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Jurisprudência


TJDF APC - 1088352-20160110172462APC

Ementa
CIVIL. CONSUMIDOR. RESPONSABILIDADE CIVIL. RECURSOS DE APELAÇÃO. PLANO DE SAÚDE. ALL CARE. AMIL. APLICAÇÃO DO CDC. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA. SÚMULA 469 DO STJ. CUSTEIO DE INTERNAÇÃO MÉDICO-HOSPITALAR. SITUAÇÃO DE EMERGÊNCIA. CONFIGURAÇÃO. CIRURGIA DECORRENTE DE APENDICITE AGUDA. GRAVE RISCO À SAÚDE DO BENEFICIÁRIO. ATESTADO MÉDICO. INAPLICABILIDADE DO PRAZO DE CARÊNCIA. RECUSA INJUSTIFICADA. DESCUMPRIMENTO DE NORMA LEGAL E CONTRATUAL. LEI Nº 9.656/98. DANO MATERIAL. VALORES DESPENDIDOS COM O PROCEDIMENTO CIRÚRGICO DE URGÊNCIA COBERTO E NEGADO PELO PLANO DE SAÚDE. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. DESPESAS COMPROVADAS. NEXO DE CAUSALIDADE EVIDENCIADO. RESSARCIMENTO DEVIDO. ABALO MORAL. OCORRÊNCIA. PREJUÍZO IN RE IPSA. QUANTUM COMPENSATÓRIO CONFIRMADO. OBEDIÊNCIA AOS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE. NORMATIVA DA EFETIVA EXTENSÃO DO DANO (CPC, ART. 944). APELOS DESPROVIDOS. SENTENÇA CONFIRMADA. 1. Nos termos da súmula 469 do STJ, aplica-se o Código de Defesa do Consumidor aos contratos de plano de saúde. 2. Em se tratando de uma relação de consumo, constatado o vício do serviço, possível que a administradora e a operadora do plano de saúde respondam solidariamente pelos atos, posto que evidenciado que ambos agentes compõem uma cadeia de prestação de serviços, tendo como destinatário final a autora, consumidora e ora apelada. 3. O artigo 35-C, inciso I, da Lei 9.656/98, preceitua a obrigatoriedade da cobertura nos casos de emergência, conceituados como sendo aquele que impliquem risco imediato de vida ou de lesões irreparáveis ao paciente, devidamente atestados pelo médico, o que restou demonstrado na hipótese. 4. A responsabilidade civil das operadoras de plano de saúde é objetiva, fundada no risco da atividade por elas desenvolvida, não se fazendo necessário perquirir acerca da existência de culpa (Súmula n. 469/STJ; CDC, art. 14; CC, arts. 186, 187, 389, 475 e 927; Lei n. 9.656/98). Basta a comprovação do liame de causalidade entre o defeito do serviço e o evento danoso experimentado pelo consumidor, para fins de reparação. 4.1. In casu, depreende-se do processo que o apelado, estudante universitário com 24 anos na data do sinistro, necessitou de internação hospitalar em função de apendicite aguda, com indicação médica para procedimento cirúrgico realizado em caráter de urgência médica. 4.2. No entanto, em contato com a seguradora, a resposta do plano de saúde às solicitações de internação - realizadas pelo próprio segurado, já no hospital e sob a influência de fortes dores no abdômen - foi a negativa de atendimento calcada no argumento de que o participante se encontrava em período de carência com relação à internação hospitalar. 4.3. Nesse contexto, a negativa do plano de saúde restou temerária e abusiva, porquanto a apelante encontrava-se em situação de dor intensa, derivado de procedimento relativamente costumeiro e notadamente não programável, sendo certo que a demora no início do procedimento cirúrgico em casos tais tende a aumentar o risco de infecção e outras complicações, inclusive, a própria vida do segurado. 5. Nesse contexto, a circunstância emergencial determina o cumprimento da obrigação contratual da parte requerida em custear o tratamento médico necessário à parte requerente, não sendo o período de carência justificativa à recusa. 5.1. As cláusulas restritivas de cobertura de despesas nos casos de emergência e/ou urgência, bem assim a aludida Resolução 13 do CONSU, não podem se sobrepor à Lei nº 9.656/98, que veda quaisquer limitações nessas hipóteses. Precedentes do STJ de deste e. TJDFT. 5.2. Esta Corte Superior firmou o entendimento de que o período de carência contratualmente estipulado pelos planos de saúde não prevalece diante de situações emergenciais graves nas quais a recusa de cobertura possa frustrar o próprio sentido e a razão de ser do negócio jurídico firmado. Incidência da Súmula nº 568/STJ. (AgInt no AREsp 858.013/DF, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 09/08/2016, DJe 16/08/2016) 6. A seguradora não só descumpriu a legislação e o contrato, como deu ensejo à compensação pelos danos materiais e morais suportados pelo autor, sendo estes de natureza in re ipsa, ou seja, decorre do próprio evento ofensivo. 7. Danos materiais. Verificada a irregularidade na conduta do plano de saúde em negar o procedimento cirúrgico ao autor levado a cabo em situação de urgência, surge o dever de indenizá-lo pelas expensas que se demonstraram imprescindíveis para a realização do procedimento naquela oportunidade e cujo dispêndio tenha sido devidamente comprovado nos autos. 7.1. Como é cediço, o prejuízo material compreende os danos emergentes (efetiva diminuição patrimonial) e os lucros cessantes (frustração da expectativa de um lucro esperado), sendo imperiosa a demonstração de que a efetiva perda patrimonial decorre do ato ilícito noticiado, conforme arts. 402 e 403 do CC, para fins de ressarcimento. 7.2. Portanto, demonstrado e inconteste o evento danoso, bem assim os danos de cunho patrimonial, e evidenciado o liame entre ambos como sendo de responsabilidade das rés em virtude de sua conduta em negar cobertura a sinistro acobertado pelo contrato, na forma da legislação de regência do mercado de planos privados de assistência à saúde. 8. Danos morais. Via de regra, nos casos de inadimplemento contratual não há que se falar em danos morais, porquanto o descumprimento dessa espécie obrigacional não é de todo imprevisível. 8.1. Todavia, inarredável a existência de dano moral diante da negativa de cobertura pelo plano de saúde calcada em cláusula de carência quando diante de situação do beneficiário resta devidamente caracterizada como urgência ou emergência, visto não se tratar apenas de mero aborrecimento por descumprimento contratual. 8.2. Tal conclusão demonstra-se harmonizada com a jurisprudência do c. STJ, segundo a qual o mero descumprimento contratual não enseja indenização por dano moral. No entanto, nas hipóteses em que há recusa de cobertura por parte da operadora do plano de saúde para tratamento emergencial, como ocorrido no presente caso, a orientação desta Corte é assente quanto à caracterização de dano moral, não se tratando apenas de mero aborrecimento. (AgInt no AREsp 912.662/SP, Rel. Ministro RAUL ARAÚJO, QUARTA TURMA, julgado em 06/09/2016, DJe 21/09/2016) 9. O quantum compensatório a título de dano moral deve ser arbitrado em consonância com os princípios da razoabilidade e proporcionalidade. A fixação do valor dos danos morais há de se atentar, ainda, para a extensão da dor, do sentimento, das marcas deixadas pelo evento danoso, e ainda as condições sociais e econômicas da vítima e as da pessoa obrigada. Essa compensação não pode ser fonte de enriquecimento sem causa da vítima e nem de empobrecimento do devedor. 9.1. O valor a ser fixado também deverá observar o grau de culpa do agente (gravidade da conduta), sua reprovabilidade, repercussão na esfera íntima do ofendido e no meio social, o caráter educativo, o potencial econômico e características pessoais das partes, e a natureza do direito violado. 9.2. Nessa árdua tarefa, cabe ao Poder Judiciário adotar medidas severas e comprometidas hábeis a desestimular as infrações das regras consumeristas, por meio do arbitramento de quantia que cumpra o perfil de advertência à instituição envolvida, sob pena de incentivo à impunidade e de desrespeito ao consumidor. 9.3. Nesse panorama, em homenagem aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade atinentes ao caso versado nestes autos, impõe-se confirmação da verba compensatória fixada pelo Juízo a quo a título de danos morais, a qual alcançou o montante de R$ 12.000,00 (doze mil reais), porquanto atende às peculiaridades do caso concreto e às finalidades do instituto (reprovabilidade da conduta, repercussão na esfera íntima do ofendido, caráter educativo, capacidade econômica da parte), não sendo excessiva a ponto de beirar o enriquecimento ilícito, nem ínfima, que não coíba novas práticas. 10. No que toca aos honorários advocatícios recursais, ex vi do art. 85, § 11, do art. 85, §§ 2º e 11, do CPC/2015 e o Enunciado Administrativo nº 7 do c. STJ, e levando em consideração o trabalho adicional nesta instância recursal, majoro em 5% (cinco por cento) a verba honorária já fixada em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação em favor do apelado, tendo em vista que os apelantes não obtiveram êxito, ainda que parcial, em sua insurgência recursal. 11. Apelos conhecidos e desprovidos. Sentença mantida. Honorários recursais fixados.

Data do Julgamento : 11/04/2018
Data da Publicação : 17/04/2018
Órgão Julgador : 6ª TURMA CÍVEL
Relator(a) : ALFEU MACHADO
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