TJDF APC - 891415-20150110416949APC
APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO CONSTITUCIONAL. DIREITO ADMINISTRATIVO. AÇÃO DE RESPONSABILIDADE CIVIL PROPOSTA EM FACE DE AGENTES PÚBLICOS, QUE, AGINDO NESSA QUALIDADE, TERIAM CAUSADO DANOS MATERIAIS E MORAIS AOS AUTORES. SENTENÇA QUE EXTINGUIU O FEITO SEM EXAME DO MÉRITO, POR ILEGITIMIDADE PASSIVA. PEDIDOS DIRIGIDOS A ORGÃO PÚBLICO FEDERAL. EXCLUSÃO. CONHECIMENTO PARCIAL DO APELO. ART. 37, § 6º DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. INTERPRETAÇÃO DADA PELO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. DISPOSITIVO QUE CONTÉM DUPLA GARANTIA. UMA EM FAVOR DO LESADO QUANTO À RESPONSABILIZAÇÃO DO ESTADO OU DO ENTE PRIVADO PRESTADOR DE SERVIÇO PÚBLICO E OUTRA EM FAVOR DO AGENTE PÚBLICO, QUE SOMENTE RESPONDE, REGRESSIVAMENTE, EM FACE DA PESSOA JURÍDICA PÚBLICA OU PRIVADA A QUE ESTEJA VINCULADO, NOS CASOS DE ATUAÇÃO COM DOLO OU CULPA. DANOS QUE TERIAM ADVINDO DE ATOS PRATICADOS POR SERVIDORES PÚBLICOS FEDERAIS NO DESEMPENHO DE SUAS FUNÇÕES. RESPONSABILIDADE PRIMÁRIA DO ESTADO. TEORIA DA FALTA DO SERVIÇO. IMPERTINÊNCIA. ILEGITIMIDADE PASSIVA CORRETAMENTE RECONHECIDA. RECURSO PARCIALMENTE CONHECIDO E NÃO PROVIDO. 1. Os pedidos que tenham por fim impor a servidor público federal ou órgão da União a prática de ato administrativo não podem ser conhecidos em demanda nesta Justiça Distrital (art. 109, I, da Constituição Federal). 2. Embora tecnicamente inadequado o provimento jurisdicional principal requerido (que seja deferido o recurso e comunicado ao juízo a quo o deferimento da apelação e da reforma da decisãoe determinação deexpedição de mandado citatório aos réus), supera-se o rigor formal em atenção ao princípio da instrumentalidade das formas, conhecendo-se parcialmente o recurso, limitado o seu objeto à análise da ilegitimidade passiva, que deu causa à extinção da demanda na instância primeira. 3. Os Apelantes buscam indenização e reparação por danos materiais e morais de que teriam sido vítimas em razão de alegados atos ilícitos praticados pelos Apelados, todos servidores públicos federais, no exercício de suas funções públicas. 4. O juízo a quo, em acolhimento a precedente da Excelsa Corte no julgamento do Recurso Extraordinário nº 327904, envolvendo a aplicação do § 6º do art. 37 da Constituição Federal, houve por bem extinguir o feito, sem examinar-lhe o mérito, por ilegitimidade passiva dos Réus. 5. Ao lado do princípio da Responsabilidade Civil do Estado (§ 6º do art. 37 da Constituição Federal), a questão tem estreito vínculo com outro princípio também constitucional, o da impessoalidade da Administração Pública (art. 37, caput), segundo o qual a atuação de qualquer agente público, nessa qualidade, não é ato próprio dele, mas da pessoa de direito público (ou de direito privado prestadora de serviço público) que lhe investiu no cargo, emprego ou função pública e em nome de quem deve atuar na consecução do interesse público. 6. Adespeito de alguma divergência no campo doutrinário e do julgado do colendo Superior Tribunal de Justiça no sentido de ser faculdade do particular lesado acionar o agente, a Administração ou ambos, a fundamentação adotada pelo magistrado a quo está em perfeita consonância com a posição pacificada do Supremo Tribunal Federal sobre o tema em debate, como bem o demonstram diversos outros julgados, na esteira do precedente citado na r. sentença recorrida. 7. Estando pacificado o tema na Corte Suprema, que tem a autoridade constitucional para dar a última palavra acerca da interpretação de dispositivo da Carta Magna, há de se reconhecer a inviabilidade de o particular ingressar com a ação indenizatória diretamente em face do agente público, que, no exercício de sua função pública, tenha praticado o ato danoso, não importando para a configuração do pólo passivo, como pretendem os Apelantes,provar a culpa dos Apelados pela prática de alegados atos ilícitos. 8. Ainda que a conduta do agente público se possa reputar ilícita, quando praticada no exercício dos misteres que o cargo, emprego ou função públicos lhe conferem, não pode ele responder primariamente face ao particular vítima do dano que daquela conduta advenha, nem mesmo em litisconsórcio com a pessoa de direito público ou de direito privado prestadora de serviço público (concessão, permissão e autorização de serviço) a que esteja vinculado. 9. O acionamento direto do agente público somente terá lugar se o dano que venha a causar decorra de ato desvestido do exercício da função pública, é dizer, quando a conduta danosa seja pura e simplesmente um atuar do cidadão comum, sem qualquer relação com o desempenho das atribuições que detenha em razão do cargo, emprego ou função de que seja titular. 10. Caso em que os atos reputados danosos se constituem em faltas que teriam sido indevidamente lançadas, pareceres e notas técnicas proferidos no bojo de processo administrativo disciplinar a que respondeu o primeiro Apelante, que conteriam informações falsas, atribuindo-se aos Apelados diversas violações de dispositivos legais, tudo, portanto, absoluta e estritamente vinculado ao exercício de suas funções públicas. 11. Ateoria civilista francesa Du Faute do Service, que, segundo os Apelantes, justificaria não haver responsabilização da Administração Pública no caso dos autos, foi construída para traçar os requisitos da responsabilidade do Estado nos casos de omissão na prestação do serviço público ou, segundo se extrai do próprio nome da teoria, quando falta o serviço ou ele é prestado de forma precária, hipóteses em que há responsabilidade subjetiva, em contraposição à teoria do risco administrativo, que é a regra geral no nosso ordenamento jurídico quanto à responsabilização estatal, de cunho objetivo. 12. No caso dos autos, contudo, não houve falta do serviço, mas atuação concreta dos servidores públicos, com a prática de atos tipicamente administrativos, devendo-se asseverar, de todo modo, que, quer se aplicasse a teoria do risco administrativo ou da falta do serviço, estamos a falar da responsabilidade do Estado, e não de seus agentes, que nessa qualidade atuem, os quais somente respondem de forma regressiva (e subjetiva) em face do Ente Público ou do ente privado delegatário de serviço público. 13. Apelação parcialmente conhecida e não provida, mantendo-se intacta a r. Sentença que extinguiu o feito por ilegitimidade passiva.
Ementa
APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO CONSTITUCIONAL. DIREITO ADMINISTRATIVO. AÇÃO DE RESPONSABILIDADE CIVIL PROPOSTA EM FACE DE AGENTES PÚBLICOS, QUE, AGINDO NESSA QUALIDADE, TERIAM CAUSADO DANOS MATERIAIS E MORAIS AOS AUTORES. SENTENÇA QUE EXTINGUIU O FEITO SEM EXAME DO MÉRITO, POR ILEGITIMIDADE PASSIVA. PEDIDOS DIRIGIDOS A ORGÃO PÚBLICO FEDERAL. EXCLUSÃO. CONHECIMENTO PARCIAL DO APELO. ART. 37, § 6º DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. INTERPRETAÇÃO DADA PELO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. DISPOSITIVO QUE CONTÉM DUPLA GARANTIA. UMA EM FAVOR DO LESADO QUANTO À RESPONSABILIZAÇÃO DO ESTADO OU DO ENTE PRIVADO PRESTADOR DE SERVIÇO PÚBLICO E OUTRA EM FAVOR DO AGENTE PÚBLICO, QUE SOMENTE RESPONDE, REGRESSIVAMENTE, EM FACE DA PESSOA JURÍDICA PÚBLICA OU PRIVADA A QUE ESTEJA VINCULADO, NOS CASOS DE ATUAÇÃO COM DOLO OU CULPA. DANOS QUE TERIAM ADVINDO DE ATOS PRATICADOS POR SERVIDORES PÚBLICOS FEDERAIS NO DESEMPENHO DE SUAS FUNÇÕES. RESPONSABILIDADE PRIMÁRIA DO ESTADO. TEORIA DA FALTA DO SERVIÇO. IMPERTINÊNCIA. ILEGITIMIDADE PASSIVA CORRETAMENTE RECONHECIDA. RECURSO PARCIALMENTE CONHECIDO E NÃO PROVIDO. 1. Os pedidos que tenham por fim impor a servidor público federal ou órgão da União a prática de ato administrativo não podem ser conhecidos em demanda nesta Justiça Distrital (art. 109, I, da Constituição Federal). 2. Embora tecnicamente inadequado o provimento jurisdicional principal requerido (que seja deferido o recurso e comunicado ao juízo a quo o deferimento da apelação e da reforma da decisãoe determinação deexpedição de mandado citatório aos réus), supera-se o rigor formal em atenção ao princípio da instrumentalidade das formas, conhecendo-se parcialmente o recurso, limitado o seu objeto à análise da ilegitimidade passiva, que deu causa à extinção da demanda na instância primeira. 3. Os Apelantes buscam indenização e reparação por danos materiais e morais de que teriam sido vítimas em razão de alegados atos ilícitos praticados pelos Apelados, todos servidores públicos federais, no exercício de suas funções públicas. 4. O juízo a quo, em acolhimento a precedente da Excelsa Corte no julgamento do Recurso Extraordinário nº 327904, envolvendo a aplicação do § 6º do art. 37 da Constituição Federal, houve por bem extinguir o feito, sem examinar-lhe o mérito, por ilegitimidade passiva dos Réus. 5. Ao lado do princípio da Responsabilidade Civil do Estado (§ 6º do art. 37 da Constituição Federal), a questão tem estreito vínculo com outro princípio também constitucional, o da impessoalidade da Administração Pública (art. 37, caput), segundo o qual a atuação de qualquer agente público, nessa qualidade, não é ato próprio dele, mas da pessoa de direito público (ou de direito privado prestadora de serviço público) que lhe investiu no cargo, emprego ou função pública e em nome de quem deve atuar na consecução do interesse público. 6. Adespeito de alguma divergência no campo doutrinário e do julgado do colendo Superior Tribunal de Justiça no sentido de ser faculdade do particular lesado acionar o agente, a Administração ou ambos, a fundamentação adotada pelo magistrado a quo está em perfeita consonância com a posição pacificada do Supremo Tribunal Federal sobre o tema em debate, como bem o demonstram diversos outros julgados, na esteira do precedente citado na r. sentença recorrida. 7. Estando pacificado o tema na Corte Suprema, que tem a autoridade constitucional para dar a última palavra acerca da interpretação de dispositivo da Carta Magna, há de se reconhecer a inviabilidade de o particular ingressar com a ação indenizatória diretamente em face do agente público, que, no exercício de sua função pública, tenha praticado o ato danoso, não importando para a configuração do pólo passivo, como pretendem os Apelantes,provar a culpa dos Apelados pela prática de alegados atos ilícitos. 8. Ainda que a conduta do agente público se possa reputar ilícita, quando praticada no exercício dos misteres que o cargo, emprego ou função públicos lhe conferem, não pode ele responder primariamente face ao particular vítima do dano que daquela conduta advenha, nem mesmo em litisconsórcio com a pessoa de direito público ou de direito privado prestadora de serviço público (concessão, permissão e autorização de serviço) a que esteja vinculado. 9. O acionamento direto do agente público somente terá lugar se o dano que venha a causar decorra de ato desvestido do exercício da função pública, é dizer, quando a conduta danosa seja pura e simplesmente um atuar do cidadão comum, sem qualquer relação com o desempenho das atribuições que detenha em razão do cargo, emprego ou função de que seja titular. 10. Caso em que os atos reputados danosos se constituem em faltas que teriam sido indevidamente lançadas, pareceres e notas técnicas proferidos no bojo de processo administrativo disciplinar a que respondeu o primeiro Apelante, que conteriam informações falsas, atribuindo-se aos Apelados diversas violações de dispositivos legais, tudo, portanto, absoluta e estritamente vinculado ao exercício de suas funções públicas. 11. Ateoria civilista francesa Du Faute do Service, que, segundo os Apelantes, justificaria não haver responsabilização da Administração Pública no caso dos autos, foi construída para traçar os requisitos da responsabilidade do Estado nos casos de omissão na prestação do serviço público ou, segundo se extrai do próprio nome da teoria, quando falta o serviço ou ele é prestado de forma precária, hipóteses em que há responsabilidade subjetiva, em contraposição à teoria do risco administrativo, que é a regra geral no nosso ordenamento jurídico quanto à responsabilização estatal, de cunho objetivo. 12. No caso dos autos, contudo, não houve falta do serviço, mas atuação concreta dos servidores públicos, com a prática de atos tipicamente administrativos, devendo-se asseverar, de todo modo, que, quer se aplicasse a teoria do risco administrativo ou da falta do serviço, estamos a falar da responsabilidade do Estado, e não de seus agentes, que nessa qualidade atuem, os quais somente respondem de forma regressiva (e subjetiva) em face do Ente Público ou do ente privado delegatário de serviço público. 13. Apelação parcialmente conhecida e não provida, mantendo-se intacta a r. Sentença que extinguiu o feito por ilegitimidade passiva.
Data do Julgamento
:
02/09/2015
Data da Publicação
:
11/09/2015
Órgão Julgador
:
1ª TURMA CÍVEL
Relator(a)
:
ROMULO DE ARAUJO MENDES
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