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Jurisprudência


TJDF APC - 931409-20140110699579APC

Ementa
DIREITO CIVIL E DO CONSUMIDOR. CONTRATO VERBAL DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS DE CRECHE. RELAÇÃO DE CONSUMO. QUALIFICAÇÃO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. APURAÇÃO DE FATOS OCORRIDOS NO INTERIOR DO ESTABELECIMENTO. LESÕES SOFRIDAS POR INFANTE. ORIGEM. MORDEDURAS PROVENIENTES DE OUTRA CRIANÇA. NEGLIGÊNCIA QUANTO AOS DEVERES DE CUIDADO E PROTEÇÃO À INCOLUMIDADE FÍSICA. ATO ILÍCITO. OCORRÊNCIA. DANO MORAL. QUALIFICAÇÃO. COMPENSAÇÃO PECUNIÁRIA DEVIDA. QUANTUM. CONFORMAÇÃO AOS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE. REDUÇÃO. NECESSIDADE. DANOS MORAIS REFLEXOS. GENITORA. NÃO CARACTERIZAÇÃO. EFEITOS IMPASSÍVEIS DE REFLEXOS MORAIS EM PESSOA ADULTA. PETIÇÃOINICIAL. REQUISITOS. QUALIFICAÇÃO DAS PARTES. ARTIGO 282, INCISO II, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. SUPRIMENTO. INÉPCIA NÃO CONFIGURADA. FORMALISMO EXACERBADO. 1. Como cediço, o exercitamento do direito subjetivo de ação que é resguardado a todas as pessoas, naturais ou jurídicas, é paramentado pelas formulações procedimentais que paramentam o devido processo legal, e, dentre as exigências legalmente estabelecidas para invocação da tutela jurisdicional inscreve-se, como premissa genética, a formulação da pretensão através de peça tecnicamente adequada e apropriada para, paramentando os fatos e fundamentos, viabilizar a delimitação da pretensão e o exercício do direito de defesa pela parte acionada (CPC, art. 282). 2. Consubstanciando a adequação formal da petição inicial a gênese da deflagração da relação processual na moldura do devido processo legal, a identificação dos protagonistas da relação processual - autor e réu -, como pressuposto para a exatidão da formação do processo, restara delimitada especificamente pelo legislador processual, que, de sua parte, estabelecera os requisitos a serem observados, não inscrevendo dentre eles a indicação da filiação dos litigantes, inscrição no CNPJ, número de CPF ou se seus documentos de identidade, não padecendo de inaptidão técnica, portanto, a peça de ingresso que não contempla esse indicativos, notadamente se apontados outros elementos pessoais daqueles que protagonizarão a lide suficientes à correta individualização e pontual localização dos sujeitos processuais, viabilizando a correta formação da relação processual e exercício do contraditório e do direito de defesa por parte da parte ré. 3. O contrato de prestação de serviços de creche que enlaça em seus vértices o estabelecimento particular e a criança destinatária final dos serviços que fazem seu objeto qualifica-se como relação de consumo, pois envolve a prestação de serviços volvidos a destinatário final, ostentando a responsabilidade do estabelecimento natureza objetiva, não prescindindo, para a aferição da responsabilidade pela falha nos serviços prestados, a efetiva comprovação da subsistência de uma conduta ilícita e do liame causal enlaçando-a ao resultado danoso que eventualmente teria irradiado (CDC, arts. 2º, 3º e 14, § 4º; CC, art. 932, IV). 4. Adespeito da ocorrência habitual e corriqueira de incidentes havidos no interior de creches e berçários entre crianças da mesma faixa etária que compartilham o mesmo espaço, resta qualificada a negligência do estabelecimento que se descura das providências afetas ao resguardo da integridade física da infante que é colocada a seu cuidado ao permitir que venha a sofrer diversas e consecutivas mordeduras no corpo provenientes de outra criança, pois revela a reiteração do fato omissão da profissional responsável pela preservação da integridade dos infantes matriculados, configurando o fato ato ilícito passível de ensejar a responsabilidade civil da creche diante a falha na prestação dos serviços e por implicar dano moral à infante vitimada em razão do sofrimento decorrente das lesões físicas que sofrera. 5. O dano moral, afetando os atributos da personalidade do ofendido e atingindo-lhe no que lhe é mais caro, se aperfeiçoa com a simples ocorrência do ato ilícito e aferição de que é apto a impregnar reflexos em sua personalidade, prescindindo sua qualificação da germinação de efeitos materiais imediatos, inclusive porque se destina a sancionar o autor do ilícito e assegurar ao lesado uma compensação pecuniária como forma de atenuar as consequências que lhe advieram da ação lesiva que o atingira. 6. Amensuração da compensação pecuniária a ser deferida ao atingido por ofensas de natureza moral deve ser efetivada de forma parcimoniosa e em conformação com os princípios da proporcionalidade, atentando-se para a gravidade dos danos havidos e para o comportamento do ofensor e do próprio lesado em face do ilícito que o vitimara, e da razoabilidade, que recomenda que o importe fixado não seja tão excessivo a ponto de ensejar alteração na situação financeira dos envolvidos, nem tão inexpressivo que redunde em uma nova ofensa ao vitimado, devendo ser reduzido o importe arbitrado quando dissonante com esses parâmetros e com os efeitos germinados do havido. 7. Conquanto evoluído o entendimento jurisprudencial no sentido de também proteger os direitos de personalidade daqueles que são indiretamente afetados pelo sofrimento íntimo da vítima imediata do evento, em razão da proximidade e vínculo afetivo, admitindo a composição pelos danos morais reflexos causados pela severidade dos resultados experimentados pelo ofendido que transbordam sua individualidade, resta por obstado o pleito indenizatório se os efeitos danosos vivenciados pela filha no interior de creche, sem maiores consequências, são incapazes de ocasionar reflexos oblíquos na seara psíquica de sua genitora aptos a causar-lhe abalo emocional, então passíveis de qualificar-se como fato gerador da ofensa moral em ricochete legitimamente merecedora de uma compensação pecuniária. 8. Apelação principal conhecida e parcialmente provida. Recurso Adesivo conhecido e desprovido. Preliminar rejeitada. Unânime.

Data do Julgamento : 30/03/2016
Data da Publicação : 20/04/2016
Classe/Assunto : Segredo de Justiça
Órgão Julgador : 1ª TURMA CÍVEL
Relator(a) : TEÓFILO CAETANO
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