TJDF APC - 925637-20140111182817APC
APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO CIVIL, PROCESSUAL CIVIL E CONSUMIDOR. PROMESSA DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL NA PLANTA. RESOLUÇÃO CONTRATUAL. INADIMPLÊNCIA. CONSTRUTORA. ATRASO NA ENTREGA DA OBRA. PRELIMINAR. VÍCIO FORMAL. DEVOLUÇÃO DE VALORES INDEVIDAMENTE COBRADOS. PAGAMENTO. PROVA NOS AUTOS. SENTENÇA CITRA PETITA. CONHECIMENTO DE OFÍCIO. SENTENÇA PARCIALMENTE ANULADA. TEORIA DA CAUSA MADURA (ART. 515, §3º, CPC). APLICAÇÃO. PEDIDO DE DEVOLUÇÃO DE IPTU E COTAS CONDOMINIAIS. PROCEDENTE. TOLERÂNCIA. 180 (CENTO E OITENTA) DIAS. EXTRAPOLAÇÃO. CULPA. FORNECEDORA. CLÁUSULA DE TOLERÂNCIA. 180 (CENTO E OITENTA) DIAS CORRIDOS. LEGALIDADE. TÉRMINO DA OBRA. AVERBAÇÃO DO HABITE-SE. NÃO DEMARCAÇÃO. AVERBAÇÃO DO HABITE-SE NO CARTÓRIO DE REGISTRO DE IMÓVEIS. ADEQUAÇÃO. MULTA MORATÓRIA. AUSÊNCIA DE PREVISÃO EM CASO DE MORA DO FORNECEDOR. ABUSIVIDADE. RESTABELECIMENTO DO EQUILÍBRIO CONTRATUAL. JUÍZO DE EQUIDADE. APLICAÇÃO POR INVERSÃO. CABIMENTO. LUCROS CESSANTES. CABIMENTO. CUMULAÇÃO COM MULTA MORATÓRIA. POSSIBILIDADE. DANOS MORAIS. INOCORRÊNCIA. MERO DESCUMPRIMENTO CONTRATUAL. COMPENSAÇÃO PECUNIÁRIA. NÃO CABIMENTO. VALORES PAGOS. DEVOLUÇÃO. INTEGRALIDADE. EXCEÇÃO DO CONTRATO NÃO CUMPRIDO. PARTE AUTORA. INOCORRÊNCIA. COBRANÇA DE JUROS COMPENSATÓRIOS DURANTE O ATRASO DA CONSTRUTORA. ABUSIVIDADE. COBRANÇA DE COTAS CONDOMINIAIS E IPTU ANTES DA ENTREGA DO IMÓVEL. ABUSIVIDADE. PRELIMINAR. SENTENÇA CITRA PETITA. DECLARAÇÃO DE NULIDADE PARCIAL DE OFÍCIO. APLICAÇÃO DO §3º DO ART. 515 DO CPC. PEDIDO DE DEVOLUÇÃO DE VALORES JULGADO PROCEDENTE. MÉRITO. SENTENÇA REFORMADA. APELO PARCIALMENTE PROVIDO. 1. Preliminar. Vício formal. Sentença parcialmente anulada. Aplicação do §3º do art. 515 do CPC. Aferido, de ofício, que a sentença não apreciou o pedido pertinente à devolução de valores indevidamente cobrados da parte consumidora, associado ao IPTU e cotas condominiais antes da entrega das chaves, deve ser declarada a nulidade parcial da sentença, por vício citra petita, no tocante ao pedido referido, em vista de, julgando procedente o pedido, na forma autorizada pelo art. 515, §3º, do CPC, condenar a ré a devolver os valores pagos e comprovados pela autora às fls. 63-68 dos autos. Preliminar suscitada de ofício acolhida. Nulidade afastada. 2. Resolvido o contrato por culpa da incorporadora/construtora/fornecedora, a restituição dos valores pagos pelo consumidor deve dar-se de forma integral, devidamente corrigidos, além dos juros de mora. Nesse caso, não há falar em retenção de quaisquer valores em favor da promitente vendedora, reconhecida culpada pela resolução do contrato. 3. Conforme entendimento dominante desta Corte, é válida e, logo, não abusiva, a cláusula contratual que estipula o prazo de tolerância de até 180 (cento e oitenta) dias corridos para prorrogar a data de entrega de imóvel adquirido na planta, haja vista as intempéries que podem ocorrer durante as obras, notadamente quando se trata de construção de porte considerável. 4. A data de expedição da Carta de Habite-se não é o marco mais adequado para representar o término da obra, haja vista que há várias providências debitadas a ambas as partes nesse tipo de contratação a exigir a averbação da Carta de Habite-se junto à matrícula do imóvel no Cartório de Registro de Imóveis respectivo, o que deve ser feito pela construtora/incorporadora. 5. Quando evidente a responsabilidade da construtora por atraso na entrega do imóvel e manifesto o desequilíbriocontratual gerador de onerosidade excessiva, apesar de o intervencionismo estatal ser admitido minimamente, plausível a inversão da multa moratória contratual de modo a alinhar a relação contratual face ao inadimplemento da parte ré. 6. No caso concreto, embora haja previsão da aplicação de multa moratória em caso de atraso da prestação devida pela parte consumidora, o mesmo não ocorre quando o atraso é da fornecedora. Assim, constatado o atraso na entrega da obra por parte desta última, deve ser invertida a multa referida, para o fim de impor à inadimplente o seu pagamento, no caso, no percentual de 2% (dois por cento), devendo incidir sobre todos os valores vertidos pelo consumidor até 29/04/2014. Coincidirá o período de incidência com aquele definido para os lucros cessantes, isto é, entre 29/04/2014 até a averbação da Carta de Habite-se (21/05/2014). 7. Além da multa moratória, são devidos lucros cessantes pela impossibilidade do promitente comprador desfrutar do imóvel no período de atraso da entrega, que, na espécie, coincide com o período de incidência daquela multa, pelo valor mensal de R$ 1.500,00 (mil e quinhentos reais), calculado pro rata die. 8. O descumprimento contratual decorrente de atraso na entrega de imóvel não tem aptidão, ordinariamente, para atingir os direitos da personalidade, limitando-se a dissabor, irritação, sem repercussão na esfera íntima a ensejar compensação a título de danos morais. 9. Não se aplica o art. 476 do Código Civil, à guisa de descumprimento de suas obrigações por parte do consumidor, quando comprovado nos autos que se manteve fiel e adimplente durante todo o vínculo contratual, sendo da fornecedora a culpa pela resolução, haja vista a inadimplência decorrente do atraso na entrega da obra, inclusive extrapolando o prazo de tolerância de 180 (cento e oitenta) dias. 10. Inexiste contradição entre a resolução do contrato e a condenação da parte culpada, no caso a fornecedora, ao pagamento da multa moratória. Ao contrário, a multa é prevista exatamente para a hipótese de inadimplemento que pode conduzir à resolução. O mesmo raciocínio se aplica em relação aos lucros cessantes, no caso, consubstanciados no valor dos aluguéis do imóvel cuja entrega foi frustrada. 11. Recurso de apelação da autora conhecido, preliminar de nulidade parcial da sentença (citra petita) suscitada de ofício e, na forma do art. 515, §3º, do CPC, pedido para devolução dos valores pagos e comprovados a título de IPTU e cotas condominiais julgado procedente. Recurso parcialmente provido. Sentença integralmente reformada.
Ementa
APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO CIVIL, PROCESSUAL CIVIL E CONSUMIDOR. PROMESSA DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL NA PLANTA. RESOLUÇÃO CONTRATUAL. INADIMPLÊNCIA. CONSTRUTORA. ATRASO NA ENTREGA DA OBRA. PRELIMINAR. VÍCIO FORMAL. DEVOLUÇÃO DE VALORES INDEVIDAMENTE COBRADOS. PAGAMENTO. PROVA NOS AUTOS. SENTENÇA CITRA PETITA. CONHECIMENTO DE OFÍCIO. SENTENÇA PARCIALMENTE ANULADA. TEORIA DA CAUSA MADURA (ART. 515, §3º, CPC). APLICAÇÃO. PEDIDO DE DEVOLUÇÃO DE IPTU E COTAS CONDOMINIAIS. PROCEDENTE. TOLERÂNCIA. 180 (CENTO E OITENTA) DIAS. EXTRAPOLAÇÃO. CULPA. FORNECEDORA. CLÁUSULA DE TOLERÂNCIA. 180 (CENTO E OITENTA) DIAS CORRIDOS. LEGALIDADE. TÉRMINO DA OBRA. AVERBAÇÃO DO HABITE-SE. NÃO DEMARCAÇÃO. AVERBAÇÃO DO HABITE-SE NO CARTÓRIO DE REGISTRO DE IMÓVEIS. ADEQUAÇÃO. MULTA MORATÓRIA. AUSÊNCIA DE PREVISÃO EM CASO DE MORA DO FORNECEDOR. ABUSIVIDADE. RESTABELECIMENTO DO EQUILÍBRIO CONTRATUAL. JUÍZO DE EQUIDADE. APLICAÇÃO POR INVERSÃO. CABIMENTO. LUCROS CESSANTES. CABIMENTO. CUMULAÇÃO COM MULTA MORATÓRIA. POSSIBILIDADE. DANOS MORAIS. INOCORRÊNCIA. MERO DESCUMPRIMENTO CONTRATUAL. COMPENSAÇÃO PECUNIÁRIA. NÃO CABIMENTO. VALORES PAGOS. DEVOLUÇÃO. INTEGRALIDADE. EXCEÇÃO DO CONTRATO NÃO CUMPRIDO. PARTE AUTORA. INOCORRÊNCIA. COBRANÇA DE JUROS COMPENSATÓRIOS DURANTE O ATRASO DA CONSTRUTORA. ABUSIVIDADE. COBRANÇA DE COTAS CONDOMINIAIS E IPTU ANTES DA ENTREGA DO IMÓVEL. ABUSIVIDADE. PRELIMINAR. SENTENÇA CITRA PETITA. DECLARAÇÃO DE NULIDADE PARCIAL DE OFÍCIO. APLICAÇÃO DO §3º DO ART. 515 DO CPC. PEDIDO DE DEVOLUÇÃO DE VALORES JULGADO PROCEDENTE. MÉRITO. SENTENÇA REFORMADA. APELO PARCIALMENTE PROVIDO. 1. Preliminar. Vício formal. Sentença parcialmente anulada. Aplicação do §3º do art. 515 do CPC. Aferido, de ofício, que a sentença não apreciou o pedido pertinente à devolução de valores indevidamente cobrados da parte consumidora, associado ao IPTU e cotas condominiais antes da entrega das chaves, deve ser declarada a nulidade parcial da sentença, por vício citra petita, no tocante ao pedido referido, em vista de, julgando procedente o pedido, na forma autorizada pelo art. 515, §3º, do CPC, condenar a ré a devolver os valores pagos e comprovados pela autora às fls. 63-68 dos autos. Preliminar suscitada de ofício acolhida. Nulidade afastada. 2. Resolvido o contrato por culpa da incorporadora/construtora/fornecedora, a restituição dos valores pagos pelo consumidor deve dar-se de forma integral, devidamente corrigidos, além dos juros de mora. Nesse caso, não há falar em retenção de quaisquer valores em favor da promitente vendedora, reconhecida culpada pela resolução do contrato. 3. Conforme entendimento dominante desta Corte, é válida e, logo, não abusiva, a cláusula contratual que estipula o prazo de tolerância de até 180 (cento e oitenta) dias corridos para prorrogar a data de entrega de imóvel adquirido na planta, haja vista as intempéries que podem ocorrer durante as obras, notadamente quando se trata de construção de porte considerável. 4. A data de expedição da Carta de Habite-se não é o marco mais adequado para representar o término da obra, haja vista que há várias providências debitadas a ambas as partes nesse tipo de contratação a exigir a averbação da Carta de Habite-se junto à matrícula do imóvel no Cartório de Registro de Imóveis respectivo, o que deve ser feito pela construtora/incorporadora. 5. Quando evidente a responsabilidade da construtora por atraso na entrega do imóvel e manifesto o desequilíbriocontratual gerador de onerosidade excessiva, apesar de o intervencionismo estatal ser admitido minimamente, plausível a inversão da multa moratória contratual de modo a alinhar a relação contratual face ao inadimplemento da parte ré. 6. No caso concreto, embora haja previsão da aplicação de multa moratória em caso de atraso da prestação devida pela parte consumidora, o mesmo não ocorre quando o atraso é da fornecedora. Assim, constatado o atraso na entrega da obra por parte desta última, deve ser invertida a multa referida, para o fim de impor à inadimplente o seu pagamento, no caso, no percentual de 2% (dois por cento), devendo incidir sobre todos os valores vertidos pelo consumidor até 29/04/2014. Coincidirá o período de incidência com aquele definido para os lucros cessantes, isto é, entre 29/04/2014 até a averbação da Carta de Habite-se (21/05/2014). 7. Além da multa moratória, são devidos lucros cessantes pela impossibilidade do promitente comprador desfrutar do imóvel no período de atraso da entrega, que, na espécie, coincide com o período de incidência daquela multa, pelo valor mensal de R$ 1.500,00 (mil e quinhentos reais), calculado pro rata die. 8. O descumprimento contratual decorrente de atraso na entrega de imóvel não tem aptidão, ordinariamente, para atingir os direitos da personalidade, limitando-se a dissabor, irritação, sem repercussão na esfera íntima a ensejar compensação a título de danos morais. 9. Não se aplica o art. 476 do Código Civil, à guisa de descumprimento de suas obrigações por parte do consumidor, quando comprovado nos autos que se manteve fiel e adimplente durante todo o vínculo contratual, sendo da fornecedora a culpa pela resolução, haja vista a inadimplência decorrente do atraso na entrega da obra, inclusive extrapolando o prazo de tolerância de 180 (cento e oitenta) dias. 10. Inexiste contradição entre a resolução do contrato e a condenação da parte culpada, no caso a fornecedora, ao pagamento da multa moratória. Ao contrário, a multa é prevista exatamente para a hipótese de inadimplemento que pode conduzir à resolução. O mesmo raciocínio se aplica em relação aos lucros cessantes, no caso, consubstanciados no valor dos aluguéis do imóvel cuja entrega foi frustrada. 11. Recurso de apelação da autora conhecido, preliminar de nulidade parcial da sentença (citra petita) suscitada de ofício e, na forma do art. 515, §3º, do CPC, pedido para devolução dos valores pagos e comprovados a título de IPTU e cotas condominiais julgado procedente. Recurso parcialmente provido. Sentença integralmente reformada.
Data do Julgamento
:
09/03/2016
Data da Publicação
:
17/03/2016
Órgão Julgador
:
1ª TURMA CÍVEL
Relator(a)
:
ALFEU MACHADO
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