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Jurisprudência


TJDF APC - 894618-20140110942134APC

Ementa
CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. APOSENTADORIA. LICENÇA-PRÊMIO NÃO GOZADA. CONVERSÃO EM PECÚNIA. CABIMENTO. PRINCÍPIOS DA MORALIDADE ADMINISTRATIVA E DO ENUNCIADO GERAL DE DIREITO QUE REPUGNA O LOCUPLETAMENTO DESPROVIDO DE CAUSA LEGÍTIMA. DIREITO POSTULADO E RECONHECIDO ADMINISTRATIVAMENTE. ATO ADMINISTRATIVO DE RECONHECIMENTO. PRESCRIÇÃO SUSPENSÃO DURANTE O TRÂNSITO DO PROCEDIMENTO E INTERRUPÇÃO PELO ATO ADMINISTARTIVO DE RECONHECIMENTO (DECRETO Nº 20.910/32, art. 4º, CC, art. 202, VI). PRAZO. RETOMADA.TERMO INICIAL. RECONHECIMENTO. PREJUDICIAL AFASTADA.(CC, ART. 202, VI). SENTENÇA. CASSAÇÃO. EXAMINAÇÃO IMEDIATA DO MÉRITO. POSSIBILIDADE (ART. 515, § 1º). PRETENSÃO CONDENATÓRIA. ACOLHIMENTO. ADEQUAÇÃO À OBRIGAÇÃO. 1. O termo inicial do prazo para o servidor aposentado vindicar a conversão em pecúnia da licença-prêmio não usufruída enquanto estivera em atividade é o momento em que é transposto para a inatividade, pois antes do fato não o assistia direito à postulação, obstando a germinação da pretensão, que traduz, na exata dicção do princípio da actio nata, a demarcação do prazo dentro do qual deve ser materializada antes de dela decair em razão da prescrição. 2. Diante da sua origem e destinação, a prescrição tem como pressuposto a inércia do titular do direito, que, deixando de exercitá-lo, enseja a atuação do tempo sobre a pretensão que o assistia, resultando na sua extinção se não exercitada dentro dos prazos assinalados pelo legislador de acordo com a natureza que ostenta (CC, art. 189), o que obsta que seja desvirtuada da sua origem e transmudada em instrumento de alforria do obrigado quando a paralisação do fluxo processual deriva do funcionamento do mecanismo administrativo, e não da inércia do credor. 3. Aviado pleito na esfera administrativa demandando o direito, a demora da Administração Pública no estudo, reconhecimento ou no pagamento da dívida vindicada por aquele que se apresenta como seu credor suspende o curso do prazo prescricional a partir da data da entrada do requerimento nos livros ou protocolos das repartições públicas, pois a inércia do próprio obrigado elide o fato gerador da prescrição como instrumento de estabilização das relações obrigacionais, que é a omissão do titular do direito na perseguição da sua materialização (Decreto nº 20.910/32, art. 4º e parágrafo único). 4. O retardamento em que incide a administração no exame e manifestação de posicionamento negativo sobre a pretensão aduzida administrativamente almejando a percepção à conversão de licença-prêmio não usufruída em pecúnia pelo administrado interfere na fluição do prazo prescricional, pois enquanto processada a pendência na seara administrativa o interregno não flui, permanecendo suspenso, notadamente porque, agregado ao fato de que não se aperfeiçoa a inércia do credor, não estava revestido de interesse para aduzir a pretensão judicialmente quando nutria a expectativa de vê-la resolvida suasoriamente. 5. O reconhecimento do direito vindicado na esfera administrativa pelo obrigado, encerrando ato inequívoco de assimilação da obrigação, ainda que extrajudicial, consubstancia fato apto a, de conformidade com a regra inserta no artigo 202, inciso VI, do Código Civil, interromper a prescrição, que somente volta a fluir a partir do ato que a interrompera, regulação que se aplica à administração pública ante a ausência de disposição casuística sobre a matéri. 6. Elidida a prescrição reconhecida pela sentença, redundando na reforma do originariamente decidido, o tribunal, estando a ação devidamente instruída e tendo percorrido o itinerário procedimental, restando resguardado o devido processo legal, está autorizado a resolver as questões suscitadas e não resolvidas, ou seja, o próprio mérito da ação, ainda que não tenham sido resolvidas inteiramente pela sentença, não importando a resolução do mérito em ofensa ao princípio do duplo grau de jurisdição ante a previsão legal que autoriza esse procedimento como expressão dos princípios da economia, efetividade e celeridade processuais (CPC, art. 515, § 1º). 7. O servidor que, enquanto estivera em atividade, satisfizera a condição legalmente estabelecida para que pudesse fruir da licença-prêmio, passando a usufruir do direito de se ausentar do trabalho durante o interregno por ele alcançado sem nenhum prejuízo para os vencimentos que aufere, continuara laborando até que implementasse o interregno temporal necessário à sua aposentação, ensejara que seu labor redundasse em benefício para a administração pública. 8. Aposentado o servidor sem a fruição da licença-prêmio que já estava incorporada ao seu patrimônio jurídico, assiste-lhe o direito de merecer a contrapartida pecuniária correspondente, pois, em não tendo usufruído o benefício, laborando durante o período em que poderia ter se ausentado das suas funções sem prejuízo dos seus vencimentos, a administração experimentara os benefícios decorrentes do seu labor, tornando-se obrigada a compensá-lo pecuniariamente na exata proporção do período em que poderia ter se ausentado do trabalho e continuara laborando. 9. Como a repulsa ao locupletamento indevido qualifica-se como princípio geral de direito e guarda conformação com o princípio da moralidade administrativa, ao servidor que se aposenta sem a fruição do período de licença-prêmio que já estava incorporado ao seu patrimônio jurídico deve ser resguardado o mesmo tratamento que legalmente é dispensado ao servidor que falece, à medida que os fundamentos que nortearam a asseguração da conversão do benefício não usufruído pelo servidor falecido em pecúnia são idênticos, suplantando esses enunciados o princípio da legalidade estrita, que, evidentemente, não pode se transmudar em instrumento de fomento de injustiça. 10. O fato de a administração, na esfera administrativa, ter reconhecido o direito, inclusive a expressão pecuniária que alcança, não obsta que o servidor que o titulariza demande sua materialização em sede judicial, à medida em que o reconhecimento da obrigação não encerra sua materialização e, outrossim, não pode ficar o credor dependente da atuação administrativa para auferir o que lhe cabe, tornando legítimo que, na expressão do dogma constitucional que assegura o acesso ao judiciário, persiga a realização do que lhe está reconhecido mas não realizado. 11. Apelação conhecida e provida. Prescrição ilidida e pedido acolhido. Maioria.

Data do Julgamento : 02/09/2015
Data da Publicação : 24/09/2015
Órgão Julgador : 1ª TURMA CÍVEL
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