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Jurisprudência


TJDF APC - 1067424-20150810034986APC

Ementa
CONSUMIDOR E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER CUMULADA COM DANOS MATERIAIS E MORAIS. PEDIDO DE GRATUIDADE DE JUSTIÇA. DEFERIDO. PRELIMINARES. JULGAMENTO EXTRA PETITA. PETIÇÃO APÓCRIFA. REVELIA. INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. REJEITADAS. MÉRITO. APLICAÇÃO DO ART. 18, §1º, CDC. DEVOLUÇÃO DO VALOR PAGO. DESFAZIMENTO DO NEGÓCIO JURÍDICO. INVIABILIDADE. ABATIMENTO DO PREÇO. POSSBILIDADE. DANO MORAL. NÃO CONSTATAÇÂO. RECURSO IMPROVIDO. 1. Apelação interposta contra sentença proferida pela Vara Cível do Paranoá/DF que, nos autos da ação de obrigação de fazer c/c danos materiais e morais, julgou parcialmente procedentes os pedidos iniciais para condenar as rés ao pagamento de R$ 538,33 (quinhentos e trinta e oito reais e trinta e três centavos), extinguindo o feito com resolução de mérito, nos termos do art. 490, do CPC. 1.1. Recurso aviado para que seja reformada a sentença. 2. De acordo com o § 3º do art. 99 do CPC, presume-se verdadeira a alegação de insuficiência deduzida exclusivamente por pessoa natural.2.1. No caso, a apelante juntou declaração de hipossuficiência e declarações de Imposto de Renda com as quais demonstrou auferir rendimentos anuais abaixo de R$ 20.000,00 (vinte mil reais), por ser autônoma. 2.2. Além disto, o fato de haver ter financiado seu veículo em 24 (vinte e quatro) parcelas, com prestações no valor de R$ 1.037,86 (um mil, trinta e sete reais e oitenta e seis centavos), não é suficiente para afastar a presunção de hipossuficiência emanada da declaração apresentada com a inicial. 2.3.Referidos elementos apontam para a alegada vulnerabilidade da recorrente. 2.4. Justiça Gratuita deferida. 3. As balizas da sentença devem estar inseridas no pedido. 3.1. Assim, em decorrência do princípio da congruência ou da adstrição, é vedado ao juiz o julgamento citra petita, ultra petita ou extra petita. 3.2 Os limites da lide são demarcados pelo pedido deduzido e pelos argumentos que lhe conferem sustentação, não sendo lícito e nem permitido ao julgador extrapolá-los e decidir o conflito de interesses estabelecido de forma aleatória e em desconformidade com a argumentação delineada e com a pretensão aduzida na inicial. 3.3. No caso em análise, infere-se que, embora o pedido de restituição ou abatimento do valor pago no veículo conste apenas no pleito liminar, apresenta-se implícito que se cuida também de pedido principal, por dedução lógica, haja vista que havendo vícios de qualidade ou quantidade identificáveis em produtos de consumo duráveis ou não, caso não seja sanado o vício no prazo máximo de 30 (trinta) dias, pode o consumidor exigir, alternativamente e à sua escolha: a) substituição do produto por outro da mesma espécie; b) restituição imediata da quantia paga, ou c) abatimento proporcional do preço (art. 18, §1º, do CDC). 3.4. O magistrado a quo, ao acolher, em parte, esses fundamentos não incorreu em julgamento extra petita. 4. Aassinatura do advogado constitui formalidade essencial de qualquer ato processual de natureza escrita. 4.1. No caso de petição interposta de forma apócrifa configura-se mera irregularidade, devendo ser aberto prazo para o defeito ser sanado (vício processual sanável), nos termos do disposto no art. 76 do CPC. 4.2. Ou seja, havendo erro de forma aplica-se também o art. 283, do CPC. 4.3. In casu, a petição contestatória da primeira apelada foi devidamente assinada, razão pela qual não há se falar em documento apócrifo.4.4. Além disso, não houve qualquer prejudicialidade à apelante, uma vez que o que embasou a sentença proferida foram os documentos trazidos aos autos, bem como a perícia realizada no veículo. 5. Ao contrário do que pretende a recorrente, a inversão do ônus da prova, com vistas à facilitação da defesa dos direitos do consumidor, não se dá de forma automática, mas depende do seu grau de vulnerabilidade e ainda da verossimilhança de suas alegações, consoante dispõe o art. 6º, inciso VIII, do Código de Defesa do Consumidor.5.1. No caso dos autos, apesar de tratar-se de relação de consumo, inexiste verossimilhança nas alegações da apelante, o que foi cabalmente demonstrado através da perícia realizada no veículo objeto da lide. 5.2 Aliás, e como salientado pelo magistrado sentenciante, No entanto, realizada perícia no veículo, nenhum dos defeitos alegados pela autora foram constatados. Ao contrário, o perito afirmou que o veículo estava em perfeitas condições, exceto no tocante à bateria descarregada devido a prolongada ausência de uso, conforme se lê nas fls. 285 e seguintes. 6. Arelação estabelecida entre as partes configura uma relação de consumo a ser regida pelo Código de Defesa do Consumidor, já que havendo transferência de um bem por contrato oneroso, constatando-se a presença de vício redibitório, abre-se a possibilidade de: a) substituição por outro da mesma espécie, ou b) a restituição da quantia paga, ou c) o abatimento proporcional do preço, conforme dispõe o art. 18, §1º, do CDC. 7. Veículo adquirido em 08 de agosto de 2012. Ordem de serviço aberta para corrigir suposto defeito em 19 de fevereiro de 2015, quando a quilometragem marcava 61.437 km. Outrossim, o lapso temporal decorrido entre a data da abertura da ordem de serviço (19/2/15) e a disponibilização do veículo para a apelante (9/4/15) superou em 19 (dezenove) dias o prazo previsto para a entrega do automóvel, que se encerraria no dia 21/3/15, de acordo com o art. 18, §1º, do CDC. 7.1. Dentre as 3 (três) opções pelas quais poderia optar, de acordo com o referido artigo, a apelante manifestou interesse, em sua inicial, na restituição do valor pago ou no abatimento do preço. 7.2. Contudo, a restituição do valor pago mostra-se inviável, pois implicaria no desfazimento do negócio firmado entre as partes. 7.3. Tal solução é inadequada ao caso, tendo em vista o tempo de uso do veículo, já que a recorrente dele fruiu por quase 3 (três) anos, rodando por 61.437 quilômetros, sem que ele apresentasse qualquer vício até 19/2/15. 7.4. Com efeito, foi realizado reparo no veículo, o qual foi colocado à disposição da apelante, após o prazo de 30 (trinta) dias, oportunidade em que ela se recusou a receber o automóvel sob a alegação de que apresentava vazamento de óleo e ruídos, argumentos que caíram por terra após a realização de perícia que constatou a inexistência de tais vícios. 7.5. Nesses termos, mostra-se correta a sentença ao conferir à recorrente o abatimento do preço do veículo, porque, no momento em que realizada a perícia, não se constatou qualquer problema no automóvel. 7.6. Ademais, a fixação do valor quanto ao abatimento do preço deverá ser objeto deliquidação de sentença. 8. Quanto aos danos materiais a apelante juntou aos autos documentos referentes ao aluguel mensal de um veículo, boletos de IPVA, seguro obrigatório e licenciamento, requerendo o reembolso dos valores gastos. 8.1. Acontece que os recibos de aluguel do veículo são posteriores à data em que a assistência técnica o disponibilizou à recorrente, havendo apenas um recibo de 1º de abril de 2015. 8.2. Tendo em vista que o prazo para que o vício/defeito do veículo fosse sanado acabou em 21/3/15 e o veículo só foi disponibilizado à apelante em 9/4/15, ou seja, 19 (dezenove) dias após o prazo previsto no art. 18, §1º, do CDC, é por esse período que deve a apelante ser indenizada. 8.3. Utilizando-se como base o valor de R$ 850 (oitocentos e cinqüenta reais), referente ao aluguel mensal de outro veículo, e aguardado a parte recorrente por 19 (dezenove) dias até a disponibilização de seu automóvel, nota-se que teria pago proporcionalmente pelo uso dos 19 (dezenove) dias o valor de R$ 538,33 (quinhentos e trinta e oito reais e trinta e três centavos), os quais devem ser devolvidos a título de aluguel. 8.4. Já em relação ao IPVA, seguro obrigatório e licenciamento do exercício de 2015 ela deve ser restituída na proporção de 19/365. 9.5. Posto isso, não merece reparos a sentença proferida. 9. Aindenização pelos danos morais pressupõe a violação aos direitos da personalidade. 9.1. No caso, é certo que a retenção do veículo por mais de 30 dias pela concessionária gerou aborrecimentos à consumidora, que se viu privada de seu meio de locomoção por aproximadamente 19 (dezenove) dias. 9.2. Contudo, os transtornos ocasionados não têm o condão de, por si só, causar vexame, humilhação ou dor exagerada, a ponto de abalar, de forma indubitável, os direitos da personalidade e ensejar a condenação da ré à reparação por danos morais. 10. Apelação improvida.

Data do Julgamento : 13/12/2017
Data da Publicação : 15/12/2017
Órgão Julgador : 2ª TURMA CÍVEL
Relator(a) : JOÃO EGMONT
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