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Jurisprudência


TJDF APC - 894788-20100110265334APC

Ementa
CIVIL. PROCESSUAL CIVIL.AÇÃO INDENIZATÓRIA. ACIDENTE DE TRÂNSITO. RAZÕES DISSOCIADAS. CPC, ART. 514, II. INOBSERVÂNCIA DO PRINCÍPIO DA DIALETICIDADE. RECURSO DO PROPRIETÁRIO DO VEÍCULO PARCIALMENTE CONHECIDO. ACIDENTE AUTOMOBILÍSTICO. ÓBITO DO CÔNJUGE E GENITOR DOS AUTORES. SOLIDARIEDADE DO CONDUTOR, DO PROPRIETÁRIO DO VEÍCULO E DA EMPRESA EM CUJO NOME O TRANSPORTE ERA REALIZADO. RESPONSABILIDADE CIVIL SUBJETIVA. CONFIGURAÇÃO. DANO MORAL. MORTE DE ENTE FAMILIAR. PREJUÍZO PRESUMIDO. QUANTUM. OBEDIÊNCIA AOS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE. NORMATIVA DA EFETIVA EXTENSÃO DO DANO. CC, ART. 944. DANO MATERIAL. RESTITUIÇÃO DE DESPESAS COM TRATAMENTO PSICOLÓGICO DEVIDA. PENSÃO EM FAVOR DA VIÚVA E DOS FILHOS. CC, ART. 948, II. DEPENDÊNCIA ECONÔMICA COMPROVADA. CABIMENTO. QUANTUM MANTIDO. TERMO FINAL. EXPECTATIVA DE VIDA DO FALECIDO. TABELA DO IBGE. HONORÁRIOS DE SUCUMBÊNCIA. PATAMAR. MODIFICAÇÃO. RECURSOS DOS RÉUS DESPROVIDOS. RECURSO DOS AUTORES PARCIALMENTE PROVIDO. SENTENÇA REFORMADA EM PARTE. 1.As razões recursais devem tratar dos fundamentos decididos na sentença, devolvendo ao Tribunal o conhecimento da matéria impugnada, sob pena de inépcia do apelo, à luz do princípio da dialeticidade (CPC, art. 514, II). Uma vez constatada que parte do inconformismo descrito pelo proprietário do veículo está dissociada do que foi decidido pela sentença, o não conhecimento do apelo, nesse ponto, é medida imperativa. 2.A responsabilidade civil aquiliana/subjetiva advém da prática de evento danoso, cuja reparação exige a presença: do ato ilícito; da culpa em seu sentido lato sensu (que engloba o ato doloso e o culposo em sentido estrito); do nexo causal que une a conduta do agente ao prejuízo experimentado pelo ofendido; e do dano (CC, arts. 186, 187 e 927). Presentes esses pressupostos, impõe-se o dever de indenizar. 3.No particular, é fato incontroverso a ocorrência de acidente de trânsito, em 5/4/2008, às 10h45min, na BR 450, pista auxiliar localizada atrás das Lojas Leroy Merlin e Extra, com velocidade máxima de 40 km/h, envolvendo o veículo automotor conduzido por um dos réus e o carro conduzido pelo cônjuge e genitor dos autores, o qual, em razão dos ferimentos advindos do episódio, veio a óbito. A dinâmica do incidente denota a culpa do veículo da parte ré que, ao trafegar no sentido norte/sul ocupando parcialmente a faixa de trânsito de sentido contrário e em velocidade muito acima da permitida (70 km/h), colidiu com o veículo da vítima que trafegava regularmente na faixa de trânsito sentido sul/norte. Ademais, cumpre observar que já houve condenação definitiva pela prática de crime de homicídio culposo na direção de veículo automotor (CTB, art. 302) (Processo n. 2008.01.1.071184-2), estando ultrapassada eventual discussão sobre a existência de culpa, conforme art. 935 do CC. 4. Uma vez demonstrada a culpa, nos termos dos arts. 186, 187 e 927 do CC, evidente a responsabilidade civil do condutor do veículo quanto aos danos advindos do acidente de trânsito que deu causa. 5.Em acidente de trânsito, há responsabilidade solidária do condutor e do proprietário do veículo automotor, em razão do dever de guarda sobre o bem e do risco social do automóvel. 6.A empresa ré, em cujo nome é realizado o transporte de doações de leite, também responde solidariamente pelos prejuízos advindos do acidente de trânsito, nos termos dos arts. 932, III, e 933 do CC e da Súmula n. 341/STF. 6.1. A responsabilidade objetiva prevista no inciso III do artigo 932 do CC não está condicionada à efetiva comprovação de um vínculo formal de trabalho. Tanto é assim que utiliza as expressões empregados, serviçais ou prepostos, ampliando a responsabilidade dos empregadores pelos atos praticados por qualquer pessoa que demonstre estar sob sua subordinação direta. 7.O dano moral se relaciona diretamente com os prejuízos ocasionados a direitos da personalidade, cuja violação afeta diretamente à dignidade do indivíduo e constitui motivação suficiente para fundamentar uma ação dessa natureza. 7.1.As circunstâncias fáticas narradas são capazes de atentar contra direitos da personalidade, sendo evidente o dano moral in re ipsa experimentado pelos parentes da vítima. A morte de um ente familiar querido, na qualidade de marido e pai dos autores, a toda evidência, desencadeia naturalmente uma sensação dolorosa de fácil e objetiva percepção, dispensada demonstração, notadamente em razão da imprevisibilidade do evento. É o que se chama de danos morais reflexos ou por ricochete. Ou seja, embora o evento danoso tenha afetado determinada pessoa, seus efeitos acabam por atingir, indiretamente, a integridade moral de terceiros (préjudice d'affection). 7.2.O valor dos danos morais deve obedecer a critérios de razoabilidade e proporcionalidade, levando-se em conta, além da necessidade de reparação dos danos sofridos, as circunstâncias do caso, a gravidade do prejuízo, a situação do ofensor, a condição do ofendido e a prevenção de comportamentos futuros análogos. O valor pecuniário não pode ser fonte de obtenção de vantagem indevida (CC, art. 884), mas também não pode ser irrisório, para não fomentar comportamentos irresponsáveis. Normativa da efetiva extensão do dano (CC, art. 944). Nessa ótica, mantém-se o valor dos danos morais, de R$ 50.000,00 para cada autor. 8.O critério para o ressarcimento dos prejuízos materiais encontra-se nos arts. 402 e 403 do CC, que compreende os danos emergentes (diminuição patrimonial ocasionada à vítima) e os lucros cessantes (frustração da expectativa de um lucro esperado), sendo necessária a comprovação da efetiva perda patrimonial. In casu, passível de restituição o valor de R$ 4.440,00, referente aos gastos com tratamento psicológico em razão do acidente em questão. 9.Tratando-se de indenização devida em caso de homicídio, especificamente, tal montante compreende tanto os gastos com funeral/sepultamento como a prestação de alimentos às pessoas a quem o morto os devia, proporcionais à expectativa provável de vida da vítima, ex vi do art. 948 do CC. 9.1.Verificada a dependência econômica dos autores, na qualidade de esposa e filhos do de cujus, conforme declaração de imposto de renda, emerge evidente o cabimento do pensionamento em razão do ato ilícito, no patamar de 2/3 dos rendimentos comprovados do falecido (30 salários mínimos à época do acidente). Em caso tais, há presunção de que o remanescente (1/3) seria gasto com o próprio sustento da vítima. 10.Para fixação do termo final da pensão por morte decorrente de ato ilícito deverá ser levado em conta as peculiaridades do caso concreto, como os dados estatísticos atuais divulgados pela Previdência Social, com base nas informações do IBGE, no tocante ao cálculo de sobrevida da população média brasileira (STJ, AgRg nos EDcl no AREsp 119.035/RJ, Rel. Ministro MARCO BUZZI, QUARTA TURMA, julgado em 10/02/2015, DJe 19/02/2015). 10.1.Escorreita a fixação do pensionamento até a data que a vítima completaria 78 anos, levando em conta sua idade à época do acidente de trânsito (47 anos) e a expectativa de vida (31,4 anos), conforme dados estatísticos divulgados pelo IBGE. 11.Os honorários advocatícios de sucumbência devem guardar similitude com os parâmetros propostos pelo art. 20 do CPC, segundo apreciação equitativa do juiz. Deve ser razoável e prezar pelo equilíbrio entre o tempo despendido e o esforço desempenhado pelo advogado, não estando restrito aos limites percentuais de 10% e 20%, tampouco ao valor da causa. Precedente STJ. 11.1.No particular, diante da complexidade da matéria e da atuação dos patronos, impõe-se a modificação da verba honoráriapara 5% do valor da condenação (CPC, art. 20, §§ 3º, 4º e § 5º), na proporção de 30% para os autores e de 70% para os réus, ante a sucumbência parcial, mas não equivalente, ressalvada a possibilidade de compensação (CPC, art. 21; Súmula n. 306/STJ). A base de cálculo dos honorários deve observar o valor indenizatório dos danos morais e dos danos materiais, inclusive com o acréscimo das parcelas de pensão vencidas e outras 12 prestações vincendas (CPC, arts. 20, § 5º; CPC, art. 260). Precedentes. 12. Recurso do proprietário do veículo conhecido em parte, por razões dissociadas, e, no mérito, desprovido. Recurso dos demais réus conhecidos e desprovidos. Recurso dos autores conhecido e parcialmente provido quanto ao valor dos honorários. Sentença reformada em parte.

Data do Julgamento : 09/09/2015
Data da Publicação : 24/09/2015
Órgão Julgador : 1ª TURMA CÍVEL
Relator(a) : ALFEU MACHADO
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