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Jurisprudência


TJDF APC - 1110529-20140710054168APC

Ementa
DIREITO IMOBILIÁRIO, DIREITO DO CONSUMIDOR, CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. COOPERATIVA HABITACIONAL. CONTRATO DE CONSTRUÇÃO DE IMÓVEL. COOPERATIVADO. INADIMPLEMENTO CULPOSO. OBRAS NÃO INICIADAS. CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. INCIDÊNCIA. DIÁLOGO COM A LEGISLAÇÃO COOPERATIVISTA (STJ, SÚMULA 602). APLICAÇÃO. RESPONSABILIDADE CIVIL. PRINCÍPIO DA REPARAÇÃO INTEGRAL. ILÍCITO CONTRATUAL. CONFIGURAÇÃO. ATRASO. CAUSAS SUPERVENIENTES. ALEGAÇÃO. JUSTIFICATIVAS INAPTAS A ELIDIR A RESPONSABILIDADE. REPARAÇÃO INTEGRAL DOS PREJUÍZOS. IMPOSIÇÃO. OBRIGAÇÃO DE ENTREGAR O IMÓVEL PROMETIDO SOB PENA DE CONVERSÃO EM PERDAS E DANOS. LUCROS CESSANTES. CABIMENTO. PRIVAÇÃO DE USO. QUALIFICAÇÃO DO DANO. COMPOSIÇÃO NECESSÁRIA. DENUNCIAÇÃO À LIDE. CONSTRUTORAS CONTRATADAS PARA EXECUÇÃO DAS OBRAS. DESCABIMENTO. EXCLUSÃO DE RESPONSABILIDADE EXPRESSA. ASSUNÇÃO DAS DÍVIDAS E DAS CAUSAS JUDICIAIS PELA COOPERATIVA EM MOMENTO POSTERIOR. SENTENÇA. JULGAMENTO EXTRA PETITA. INOCORRÊNCIA. SENTENÇA CONFORME OS LIMITES DA LIDE. VÍCIO INEXISTENTE. PEDIDO JURIDICAMENTE POSSÍVEL. TEORIA ECLÉTICA DA AÇÃO. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO. HONORÁRIOS RECURSAIS. MAJORAÇÃO DA VERBA HONORÁRIA ORIGINALMENTE FIXADA (CPC, ART. 85, §§ 2º e 11). 1. Aparelhada com fundamentação reputada hábil a lastrear o direito invocado e derivando o pedido logicamente da argumentação alinhada, a petição inicial reveste-se de aptidão técnica e pauta o objeto da ação, delimitando os parâmetros que devem governar sua resolução, resultando que, em tendo a sentença atinado para as premissas firmadas, acolhendo pedido efetivamente formulado e devidamente aparelhado, prestara a jurisdição nos parâmetros que estava autorizada, obstando sua qualificação como julgado extra petita (CPC, art. 492). 2. Consubstancia verdadeiro truísmo que o legislador processual, na expressão do dogma constitucional da inafastabilidade da jurisdição, encampara a teoria eclética da ação, resultando que a impossibilidade jurídica do pedido somente se descortina quando a pretensão formulada é repugnada, no plano abstrato, por vedação explicitada pelo direito positivado, não se confundindo o direito subjetivo de ação com a subsistência do direito material invocado, pois sua resolução encarta matéria afetada exclusivamente ao mérito, não às condições da ação ou aos pressupostos processuais. 3. A cooperativa habitacional que figura expressamente no contrato de promessa de compra e venda como alienante/proprietária do terreno no qual é erigido o empreendimento levado a efeito sob a forma de incorporação imobiliária e no qual estava inserida a unidade negociada com o consumidor adquirente, ostentando a condição de partícipe da relação negocial, assumindo a posição contratual de alienante/fornecedora, emoldura-se linearmente na definição inserta nos artigos 2º e 3º do CDC, qualificando-se o negócio formatado como relação de consumo, não ilidindo essa natureza jurídica o fato de estar sujeito à incidência de legislação específica por encerrar o convencionado nítida relação de natureza negocial afeta à compra e venda de imóvel (STJ, súmula 602). 4. O fato de a obrigada ostentar a natureza jurídica de cooperativa não ilide a qualificação do contrato de compra e venda que celebrara na posição de alienante/proprietária como relação de consumo, pois, atuando no mercado imobiliário como verdadeira incorporadora, exigindo como pressuposto para a aquisição de imóveis erigidos mediante sua interseção a adesão ao seu quadro social, desvirtua-se da gênese e destinação das sociedades cooperativas legítimas, porquanto a forma de atuação obsta que os atos praticados no mercado sejam assimilados como atos cooperativos na dicção legal, devendo a entidade, portanto, ser tratada como a fornecedora em que se transmudara, sujeitando-se ao disposto no Código de Defesa do Consumidor (CDC). 5. Apurado o ilícito contratual derivado do inadimplemento da entidade cooperativa, caracterizado pela não entrega do bem imóvel residencial objeto do contrato de construção, deve suportar os consectários da responsabilidade que lhe é imputada, de modo a propiciar a reparação integral dos prejuízos daí decorrentes e injustamente experimentados pela cooperativada que solvera integralmente as contraprestações que lhe estavam destinadas, não se consubstanciando o alegado inadimplemento dos demais cooperados e a má gestão das antigas diretorias da entidade cooperativa causas supervenientes capazes de justificar o atraso e elidir sua responsabilidade, porquanto inerentes aos riscos do empreendimento e das atividades desenvolvidas, compreendendo-se, pois, como riscos da atividade desenvolvida e integrando a álea ordinária do contratado (CC, arts. 402 e 944). 6. A natureza jurídica da entidade cooperativista, que originariamente tinha finalidade diversa do lucro, não é capaz de alforriá-la das responsabilidades contratuais que mantém com seus cooperativados, mormente quanto ao dever de reparar os danos causados aos adquirentes das unidades imobiliárias que promovera à venda, exigindo, como premissa da concertação, a adesão do adquirente ao seu quadro de associados, determinando que, em face de ilícito contratual traduzido em inadimplemento quanto à conclusão e entrega da unidade prometida no prazo convencionado, componha os prejuízos derivados do inadimplemento, inclusive os lucros cessantes sofridos pelo cooperado/adquirente afetado. 7. Os lucros cessantes devidos à cooperativada em decorrência do inadimplemento da entidade cooperativa que lhe prometera a entrega do imóvel prometido à venda em data certa não são afetados pela ausência de finalidade lucrativa inerente ao sistema cooperativista, pois, a despeito de seu desiderato institucional, não está legitimada a entidade a, atuando como incorporadora, ser alforriada das responsabilidades que emergem do negócio jurídico firmado, que, diante das nuanças e objeto, encarta, ademais, relação de consumo, a par de estar sujeito à incidência dos dispositivos que pautam o direito obrigacional (CC, art. 402). 8. Conquanto a legislação cooperativista refute a finalidade lucrativa da entidade, o mesmo não se poder dizer quanto aos cooperativados que, ao firmar contrato de construção de imóvel com participação em cooperativa habitacional visando a aquisição de unidade particularizada, guardam a lídima reserva mental de auferir lucro sobre o produto da cooperação, posto que, se a cooperativa habitacional originariamente não visa o lucro, o mesmo não sucede com os cooperados/adquirentes, pois, de qualquer sorte, visam a obtenção de proveito econômico com a participação no empreendimento e aquisição duma unidade, seja através da fruição pessoal, seja mediante a locação do imóvel, mormente em se cuidando de unidade comercial. 9. A denunciação da lide, como é cediço, destina-se simplesmente a assegurar ao acionado o direito de se forrar quanto ao equivalente à condenação que lhe fora imposta junto a quem, pela lei ou pelo contrato, está obrigado a responder junto a ele pelos efeitos decorrentes do relacionamento que mantém, resultando dessa apreensão a inconsistência e descabimento da intervenção de terceiros formulada por cooperativa habitacional, ao ser acionada por cooperada/adquirente de unidade negociada, visando a responsabilização das empresas com as quais firmara contratos de gestão de obras e de empreitada se os vínculos foram distratados, ilidindo a responsabilidade regressiva, intervenção, ademais, repugnada pela natureza da relação de direito material subsistente entre as litigantes originárias. 10. Editada a sentença e aviado o apelo sob a égide da nova codificação processual civil, o desprovimento do recurso implica a majoração dos honorários advocatícios originalmente impostos à parte recorrente em ponderação com o resultado obtido e com os serviços realizados no grau recursal, porquanto o novo estatuto processual contemplara o instituto dos honorários recursais, que visam remunerar os serviços desenvolvidos após a edição do provimento recorrido e coibir recursos desguarnecidos de plausibilidade, ressalvado que a mensuração da verba deve ser levada a efeito mediante ponderação dos serviços executados na fase recursal pelo patrono da parte exitosa (NCPC, art. 85, §§ 2º e 11). 11. Apelação conhecida e desprovida. Preliminares rejeitadas. Honorários advocatícios recursais fixados. Unânime.

Data do Julgamento : 18/07/2018
Data da Publicação : 25/07/2018
Órgão Julgador : 1ª TURMA CÍVEL
Relator(a) : TEÓFILO CAETANO
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