelo serviço de consulta de saldo. 4. São inaplicáveis as normas do Código de Defesa do Consumidor ao presente feito, pois inexiste qualquer vulnerabilidade da empresa autora frente ao BRB, razão pela qual não há como equipará-la à condição de consumidor, nem caracterizar a contratação entre as partes como relação de consumo. 5. A finalidade do contrato entabulado entre as partes é a de remunerar a atividade de se automatizar (débito e crédito automático) o pagamento feito à empresa autora pelos seus clientes. 6. O BRB somente pode receber pelo serviço de consulta de saldo se encaminhar o valor do débito do associado da empresa CONTRATANTE para esta, pois por força contratual - parágrafo terceiro da Cláusula Quinta - apenas poderá cobrar o pagamento pelo serviço realizado quando o débito automático for concretizado. 7. As cobranças efetuadas pelo BRB - nas hipóteses de ausência de fundos dos clientes da empresa autora - refletem conduta abusiva, vez que se exige do consumidor vantagem manifestamente excessiva. 8. O abuso do direito realizado pelo BRB é constatado no momento em que ele realiza a cobrança da tarifa de consulta de saldo (tanto o processamento, como o reprocessamento) sem entregar à empresa autora a contraprestação contratual (o crédito debitado na conta dos associados). 9. O verdadeiro critério do abuso do direito, por conseguinte, parece se localizar no princípio da boa-fé, pois em todos os atos geralmente apontados como abusivos estará presente uma violação ao dever de agir de acordo com os padrões de lealdade e confiança, independentemente de qualquer propósito de prejudicar. Por isso, conforme a lição de Teresa Negreiros, boa-fé e abuso do direito complementam-se, operando aquela como parâmetro de valoração do comportamento dos contratantes; o exercício de um direito será irregular e, nessa medida, abusivo se consubstanciar quebra de confiança e frustração de legítimas expectativas. Sendo o uso antifuncional do direito aferido objetivamente, com base no conflito entre a sua finalidade própria e a atuação concreta da parte, é forçoso reconhecer que a constatação do abuso passa, obrigatoriamente, pela análise da boa-fé objetiva (FARIAS, Cristiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson. Curso de Direito Civil. V. 1. 14. ed. Salvador: JusPodivm, 2016, p. 680-681). 10. É necessário observar o princípio da pacta sunt servanda no contrato celebrado entre as partes, vez que a cobrança da consulta de saldo não pode ser antes e nem depois, mas concomitante à transferência do crédito do BRB à empresa autora. 11. Inviável a repetição em dobro do indébito sem prova inequívoca da má-fé do credor, que não pode ser presumida (STJ, AgInt no AREsp n. 779.575/PB, Rel. Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, QUARTA TURMA, julgado em 11/10/2016, DJe 21/10/2016). 12. Por se tratar de relação contratual e de valores líquidos, porém, cobrados indevidamente da empresa autora, o termo inicial dos juros moratórios deve ser a data de cada cobrança indevida. 13. Diante da sucumbência mínima da empresa autora, o BRB deve continuar respondendo pelas despesas e pelos honorários advocatícios, consoante estabelece o artigo 86, parágrafo único do atual CPC. 14. Honorários recursais fixados em 1% do valor atualizado da condenação, ficando, portanto, o montante global dos honorários advocatícios em 11% (onze por cento) do valor condenatório atualizado. 15. Apelação conhecida, preliminar rejeitada e, na extensão, parcialmente provida.
Ementa
DIREITO ADMINISTRATIVO. DIREITO CIVIL. DIREITO PROCESSUAL CIVIL. RECURSO INTERPOSTO NA VIGÊNCIA DO CPC/1973. APLICAÇÃO DO ENUNCIADO ADMINISTRATIVO 2 DO C. STJ. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE REPARAÇÃO DE DANOS. BANCO DE BRASÍLIA - BRB. PRELIMINARES: GRATUIDADE DE JUSTIÇA. PESSOA JURÍDICA. IMPOSSIBILIDADE DE ARCAR COM OS ENCARGOS PROCESSUAIS. SÚMULA 481/STJ. NECESSIDADE DE COMPROVAÇÃO. INÉPCIA DA EXORDIAL. NÃO OCORRÊNCIA. MÉRITO: PESSOA JURÍDICA. APLICAÇÃO DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. TEORIA FINALISTA. TARIFA DE CONSULTA DE SALDO. PROCESSAMENTO E REPROCESSAMENTO (RESPECAGEM). COBRANÇA. NECESSIDADE DE COINCIDÊNCIA COM O ENVIO DO CRÉDITO À EMPRESA CONTRATANTE. CLÁUSULA CONTRATUAL EXPRESSA. COBRANÇA INDEPENDENTE. ABUSO DE DIREITO POR PARTE DO BRB. OCORRÊNCIA. VIOLAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DA BOA-FÉ, DA TRANSPARÊNCIA, DA LEALDADE E DA CONFIANÇA. DESRESPEITO AO PACTA SUNT SERVANDA. NECESSIDADE DE DEVOLUÇÃO DOS VALORES. REPETIÇÃO DE INDÉBITO EM DOBRO. IMPOSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE MÁ-FÉ. JUROS MORATÓRIOS. TERMO INICIAL. DATA DE CADA COBRANÇA INDEVIDA. APELO PARCIALMENTE PROVIDO. SENTENÇA PARCIALMENTE REFORMADA. 1. Faz jus ao benefício da justiça gratuita a pessoa jurídica com ou sem fins lucrativos que demonstrar sua impossibilidade de arcar com os encargos processuais (STJ, Súmula 481). 2.É necessário que a parte apelada comprove concretamente o direito a gratuidade de justiça. Ainda que a empresa apelada alegue estar com dificuldades financeiras, tal argumento - por si só - não é apto a autorizar o deferimento deste benefício legal de modo automático. 3. Não há que se falar em inépcia da petição inicial vez que a exordial formulada obedece às condições da ação e aos pressupostos processuais de constituição e desenvolvimento válido do processo, na medida em que a parte autora requer a interpretação das cláusulas contidas no instrumento contratual, em especial a compreensão do parágrafo terceiro da Cláusula Quinta, sobretudo no que diz respeito ao momento da cobrança pelo serviço de consulta de saldo. 4. São inaplicáveis as normas do Código de Defesa do Consumidor ao presente feito, pois inexiste qualquer vulnerabilidade da empresa autora frente ao BRB, razão pela qual não há como equipará-la à condição de consumidor, nem caracterizar a contratação entre as partes como relação de consumo. 5. A finalidade do contrato entabulado entre as partes é a de remunerar a atividade de se automatizar (débito e crédito automático) o pagamento feito à empresa autora pelos seus clientes. 6. O BRB somente pode receber pelo serviço de consulta de saldo se encaminhar o valor do débito do associado da empresa CONTRATANTE para esta, pois por força contratual - parágrafo terceiro da Cláusula Quinta - apenas poderá cobrar o pagamento pelo serviço realizado quando o débito automático for concretizado. 7. As cobranças efetuadas pelo BRB - nas hipóteses de ausência de fundos dos clientes da empresa autora - refletem conduta abusiva, vez que se exige do consumidor vantagem manifestamente excessiva. 8. O abuso do direito realizado pelo BRB é constatado no momento em que ele realiza a cobrança da tarifa de consulta de saldo (tanto o processamento, como o reprocessamento) sem entregar à empresa autora a contraprestação contratual (o crédito debitado na conta dos associados). 9. O verdadeiro critério do abuso do direito, por conseguinte, parece se localizar no princípio da boa-fé, pois em todos os atos geralmente apontados como abusivos estará presente uma violação ao dever de agir de acordo com os padrões de lealdade e confiança, independentemente de qualquer propósito de prejudicar. Por isso, conforme a lição de Teresa Negreiros, boa-fé e abuso do direito complementam-se, operando aquela como parâmetro de valoração do comportamento dos contratantes; o exercício de um direito será irregular e, nessa medida, abusivo se consubstanciar quebra de confiança e frustração de legítimas expectativas. Sendo o uso antifuncional do direito aferido objetivamente, com base no conflito entre a sua finalidade própria e a atuação concreta da parte, é forçoso reconhecer que a constatação do abuso passa, obrigatoriamente, pela análise da boa-fé objetiva (FARIAS, Cristiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson. Curso de Direito Civil. V. 1. 14. ed. Salvador: JusPodivm, 2016, p. 680-681). 10. É necessário observar o princípio da pacta sunt servanda no contrato celebrado entre as partes, vez que a cobrança da consulta de saldo não pode ser antes e nem depois, mas concomitante à transferência do crédito do BRB à empresa autora. 11. Inviável a repetição em dobro do indébito sem prova inequívoca da má-fé do credor, que não pode ser presumida (STJ, AgInt no AREsp n. 779.575/PB, Rel. Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, QUARTA TURMA, julgado em 11/10/2016, DJe 21/10/2016). 12. Por se tratar de relação contratual e de valores líquidos, porém, cobrados indevidamente da empresa autora, o termo inicial dos juros moratórios deve ser a data de cada cobrança indevida. 13. Diante da sucumbência mínima da empresa autora, o BRB deve continuar respondendo pelas despesas e pelos honorários advocatícios, consoante estabelece o artigo 86, parágrafo único do atual CPC. 14. Honorários recursais fixados em 1% do valor atualizado da condenação, ficando, portanto, o montante global dos honorários advocatícios em 11% (onze por cento) do valor condenatório atualizado. 15. Apelação conhecida, preliminar rejeitada e, na extensão, parcialmente provida.
Data do Julgamento
:
13/12/2017
Data da Publicação
:
23/01/2018
Órgão Julgador
:
5ª TURMA CÍVEL
Relator(a)
:
MARIA IVATÔNIA
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