TJDF APC - 902773-20140111527725APC
CIVIL. PROCESSUAL CIVIL.AÇÃO INDENIZATÓRIA. ACIDENTE DE TRÂNSITO. INVASÃO DE FAIXA DE SENTIDO CONTRÁRIO. ÓBITO DA MÃE DOS AUTORES. ERRO MATERIAL NA SENTENÇA. RETIFICAÇÃO. GRATUIDADE DE JUSTIÇA. NECESSIDADE NÃO COMPROVADA. INDEFERIMENTO. CULPA EXCLUSIVA OU CONCORRENTE DA VÍTIMA OU DE TERCEIRO. NÃO DEMONSTRAÇÃO. RESPONSABILIDADE CIVIL SUBJETIVA. PRESSUPOSTOS PRESENTES. DANO MORAL. MORTE DE ENTE FAMILIAR. PREJUÍZO PRESUMIDO. QUANTUM. OBEDIÊNCIA AOS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE. NORMATIVA DA EFETIVA EXTENSÃO DO DANO. DANO MATERIAL. CONSULTAS PSICOLÓGICAS E DESPESAS COM FUNERAL. DECRÉSCIMO PATRIMONIAL NÃO COMPROVADO. SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA, MAS NÃO EQUIVALENTE. RATEIO PROPORCIONAL. SENTENÇA MANTIDA. RECURSOS DESPROVIDOS. 1. Constatada a ocorrência de erro material na da decisão de 1ª Instância, quanto à condição financeira dos autores, que não são beneficiários da justiça gratuita, à luz do art. 463, I, do CPC, cuja aplicabilidade é possível em sede recursal, cabe ao julgador retificar a inexatidão verificada. 2. Para a obtenção da gratuidade de justiça, faz-se necessário que a parte cumpra os critérios estabelecidos no art. 4º da Lei n. 1.060/50, apresentando declaração de que não está em condições de pagar as custas do processo e os honorários advocatícios, sem prejuízo do sustento próprio ou de sua família, o que admite prova em contrário. 2.1. In casu, inexistindo elementos que efetivamente comprovem a ausência de recursos financeiros para o pagamento de eventuais despesas processuais, indefere-se o benefício em questão à ré postulante. 3. A responsabilidade civil aquiliana/subjetiva advém da prática de evento danoso, cuja reparação exige a presença: do ato ilícito; da culpa em seu sentido lato sensu (que engloba o ato doloso e o culposo em sentido estrito); do nexo causal; e do dano (CC, arts. 186, 187 e 927). Presentes esses pressupostos, impõe-se o dever de indenizar. 4. É fato incontroverso a ocorrência de acidente de trânsito, em 5/10/2011, na SQS 109/110 Sul, por volta das 11h, envolvendo o veículo automotor VW/Gol, conduzido pela vítima, mãe dos autores, e o veículo CITROEN/C4VTR conduzido pela ré. Em razão do incidente, a mãe dos autores, após atendimento médico, veio a óbito em 1º/11/2011. 4.1. O Laudo de Exame de Local de Acidente de Tráfego, elaborado pela Polícia Civil do DF, esclarece a dinâmica do acidente e evidencia que o carro da ré (C4) trafegava ocupando a faixa de trânsito sentido SQS 210 - SQS 110 (leste - oeste), quando, na altura da tesourinha de ligação com o eixo W, entrou em processo de derivação e giro para a esquerda, invadindo a faixa de sentido contrário, momento em que interceptou a trajetória do veículo da vítima (Gol), que se deslocava no sentido SQS 110 - SQS 210. A causa determinante do acidente foi a manobra de derivação para esquerda do carro da ré, a qual, inclusive, foi condenada pelo crime de homicídio culposo na direção de veículo automotor (CTB, art. 302). 5. Não há falar em afastamento da responsabilidade civil, fundada em culpa exclusiva/concorrente da vítima ou de terceiro, porquanto tais alegações não foram comprovadas nos autos (CPC, art. 333, II). 6. Uma vez demonstrada a culpa da ré para o acidente de trânsito em questão, ao desrespeitar as regras de trânsito, atuando com imprudência, impõe-se o dever de indenizar, nos termos dos arts. 186, 187 e 927 do CC e 28 e 34 do CTB. 7. O dano moral se relaciona diretamente com os prejuízos ocasionados a direitos da personalidade, cuja violação afeta diretamente à dignidade do indivíduo e constitui motivação suficiente para fundamentar uma ação dessa natureza. 7.1. As circunstâncias fáticas narradas são capazes de atentar contra direitos da personalidade, sendo evidente o dano moral in re ipsa experimentado pelos parentes da vítima. A morte de um ente familiar querido, na qualidade de mãe dos autores, a toda evidência, desencadeia naturalmente uma sensação dolorosa de fácil e objetiva percepção, dispensada demonstração, notadamente em razão da imprevisibilidade do evento. É o que se chama de danos morais reflexos ou por ricochete. Ou seja, embora o evento danoso tenha afetado determinada pessoa, seus efeitos acabam por atingir, indiretamente, a integridade moral de terceiros (préjudice d'affection). 7.2. O valor dos danos morais deve obedecer a critérios de razoabilidade e proporcionalidade, levando-se em conta, além da necessidade de reparação dos danos sofridos, as circunstâncias do caso, a gravidade do prejuízo, a situação do ofensor, a condição do ofendido e a prevenção de comportamentos futuros análogos. O valor pecuniário não pode ser fonte de obtenção de vantagem indevida (CC, art. 884), mas também não pode ser irrisório, para não fomentar comportamentos irresponsáveis. Normativa da efetiva extensão do dano (CC, art. 944). Nessa ótica, mantém-se o valor dos danos morais, de R$ 100.000,00, sendo R$ 50.000,00 para cada autor. 8. O critério para o ressarcimento dos prejuízos materiais encontra-se nos arts. 402 e 403 do CC, que compreende os danos emergentes (diminuição patrimonial ocasionada à vítima) e os lucros cessantes (frustração da expectativa de um lucro esperado), sendo necessária a comprovação da efetiva perda patrimonial. Tratando-se de indenização devida em caso de homicídio, especificamente, tal montante compreende tanto os gastos com funeral/sepultamento como a prestação de alimentos às pessoas a quem o morto os devia, proporcionais à expectativa provável de vida da vítima, ex vi do art. 948 do CC. 8.1. Inviável a restituição de valores gastos com funeral e consultas psicológicas, seja porque as notas fiscais e recibos estão em nome de terceiro, não havendo falar em decréscimo patrimonial por parte dos autores, seja porque as transferências bancárias realizadas sequer indicam o beneficiário. Mais a mais, não consta dos autos o valor cobrado a título de consulta ou tratamento psicológico, inviabilizando, assim, o pagamento de danos materiais a esse título. 9. Sendo a ré vencida em parcela maior que a dos autores, mas sem que houvesse sucumbência mínima destes últimos, escorreita a sentença que impôs a condenação da verba honorária e das custas processuais de forma proporcional, mas não equivalente (40% para os autores e 60% para a ré), ex vi do caput do art. 21 do CPC. 10. Recursos de apelação conhecidos e desprovidos.
Ementa
CIVIL. PROCESSUAL CIVIL.AÇÃO INDENIZATÓRIA. ACIDENTE DE TRÂNSITO. INVASÃO DE FAIXA DE SENTIDO CONTRÁRIO. ÓBITO DA MÃE DOS AUTORES. ERRO MATERIAL NA SENTENÇA. RETIFICAÇÃO. GRATUIDADE DE JUSTIÇA. NECESSIDADE NÃO COMPROVADA. INDEFERIMENTO. CULPA EXCLUSIVA OU CONCORRENTE DA VÍTIMA OU DE TERCEIRO. NÃO DEMONSTRAÇÃO. RESPONSABILIDADE CIVIL SUBJETIVA. PRESSUPOSTOS PRESENTES. DANO MORAL. MORTE DE ENTE FAMILIAR. PREJUÍZO PRESUMIDO. QUANTUM. OBEDIÊNCIA AOS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE. NORMATIVA DA EFETIVA EXTENSÃO DO DANO. DANO MATERIAL. CONSULTAS PSICOLÓGICAS E DESPESAS COM FUNERAL. DECRÉSCIMO PATRIMONIAL NÃO COMPROVADO. SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA, MAS NÃO EQUIVALENTE. RATEIO PROPORCIONAL. SENTENÇA MANTIDA. RECURSOS DESPROVIDOS. 1. Constatada a ocorrência de erro material na da decisão de 1ª Instância, quanto à condição financeira dos autores, que não são beneficiários da justiça gratuita, à luz do art. 463, I, do CPC, cuja aplicabilidade é possível em sede recursal, cabe ao julgador retificar a inexatidão verificada. 2. Para a obtenção da gratuidade de justiça, faz-se necessário que a parte cumpra os critérios estabelecidos no art. 4º da Lei n. 1.060/50, apresentando declaração de que não está em condições de pagar as custas do processo e os honorários advocatícios, sem prejuízo do sustento próprio ou de sua família, o que admite prova em contrário. 2.1. In casu, inexistindo elementos que efetivamente comprovem a ausência de recursos financeiros para o pagamento de eventuais despesas processuais, indefere-se o benefício em questão à ré postulante. 3. A responsabilidade civil aquiliana/subjetiva advém da prática de evento danoso, cuja reparação exige a presença: do ato ilícito; da culpa em seu sentido lato sensu (que engloba o ato doloso e o culposo em sentido estrito); do nexo causal; e do dano (CC, arts. 186, 187 e 927). Presentes esses pressupostos, impõe-se o dever de indenizar. 4. É fato incontroverso a ocorrência de acidente de trânsito, em 5/10/2011, na SQS 109/110 Sul, por volta das 11h, envolvendo o veículo automotor VW/Gol, conduzido pela vítima, mãe dos autores, e o veículo CITROEN/C4VTR conduzido pela ré. Em razão do incidente, a mãe dos autores, após atendimento médico, veio a óbito em 1º/11/2011. 4.1. O Laudo de Exame de Local de Acidente de Tráfego, elaborado pela Polícia Civil do DF, esclarece a dinâmica do acidente e evidencia que o carro da ré (C4) trafegava ocupando a faixa de trânsito sentido SQS 210 - SQS 110 (leste - oeste), quando, na altura da tesourinha de ligação com o eixo W, entrou em processo de derivação e giro para a esquerda, invadindo a faixa de sentido contrário, momento em que interceptou a trajetória do veículo da vítima (Gol), que se deslocava no sentido SQS 110 - SQS 210. A causa determinante do acidente foi a manobra de derivação para esquerda do carro da ré, a qual, inclusive, foi condenada pelo crime de homicídio culposo na direção de veículo automotor (CTB, art. 302). 5. Não há falar em afastamento da responsabilidade civil, fundada em culpa exclusiva/concorrente da vítima ou de terceiro, porquanto tais alegações não foram comprovadas nos autos (CPC, art. 333, II). 6. Uma vez demonstrada a culpa da ré para o acidente de trânsito em questão, ao desrespeitar as regras de trânsito, atuando com imprudência, impõe-se o dever de indenizar, nos termos dos arts. 186, 187 e 927 do CC e 28 e 34 do CTB. 7. O dano moral se relaciona diretamente com os prejuízos ocasionados a direitos da personalidade, cuja violação afeta diretamente à dignidade do indivíduo e constitui motivação suficiente para fundamentar uma ação dessa natureza. 7.1. As circunstâncias fáticas narradas são capazes de atentar contra direitos da personalidade, sendo evidente o dano moral in re ipsa experimentado pelos parentes da vítima. A morte de um ente familiar querido, na qualidade de mãe dos autores, a toda evidência, desencadeia naturalmente uma sensação dolorosa de fácil e objetiva percepção, dispensada demonstração, notadamente em razão da imprevisibilidade do evento. É o que se chama de danos morais reflexos ou por ricochete. Ou seja, embora o evento danoso tenha afetado determinada pessoa, seus efeitos acabam por atingir, indiretamente, a integridade moral de terceiros (préjudice d'affection). 7.2. O valor dos danos morais deve obedecer a critérios de razoabilidade e proporcionalidade, levando-se em conta, além da necessidade de reparação dos danos sofridos, as circunstâncias do caso, a gravidade do prejuízo, a situação do ofensor, a condição do ofendido e a prevenção de comportamentos futuros análogos. O valor pecuniário não pode ser fonte de obtenção de vantagem indevida (CC, art. 884), mas também não pode ser irrisório, para não fomentar comportamentos irresponsáveis. Normativa da efetiva extensão do dano (CC, art. 944). Nessa ótica, mantém-se o valor dos danos morais, de R$ 100.000,00, sendo R$ 50.000,00 para cada autor. 8. O critério para o ressarcimento dos prejuízos materiais encontra-se nos arts. 402 e 403 do CC, que compreende os danos emergentes (diminuição patrimonial ocasionada à vítima) e os lucros cessantes (frustração da expectativa de um lucro esperado), sendo necessária a comprovação da efetiva perda patrimonial. Tratando-se de indenização devida em caso de homicídio, especificamente, tal montante compreende tanto os gastos com funeral/sepultamento como a prestação de alimentos às pessoas a quem o morto os devia, proporcionais à expectativa provável de vida da vítima, ex vi do art. 948 do CC. 8.1. Inviável a restituição de valores gastos com funeral e consultas psicológicas, seja porque as notas fiscais e recibos estão em nome de terceiro, não havendo falar em decréscimo patrimonial por parte dos autores, seja porque as transferências bancárias realizadas sequer indicam o beneficiário. Mais a mais, não consta dos autos o valor cobrado a título de consulta ou tratamento psicológico, inviabilizando, assim, o pagamento de danos materiais a esse título. 9. Sendo a ré vencida em parcela maior que a dos autores, mas sem que houvesse sucumbência mínima destes últimos, escorreita a sentença que impôs a condenação da verba honorária e das custas processuais de forma proporcional, mas não equivalente (40% para os autores e 60% para a ré), ex vi do caput do art. 21 do CPC. 10. Recursos de apelação conhecidos e desprovidos.
Data do Julgamento
:
28/10/2015
Data da Publicação
:
17/11/2015
Órgão Julgador
:
1ª TURMA CÍVEL
Relator(a)
:
ALFEU MACHADO
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