TJDF APC - 793018-20090111961262APC
CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE REINTEGRAÇÃO DE POSSE. IMÓVEL PARTICULAR. ÁREA ESBULHADA. COMPREENSÃO DA ATUAL REGIÃO ADMINISTRATIVA DO ITAPOÃ. OCUPAÇÃO POR POPULARES AUTORIZADA INFORMALMENTE E TOLERADA PELO PODER PÚBLICO. POSSE PRECÁRIA. DETENTORES. ESBULHO. CARACTERIZAÇÃO. TRANSMUDAÇÃO DA ÁREA ESBULHADA EM BAIRRO RESIDENCIAL QUE ACOMADA APROXIMADAMENTE 50.000 PESSOAS. DIREITO DE PROPRIEDADE E FUNÇÃO SOCIAL DA PROPRIEDADE. COLISÃO. PONDERAÇÃO. PRESERVAÇÃO DA SITUAÇÃO DE FATO. RESOLUÇÃO DO DOMÍNIO EM PERDAS E DANOS. SITUAÇÃO DE FATO ESTABILIZADA HÁ MAIS DE DÉCADA.APELO. TEMPESTIVIDADE. RECURSO INTERPOSTO APÓS A REPUBLICAÇÃO DA SENTENÇA. DECISÃO. PRECLUSÃO. CERCEAMENTO DE DEFESA. INOCORRÊNCIA. LEGITIMAÇÃO PASSIVA AD CAUSAM. OCUPAÇÃO DO IMÓVEL NÃO DEMONSTRADA. ILEGITIMIDADE. RECONHECIMENTO. CERCEAMENTO DE DEFESA. PROPRIEDADE INCONTROVERSA. EXISTÊNCIA. TÍTULO DE DOMÍNIO. REIVINDICAÇÃO. IMÓVEL. INDIVIDUALIZAÇÃO. REQUISITO ATENDIDO. 1. Refutada a intempestividade do apelo através de decisão acobertada pelo manto da preclusão, a questão resta definitivamente resolvida, não assistindo à parte lastro para, ignorando o decidido, renovar a arguição sob a forma de preliminar de não conhecimento do recurso decorrente da intempestividade, à medida que a preclusão integra o acervo instrumental que guarnece o devido processo legal, obstando que questão resolvida seja reprisada de conformidade com o interesse dos litigantes como forma de ser assegurado o objetivo teleológico do processo, que é a resolução dos conflitos de interesses surgidos das relações sociais intersubjetivas (CPC, art. 471). 2. A legitimação passiva da ação possessória está condicionada à aferição de que o inserido na composição passiva da relação processual possui ou detém, direta ou indiretamente, o imóvel reivindicado ou sobre ele exercita qualquer ingerência de fato apta a ensejar a ilação de que o deteria, resultando da inexistência desse liame a insubsistência de pertinência subjetiva entre o direito invocado e a parte, determinando a afirmação da sua ilegitimidade passiva ad causam, com os efeitos inerentes a essa resolução. 3. Evidenciado que o autor é o efetivo proprietário do imóvel que faz o objeto da possessória que maneja, o fato jurídico do qual emergira a pretensão resta incontroverso, tornando inviável, porque inteiramente desnecessária, a produção de qualquer prova volvida a conferir subsídio ao desate da pretensão possessória inicialmente formulada, legitimando que, sob essa moldura, a ação seja solvida antecipadamente sem que reste caracterizado cerceamento de defesa. 4. A circunstância de, aliada à individualização do imóvel contemplada na inicial, constitui fato público e notório que fora invadido por populares e, posteriormente, convertido na região administrativa do Itapoã, elide qualquer deficiência eventualmente havida na exata discriminação do imóvel que faz o objeto do interdito, vez que, além de não sobejar dúvida sobre a exatidão do objeto do pedido, resta obstada a caracterização de prejuízo à defesa proveniente da eventual imprecisão na discriminação do bem vindicado. 5. Conquanto tenha sido comprovada a posse, premissa genética da invocação da proteção possessória e, outrossim, evidenciado o esbulho ou turbação que a alcançara, demonstrando que efetivamente a parte contrária cometera os atos turbativos alegados, a proteção reintegratória resta desprovida de sustentação, diante da excepcional situação fática experimentada pelo proprietário ante o fato de que, conquanto albergado por decisão judicial, tivera a reintegração de posse assegurada obstada por falta ou conivência do poder público, circunstância que ensejara à germinação de bairro residencial derivado do esbulho havido sobre o imóvel e na sua inserção na área compreendida pela atual região administrativa do Itapoã, habitada por aproximadamente 50.000 (cinqüenta mil) pessoas. 6. A realidade de fato germinada da invasão do imóvel particular que restara transmudado em bairro residencial e região administrativa enseja a germinação de nítida perplexidade, pois de um lado subsiste o direito de propriedade que assiste ao proprietário, outorgando-lhe o direito de vindicar de quem ocupa ilegitimamente o imóvel que lhe pertence como expressão do direito de sequela agregado ao domínio, e, do outro, subsiste situação de fato germinada do fato de que o imóvel que lhe pertence é ocupado atualmente por expressivo número de famílias de baixa renda, tendo se transformado em bairro residencial de substancial densidade demográfica, determinando a compatibilização do direito de propriedade com a função social da propriedade. 7. A colidência entre o direito de propriedade com o postulado da função social da propriedade enseja que, mediante aplicação do princípio da preponderância, seja assegrada prevalência à função social da propriedade, que também ostenta a qualidade de direito e garantia fundamental (CF, art. 5º, XII e XIII), pois o descortinar dos fatos irradiara fato social de natureza irreversível, pois materialmente irrealizável o desalojamento de milhares de famílias e eliminação do bairro residencial germinado como forma de materialização do direito de propriedade que assiste ao proprietário, resultando na constatação de que os fatos, sob essa realidade, sobrepujam a garantia inerente à propriedade. 8. Sob a ponderação da situação de fato estabelecida, que alcançara a fixação de mais de 50.000 pessoas na área vindicada, com o direito de propridade que assiste ao proprietário, sobeja que deve ser privilegiada nitidamente a função social da propriedade, aqui materializada na destinação da área vindicada ao assentamento de famílias de baixa renda, e, sob essa moldura irrefutável, mas não podendo o deterntor do domínio restar desguarnecido, pois nitidamente tivera seu direito violado, mas devendo ser privilegiado o fato social criado em conformidade com a função social da propriedade, o direito de propriedade que o assiste deve ser materializado via de perdas e danos a serem perseguidas pela via própria, inclusive sob a forma de desapropriação indireta, pois, agregado ao fato social germinado, fora deflagrado e consolidado mediante a anuência, incentivo e complacência do poder público, que resistira até mesmo em viabilizar a reintegração de posse concedida em caráter antecipatório. 9. Se a transmudação do direito de sequela inerente ao domínio em indenização não satisfaz o direito de propriedade que assiste ao proprietário, outorga-lhe, condudo, justa contraprestação por dele ter ficado despojado por fato social germinado com a complacência do poder publico, pois a inviabilidade de materialização do direito de sequela inerente ao domínio determina que aufira indenização compatível com o título que ostenta e com o valor do imóvel ocupado, o que deve ser resolvido em sede apropriada, pois exorbita o objeto da pretensão possessória originalmente formulada. 10. Sob a moldura de fato consolidada pelo tempo, que é fator preponderante e inexorável de todos os atos da vida, irradiando efeitos irreversíveis, pois impossível se retroceder na escalada da existência, o que se afigura consoante com a ponderação dos postulados constitucionais em conflito é a preponderância do princípio da segurança jurídica e a preservação do status quo estabelecido há mais de uma década, o que, ademais, se afina com o fim social da propriedade urbana, não ressoando atinente com a proporcionalidade se deslocar mais de 50.000 (cinqüenta mil) pessoas instaladas no imóvel particular como forma de realização do direito de propriedade ante a comoção e perturbação social que essa resolução determinaria, ensejando que o domínio, sob essa realidade, seja realizado sob a forma de perdas e danos. . 11. Apelações conhecidas e providas. Unânime.
Ementa
CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE REINTEGRAÇÃO DE POSSE. IMÓVEL PARTICULAR. ÁREA ESBULHADA. COMPREENSÃO DA ATUAL REGIÃO ADMINISTRATIVA DO ITAPOÃ. OCUPAÇÃO POR POPULARES AUTORIZADA INFORMALMENTE E TOLERADA PELO PODER PÚBLICO. POSSE PRECÁRIA. DETENTORES. ESBULHO. CARACTERIZAÇÃO. TRANSMUDAÇÃO DA ÁREA ESBULHADA EM BAIRRO RESIDENCIAL QUE ACOMADA APROXIMADAMENTE 50.000 PESSOAS. DIREITO DE PROPRIEDADE E FUNÇÃO SOCIAL DA PROPRIEDADE. COLISÃO. PONDERAÇÃO. PRESERVAÇÃO DA SITUAÇÃO DE FATO. RESOLUÇÃO DO DOMÍNIO EM PERDAS E DANOS. SITUAÇÃO DE FATO ESTABILIZADA HÁ MAIS DE DÉCADA.APELO. TEMPESTIVIDADE. RECURSO INTERPOSTO APÓS A REPUBLICAÇÃO DA SENTENÇA. DECISÃO. PRECLUSÃO. CERCEAMENTO DE DEFESA. INOCORRÊNCIA. LEGITIMAÇÃO PASSIVA AD CAUSAM. OCUPAÇÃO DO IMÓVEL NÃO DEMONSTRADA. ILEGITIMIDADE. RECONHECIMENTO. CERCEAMENTO DE DEFESA. PROPRIEDADE INCONTROVERSA. EXISTÊNCIA. TÍTULO DE DOMÍNIO. REIVINDICAÇÃO. IMÓVEL. INDIVIDUALIZAÇÃO. REQUISITO ATENDIDO. 1. Refutada a intempestividade do apelo através de decisão acobertada pelo manto da preclusão, a questão resta definitivamente resolvida, não assistindo à parte lastro para, ignorando o decidido, renovar a arguição sob a forma de preliminar de não conhecimento do recurso decorrente da intempestividade, à medida que a preclusão integra o acervo instrumental que guarnece o devido processo legal, obstando que questão resolvida seja reprisada de conformidade com o interesse dos litigantes como forma de ser assegurado o objetivo teleológico do processo, que é a resolução dos conflitos de interesses surgidos das relações sociais intersubjetivas (CPC, art. 471). 2. A legitimação passiva da ação possessória está condicionada à aferição de que o inserido na composição passiva da relação processual possui ou detém, direta ou indiretamente, o imóvel reivindicado ou sobre ele exercita qualquer ingerência de fato apta a ensejar a ilação de que o deteria, resultando da inexistência desse liame a insubsistência de pertinência subjetiva entre o direito invocado e a parte, determinando a afirmação da sua ilegitimidade passiva ad causam, com os efeitos inerentes a essa resolução. 3. Evidenciado que o autor é o efetivo proprietário do imóvel que faz o objeto da possessória que maneja, o fato jurídico do qual emergira a pretensão resta incontroverso, tornando inviável, porque inteiramente desnecessária, a produção de qualquer prova volvida a conferir subsídio ao desate da pretensão possessória inicialmente formulada, legitimando que, sob essa moldura, a ação seja solvida antecipadamente sem que reste caracterizado cerceamento de defesa. 4. A circunstância de, aliada à individualização do imóvel contemplada na inicial, constitui fato público e notório que fora invadido por populares e, posteriormente, convertido na região administrativa do Itapoã, elide qualquer deficiência eventualmente havida na exata discriminação do imóvel que faz o objeto do interdito, vez que, além de não sobejar dúvida sobre a exatidão do objeto do pedido, resta obstada a caracterização de prejuízo à defesa proveniente da eventual imprecisão na discriminação do bem vindicado. 5. Conquanto tenha sido comprovada a posse, premissa genética da invocação da proteção possessória e, outrossim, evidenciado o esbulho ou turbação que a alcançara, demonstrando que efetivamente a parte contrária cometera os atos turbativos alegados, a proteção reintegratória resta desprovida de sustentação, diante da excepcional situação fática experimentada pelo proprietário ante o fato de que, conquanto albergado por decisão judicial, tivera a reintegração de posse assegurada obstada por falta ou conivência do poder público, circunstância que ensejara à germinação de bairro residencial derivado do esbulho havido sobre o imóvel e na sua inserção na área compreendida pela atual região administrativa do Itapoã, habitada por aproximadamente 50.000 (cinqüenta mil) pessoas. 6. A realidade de fato germinada da invasão do imóvel particular que restara transmudado em bairro residencial e região administrativa enseja a germinação de nítida perplexidade, pois de um lado subsiste o direito de propriedade que assiste ao proprietário, outorgando-lhe o direito de vindicar de quem ocupa ilegitimamente o imóvel que lhe pertence como expressão do direito de sequela agregado ao domínio, e, do outro, subsiste situação de fato germinada do fato de que o imóvel que lhe pertence é ocupado atualmente por expressivo número de famílias de baixa renda, tendo se transformado em bairro residencial de substancial densidade demográfica, determinando a compatibilização do direito de propriedade com a função social da propriedade. 7. A colidência entre o direito de propriedade com o postulado da função social da propriedade enseja que, mediante aplicação do princípio da preponderância, seja assegrada prevalência à função social da propriedade, que também ostenta a qualidade de direito e garantia fundamental (CF, art. 5º, XII e XIII), pois o descortinar dos fatos irradiara fato social de natureza irreversível, pois materialmente irrealizável o desalojamento de milhares de famílias e eliminação do bairro residencial germinado como forma de materialização do direito de propriedade que assiste ao proprietário, resultando na constatação de que os fatos, sob essa realidade, sobrepujam a garantia inerente à propriedade. 8. Sob a ponderação da situação de fato estabelecida, que alcançara a fixação de mais de 50.000 pessoas na área vindicada, com o direito de propridade que assiste ao proprietário, sobeja que deve ser privilegiada nitidamente a função social da propriedade, aqui materializada na destinação da área vindicada ao assentamento de famílias de baixa renda, e, sob essa moldura irrefutável, mas não podendo o deterntor do domínio restar desguarnecido, pois nitidamente tivera seu direito violado, mas devendo ser privilegiado o fato social criado em conformidade com a função social da propriedade, o direito de propriedade que o assiste deve ser materializado via de perdas e danos a serem perseguidas pela via própria, inclusive sob a forma de desapropriação indireta, pois, agregado ao fato social germinado, fora deflagrado e consolidado mediante a anuência, incentivo e complacência do poder público, que resistira até mesmo em viabilizar a reintegração de posse concedida em caráter antecipatório. 9. Se a transmudação do direito de sequela inerente ao domínio em indenização não satisfaz o direito de propriedade que assiste ao proprietário, outorga-lhe, condudo, justa contraprestação por dele ter ficado despojado por fato social germinado com a complacência do poder publico, pois a inviabilidade de materialização do direito de sequela inerente ao domínio determina que aufira indenização compatível com o título que ostenta e com o valor do imóvel ocupado, o que deve ser resolvido em sede apropriada, pois exorbita o objeto da pretensão possessória originalmente formulada. 10. Sob a moldura de fato consolidada pelo tempo, que é fator preponderante e inexorável de todos os atos da vida, irradiando efeitos irreversíveis, pois impossível se retroceder na escalada da existência, o que se afigura consoante com a ponderação dos postulados constitucionais em conflito é a preponderância do princípio da segurança jurídica e a preservação do status quo estabelecido há mais de uma década, o que, ademais, se afina com o fim social da propriedade urbana, não ressoando atinente com a proporcionalidade se deslocar mais de 50.000 (cinqüenta mil) pessoas instaladas no imóvel particular como forma de realização do direito de propriedade ante a comoção e perturbação social que essa resolução determinaria, ensejando que o domínio, sob essa realidade, seja realizado sob a forma de perdas e danos. . 11. Apelações conhecidas e providas. Unânime.
Data do Julgamento
:
21/05/2014
Data da Publicação
:
02/06/2014
Órgão Julgador
:
1ª TURMA CÍVEL
Relator(a)
:
TEÓFILO CAETANO
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