TJDF APC - 213202-20020110253352APC
DIREITO COMERCIAL. SOCIEDADE LIMITADA. RETIRADA DE SÓCIO. APURAÇÃO DE HAVERES E NULIDADE DE ALTERAÇÃO SOCIAL QUE EXCLUIU O SÓCIO RETIRANTE. 1. Não obstante estabelecerem o Decreto n. 3.508/19 e o art. 48 da Lei de Falências que o sócio somente pode ser excluído da sociedade de responsabilidade limitada nos casos de não integralização das quotas (sócio remisso) e de falência, pacífico na doutrina e na jurisprudência o entendimento de que, havendo justa causa e independentemente de previsão contratual, é possível a despedida compulsória do sócio (LUCENA, JOSÉ WALDECY, in Das sociedades por quotas de responsabilidade limitada, Rio de Janeiro: Renovar, 2001, p. 623).2. É certo, outrossim, que, independentemente da despedida compulsória, o sócio pode pedir para sair da sociedade. Trata-se, aqui, da retirada, e não da exclusão. Vale dizer, o sócio sai porque quer, não porque seja afastado, mas porque a lei o autoriza. Não querendo mais participar da sociedade ou não querendo submeter-se às alterações do contrato social, retira-se da sociedade (arts. 335, 5, e 339 do Código Comercial).3. O autor notificou extrajudicialmente a empresa quanto à sua disposição de não mais participar da sociedade e intimando-a para que promovesse, de acordo com o respectivo contrato social, a apuração dos haveres. Não atendido, ajuizou ação de dissolução de sociedade comercial. Entrementes, foi registrada na Junta Comercial a 4ª alteração contratual, fato esse que deu ensejo ao ajuizamento de ação anulatória.4. Emerge cristalina a nulidade da 4ª alteração contratual. Isso porque o autor não pode simplesmente ser excluído da sociedade-ré, a pretexto de falta de afeição societária, sem a apuração dos haveres e dos bens que lhe são devidos, na forma estipulada no contrato social. O sócio retirante só perde essa qualidade quando recebe seus haveres. Enquanto tal não ocorrer, continua sendo sócio quer de fato, quer de direito. E dessa condição não pode ser alijado ou excluído por ato unilateral dos demais sócios.5. Assim, ainda que a sociedade limitada seja regida pelo princípio da plena autonomia patrimonial da pessoa jurídica, o sócio, em virtude do seu status, tem direito à sua cota-capital, consistente, em especial, na percepção do quinhão de lucros durante a existência social e, em particular, na partilha da massa residual, depois de liquidada a sociedade, não pode simplesmente ser excluído da sociedade. O capital social é a soma representativa das contribuições de todos os quotistas: Os sócios, sob qualquer pretexto, não concorrem com os credores da sociedade, têm um direito de crédito subordinado inteiramente à liquidação social, de modo que este poderá ser igual a zero, ou ainda descer abaixo de zero, tornando-se quantidade negativa, passivo (J. X. Carvalho de Mendonça, citado por Rubens Requião, ob. cit., p. 391).6. Nula a 4ª alteração contratual, patente o interesse de agir do autor-apelante em requerer a dissolução da CASTMETA e a respectiva apuração dos haveres. O autor provocou a prestação jurisdicional no sentido de dissolução de sociedade civil e de apuração de haveres. O interesse nesta dissolução se encontra no fato de que, enquanto não houver seu reconhecimento judicial, não haverá produção de efeitos erga omnes, nem tampouco apuração dos haveres. Nessa esteira, resta incontroverso o prejuízo do sócio retirante, uma vez que persiste a situação de incerteza no tocante à formação pessoal e patrimonial da sociedade.7. De outra perspectiva, também não merece acolhida a afirmação de que o apelante não tem interesse processual na dissolução da sociedade e na apuração dos haveres, porque o juízo natural da controvérsia é o arbitral. No caso, a competência do juízo arbitral limita-se à apuração dos créditos remanescentes. 8. Quer o sócio retirante que a sociedade seja inteiramente dissolvida e, por conseqüência, liquidada. Toda sociedade comercial tem por escopo imediato e primordial, do ponto de vista das pessoas que a compõem, o lucro. No entanto, não se pode olvidar que há interesses maiores de cunho social e econômico que devem ser considerados no momento da dissolução, como por exemplo, os empregos gerados, a produção etc. Por tais motivos, a doutrina e a jurisprudência se firmaram pela primazia da preservação da empresa, ou seja, pela chamada dissolução parcial: Como assente pela maioria dos comercialistas, a dissolução parcial foi construída pela doutrina e adotada pela jurisprudência, precisamente para resguardar a estabilidade da empresa contra eventual instabilidade dos interesses dos sócios, suprindo assim as deficiências do individualismo do Código Comercial, voltado preferencialmente para a proteção destes. Por isso, só uma leitura produtiva daquele diploma pode superar a perplexidade despertada por sua exegese unilateral. Se não se faz mais presente a affectio societatis, nem por isso se desfaz a sociedade, para o bem dela mesmo, dos sócios que ficam e da coletividade que usufrui da empresa. O princípio protetivo da continuidade desta alicerça, por si só, a dissolução parcial e não total (Waldo Fazzio Júnior, in Manual de Direito Comercial, Atlas, 4.ed., p. 184).9. A apuração dos haveres deverá ser feita por liquidação de sentença por artigos e na forma do contrato social, mediante a apuração do ativo, do passivo, dos lucros e das dívidas pendentes, assegurando-se a cada parte o que lhe for efetivamente devido. A questão afeta ao termo inicial da dissolução da sociedade limitada é controvertida. A doutrina não trata com clareza do tema e a jurisprudência nacional, por sua vez, traz à balha posições diametralmente opostas. In casu, a dissolução parcial da sociedade ocorreu com o ajuizamento da ação de dissolução de sociedade comercial c/c apuração de haveres. A partir de então, restou claro que o apelante não tinha mais interesse em permanecer no quadro societário da empresa.
Ementa
DIREITO COMERCIAL. SOCIEDADE LIMITADA. RETIRADA DE SÓCIO. APURAÇÃO DE HAVERES E NULIDADE DE ALTERAÇÃO SOCIAL QUE EXCLUIU O SÓCIO RETIRANTE. 1. Não obstante estabelecerem o Decreto n. 3.508/19 e o art. 48 da Lei de Falências que o sócio somente pode ser excluído da sociedade de responsabilidade limitada nos casos de não integralização das quotas (sócio remisso) e de falência, pacífico na doutrina e na jurisprudência o entendimento de que, havendo justa causa e independentemente de previsão contratual, é possível a despedida compulsória do sócio (LUCENA, JOSÉ WALDECY, in Das sociedades por quotas de responsabilidade limitada, Rio de Janeiro: Renovar, 2001, p. 623).2. É certo, outrossim, que, independentemente da despedida compulsória, o sócio pode pedir para sair da sociedade. Trata-se, aqui, da retirada, e não da exclusão. Vale dizer, o sócio sai porque quer, não porque seja afastado, mas porque a lei o autoriza. Não querendo mais participar da sociedade ou não querendo submeter-se às alterações do contrato social, retira-se da sociedade (arts. 335, 5, e 339 do Código Comercial).3. O autor notificou extrajudicialmente a empresa quanto à sua disposição de não mais participar da sociedade e intimando-a para que promovesse, de acordo com o respectivo contrato social, a apuração dos haveres. Não atendido, ajuizou ação de dissolução de sociedade comercial. Entrementes, foi registrada na Junta Comercial a 4ª alteração contratual, fato esse que deu ensejo ao ajuizamento de ação anulatória.4. Emerge cristalina a nulidade da 4ª alteração contratual. Isso porque o autor não pode simplesmente ser excluído da sociedade-ré, a pretexto de falta de afeição societária, sem a apuração dos haveres e dos bens que lhe são devidos, na forma estipulada no contrato social. O sócio retirante só perde essa qualidade quando recebe seus haveres. Enquanto tal não ocorrer, continua sendo sócio quer de fato, quer de direito. E dessa condição não pode ser alijado ou excluído por ato unilateral dos demais sócios.5. Assim, ainda que a sociedade limitada seja regida pelo princípio da plena autonomia patrimonial da pessoa jurídica, o sócio, em virtude do seu status, tem direito à sua cota-capital, consistente, em especial, na percepção do quinhão de lucros durante a existência social e, em particular, na partilha da massa residual, depois de liquidada a sociedade, não pode simplesmente ser excluído da sociedade. O capital social é a soma representativa das contribuições de todos os quotistas: Os sócios, sob qualquer pretexto, não concorrem com os credores da sociedade, têm um direito de crédito subordinado inteiramente à liquidação social, de modo que este poderá ser igual a zero, ou ainda descer abaixo de zero, tornando-se quantidade negativa, passivo (J. X. Carvalho de Mendonça, citado por Rubens Requião, ob. cit., p. 391).6. Nula a 4ª alteração contratual, patente o interesse de agir do autor-apelante em requerer a dissolução da CASTMETA e a respectiva apuração dos haveres. O autor provocou a prestação jurisdicional no sentido de dissolução de sociedade civil e de apuração de haveres. O interesse nesta dissolução se encontra no fato de que, enquanto não houver seu reconhecimento judicial, não haverá produção de efeitos erga omnes, nem tampouco apuração dos haveres. Nessa esteira, resta incontroverso o prejuízo do sócio retirante, uma vez que persiste a situação de incerteza no tocante à formação pessoal e patrimonial da sociedade.7. De outra perspectiva, também não merece acolhida a afirmação de que o apelante não tem interesse processual na dissolução da sociedade e na apuração dos haveres, porque o juízo natural da controvérsia é o arbitral. No caso, a competência do juízo arbitral limita-se à apuração dos créditos remanescentes. 8. Quer o sócio retirante que a sociedade seja inteiramente dissolvida e, por conseqüência, liquidada. Toda sociedade comercial tem por escopo imediato e primordial, do ponto de vista das pessoas que a compõem, o lucro. No entanto, não se pode olvidar que há interesses maiores de cunho social e econômico que devem ser considerados no momento da dissolução, como por exemplo, os empregos gerados, a produção etc. Por tais motivos, a doutrina e a jurisprudência se firmaram pela primazia da preservação da empresa, ou seja, pela chamada dissolução parcial: Como assente pela maioria dos comercialistas, a dissolução parcial foi construída pela doutrina e adotada pela jurisprudência, precisamente para resguardar a estabilidade da empresa contra eventual instabilidade dos interesses dos sócios, suprindo assim as deficiências do individualismo do Código Comercial, voltado preferencialmente para a proteção destes. Por isso, só uma leitura produtiva daquele diploma pode superar a perplexidade despertada por sua exegese unilateral. Se não se faz mais presente a affectio societatis, nem por isso se desfaz a sociedade, para o bem dela mesmo, dos sócios que ficam e da coletividade que usufrui da empresa. O princípio protetivo da continuidade desta alicerça, por si só, a dissolução parcial e não total (Waldo Fazzio Júnior, in Manual de Direito Comercial, Atlas, 4.ed., p. 184).9. A apuração dos haveres deverá ser feita por liquidação de sentença por artigos e na forma do contrato social, mediante a apuração do ativo, do passivo, dos lucros e das dívidas pendentes, assegurando-se a cada parte o que lhe for efetivamente devido. A questão afeta ao termo inicial da dissolução da sociedade limitada é controvertida. A doutrina não trata com clareza do tema e a jurisprudência nacional, por sua vez, traz à balha posições diametralmente opostas. In casu, a dissolução parcial da sociedade ocorreu com o ajuizamento da ação de dissolução de sociedade comercial c/c apuração de haveres. A partir de então, restou claro que o apelante não tinha mais interesse em permanecer no quadro societário da empresa.
Data do Julgamento
:
18/04/2005
Data da Publicação
:
17/05/2005
Órgão Julgador
:
2ª Turma Cível
Relator(a)
:
WALDIR LEÔNCIO LOPES JÚNIOR
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