TJDF APC - 1090502-20161310013183APC
CONSUMIDOR. CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C DANOS MORAIS. PLANO DE SAÚDE. FALSO COLETIVO POR ADESÃO. PRELIMINAR DE ILEGITIMIDADE PASSIVA. REJEITADA. MÉRITO: CONTRATAÇÃO IRREGULAR. ELEGIBILIDADE DO BENEFICIÁRIO. NÃO DEMONSTRADA. EQUIPARAÇÃO AO PLANO INDIVIDUAL. RESOLUÇÃO ANS 195/09. RESCISÃO UNILATERALIMOTIVADA. IMPOSSIBILIDADE. ART. 13, PARÁGRAFO ÚNICO DA LEI 9.656/98. CONDUTA ILÍCITA. MANUTENÇÃO DO PLANO. DANO MORAL. CANCELAMENTO DE PLANO DE SAÚDE. CANCELAMENTO INDEVIDO. AUSÊNCIA DE AVISO PRÉVIO. ESTADO GESTACIONAL AVANÇADO. DANO MORAL CONFIGURADO. QUANTUM. MANUTENÇÃO. PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE. ADSTRIÇÃO À NORMATIVA DA EFETIVA EXTENSÃO DO DANO. HONORÁRIOS RECURSAIS. CABIMENTO. RECURSOS PRINCIPAL E ADESIVO DESPROVIDOS. SENTENÇA MANTIDA. 1. Aplica-se o Código de Defesa do Consumidor aos contratos de plano de saúde (Súmula n. 469/STJ). 1.1Tratando-se de uma relação de consumo, alegado o vício da prestação do serviço contratado, possível que o plano de saúde responda solidariamente pelos atos da administradora, posto que evidenciado que ambos agentes compõem uma cadeia de prestação de serviços, tendo como destinatário final a autora, consumidora e ora apelada. Preliminar rejeitada. 2.Os chamados planos coletivos, modalidades previstas nos artigos 16, VII, 'b' e 'c' da Lei 9.656/98, e qualificados pelos artigos 5º e 9º da Resolução Normativa 195/09 da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), são formas legítimas de contratação de planos privados de assistência à saúde, e apresentam-se como elemento facilitador da expansão do mercado privado de assistência à saúde ao possibilitar a contratação em grupos determinados, negociada por intermédio de empresas ou ainda por entidades associativas, sindicais, cooperativas, estudantis e classistas. 2.1.Suas especificidades denotam uma relação distinta das contratações individuais e familiares, sobretudo no que diz respeito aos parâmetros estabelecidos para se encontrar o equilíbrio econômico-financeiro da contratação, motivo pelo qual, ao contrário daqueles primeiros, os planos coletivos possuem regras próprias de ajustamento do prêmio, tais como liberdade no reajuste anual das mensalidades, exigências acerca do grupo elegível para a contratação, limitado àquelas pessoas que possuam vínculo com a empresa ou entidade estipulante e, eventualmente, seus familiares, necessidade de intervenção de entidade estipulante para a contratação e, por fim, a possibilidade de, cumprindo determinados requisitos, realizar a rescisão imotivada do contrato. 3.Em razão desse panorama customizado, possibilitou-se o acesso de um contingente imensamente maior de pessoas à assistência privada à saúde, mediante adesão a tais modalidades de contratação (empresarial e por adesão) e a precificação sensivelmente diferenciada daquela praticada pelos planos individuais. 3.1.No entanto, essa nova faceta do mercado de saúde suplementar trouxe consigo outras consequências, exempli gratia o desinteresse de algumas operadoras em manter as contratações dos planos individuais - influenciado também, é bem verdade, pelas regras próprias dessa modalidade, notadamente o limite nos reajustes -, bem assim, lamentavelmente, a ocorrência de migrações e contratações por pessoas a princípio não elegíveis para formalizar contratações da modalidade coletiva. 3.2.Em casos tais, como aparentemente ocorrera na presente demanda, o vínculo com a estipulante é realizado apenas pro forma, sem qualquer relação de pertinência ou efetiva ligação com a entidade estipulante - trata-se de apenas mais uma folha a ser assinada junto à proposta de apólice, sem o devido esclarecimento nem a intenção de associação àquela. 4. Ao mesmo tempo em que define regras acerca da definição, classificação e características dos planos de saúde, dentre os quais os planos coletivos, a RN ANS 195/09, em seus artigos 9º, §§ 3º e 4º, 23 e 32, também teve o cuidado de estabelecer normas no sentido de desestimular essa indesejada prática da falsa coletivização, estabelecendo parâmetros para a elegibilidade dos contratantes e apontando responsabilidades, de maneira a exigir maior transparência e conferir rigor à observância da normatização. 4.1.Se as regras de balizamento da contratação de planos coletivos supramencionadas restam flagrantemente infringidas, inarredável que tendem a afetar diretamente o necessário equilíbrio econômico-financeiro do contrato, sendo potencialmente nocivas tanto para todo o grupo segurado, quanto para as próprias empresas e entidades envolvidas, pondo em risco a própria finalidade desse tipo de prestação de serviço. 4.2. Tampouco merecem tais fraudes/abusos serem ignoradas ou, tanto menos, chanceladas pelas instituições de controle. 5.Na seara da modalidade de contratação de planos de saúde coletivos por adesão, a responsabilidade pela comprovação da legitimidade tanto da pessoa jurídica contratante como da condição de elegibilidade do beneficiário é compartilhada tanto pela operadora como pela administradora de benefícios, na forma do art. 9º, §§ 3º e 4º da RN ANS 195/09. 5.1.A consequência ante eventual desídia ou falha nessa obrigação contratual atrai a incidência da sanção prevista no artigo 32 daquela mesma normativa, e cuja aplicação se justifica precisamente para proteger o sistema de planos de saúde coletivos de contratações deturpadas, as quais, ao cabo, prejudicam os beneficiários/consumidores, posto que sendo fictício o vínculo, aqueles restam desassistidos em relação à defesa organizada de seus interesses frente às operadoras, sujeitando-se aos eventuais abusos por estas praticados, escancarando a formação de um desequilíbrio na relação contratual. 5.3.Esse tipo irregular de contratação caracteriza os planos de saúde que possuem natureza de contrato individual, mas que se utilizam de Pessoas Jurídicas para conferir-lhes uma roupagem de plano coletivo, permanecendo, destarte, à margem de toda a rigidez regulatória da ANS aplicável aos planos individuais. (...) Portanto, caberia também à ora apelante, juntamente com a operadora do plano de saúde, a responsabilidade de comprovar a condição de elegibilidade do beneficiário do plano coletivo por adesão. Essa obrigação é de crucial importância, uma vez que a sua não observância implica vínculo direto e individual do beneficiário com a operadora, equiparando-se para todos os efeitos legais ao plano individual ou familiar (art. 32, RN 195/2009). (Acórdão n.1021322, 20160910067304APC, Relator: GISLENE PINHEIRO 7ª TURMA CÍVEL, Data de Julgamento: 31/05/2017, Publicado no DJE: 05/06/2017. Pág.: 704-710) 6.Na espécie, possível se auferir da documentação trazida aos autos, a qual oferta escoro probatório às alegações da autora, que a beneficiária tanto não foi informada acerca do cancelamento do plano de saúde, o que já configura irregularidade na conduta das empresas que promovem o serviço, como tampouco sabia que estava associada a determinada associação, declaração que não foi alvo de impugnação específica pelas requeridas, tendo desavisada adesão somente ocorrido para que se lhe pudesse vender o plano de saúde, visto que as datas constantes da apólice e da ficha de inscrição coincidem, estando esta última, ademais, predominantemente incompleta. 6.1.Assim, resta demonstrado no feito a ausência de vínculo da autora com a entidade estipulante do plano coletivo contratado por intermédio da administradora ré junto à operadora apelante, não apenas em razão da presunção de veracidade que passou a nortear a análise dos fatos trazidos a baila pela autora ao deixarem as rés de oferecer impugnação específica, consoante o art. 341 do CPC, mas também por não se desincumbirem os componentes do polo passivo do ônus de fazer prova de fado impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor (art. 373, III do CPC) relativamente à condição de ser a beneficiária filiada à entidade estipulante do plano de saúde. 6.2.Portanto, realçada pela ausência de prova da condição de elegibilidade da autora, ora apelada, para com o plano de saúde coletivo ao qual ingressara, tem-se que o contrato havido entre as partes no caso em comento se assemelha mais a uma contratação individual do que coletiva, pelo que se impõe a declaração do vínculo direto e individual com a operadora, na forma do art. 32 da RN ANS 195/2009. 7.Verificada a irregularidade na contratação, com a inobservância, pelo plano de saúde, da elegibilidade do beneficiário para adesão à apólice, deve-se prestigiar o art. 32 da RN ANS 195/09, o qual, como visto, equipara o plano coletivo irregularmente contratado ao plano individual ou familiar, independentemente de disponibilização de outro pela operadora - posto que inaplicável o art. 3º da Resolução CONSU 19/99 aos casos de contratação irregular -, justificando-se tal medida sancionatória pela necessidade de disponibilizar mecanismo de inibição de condutas tendentes a manipular o sistema de planos coletivos. 7.1. Do cumprimento do disposto no art. 32 da Resolução ANS 195/09, impõe-se a declaração do vínculo direto e individual do beneficiário com a operadora, devendo ser assegurado ao consumidor o valor da mensalidade pactuada originalmente no plano coletivo, visto que entendimento diverso, com a majoração abrupta e acentuada do prêmio, retiraria o sentido sancionatório que constitui o espírito da normativa. Lado outro, e no mesmo escopo, deve ser reconhecida em relação ao contrato telado nos autos tanto a impossibilidade de resilição unilateral imotivada, quanto a forma de reajuste da mensalidade, características típicas dos planos individuais. 7.2.Dessa maneira, impõe-se a manutenção do plano de saúde da autora, nas condições narradas, visto que ausentes quaisquer das razões justificantes do art. 13, parágrafo único da Lei 9.656/98 para a rescisão unilateral do plano, considerado este como se individual fosse, não apenas em razão da falha das fornecedoras na correta informação do serviço, mas principalmente em razão da sua inadequada contratação, tendo as rés infringido o dever que lhes cumpria de averiguar a elegibilidade do beneficiário para a modalidade do plano contratado. 8.O dano moral se relaciona diretamente com os prejuízos ocasionados a direitos da personalidade, cuja violação afeta diretamente à dignidade do indivíduo e constitui motivação suficiente para fundamentar uma ação dessa natureza (CF, art. 5º, V e X; CDC, art. 6º, VI). 8.1.O mero dissabor/aborrecimento/irritação, por fazer parte do dia a dia da população, não é capaz de romper o equilíbrio psicológico do indivíduo, para fins de configuração do dano moral, notadamente nos casos de inadimplemento contratual, porquanto o descumprimento dessa espécie obrigacional, via de regra, não é de todo imprevisível. 8.2.No particular, a rescisão do contrato de plano de saúde, considerado este como individual (art. 32 da RN/ANS 195/09), por parte da seguradora ré recorrente configura conduta ilícita em razão da vedação expressa pela legislação de regência (art. 13, parágrafo único da Lei 9.656/98). Ademais, tal rescisão imotivada fora realizada, sobretudo, sem qualquer notificação prévia, exigida até mesmo para os contratos coletivos, deixando a beneficiária desamparada em um momento de fragilidade quanto à sua saúde, estando a autora em estágio avançado de gravidez, tendo, ademais, dado à luz na decorrência do trâmite desde feito à revelia de cobertura do plano de saúde, tendo sido as expensas do parto afiançadas pela irmã. 9.Acontratação de plano de saúde gera a legítima expectativa no consumidor de que obterá o adequado tratamento médico, necessário ao restabelecimento da saúde, cuja frustração viola a dignidade da pessoa humana e ultrapassa a esfera do mero inadimplemento contratual, atingindo o direito de personalidade (CDC, art. 14; CC, arts. 186, 187, 389, 475 e 927). 9.1.A autora, adimplente com suas obrigações contratuais, foi surpreendida com o cancelamento do plano de saúde que lhe era fomentado em período gravídico, necessitando realizar consultas e exames típicos dessa sensível condição, sem mencionar a preocupação com os procedimentos relativos ao parto, o que é inadmissível. Considerado o panorama fático delineado, estreme de dúvidas que a conduta dos fornecedores do plano de saúde acarretou à autora apelada dor, sofrimento, medo, sentimento de impotência e indignação suficientemente capazes de consubstanciar dano moral, ferindo os deveres anexos de conduta na relação contratual, notadamente quanto à boa-fé (CC, art. 422). 10. Aquantificação dos danos morais deve obedecer a critérios de razoabilidade e proporcionalidade, levando-se em conta, além da necessidade de compensação dos danos sofridos, as circunstâncias do caso, a natureza do direito violado, a repercussão na esfera íntima do ofendido, a reprovabilidade da conduta,a situação do ofensor (plano de saúde) e a prevenção de comportamentos futuros análogos. Normativa da efetiva extensão do dano (CC, art. 944). Nesse passo, razoável a fixação na origem dos danos morais em R$ 10.000,00. 11. O tribunal, ao julgar o recurso, majorará os honorários fixados anteriormente levando em conta o trabalho adicional realizado em grau recursal, observando, conforme o caso, o disposto nos §§ 2º a 6º, sendo-lhe vedado, no cômputo geral da fixação de honorários devidos ao advogado do vencedor, ultrapassar os respectivos limites estabelecidos nos §§ 2º (20%) e 3º para a fase de conhecimento (§ 11, do art. 85, do CPC/2015). Nesse prisma, os honorários foram majorados para 12% do valor atualizado da condenação. 12. Recurso de apelação e apelo adesivo conhecidos, preliminar de ilegitimidade passiva rejeitada e, no mérito, desprovidos. Sentença mantida. Honorários recursais fixados.
Ementa
CONSUMIDOR. CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C DANOS MORAIS. PLANO DE SAÚDE. FALSO COLETIVO POR ADESÃO. PRELIMINAR DE ILEGITIMIDADE PASSIVA. REJEITADA. MÉRITO: CONTRATAÇÃO IRREGULAR. ELEGIBILIDADE DO BENEFICIÁRIO. NÃO DEMONSTRADA. EQUIPARAÇÃO AO PLANO INDIVIDUAL. RESOLUÇÃO ANS 195/09. RESCISÃO UNILATERALIMOTIVADA. IMPOSSIBILIDADE. ART. 13, PARÁGRAFO ÚNICO DA LEI 9.656/98. CONDUTA ILÍCITA. MANUTENÇÃO DO PLANO. DANO MORAL. CANCELAMENTO DE PLANO DE SAÚDE. CANCELAMENTO INDEVIDO. AUSÊNCIA DE AVISO PRÉVIO. ESTADO GESTACIONAL AVANÇADO. DANO MORAL CONFIGURADO. QUANTUM. MANUTENÇÃO. PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE. ADSTRIÇÃO À NORMATIVA DA EFETIVA EXTENSÃO DO DANO. HONORÁRIOS RECURSAIS. CABIMENTO. RECURSOS PRINCIPAL E ADESIVO DESPROVIDOS. SENTENÇA MANTIDA. 1. Aplica-se o Código de Defesa do Consumidor aos contratos de plano de saúde (Súmula n. 469/STJ). 1.1Tratando-se de uma relação de consumo, alegado o vício da prestação do serviço contratado, possível que o plano de saúde responda solidariamente pelos atos da administradora, posto que evidenciado que ambos agentes compõem uma cadeia de prestação de serviços, tendo como destinatário final a autora, consumidora e ora apelada. Preliminar rejeitada. 2.Os chamados planos coletivos, modalidades previstas nos artigos 16, VII, 'b' e 'c' da Lei 9.656/98, e qualificados pelos artigos 5º e 9º da Resolução Normativa 195/09 da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), são formas legítimas de contratação de planos privados de assistência à saúde, e apresentam-se como elemento facilitador da expansão do mercado privado de assistência à saúde ao possibilitar a contratação em grupos determinados, negociada por intermédio de empresas ou ainda por entidades associativas, sindicais, cooperativas, estudantis e classistas. 2.1.Suas especificidades denotam uma relação distinta das contratações individuais e familiares, sobretudo no que diz respeito aos parâmetros estabelecidos para se encontrar o equilíbrio econômico-financeiro da contratação, motivo pelo qual, ao contrário daqueles primeiros, os planos coletivos possuem regras próprias de ajustamento do prêmio, tais como liberdade no reajuste anual das mensalidades, exigências acerca do grupo elegível para a contratação, limitado àquelas pessoas que possuam vínculo com a empresa ou entidade estipulante e, eventualmente, seus familiares, necessidade de intervenção de entidade estipulante para a contratação e, por fim, a possibilidade de, cumprindo determinados requisitos, realizar a rescisão imotivada do contrato. 3.Em razão desse panorama customizado, possibilitou-se o acesso de um contingente imensamente maior de pessoas à assistência privada à saúde, mediante adesão a tais modalidades de contratação (empresarial e por adesão) e a precificação sensivelmente diferenciada daquela praticada pelos planos individuais. 3.1.No entanto, essa nova faceta do mercado de saúde suplementar trouxe consigo outras consequências, exempli gratia o desinteresse de algumas operadoras em manter as contratações dos planos individuais - influenciado também, é bem verdade, pelas regras próprias dessa modalidade, notadamente o limite nos reajustes -, bem assim, lamentavelmente, a ocorrência de migrações e contratações por pessoas a princípio não elegíveis para formalizar contratações da modalidade coletiva. 3.2.Em casos tais, como aparentemente ocorrera na presente demanda, o vínculo com a estipulante é realizado apenas pro forma, sem qualquer relação de pertinência ou efetiva ligação com a entidade estipulante - trata-se de apenas mais uma folha a ser assinada junto à proposta de apólice, sem o devido esclarecimento nem a intenção de associação àquela. 4. Ao mesmo tempo em que define regras acerca da definição, classificação e características dos planos de saúde, dentre os quais os planos coletivos, a RN ANS 195/09, em seus artigos 9º, §§ 3º e 4º, 23 e 32, também teve o cuidado de estabelecer normas no sentido de desestimular essa indesejada prática da falsa coletivização, estabelecendo parâmetros para a elegibilidade dos contratantes e apontando responsabilidades, de maneira a exigir maior transparência e conferir rigor à observância da normatização. 4.1.Se as regras de balizamento da contratação de planos coletivos supramencionadas restam flagrantemente infringidas, inarredável que tendem a afetar diretamente o necessário equilíbrio econômico-financeiro do contrato, sendo potencialmente nocivas tanto para todo o grupo segurado, quanto para as próprias empresas e entidades envolvidas, pondo em risco a própria finalidade desse tipo de prestação de serviço. 4.2. Tampouco merecem tais fraudes/abusos serem ignoradas ou, tanto menos, chanceladas pelas instituições de controle. 5.Na seara da modalidade de contratação de planos de saúde coletivos por adesão, a responsabilidade pela comprovação da legitimidade tanto da pessoa jurídica contratante como da condição de elegibilidade do beneficiário é compartilhada tanto pela operadora como pela administradora de benefícios, na forma do art. 9º, §§ 3º e 4º da RN ANS 195/09. 5.1.A consequência ante eventual desídia ou falha nessa obrigação contratual atrai a incidência da sanção prevista no artigo 32 daquela mesma normativa, e cuja aplicação se justifica precisamente para proteger o sistema de planos de saúde coletivos de contratações deturpadas, as quais, ao cabo, prejudicam os beneficiários/consumidores, posto que sendo fictício o vínculo, aqueles restam desassistidos em relação à defesa organizada de seus interesses frente às operadoras, sujeitando-se aos eventuais abusos por estas praticados, escancarando a formação de um desequilíbrio na relação contratual. 5.3.Esse tipo irregular de contratação caracteriza os planos de saúde que possuem natureza de contrato individual, mas que se utilizam de Pessoas Jurídicas para conferir-lhes uma roupagem de plano coletivo, permanecendo, destarte, à margem de toda a rigidez regulatória da ANS aplicável aos planos individuais. (...) Portanto, caberia também à ora apelante, juntamente com a operadora do plano de saúde, a responsabilidade de comprovar a condição de elegibilidade do beneficiário do plano coletivo por adesão. Essa obrigação é de crucial importância, uma vez que a sua não observância implica vínculo direto e individual do beneficiário com a operadora, equiparando-se para todos os efeitos legais ao plano individual ou familiar (art. 32, RN 195/2009). (Acórdão n.1021322, 20160910067304APC, Relator: GISLENE PINHEIRO 7ª TURMA CÍVEL, Data de Julgamento: 31/05/2017, Publicado no DJE: 05/06/2017. Pág.: 704-710) 6.Na espécie, possível se auferir da documentação trazida aos autos, a qual oferta escoro probatório às alegações da autora, que a beneficiária tanto não foi informada acerca do cancelamento do plano de saúde, o que já configura irregularidade na conduta das empresas que promovem o serviço, como tampouco sabia que estava associada a determinada associação, declaração que não foi alvo de impugnação específica pelas requeridas, tendo desavisada adesão somente ocorrido para que se lhe pudesse vender o plano de saúde, visto que as datas constantes da apólice e da ficha de inscrição coincidem, estando esta última, ademais, predominantemente incompleta. 6.1.Assim, resta demonstrado no feito a ausência de vínculo da autora com a entidade estipulante do plano coletivo contratado por intermédio da administradora ré junto à operadora apelante, não apenas em razão da presunção de veracidade que passou a nortear a análise dos fatos trazidos a baila pela autora ao deixarem as rés de oferecer impugnação específica, consoante o art. 341 do CPC, mas também por não se desincumbirem os componentes do polo passivo do ônus de fazer prova de fado impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor (art. 373, III do CPC) relativamente à condição de ser a beneficiária filiada à entidade estipulante do plano de saúde. 6.2.Portanto, realçada pela ausência de prova da condição de elegibilidade da autora, ora apelada, para com o plano de saúde coletivo ao qual ingressara, tem-se que o contrato havido entre as partes no caso em comento se assemelha mais a uma contratação individual do que coletiva, pelo que se impõe a declaração do vínculo direto e individual com a operadora, na forma do art. 32 da RN ANS 195/2009. 7.Verificada a irregularidade na contratação, com a inobservância, pelo plano de saúde, da elegibilidade do beneficiário para adesão à apólice, deve-se prestigiar o art. 32 da RN ANS 195/09, o qual, como visto, equipara o plano coletivo irregularmente contratado ao plano individual ou familiar, independentemente de disponibilização de outro pela operadora - posto que inaplicável o art. 3º da Resolução CONSU 19/99 aos casos de contratação irregular -, justificando-se tal medida sancionatória pela necessidade de disponibilizar mecanismo de inibição de condutas tendentes a manipular o sistema de planos coletivos. 7.1. Do cumprimento do disposto no art. 32 da Resolução ANS 195/09, impõe-se a declaração do vínculo direto e individual do beneficiário com a operadora, devendo ser assegurado ao consumidor o valor da mensalidade pactuada originalmente no plano coletivo, visto que entendimento diverso, com a majoração abrupta e acentuada do prêmio, retiraria o sentido sancionatório que constitui o espírito da normativa. Lado outro, e no mesmo escopo, deve ser reconhecida em relação ao contrato telado nos autos tanto a impossibilidade de resilição unilateral imotivada, quanto a forma de reajuste da mensalidade, características típicas dos planos individuais. 7.2.Dessa maneira, impõe-se a manutenção do plano de saúde da autora, nas condições narradas, visto que ausentes quaisquer das razões justificantes do art. 13, parágrafo único da Lei 9.656/98 para a rescisão unilateral do plano, considerado este como se individual fosse, não apenas em razão da falha das fornecedoras na correta informação do serviço, mas principalmente em razão da sua inadequada contratação, tendo as rés infringido o dever que lhes cumpria de averiguar a elegibilidade do beneficiário para a modalidade do plano contratado. 8.O dano moral se relaciona diretamente com os prejuízos ocasionados a direitos da personalidade, cuja violação afeta diretamente à dignidade do indivíduo e constitui motivação suficiente para fundamentar uma ação dessa natureza (CF, art. 5º, V e X; CDC, art. 6º, VI). 8.1.O mero dissabor/aborrecimento/irritação, por fazer parte do dia a dia da população, não é capaz de romper o equilíbrio psicológico do indivíduo, para fins de configuração do dano moral, notadamente nos casos de inadimplemento contratual, porquanto o descumprimento dessa espécie obrigacional, via de regra, não é de todo imprevisível. 8.2.No particular, a rescisão do contrato de plano de saúde, considerado este como individual (art. 32 da RN/ANS 195/09), por parte da seguradora ré recorrente configura conduta ilícita em razão da vedação expressa pela legislação de regência (art. 13, parágrafo único da Lei 9.656/98). Ademais, tal rescisão imotivada fora realizada, sobretudo, sem qualquer notificação prévia, exigida até mesmo para os contratos coletivos, deixando a beneficiária desamparada em um momento de fragilidade quanto à sua saúde, estando a autora em estágio avançado de gravidez, tendo, ademais, dado à luz na decorrência do trâmite desde feito à revelia de cobertura do plano de saúde, tendo sido as expensas do parto afiançadas pela irmã. 9.Acontratação de plano de saúde gera a legítima expectativa no consumidor de que obterá o adequado tratamento médico, necessário ao restabelecimento da saúde, cuja frustração viola a dignidade da pessoa humana e ultrapassa a esfera do mero inadimplemento contratual, atingindo o direito de personalidade (CDC, art. 14; CC, arts. 186, 187, 389, 475 e 927). 9.1.A autora, adimplente com suas obrigações contratuais, foi surpreendida com o cancelamento do plano de saúde que lhe era fomentado em período gravídico, necessitando realizar consultas e exames típicos dessa sensível condição, sem mencionar a preocupação com os procedimentos relativos ao parto, o que é inadmissível. Considerado o panorama fático delineado, estreme de dúvidas que a conduta dos fornecedores do plano de saúde acarretou à autora apelada dor, sofrimento, medo, sentimento de impotência e indignação suficientemente capazes de consubstanciar dano moral, ferindo os deveres anexos de conduta na relação contratual, notadamente quanto à boa-fé (CC, art. 422). 10. Aquantificação dos danos morais deve obedecer a critérios de razoabilidade e proporcionalidade, levando-se em conta, além da necessidade de compensação dos danos sofridos, as circunstâncias do caso, a natureza do direito violado, a repercussão na esfera íntima do ofendido, a reprovabilidade da conduta,a situação do ofensor (plano de saúde) e a prevenção de comportamentos futuros análogos. Normativa da efetiva extensão do dano (CC, art. 944). Nesse passo, razoável a fixação na origem dos danos morais em R$ 10.000,00. 11. O tribunal, ao julgar o recurso, majorará os honorários fixados anteriormente levando em conta o trabalho adicional realizado em grau recursal, observando, conforme o caso, o disposto nos §§ 2º a 6º, sendo-lhe vedado, no cômputo geral da fixação de honorários devidos ao advogado do vencedor, ultrapassar os respectivos limites estabelecidos nos §§ 2º (20%) e 3º para a fase de conhecimento (§ 11, do art. 85, do CPC/2015). Nesse prisma, os honorários foram majorados para 12% do valor atualizado da condenação. 12. Recurso de apelação e apelo adesivo conhecidos, preliminar de ilegitimidade passiva rejeitada e, no mérito, desprovidos. Sentença mantida. Honorários recursais fixados.
Data do Julgamento
:
18/04/2018
Data da Publicação
:
24/04/2018
Órgão Julgador
:
6ª TURMA CÍVEL
Relator(a)
:
ALFEU MACHADO
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