TJDF APC - 894590-20140110787570APC
DIREITO CIVIL E DO CONSUMIDOR. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS. DIVULGAÇÃO EM LISTA TELEFÔNICA. PESSOA JURÍDICA. RELAÇÃO DE CONSUMO. CONFIGURAÇÃO. DESTINATÁRIA FÁTICA E ECONÔMICA DO SERVIÇO. INSUFICIÊNCIA TÉCNICA E FÁTICA. EMPRESAS DE COBRANÇA. LEGITIMIDADE PASSIVA. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA COM A EMPRESA PRESTADORA DOS SERVIÇOS. CONTRATO. APERFEIÇOAMENTO. SOCIEDADE COMERCIAL. EMPREGADO DESGUARNECIDO DE PODERES DE GESTÃO E REPRESENTAÇÃO. EFICÁCIA. TEORIA DA APARÊNCIA. APLICAÇÃO. VALIDADE DO NEGÓCIO JURÍDICO. INADIMPLEMENTO CONTRATUAL DA CONTRATADA. SERVIÇOS NÃO FOMENTADOS. COBRANÇAS DE DÉBITO. ILEGALIDADE. CAUSA SUBJACENTE LEGÍTIMA. INEXISTÊNCIA. REPETIÇÃO EM DOBRO. CABIMENTO. DANO MORAL. PESSOA JURÍDICA. OFENSA À HONRA OBJETIVA. INEXISTÊNCIA.SENTENÇA PARCIALMENTE REFORMADA. 1. O legislador de consumo incorporara a teoria finalista como critério para definir o consumidor e para delimitação da natureza jurídica da relação jurídica (CDC, art. 2º), estabelecendo que somente se enquadra como consumidor o destinatário fático e econômico do produto ou serviço que coloca termo à cadeia produtiva, obstando que seja inserido na definição aquele - pessoa física ou jurídica - que adquire o produto ou serviço como simples insumo, reinserindo-os na cadeia produtiva. 2. À luz da regulação legal, reconhece-se a qualidade de consumidora à pessoa jurídica que contrata serviços para divulgação de número de telefone e lista telefônica de circulação restrita, porquanto, além de retirar o serviço contratado da cadeia de produção, ou prestação, dele se revelando como destinatária de fato, não o reinsere no mercado de consumo, qualificando-se como destinatária econômica da prestação contratada (CDC, arts. 2º e 3º), notadamente em se considerando a inquestionável condição de vulnerabilidade da empresa contratante, marcada pela insuficiência técnica e fática que a coloca em situação de desigualdade. 3. O contrato enlaça todos os protagonistas das obrigações ativas e passivas que retrata, emergindo dessa regulação que, concertado contrato de prestação de serviços de divulgação em lista telefônica, tanto a fornecedora direta dos serviços, como as empresas incumbidas de realizarem a cobrança dos débitos afetos ao contrato na forma como convencionada, são partes legítimas para figurarem no polo passivo de demanda promovida pela consumidora dos serviços em virtude de supostas nulidades ou deficiências havidas na contratação, uma vez que responsáveis pela higidez e fomento adequado dos serviços, devendo responder solidariamente por eventuais falhas havidas na prestação e por danos ocasionados ao contratante (CDC, art. 7º, parágrafo único). 4. Conquanto não se desconheça a regra legal consoante a qual obrigam a pessoa jurídica os atos dos administradores, exercidos nos limites de seus poderes definidos no ato constitutivo (art. 47, Código Civil), resultando que, via de regra, somente as pessoas autorizadas pelo contrato social ostentam poderes para contrair direitos e assumir obrigações em nome da sociedade comercial (CC, art. 1.022), essa regulação, em situações concretas, é sobrepujada pela realidade descortinada, conforme encadeado pela Teoria da Aparência, segundo a qual se afirma a validade e eficácia de atos e negócios jurídicos praticados em nome da sociedade por pessoa sem autorização legal ou contratual para tanto. 5. Sob a modulação da Teoria da Aparência, que se destina tão somente a amparar os que procedem de boa-fé, o ato praticado por aquele que aparenta ser titular do direito ou ter os necessários poderes de representação é reputado válido, derivando dessa exegese que, apurado que o contrato de prestação de serviços entabulado entre duas empresas fora assinado por empregado da contratante que, conquanto não ostentasse autorização contratual ou legal para lhe representar, aparentava, perante a contratada, ostentar esses atributos e realizar validamente o negócio, o contrato deve ser reputado válido e eficaz, cuja preservação dos efeitos inerentes está condicionada ao fomento dos serviços contratados. 6. Conquanto apurado que o contrato assinado por preposto da empresa, a despeito de ter sido realizado sem maiores formalidades e por intermédio de fac-símile, não ostenta qualquer ilegalidade ou vício capaz de afetar sua validade e existência, a irradiação dos efeitos jurídicos que lhe são inerentes depende da efetiva prestação dos serviços contratados passível de vincular a contratante, derivando dessa constatação a impossibilidade de imputar-lhe responsabilidade pelo convencionado se não comprovada a realização dos serviços de divulgação em lista telefônica, tal como a correlata contraprestação pecuniária afeta à exigibilidade do pagamento pela sua realização. 7. A inexistência de prova produzida pela fornecedora apta a demonstrar a regularidade no fomento dos serviços contratados torna carente de lastro material o endereçamento de cobranças à beneficiária e destinatária da prestação, resultando que a imputação de débitos desprovidos de causa subjacente legítima consubstancia falha no fomento dos serviços, qualificando-se como ato ilícito e abuso de direito, legitimando a rescisão do negócio, a infirmação da dívida imputada e a eventual composição dos danos originários do havido, pois, conquanto não houvesse incorrido em mora, a consumidora fora qualificada como inadimplente. 8. Aferida a inexistência de débitos derivados de serviços de divulgação em lista telefônica que não foram fomentados e que a consumidora fora indevidamente cobrada por débitos carentes de sustentação, sendo compelida a verter o ilicitamente imputado como forma de ilidir a obrigação e prevenir eventuais anotações restritivas de crédito, impõe que lhe seja assegurado o direito à repetição em dobro do indevidamente exigido e vertido, à medida em que, aliado ao fato de que a cobrança indevida traduz falha nos serviços fomentados pela contratada, é inviável, porquanto derivado de atos comissivos, sua apreensão como erro justificável passível de elidir a sanção apregoada pelo legislador de consumo no sentido de que o exigido e recebido indevidamente pelo fornecedor deve ser repetido na forma dobrada (CDC, art. 42, parágrafo único). 9. A pessoa jurídica, sendo sujeita de deveres e obrigações e provida de credibilidade e nome comercial, é passível de experimentar dano de natureza moral, cuja caracterização está plasmada na noção da honra objetiva, que está inserida no conceito e prestígio que a criação jurídica erigira e usufrui perante a praça em que desenvolve suas atividades, transmudando-se em nítido diferencial e fator determinante do sucesso do empreendimento que integra seu objeto social (STJ, Súmula 227), resultando que, sob essa moldura jurídica, conquanto afetada por ato ilícito, se dele não adviera nenhuma afetação na sua honra objetiva, não experimentando ofensa em seu conceito e credibilidade comerciais, não se divisa a origem genética do dano extrapatrimonial indenizável. 10. Apelações conhecidas e parcialmente providas. Preliminar rejeitada. Sentença parcialmente reformada. Unânime.
Ementa
DIREITO CIVIL E DO CONSUMIDOR. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS. DIVULGAÇÃO EM LISTA TELEFÔNICA. PESSOA JURÍDICA. RELAÇÃO DE CONSUMO. CONFIGURAÇÃO. DESTINATÁRIA FÁTICA E ECONÔMICA DO SERVIÇO. INSUFICIÊNCIA TÉCNICA E FÁTICA. EMPRESAS DE COBRANÇA. LEGITIMIDADE PASSIVA. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA COM A EMPRESA PRESTADORA DOS SERVIÇOS. CONTRATO. APERFEIÇOAMENTO. SOCIEDADE COMERCIAL. EMPREGADO DESGUARNECIDO DE PODERES DE GESTÃO E REPRESENTAÇÃO. EFICÁCIA. TEORIA DA APARÊNCIA. APLICAÇÃO. VALIDADE DO NEGÓCIO JURÍDICO. INADIMPLEMENTO CONTRATUAL DA CONTRATADA. SERVIÇOS NÃO FOMENTADOS. COBRANÇAS DE DÉBITO. ILEGALIDADE. CAUSA SUBJACENTE LEGÍTIMA. INEXISTÊNCIA. REPETIÇÃO EM DOBRO. CABIMENTO. DANO MORAL. PESSOA JURÍDICA. OFENSA À HONRA OBJETIVA. INEXISTÊNCIA.SENTENÇA PARCIALMENTE REFORMADA. 1. O legislador de consumo incorporara a teoria finalista como critério para definir o consumidor e para delimitação da natureza jurídica da relação jurídica (CDC, art. 2º), estabelecendo que somente se enquadra como consumidor o destinatário fático e econômico do produto ou serviço que coloca termo à cadeia produtiva, obstando que seja inserido na definição aquele - pessoa física ou jurídica - que adquire o produto ou serviço como simples insumo, reinserindo-os na cadeia produtiva. 2. À luz da regulação legal, reconhece-se a qualidade de consumidora à pessoa jurídica que contrata serviços para divulgação de número de telefone e lista telefônica de circulação restrita, porquanto, além de retirar o serviço contratado da cadeia de produção, ou prestação, dele se revelando como destinatária de fato, não o reinsere no mercado de consumo, qualificando-se como destinatária econômica da prestação contratada (CDC, arts. 2º e 3º), notadamente em se considerando a inquestionável condição de vulnerabilidade da empresa contratante, marcada pela insuficiência técnica e fática que a coloca em situação de desigualdade. 3. O contrato enlaça todos os protagonistas das obrigações ativas e passivas que retrata, emergindo dessa regulação que, concertado contrato de prestação de serviços de divulgação em lista telefônica, tanto a fornecedora direta dos serviços, como as empresas incumbidas de realizarem a cobrança dos débitos afetos ao contrato na forma como convencionada, são partes legítimas para figurarem no polo passivo de demanda promovida pela consumidora dos serviços em virtude de supostas nulidades ou deficiências havidas na contratação, uma vez que responsáveis pela higidez e fomento adequado dos serviços, devendo responder solidariamente por eventuais falhas havidas na prestação e por danos ocasionados ao contratante (CDC, art. 7º, parágrafo único). 4. Conquanto não se desconheça a regra legal consoante a qual obrigam a pessoa jurídica os atos dos administradores, exercidos nos limites de seus poderes definidos no ato constitutivo (art. 47, Código Civil), resultando que, via de regra, somente as pessoas autorizadas pelo contrato social ostentam poderes para contrair direitos e assumir obrigações em nome da sociedade comercial (CC, art. 1.022), essa regulação, em situações concretas, é sobrepujada pela realidade descortinada, conforme encadeado pela Teoria da Aparência, segundo a qual se afirma a validade e eficácia de atos e negócios jurídicos praticados em nome da sociedade por pessoa sem autorização legal ou contratual para tanto. 5. Sob a modulação da Teoria da Aparência, que se destina tão somente a amparar os que procedem de boa-fé, o ato praticado por aquele que aparenta ser titular do direito ou ter os necessários poderes de representação é reputado válido, derivando dessa exegese que, apurado que o contrato de prestação de serviços entabulado entre duas empresas fora assinado por empregado da contratante que, conquanto não ostentasse autorização contratual ou legal para lhe representar, aparentava, perante a contratada, ostentar esses atributos e realizar validamente o negócio, o contrato deve ser reputado válido e eficaz, cuja preservação dos efeitos inerentes está condicionada ao fomento dos serviços contratados. 6. Conquanto apurado que o contrato assinado por preposto da empresa, a despeito de ter sido realizado sem maiores formalidades e por intermédio de fac-símile, não ostenta qualquer ilegalidade ou vício capaz de afetar sua validade e existência, a irradiação dos efeitos jurídicos que lhe são inerentes depende da efetiva prestação dos serviços contratados passível de vincular a contratante, derivando dessa constatação a impossibilidade de imputar-lhe responsabilidade pelo convencionado se não comprovada a realização dos serviços de divulgação em lista telefônica, tal como a correlata contraprestação pecuniária afeta à exigibilidade do pagamento pela sua realização. 7. A inexistência de prova produzida pela fornecedora apta a demonstrar a regularidade no fomento dos serviços contratados torna carente de lastro material o endereçamento de cobranças à beneficiária e destinatária da prestação, resultando que a imputação de débitos desprovidos de causa subjacente legítima consubstancia falha no fomento dos serviços, qualificando-se como ato ilícito e abuso de direito, legitimando a rescisão do negócio, a infirmação da dívida imputada e a eventual composição dos danos originários do havido, pois, conquanto não houvesse incorrido em mora, a consumidora fora qualificada como inadimplente. 8. Aferida a inexistência de débitos derivados de serviços de divulgação em lista telefônica que não foram fomentados e que a consumidora fora indevidamente cobrada por débitos carentes de sustentação, sendo compelida a verter o ilicitamente imputado como forma de ilidir a obrigação e prevenir eventuais anotações restritivas de crédito, impõe que lhe seja assegurado o direito à repetição em dobro do indevidamente exigido e vertido, à medida em que, aliado ao fato de que a cobrança indevida traduz falha nos serviços fomentados pela contratada, é inviável, porquanto derivado de atos comissivos, sua apreensão como erro justificável passível de elidir a sanção apregoada pelo legislador de consumo no sentido de que o exigido e recebido indevidamente pelo fornecedor deve ser repetido na forma dobrada (CDC, art. 42, parágrafo único). 9. A pessoa jurídica, sendo sujeita de deveres e obrigações e provida de credibilidade e nome comercial, é passível de experimentar dano de natureza moral, cuja caracterização está plasmada na noção da honra objetiva, que está inserida no conceito e prestígio que a criação jurídica erigira e usufrui perante a praça em que desenvolve suas atividades, transmudando-se em nítido diferencial e fator determinante do sucesso do empreendimento que integra seu objeto social (STJ, Súmula 227), resultando que, sob essa moldura jurídica, conquanto afetada por ato ilícito, se dele não adviera nenhuma afetação na sua honra objetiva, não experimentando ofensa em seu conceito e credibilidade comerciais, não se divisa a origem genética do dano extrapatrimonial indenizável. 10. Apelações conhecidas e parcialmente providas. Preliminar rejeitada. Sentença parcialmente reformada. Unânime.
Data do Julgamento
:
16/09/2015
Data da Publicação
:
24/09/2015
Órgão Julgador
:
1ª TURMA CÍVEL
Relator(a)
:
TEÓFILO CAETANO
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