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Jurisprudência


TJDF APC - 883991-20110110324093APC

Ementa
ADMINISTRATIVO E PROCESSO CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DECLARAÇÃO DE NULIDADE DE CONTRATOS E IMPUTABILIDADE DE EMPRESA RÉ. CONTRATAÇÃO DIRETA COM DISPENSA INDEVIDA DE LICITAÇÃO. URGÊNCIA PROVOCADA. PRESCRIÇÃO. PREJUDICIAL DE MÉRITO REJEITADA À LUZ DO ART. 37 §5º DA CF/88. PRELIMINARES. AGRAVO RETIDO REITERADO. CONHECIMENTO. SUPOSTO CERCEAMENTO DE DEFESA INEXISTENTE. REGRA DOS ARTIGOS 130/131, DO CPC. PERSUASÃO RACIONAL DO JUIZ. LIVRE CONVENCIMENTO MOTIVADO. INÉPCIA DA INICIAL. REJEIÇÃO. ATENDIMENTO DAS EXIGÊNCIAS PROCESSUAIS DOS ARTIGOS 282 E 283, DO CPC. NÃO OCORRÊNCIA DA SUSTENTADA OFENSA AO DEVIDO PROCESSO LEGAL. NÃO DEMONSTRAÇÃO DE QUALQUER PREJUÍZO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. EFEITOS INFRINGENTES. EXCEPCIONALIDADE. INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA PARA MODIFICAÇÃO DO JULGADO. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL NÃO CONFIGURADA. DIREITO DE DEFESA EFETIVAMENTE RESPEITADO. COMPREENSÃO DOS LIMITES DO PEDIDO EM SEDE DE APELAÇÃO. ILICITUDES APONTADAS EM PROCEDIMENTO LICITATÓRIO. NOTICIADAS FRAUDES. SOLUÇÃO NA SEARA DO DIREITO ADMINISTRATIVO E NÃO DO CCB/02. REJEIÇÃO DE TODAS AS PRELIMINARES E DO AGRAVO RETIDO. MÉRITO. APURAÇÃO DE DIRECIONAMENTO E FAVORECIMENTO DE EMPRESA EM BURLA A PROCEDIMENTO LICITATÓRIO. FRAUDE CONFIGURADA. COMBINAÇÃO DE PREÇOS EM REGIME DE DISPENSA DE LICITAÇÃO. ACERVO PROBATÓRIO CONVINCENTE E SUFICIENTE A CORROBORAR OS FATOS DENUNCIADOS. REGRA DOS ARTIGOS 59 C/C 49 §§1º E 2º DA LEI Nº 8666/93. MÁ-FÉ EVIDENCIADA IMPULSIONANDO AS FRAUDES. CONFISSÃO. AFRONTA ÀS REGRAS E PRINCÍPIOS DO ART. 3º DA LEI Nº 8666/3 E ART. 37 CAPUT DA CF/88 ESPECIALMENTE LEGALIDADE, MORALIDADE, IMPESSOALIDADE E PROBIDADE. ENRIQUECIMENTO SEM CAUSA. NÃO COMPROVAÇÃO. QUESTÕES DECIDIDAS NO JUÍZO PENAL. RECONHECIMENTO DA MATERIALIDADE E DA AUTORIA NA ESFERA PENAL. INTELIGÊNCIA DO ART. 935 DO CCB/02. APRECIAÇÃO DOS TEMAS À LUZ DOS ARTIGOS 128, 459 E 460, DO CPC. ESCOLHA PRIVILEGIADA DE EMPRESA MEDIANTE APARÊNCIA DE REGULARIDADE. PAGAMENTO DE VANTAGENS ECONÔMICAS ILÍCITAS. CONJUNTO PROBATÓRIO HARMÔNICO. DESFALQUE AO PATRIMÔNIO PÚBLICO. DANO AO ERÁRIO. ÔNUS PROBATÓRIO DO ART. 333, DO CPC. DECRETAÇÃO DA NULIDADE DOS CONTRATOS EXAMINADOS. IMPUTABILIDADE RECONHECIDA. DEVOLUÇÃO DOS VALORES RECEBIDOS EM OBEDIÊNCIA AO ART. 59 C/C 49 §§1º E 2º DA LEI DE LICITAÇÕES E CONTRATOS DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. BOA-FÉ NÃO DEMONSTRADA. CONCORRÊNCIA PARA OS PREJUÍZOS PROVOCADOS. VENIRE CONTRA FACTUM PROPRIUM. REPROVAÇÃO DA CONDUTA DE FRAUDE CONSCIENTE À EXIGÊNCIA LEGAL. RECURSO CONHECIDO. REJEITADAS A PREJUDICIAL DE MÉRITO, O AGRAVO RETIDO E TODAS AS PRELIMINARES SUSCITADAS. CERCEAMENTO DE DEFESA INEXISTENTE. NEGADO PROVIMENTO. MANTIDA NA ÍNTEGRA A SENTENÇA IMPUGNADA. 1.O art. 37, § 5º, da Constituição da República prescreve que A lei estabelecerá os prazos de prescrição para ilícitos praticados por qualquer agente, servidor ou não, que causem prejuízos ao erário, ressalvadas as respectivas ações de ressarcimento. A pretensão de ressarcimento ao Erário é imprescritível, nos termos do disposto no art. 37, § 5º, da Constituição Federal. 2.Se a petição inicial atendeu os requisitos dos artigos 282 e 283, do CPC, não dificultando nem inviabilizando, como se vê, a compreensão dos limites dos pedidos formulados e julgados na sentença, nem mesmo configurando quaisquer dos vícios do art. 295, do mesmo Codex, não prospera a alegação de que a mesma seria inepta. A via da ação civil pública não dispensa a correlação entre pedido e sentença consoante exigência dos artigos 128, 459 e 460, do CPC. 3.Confunde-se a recorrente quando aponta que não houve fato concreto ou objetivo que justifique indevida e genérica imputação, nem quais os fatos objetivos efetivamente apurados, desatendendo as exigências legais para o oferecimento de acusação com as regras e exigências do processo penal, não se atentando para o caso, ação civil pública baseada em noticiadas fraudes na contratação, com pedido de decretação de nulidade de contratos por não configuração de situação emergencial, direcionamento e favorecimento de empresa, combinação de preços, em síntese, fraude à licitação, nos termos do art. 59 da Lei de Licitações e Contratos da Administração Pública c/c art. 49 §§1º e 2º. Pedidos e causa de pedir de fácil constatação com clareza. 4.As decisões nos embargos de declaração observaram os limites da via buscada, que não serve para, de regra, alteração do julgado como, à evidência, pretende a recorrente na via adequada da apelação. Assim, a rejeição tanto dos primeiros quanto dos segundos observaram a regra processual dos artigos 535, 458 do CPC e 93, IX, da CF/88, apesar de não satisfazerem o interesse da ora recorrente que observou, oportunamente, em sede de apelação, o prazo processual para apresentar suas irresignações em 91 laudas. Excepcionalidade dos efeitos infringentes. Inadequação da via eleita para o fim pretendido de alterar o julgado. Nulidade inexistente. Atendimento ao disposto no art. 93, IX da CF/88. 5.Sendo o juiz o destinatário da prova, é certo que somente a ele cumpre aferir sobre a necessidade ou não de sua realização, não sendo, portanto, cabível a dilação probatória quando haja elementos de prova suficientes para o seu livre convencimento motivado e a resolução da controvérsia, devendo a iniciativa do juiz se restringir a situações de perplexidade diante de provas contraditórias, confusas ou incompletas, o que não evidencia ser o caso dos autos. 6.A regra processual dos artigos 130 e 131, do CPC, esclarece que cabe ao juiz, de ofício ou a requerimento da parte, determinar as provas necessárias à instrução do processo sempre que entender necessário para uma apreciação perfeita da questão que lhe é posta. Poderá inclusive, na livre apreciação da prova, atendendo aos fatos e circunstâncias constantes dos autos, indeferir as diligências consideradas inúteis ou meramente protelatórias. Agravo Retido improvido. Cerceamento de defesa inexistente. 7.Ao atribuir efeitos retroativos (ex tunc) à declaração de nulidade do contrato (o art. 59 refere-se ao contrato administrativo, mas assinale-se que o art. 62, § 3º, estende as normas dos arts. 58 a 61 aos contratos de figuração privada), a Lei nº 8.666/93 está a declarar a inépcia do certame competitivo de que haja resultado. Ou seja, declarado nulo o contrato, ao contratado não socorrerá a arguição de que, ainda assim, o contrato haveria de prevalecer porque consequente da licitação em que se apurou a proposta mais vantajosa. 8.(...) Selecionar a proposta mais vantajosa é, a um só tempo, o fim de interesse público que se quer alcançar em toda licitação (sentido amplo) e o resultado que se busca em cada licitação (sentido estrito). Licitação que não instigue competição, para dela surtir a proposta mais vantajosa, descumpre sua finalidade legal e institucional, impondo-se à autoridade competente invalidá-la por vício de ilegalidade, a par de apurar responsabilidades administrativas e penal por desvio de poder, caracterizado que houver sido ato de improbidade administrativa (...) 9.Na lição de MARÇAL JUSTEN FILHO in Comentários à Lei de Licitações, p. 298, 8ª edição: a Administração tem de justificar não apenas a presença dos pressupostos da ausência de licitação. Deve indicar, ademais, o fundamento da escolha de um determinado contratante e de uma específica proposta (...). A lei quer evitar a fraudulenta invocação de dispositivos legais autorizadores da contratação direta. Deverá ser comprovada e documentada a presença dos requisitos legais que autorizam a contratação direta. 10.Não pode ser desconsiderado, apesar da independência das esferas, o que dispõe o art. 935, do CCB/02, já que no caso em apreço há ação criminal apurando a ilicitude dos fatos relacionados com a presente ação civil pública, processo Nº 2011.01.1.048317-5, processada e julgada na 5ª Vara Criminal de Brasília, que recebeu sentença julgando parcialmente procedente a pretensão punitiva, com reconhecimento da materialidade e autoria dos ilícitos descritos na oportuna denúncia, existência dos fatos apontados na presente ação civil pública, comprovando os atos lesivos ao patrimônio público (noticiadas fraudes na contratação, com pedido de decretação de nulidade de contratos por não configuração de situação emergencial, direcionamento e favorecimento de empresa, combinação de preços, em síntese, fraude à licitação, nos termos do art. 59 da Lei de Licitações e Contratos da Administração Pública c/c art. 49 §§1º e 2º). O Supremo Tribunal Federal inclusive firmou o entendimento de que a aplicação de penalidade na instância administrativa é independente das esferas penal, cível e de improbidade administrativa. 11.Do acervo probatório dos autos, apesar da irresignação da recorrente, foi evidenciado que os contratos foram formalizados visando garantir o direcionamento de empresa (ora recorrente), com propósito de favorecimento indevido em procedimento de licitação pública, efetivamente fraudado, em desrespeito às regras e princípios da licitação pública, gerando prejuízo ao Erário e ao procedimento licitatório regular (afronta aos Princípios da Supremacia do Interesse Público, do alcance da finalidade pública, Moralidade, Impessoalidade, Razoabilidade, Legalidade, Igualdade, Boa-fé, dentre outros, exigidos tanto para o certame licitatório na Lei Nº 8666/93, art. 3º quanto pela CF/88, art. 37 caput). O desrespeito a qualquer desses fundamentos constitui elemento indiciário do desvio da vontade dos agentes e, também, da má-fé que os impulsionou. 12.O acervo probatório produzido nos autos, harmônico e conclusivo, conduz ao direcionamento da contratação, através de diversos artifícios perpetrados pelos dirigentes da empresa apelante e pelo ex-presidente da empresa pública apelada, o que, por si só, é suficiente para anular os contratos sub examine (Nº 39/2005 e 54/2005), jogando por terra a sustentada e não provada regularidade do procedimento emergencial sub judice. 13. A garantia da escolha privilegiada da recorrente, mediante aparência de regularidade, por preço e condições que melhor lhe conviesse, favorecimento e direcionamento mediante vantagens econômicas em desacordo com as regras da concorrência pública (art. 3º da Lei Nº 8666/93 e art. 37 caput da CF/88), foi comprovada, evidenciando-se o pagamento de vantagens econômicas ilícitas ao então Presidente da CODEPLAN, fraudes, simulação de consulta de preços junto a fornecedores após apuração e conjunto probatório convincente acerca das ilegalidades perpetradas, gerando desfalque ao patrimônio público. 14.A necessidade de contratação de serviços para a Administração não autoriza a fraude à licitação com direcionamento ou favorecimento de empresas como apurado, diante de todo o convincente acervo probatório sub examine à luz do disposto nos artigos 49 §§1º e 2º e 59 da Lei de Licitações e Contratos da Administração Pública - Lei Nº 8666/93. Tanto é que na esfera criminal houve apresentação de denúncia e condenação. 15.O dano à Administração Pública não decorre somente da diferença de preço, ou da ausência da prestação de serviço, mas da própria contratação irregular em si, causando o dano in re ipsa, descabendo exigir do autor da ação civil pública prova a respeito do tema. Precedentes da Segunda Turma do STJ. Não merece guarida a alegação de que não teria havido qualquer dano à Administração. 16.Ao contrário da irresignação do apelo, de que nada teria sido demonstrado quanto à autoria, nexo de causalidade, má-fé e concorrência ou participação direta ou indireta da apelante para os supostos atos irregulares, o acervo probatório se mostra eficiente e suficiente a corroborar o contrário, prestigiando a correção da sentença impugnada. 17. O fato de o contrato ter sido concluído não pode ser considerado em prejuízo dos demais princípios constitucionais, como os da Legalidade, Moralidade, Impessoalidade, Probidade, à luz dos artigos 3º, 49 §§1º e 2º e 59 da Lei Nº 8666/93 c/c art. 37 caput da CF/88. Assim, por todos os fundamentos acima expostos, verifica-se que agiu com acerto a sentença recorrida ao declarar a nulidade do contrato celebrado entre as partes. 18.Anulado o contrato, a declaração opera efeitos retroativos, e havendo a contratada concorrido para o vício, deve devolver todos os valores pagos pela Administração haja vista não se poder esperar efeito válido de contrato nulo. É o que dispõe o art. 59, parágrafo único, da Lei nº 8.666/93. 19.A declaração de nulidade do contrato administrativo possui, portanto, efeitos ex tunc, isto é, retroage a data da ilegalidade, desconstituindo todos os atos e fases subsequentes. A legislação, no entanto, assegura ao contratado o direito à indenização pelos serviços executados e por outros prejuízos comprovados, desde que não tenha agido de má fé ou contribuído para a consumação do ato ilícito. Afastada a boa fé do contratado, deve o particular restituir as quantias líquidas recebidas do Erário, conforme inteligência do parágrafo único do art. 59 da Lei 8.666/93. 20. Recurso conhecido. Rejeição da prejudicial de mérito, do agravo retido e preliminares suscitadas. No mérito, negado provimento ao apelo mantendo-se íntegra a sentença impugnada.

Data do Julgamento : 29/07/2015
Data da Publicação : 07/08/2015
Órgão Julgador : 3ª TURMA CÍVEL
Relator(a) : ALFEU MACHADO
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