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Jurisprudência


TJDF APC - 863241-20110112145697APC

Ementa
ADMINISTRATIVO E CONSTITUCIONAL. DIREITO À SAÚDE. PACIENTE PORTADORA DE ENFERMIDADE DE NATUREZA GRAVE E INCURÁVEL. MEDICAMENTO DE USO DIÁRIO. CARÊNCIA DE RECURSOS. ALTO CUSTO. IMPOSSIBILIDADE DE AQUISIÇÃO. FORNECIMENTO PELO ESTADO. DEVER CONSTITUCIONAL. INEXISTÊNCIA DE DOTAÇÃO ORÇAMENTÁRIA. AUSÊNCIA DE PADRONIZAÇÃO PELO ÓRGÃO COMPETENTE. IRRELEVÂNCIA. VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA SEPARAÇÃO DOS PODERES. INEXISTÊNCIA. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. ASTREINTES. FIXAÇÃO. (CPC, ART. 461, §§ 3º E 4º). FORNECIMENTO. VIABILIZAÇÃO. INOCORRÊNCIA. ÓBITO DA DESTINATÁRIA. SANÇÃO. APLICAÇÃO. IMPERATIVIDADE. RECALCITRÂNCIA DO OBRIGADO. 1. O acolhimento do pedido, do qual deriva a cominação de prestação positiva, enseja a qualificação da parte ré como sucumbente, revestindo-a de interesse legítimo para recorrer de forma a, sujeitando o decidido originariamente a reexame, afastar a pretensão acolhida em seu desfavor e alforriá-la da condenação que lhe fora agregada, notadamente quando almejado pela parte exitosa sua sujeição à sanção pecuniária fixada originalmente como forma de viabilização do cumprimento da obrigação de fazer fixada em sede de antecipação de tutela, alforria que tem como premissa a elisão da obrigação da qual derivara. 2. A transcendência do direito à saúde, como expressão mais eloqüente da evolução dos direitos básicos inerentes à pessoa humana e das liberdades e garantias individuais, impõe ao estado a implementação de ações positivas destinadas à materialização do almejado pelo constituinte, revestindo de eficácia plena a norma programática que está inserta no artigo 196 da Constituição Federal, que prescreve que o direito à saúde é direito de todos e dever do estado. 3. À cidadã que, padecendo de doença grave e incurável cujo tratamento reclama o uso contínuo de medicamento não fornecido ordinariamente pelo sistema público de saúde, não usufrui de recursos suficientes para custear o tratamento do qual necessita, assiste o direito de, no exercício subjetivo público à saúde que lhe é resguardado, ser contemplada com o fornecimento gratuito do medicamento que lhe fora prescrito por parte do estado, independentemente de não se qualificar como remédio padronizado e ser de origem estrangeira, consoante, inclusive, apregoa o artigo 207, inciso XXVI, da Lei Orgânica do Distrito Federal. 4. Qualificando-se a obrigação que lhe está debitada como de origem constitucional, a inexistência de prévia e específica dotação orçamentária bem como a ausência de padronização do medicamento pelo órgão competente não exime o ente estatal de adimpli-la, custeando o tratamento médico prescrito, competindo-lhe remanejar as verbas de que dispõe de forma a cumpri-la na forma que lhe está debitada. 5. Inocorre violação ao princípio da separação dos poderes a cominação de obrigação ao poder público de fornecer medicamento a cidadã carente de recursos, pois ao Judiciário, estando municiado com competência para velar e ensejar o cumprimento das leis, tem o dever de controlar a atuação do estado na aplicação das políticas públicas e agir quanto instado pela parte que teve seu direito à saúde menosprezado. 6. Sob a égide do princípio da primazia da tutela específica adotado pelo legislador processual civil ao regular o cumprimento dos provimentos jurisdicionais nas obrigações de fazer, não fazer e de entrega de coisa, a finalidade da sanção prevista no artigo 461, § 4º, do CPC - astreinte - é precipuamente compelir o obrigado a cumprir a obrigação tal como fora entabulada, entregando ao credor tudo aquilo e exatamente aquilo que obteria se tivesse cumprido espontaneamente a obrigação que lhe cabia, não podendo ser traduzida como pena inerente à mora nem ser transmudada em instrumento de fomento de beneficio indevido ao credor. 7. Emergindo da ponderação da origem e destinação da sanção pecuniária destinada a viabilizar o adimplemento da obrigação de fazer com a natureza da obrigação cuja satisfação era almejada - fornecimento de medicamento de alto custo -, que restara qualificado o descumprimento inescusável do ente público da obrigação fixada de fornecer medicamento necessário ao tratamento de paciente portadora de enfermidade grave, que, inclusive, a conduzira ao óbito, a sanção deve ser preservada, porque mensurada em importe razoável, e ser efetivada diante do não cumprimento tempestivo da obrigação, ficando caracterizada a recalcitrância do obrigado, que, por conseguinte, não pode imune aos efeitos da postura assumida. 8. Apelações conhecidas. Desprovida a do réu. Provida a dos autores. Unânime.

Data do Julgamento : 23/04/2015
Data da Publicação : 05/05/2015
Órgão Julgador : 1ª TURMA CÍVEL
Relator(a) : TEÓFILO CAETANO
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