TJDF APC - 822108-20110112232540APC
CIVIL, PROCESSUAL CIVIL E CDC. AÇÃO DE REVISÃO DE CONTRATO. APELAÇÕES CÍVEIS. PROMESSA DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL. UNIDADE HABITACIONAL DE APART-HOTEL. SENTENÇA CITRA PETITA. INEXISTÊNCIA. INVERSÃO DO ÔNUS PROBATÓRIO. PARCELA DE CHAVES. AUSÊNCIA DE VINCULAÇÃO À ENTREGA DA OBRA. SUSPENSÃO DA PARCELA ÚNICA E DAS PRESTAÇÕES DO FINANCIAMENTO ANTES DA ENTREGA DAS CHAVES. PRAZO DE TOLERÂNCIA PELO ATRASO. AUSÊNCIA DE CONTRAPARTIDA DA INCORPORADORA PELO DESCUMPRIMENTO. REVISÃO PARA INCIDIR CLÁUSULA PENAL. PUBLICIDADE ENGANOSA. NÃO CONFIGURAÇÃO. PRORROGAÇÃO POR PRAZO INDEFINIDO EM FACE DE EVENTOS PREVISÍVEIS E ORDINÁRIOS. NULIDADE. NATUREZA DO EMPREENDIMENTO. INCIDÊNCIA DE JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA PELO IGP-M NO CASO DE DEMORA PARA OBTENÇÃO DO FINANCIAMENTO POR CULPA EXCLUSIVA DA INCORPORADORA. DANOS MORAIS. INEXISTÊNCIA. OBRIGAÇÃO DE ENTREGA DOS ITENS PROMETIDOS NA PUBLICIDADE DO EMPREENDIMENTO. CASO FORTUITO. FORÇA MAIOR. INEXISTÊNCIA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. MAJORAÇÃO. DESCABIMENTO. 1. Com efeito, por ser a matéria recorrente neste Tribunal, a seu respeito já tive a oportunidade de me manifestar diversas vezes, estando este relator convencido acerca da viabilidade da reparação pelos danos materiais causados quando o atraso na entrega do imóvel decorre de culpa exclusiva das contratadas. 2. É cediço que o exame dos fatos deve fundar-se nos parâmetros do sistema consumerista, porquanto, no presente caso concreto, a relação jurídica sob exame amolda-se nos exatos termos do art. 3º § 2º, do CDC. Ademais, o contrato em questão amolda-se ao que se denomina de contrato de adesão, onde o consumidor se sujeita a condições previamente estabelecidas. 3. É certo que a demanda ajuizada pelos autores/recorrentes objetiva a revisão de contrato de promessa de compra e venda e os seus efeitos jurídicos ao discordarem de diversas cláusulas contratuais, bem como acerca da exigência de valores antes da entrega da obra, observando-se o disposto no Item IV - Parágrafo único, que assim se expressa: o vencimento das parcelas não se vincula, em nenhuma hipótese, ao andamento das obras em termos de cronograma físico financeiro. No entanto, caso o prazo de conclusão da obra (item II do quadro resumo) venha a ser antecipado, as parcelas então vincendas terão seus prazos antecipados. 4. Havendo previsão de aplicação do índice de correção do saldo devedor até a entrega do imóvel foi INCC (índice nacional de custos da construção), incidindo durante a construção do imóvel até a efetiva entrega. Observe-se que o INCC não constitui prática ilegal, pois o índice não é estabelecido unilateralmente por um dos contratantes, mas pela Fundação Getúlio Vargas - FGV, entidade que não faz parte do contrato e não aufere nenhum benefício. 5. Desnecessário o exame de pedido de inversão do ônus da prova quando a causa comporta o julgamento antecipado, mormente no caso de essa providência de julgamento na forma do artigo 330 do Código de Processo Civil ter sido expressamente requerida pelo pólo ativo na oportunidade para especificar provas. 6. Aexigência de parcela denominada única, de valor substancialmente superior ao das parcelas mensais e semestrais e ao da prestação do financiamento, na data prevista para a conclusão da obra, não tem o condão de atrelar o pagamento à efetiva entrega das unidades, máxime quando expressamente prevista no contrato essa desvinculação. 7. O prazo de tolerância por atraso se destina a sanear o adiamento da entrega da obra decorrente de eventos previsíveis, cotidianos e inerentes à grandeza e duração do empreendimento. A ausência de estipulação de cláusula penal para a incorporadora em face do descumprimento e a contrapartida de exigência aos consumidores de parcela substancial do pagamento na data prevista para a entrega do empreendimento revela desequilíbrio e desproporcionalidade entre as partes contratantes, devendo ser revisada a cláusula correspondente. 8. É abusiva a estipulação de prazo indeterminado para a prorrogação do término da obra, mormente quando a previsão elenca fatos que já devem estar abarcados pelo prazo de tolerância, devendo ser reconhecida a nulidade da cláusula que assim estabelece. 9. Não há falar-se em publicidade enganosa e indução dos consumidores a erro no momento da celebração da compra e venda, relativamente à natureza do empreendimento, quando o material publicitário fazia referência a se tratar de apart-hotel e o contrato de promessa de compra e venda assim previa expressamente. 10. Sendo o financiamento imobiliário uma faculdade do promitente comprador, que após a conclusão da obra pode optar por quitar o saldo com recursos próprios, celebrar mútuo com instituições financeiras ou permanecer pagando as prestações previamente contratadas, eventual demora na liberação do crédito não pode ser imputada à incorporadora, especialmente porque sua obtenção depende de atuação própria do promitente comprador. Reputa-se legal, portanto, a incidência de juros de 1% ao mês e correção monetária pelo IGP-M no interregno entre a conclusão da obra e a obtenção do financiamento imobiliário com instituição financeira. 11. O e. Superior Tribunal de Justiça decidiu que não é abusiva a cláusula de cobrança de juros compensatórios incidentes em período anterior à entrega das chaves nos contratos de compromisso de compra e venda de imóveis em construção sob o regime de incorporação imobiliária. Em outras palavras, os juros no pé não são abusivos (EREsp 670117/PB, SEGUNDA SEÇÃO, DJe 26/11/2012). 12. Considerando-se que os encargos cobrados são lícitos e que o atraso na conclusão da obra não tem o condão de ferir direitos da personalidade, não há falar-se em compensação por danos morais. 13. Ao contrário do que sustenta o recorrente, os transtornos, as dores, o sofrimento experimentado pelo autor se limitaram à esfera do estritamente contratual, na medida em que não foi afetada frontalmente a intimidade e a vida privada da vítima, ante a frustração do fiel cumprimento pela ré do entabulado contratualmente. 14. Ao contrário do que sustentam os autores/recorrentes, os transtornos, as dores, o sofrimento experimentados se limitaram à esfera do estritamente contratual, na medida em que não foi afetada frontalmente a intimidade e a vida privada destes, ante a frustração do fiel cumprimento pela ré do entabulado contratualmente. 15. Aimposição de impedimento administrativo para construir parte do empreendimento vendido não serve como elemento de exclusão da responsabilidade da construtora, uma vez que compete ao empreendedor analisar a possibilidade de construção antes de realizar a venda do imóvel, sendo devida, no caso, a conversão da obrigação de fazer em perdas e danos. 16. Descabe majorar honorários advocatícios quando os parâmetros ditados pelo parágrafo 3º do artigo 20 do Código de Processo Civil foram valorados de forma proporcional, razoável e condizente com a realidade dos autos. RECURSOS CONHECIDOS. DADO PARCIAL PROVIMENTO ao recurso da ré DIRECIONAL ENGENHARIA S/A para excluir da r. sentença, o item c (fl. 1379), que trata de condenação ao pagamento de danos morais pela ré/construtora aos autores e DADO PARCIAL PROVIMENTO à apelação dos autores para, reformando a sentença, CONDENAR a ré/construtora DIRECIONAL ENGENHARIA S/A na imposição de multa diária no valor de R$ 2.000,00 (dois mil reais) por dia de descumprimento, após decorrido o prazo de 90 (noventa) dias, em relação à obrigação de fazer consistente na edificação e instalação de lavanderia, no valor máximo de R$ 180.000,00 (cento e oitenta mil reais), mantendo a sentença nos demais termos.
Ementa
CIVIL, PROCESSUAL CIVIL E CDC. AÇÃO DE REVISÃO DE CONTRATO. APELAÇÕES CÍVEIS. PROMESSA DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL. UNIDADE HABITACIONAL DE APART-HOTEL. SENTENÇA CITRA PETITA. INEXISTÊNCIA. INVERSÃO DO ÔNUS PROBATÓRIO. PARCELA DE CHAVES. AUSÊNCIA DE VINCULAÇÃO À ENTREGA DA OBRA. SUSPENSÃO DA PARCELA ÚNICA E DAS PRESTAÇÕES DO FINANCIAMENTO ANTES DA ENTREGA DAS CHAVES. PRAZO DE TOLERÂNCIA PELO ATRASO. AUSÊNCIA DE CONTRAPARTIDA DA INCORPORADORA PELO DESCUMPRIMENTO. REVISÃO PARA INCIDIR CLÁUSULA PENAL. PUBLICIDADE ENGANOSA. NÃO CONFIGURAÇÃO. PRORROGAÇÃO POR PRAZO INDEFINIDO EM FACE DE EVENTOS PREVISÍVEIS E ORDINÁRIOS. NULIDADE. NATUREZA DO EMPREENDIMENTO. INCIDÊNCIA DE JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA PELO IGP-M NO CASO DE DEMORA PARA OBTENÇÃO DO FINANCIAMENTO POR CULPA EXCLUSIVA DA INCORPORADORA. DANOS MORAIS. INEXISTÊNCIA. OBRIGAÇÃO DE ENTREGA DOS ITENS PROMETIDOS NA PUBLICIDADE DO EMPREENDIMENTO. CASO FORTUITO. FORÇA MAIOR. INEXISTÊNCIA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. MAJORAÇÃO. DESCABIMENTO. 1. Com efeito, por ser a matéria recorrente neste Tribunal, a seu respeito já tive a oportunidade de me manifestar diversas vezes, estando este relator convencido acerca da viabilidade da reparação pelos danos materiais causados quando o atraso na entrega do imóvel decorre de culpa exclusiva das contratadas. 2. É cediço que o exame dos fatos deve fundar-se nos parâmetros do sistema consumerista, porquanto, no presente caso concreto, a relação jurídica sob exame amolda-se nos exatos termos do art. 3º § 2º, do CDC. Ademais, o contrato em questão amolda-se ao que se denomina de contrato de adesão, onde o consumidor se sujeita a condições previamente estabelecidas. 3. É certo que a demanda ajuizada pelos autores/recorrentes objetiva a revisão de contrato de promessa de compra e venda e os seus efeitos jurídicos ao discordarem de diversas cláusulas contratuais, bem como acerca da exigência de valores antes da entrega da obra, observando-se o disposto no Item IV - Parágrafo único, que assim se expressa: o vencimento das parcelas não se vincula, em nenhuma hipótese, ao andamento das obras em termos de cronograma físico financeiro. No entanto, caso o prazo de conclusão da obra (item II do quadro resumo) venha a ser antecipado, as parcelas então vincendas terão seus prazos antecipados. 4. Havendo previsão de aplicação do índice de correção do saldo devedor até a entrega do imóvel foi INCC (índice nacional de custos da construção), incidindo durante a construção do imóvel até a efetiva entrega. Observe-se que o INCC não constitui prática ilegal, pois o índice não é estabelecido unilateralmente por um dos contratantes, mas pela Fundação Getúlio Vargas - FGV, entidade que não faz parte do contrato e não aufere nenhum benefício. 5. Desnecessário o exame de pedido de inversão do ônus da prova quando a causa comporta o julgamento antecipado, mormente no caso de essa providência de julgamento na forma do artigo 330 do Código de Processo Civil ter sido expressamente requerida pelo pólo ativo na oportunidade para especificar provas. 6. Aexigência de parcela denominada única, de valor substancialmente superior ao das parcelas mensais e semestrais e ao da prestação do financiamento, na data prevista para a conclusão da obra, não tem o condão de atrelar o pagamento à efetiva entrega das unidades, máxime quando expressamente prevista no contrato essa desvinculação. 7. O prazo de tolerância por atraso se destina a sanear o adiamento da entrega da obra decorrente de eventos previsíveis, cotidianos e inerentes à grandeza e duração do empreendimento. A ausência de estipulação de cláusula penal para a incorporadora em face do descumprimento e a contrapartida de exigência aos consumidores de parcela substancial do pagamento na data prevista para a entrega do empreendimento revela desequilíbrio e desproporcionalidade entre as partes contratantes, devendo ser revisada a cláusula correspondente. 8. É abusiva a estipulação de prazo indeterminado para a prorrogação do término da obra, mormente quando a previsão elenca fatos que já devem estar abarcados pelo prazo de tolerância, devendo ser reconhecida a nulidade da cláusula que assim estabelece. 9. Não há falar-se em publicidade enganosa e indução dos consumidores a erro no momento da celebração da compra e venda, relativamente à natureza do empreendimento, quando o material publicitário fazia referência a se tratar de apart-hotel e o contrato de promessa de compra e venda assim previa expressamente. 10. Sendo o financiamento imobiliário uma faculdade do promitente comprador, que após a conclusão da obra pode optar por quitar o saldo com recursos próprios, celebrar mútuo com instituições financeiras ou permanecer pagando as prestações previamente contratadas, eventual demora na liberação do crédito não pode ser imputada à incorporadora, especialmente porque sua obtenção depende de atuação própria do promitente comprador. Reputa-se legal, portanto, a incidência de juros de 1% ao mês e correção monetária pelo IGP-M no interregno entre a conclusão da obra e a obtenção do financiamento imobiliário com instituição financeira. 11. O e. Superior Tribunal de Justiça decidiu que não é abusiva a cláusula de cobrança de juros compensatórios incidentes em período anterior à entrega das chaves nos contratos de compromisso de compra e venda de imóveis em construção sob o regime de incorporação imobiliária. Em outras palavras, os juros no pé não são abusivos (EREsp 670117/PB, SEGUNDA SEÇÃO, DJe 26/11/2012). 12. Considerando-se que os encargos cobrados são lícitos e que o atraso na conclusão da obra não tem o condão de ferir direitos da personalidade, não há falar-se em compensação por danos morais. 13. Ao contrário do que sustenta o recorrente, os transtornos, as dores, o sofrimento experimentado pelo autor se limitaram à esfera do estritamente contratual, na medida em que não foi afetada frontalmente a intimidade e a vida privada da vítima, ante a frustração do fiel cumprimento pela ré do entabulado contratualmente. 14. Ao contrário do que sustentam os autores/recorrentes, os transtornos, as dores, o sofrimento experimentados se limitaram à esfera do estritamente contratual, na medida em que não foi afetada frontalmente a intimidade e a vida privada destes, ante a frustração do fiel cumprimento pela ré do entabulado contratualmente. 15. Aimposição de impedimento administrativo para construir parte do empreendimento vendido não serve como elemento de exclusão da responsabilidade da construtora, uma vez que compete ao empreendedor analisar a possibilidade de construção antes de realizar a venda do imóvel, sendo devida, no caso, a conversão da obrigação de fazer em perdas e danos. 16. Descabe majorar honorários advocatícios quando os parâmetros ditados pelo parágrafo 3º do artigo 20 do Código de Processo Civil foram valorados de forma proporcional, razoável e condizente com a realidade dos autos. RECURSOS CONHECIDOS. DADO PARCIAL PROVIMENTO ao recurso da ré DIRECIONAL ENGENHARIA S/A para excluir da r. sentença, o item c (fl. 1379), que trata de condenação ao pagamento de danos morais pela ré/construtora aos autores e DADO PARCIAL PROVIMENTO à apelação dos autores para, reformando a sentença, CONDENAR a ré/construtora DIRECIONAL ENGENHARIA S/A na imposição de multa diária no valor de R$ 2.000,00 (dois mil reais) por dia de descumprimento, após decorrido o prazo de 90 (noventa) dias, em relação à obrigação de fazer consistente na edificação e instalação de lavanderia, no valor máximo de R$ 180.000,00 (cento e oitenta mil reais), mantendo a sentença nos demais termos.
Data do Julgamento
:
24/09/2014
Data da Publicação
:
02/10/2014
Órgão Julgador
:
1ª TURMA CÍVEL
Relator(a)
:
ALFEU MACHADO
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