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Jurisprudência


TJDF APC - 1081153-20161610034056APC

Ementa
DIREITO CIVIL, IMOBILIÁRIO E DIREITO DO CONSUMIDOR. CONTRATO. COMPRA E VENDA DE IMÓVEL. CLÁUSULA DE ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA EM GARANTIA EM FAVOR DA VENDEDORA. PREÇO FINANCIADO PELA ALIENANTE. INADIMPLEMENTO DOS COMPRADORES. GARANTIA. RELIZAÇÃO. CONSOLIDAÇÃO DA PROPRIEDADE FIDUCIÁRIA EM FAVOR DA CREDORA. LEI Nº 9.514/1997. ALIENAÇÃO DO IMÓVEL EM LEILÃO EXTRAJUDICIAL. FRUSTRAÇÃO POR FALTA DE LICITANTES. ADJUDICAÇÃO EM FAVOR DA CREDORA. RELAÇÃO DE CONSUMO. DEVOLUÇÃO DAS PARCELAS PAGAS. ARTIGO 53 DO CDC. NÃO APLICAÇÃO. CRITÉRIO GENÉRICO DE APURAÇÃO DE HAVERES. INCIDÊNCIA DOS ARTIGOS 26 E 27 DA LEI 9.514/1997. PROCEDIMENTO ESPECÍFICO. RESOLUÇÃO DA PROPRIEDADE EM FAVOR DA CREDORA FIDUCIÁRIA. LIBERAÇÃO DA OBRIGAÇÃO DE DEVOLUÇÃO DE SALDO SOBEJANTE. QUITAÇÃO DA DÍVIDA. CONTRAPARTIDA. FIXAÇÃO DE CONDIÇÃO PARA EFETIVAÇÃO DA IMISSÃO. OCORRÊNCIA. VINCULAÇÃO AO TRÂNSITO EM JULGADO. CRIAÇÃO DE CONDIÇÃO À MARGEM DO PROCEDIMENTO ENCADEADO PELO LEGISLADOR. IMPOSSIBILIDADE. TAXA DE OCUPAÇÃO. PERCEPÇÃO PELA CREDORA. POSSIBILIDADE. PRESSUPOSTO. CONTRAPRESTAÇÃO INERENTE À DETENÇÃO DO IMÓVEL PELOS DEVEDORES APÓS A CONSOLIDAÇÃO DA PROPRIEDADE EM NOME DA FIDUCIÁRIA. LEGITIMIDADE. EXTRAPOLAÇÃO DA CAUSA POSTA EM JUÍZO. RESOLUÇÃO ALÉM DOS LIMITES DA LIDE. PRINCÍPIO DA CONGRUÊNCIA. DEVIDO PROCESSO LEGAL. INOBSERVÂNCIA. VÍCIO OBJETIVO. DECISÃO ULTRA PETITA. ERROR IN PROCEDENDO. CARACTERIZAÇÃO. INVALIDAÇÃO PARCIAL DA SENTENÇA. DECOTE DO EXCESSO QUE SUPERA OS LIMITES DO PEDIDO. NECESSIDADE. SENTENÇA REFORMADA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS SUCUMBENCIAIS. IMPUTAÇÃO AOS DEVEDORES FIDUCIÁRIOS. SUCUMBÊNCIA QUASE INTEGRAL. MAJORAÇÃO DA VERBA ORIGINALMENTE FIXADA. SENTENÇA E APELO FORMULADOS SOB A ÉGIDE DA NOVA CODIFICAÇÃO PROCESSUAL CIVIL (NCPC, ARTS. 85, §§ 2º E 11). 1. Constituídos os devedores fiduciários formalmente em mora, deflagrado o procedimento extrajudicial legalmente autorizado para consumação da garantia representada pela alienação fiduciária e aperfeiçoada a intimação exigida como forma de ser-lhes assegurada oportunidade para emendar a mora, a expiração do prazo assinalado para quitação do débito inadimplido enseja a efetivação da garantia fiduciária mediante a consolidação da propriedade do imóvel que a representa em nome do credor fiduciário (Lei nº 9.514/97, art. 26). 2. Consolidada a propriedade do imóvel oferecido em garantia em nome do credor fiduciário, o bem deve ser alienado, em leilão público, no trintídio subsequente à averbação da propriedade, não sendo imprescindível a intimação dos antigos fiduciantes quanto ao leilão por não lhe remanescer nenhum direito sobre o bem nem lastro para se opor à consumação da alienação, inclusive em relação ao preço da alienação, cuja condução está afeta ao próprio credor, assistindo aos fiduciantes tão somente o direito de serem contemplados com eventual saldo sobejante do produto da alienação se efetivamente for consumada e lhe for devido algum crédito. 3. Conquanto a relação concertada entre compradores e vendedora em sede de compra e venda com alienação fiduciária se qualifique como relação de consumo, o inadimplemento contratual dos devedores fiduciantes se resolve mediante a aplicação da sistemática de execução extrajudicial prevista nos artigos 26 e 27 da Lei 9.514/97, e não à luz da diretriz genérica do artigo 53 do CDC, que está volvido à infirmação de cláusulas contratuais em que prevista a perda integral das parcelas pagas pelos consumidores para o caso de rescisão do contrato por motivo a eles imputado. 4. O fato de a relação jurídica se qualificar como de natureza consumerista não ilide a aplicação da legislação que especificamente regula o vínculo diante do diálogo das fontes normativas e da eficácia genérica, abrangente e cogente do direito positivado, e, ademais, a lei específica, como princípio comezinho de hermenêutica, afasta a lei genérica, não se afigurando consoante o sistema, ademais, a afirmação da abusividade de disposições normativas, afastando sua aplicação, se conformes com a Constituição Federal, pois a não-aplicação do direito posto encerra, por via transversa, o reconhecimento da sua desconformidade constitucional, o que demanda procedimento apropriado. 5. Aviados os leilões extrajudiciais determinados pela Lei nº 9.514/97 após a consolidação da propriedade do imóvel oferecido em garantia em favor da credora fiduciária, a frustração da alienação, ilidindo a obtenção de produto superior ao da dívida acrescido das despesas derivadas da realização do procedimento, enseja a resolução da propriedade plena em favor da credora fiduciária (art. 27, § 5º), resultando, em contrapartida, na quitação da dívida garantida e na consequente liberação da credora fiduciária de devolução de qualquer saldo aos fiduciantes, pois não aferido produto apto a liquidar o saldo devedor e as despesas do procedimento (art. 27, §§ 1º a 4º). 5. Estabelecendo o legislador especial que, se no segundo leilão não for obtido lance igual ou superior ao valor da dívida e dos acessórios discriminados, a obrigação garantida considerar-se-á extinta, restando o credor, nessa situação, exonerado da obrigação de entregar aos devedores eventual saldo sobejante, que, em contrapartida, restarão integralmente alforriados da dívida, pois não contemplada nenhuma prescrição com esse alcance (Lei nº 9.514/97, art. 27, §§ 5º e 6º), inexiste lastro para se cogitar da subsistência de saldo a ser repetido aos fiduciantes, notadamente porque, em se tratando de imóvel adquirido via de financiamento, os devedores não quitaram o preço, estando a repetição de quaisquer valores sujeitada à disciplina legal, não podendo ser realizada mediante a aplicação da regra genérica do artigo 53 do CDC. 6. Asujeição da relação de natureza consumerista ao disposto na lei que pauta especificamente a matéria ante o diálogo das fontes normativas não deriva de mera aplicação dos critérios de especialidade e cronológico de resolução de aparente antinomia entre regras jurídicas, pois amplamente rechaçado pela doutrina consumerista, mas da apreensão de que, conquanto encartando relação de consumo a compra e venda com alienação fiduciária em garantia, o artigo 53 do CDC não disciplina exatamente a questão da apuração de haveres em desfazimento de contratos, apenas determinando a nulidade das cláusulas contratuais que estabeleçam, em flagrante prejuízo ao consumidor, a perda, por este, dos valores pagos em caso de rescisão de contratos de compra e venda de imóveis e nas alienações fiduciárias em garantia, regra que, em última análise, reproduz o princípio de vedação do enriquecimento sem causa, ao qual se submetem todas e quaisquer relações contratuais, sejam ou não caracterizadas relações de consumo, o que legitima a sujeição da espécie à regulação que especificamente lhe confere tratamento legal (Lei nº 9.504/97). 7. Consubstancia regra comezinha de direito processual que, interposto recurso desprovido de efeito suspensivo, conquanto obstando o aperfeiçoamento da coisa julgada, afigura-se perfeitamente viável e plausível a deflagração de execução provisória, que, na modulação firmada pelo legislador, se processa pela mesma forma da execução definitiva, estando simplesmente balizada por cautelas destinadas a resguardar os executados dos efeitos que a efetivação do decidido lhes enseja para a eventualidade de o provimento que a aparelha ser modificado (CPC, art. 520), não sendo lícito ao juiz criar condições à realização da pretensão à margem do legalmente estabelecido. 8. Encontrando respaldo, previsão e modulação legal, a execução provisória deflagrada com lastro em provimento sentencial ainda não acobertado pelo manto da coisa julgada, mas arrostado por recursos desprovidos de efeito suspensivo, está devidamente aparelhada e lastreada no molde legal, inviabilizando que lhe seja colocado óbice por sentença que criara, à margem do procedimento estabelecido pelo legislador, a condição de que a execução do decidido ficaria dependente do trânsito em julgado, pois carente de sustentação esse decisum por implicar a criação de condição para a realização da execução provisória à margem do legalmente estabelecido (CPC, art. 520 e §§). 9. Consolidada a propriedade do imóvel alienado fiduciariamente por meio da execução extrajudicial levada a efeito sob a égide da Lei nº 9.514/97, já estando transcrito o bem em nome do fiduciário, assiste-lhe o direito de, a par de ser imitido na posse do imóvel como manifestação dos atributos inerentes ao domínio que restara consolidado em suas mãos, de ser indenizado mediante a fruição de taxa de ocupação correspondente ao período compreendido entre a data da consolidação da propriedade em seu nome até o momento em que efetivada a imissão de posse, pois o simples fato de ficar desprovido da posse e fruição do imóvel, após ter adquirido-o, pois retido ilegitimamente pelos devedores fiduciários, irradia o fato gerador da compensação (art. 37-A). 10. Aresolução da ação é pautada e modulada pela pretensão formulada, não podendo o juiz exorbitar as balizas às quais fica sujeito defronte o litígio posto, encerrando julgamento ultra petita, ensejando a modulação do decido, a sentença que, tangenciando os limites objetivamente impostos à demanda, confere à parte mais do que demandara, determinando o ocorrido modulação do decidido sem a necessidade de invalidação do julgado (CPC, art. 1.013, § 3º, II). 10. Editada a sentença e aviado os apelos sob a égide da nova codificação civil, o desprovimento do recurso ou seu provimento em parte mínima e, em contrapartida, o provimento do recurso da parte contrária, enseja modulação das verbas de sucumbência na conformidade da resolução empreendida e o decaimento mínimo havido, e, na sequência, a majoração dos honorários advocatícios imputados à parte vencida, porquanto o novo estatuto processual contemplara o instituto dos honorários sucumbenciais recursais, devendo a majoração ser levada a efeito mediante ponderação dos serviços executados na fase recursal pelos patronos da parte exitosa e guardar observância à limitação da verba honorária estabelecida para a fase de conhecimento (NCPC, arts. 85, §§ 2º e 11, e 86). 11. Apelações conhecidas. Apelação da credora fiduciária no proc. nº 2016.16.1.002083-0 (ação ordinária) provida. Apelação dos devedores fiduciário no proc. nº 2016.16.1.003405-6 (ação de reintegração de posse) parcialmente provida. Preliminar acolhida. Apelação da credora fiduciária no proc. nº 2016.16.1.003405-6 (ação de reintegração de posse) parcialmente provida. Majorados os honorários advocatícios impostos aos consumidores. Unânime.

Data do Julgamento : 07/03/2018
Data da Publicação : 15/03/2018
Órgão Julgador : 1ª TURMA CÍVEL
Relator(a) : TEÓFILO CAETANO
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