TJDF APC - 942484-20140110676159APC
CIVIL. PROCESSUAL CIVIL.AÇÃO REPARATÓRIA DE DANOS. DIREITO DE VIZINHANÇA. PRELIMINAR: INOVAÇÃO RECURSAL. OCORRÊNCIA. RECURSO DO AUTOR PARCIALMENTE CONHECIDO. MÉRITO: UTILIZAÇÃO DE MURO DIVISÓRIO. AUSÊNCIA DE ABUSIVIDADE. DANO MATERIAL AFASTADO. COMUNICAÇÃO DE CRIME. INSTAURAÇÃO DE INQUÉRITO POLICIAL. EXERCÍCIO REGULAR DE DIREITO. BARULHO PRODUZIDO PELO PORTÃO DA GARAGEM. MERO DISSABOR DA VIDA EM SOCIEDADE. INEXISTÊNCIA DE DANOS MORAIS. RECURSO DO AUTOR DESPROVIDO. RECURSO DO RÉU PROVIDO. SENTENÇA REFORMADA. 1. Segundo o Enunciado Administrativo n. 2 do STJ, aos recursos interpostos com fundamento no CPC/1973 (relativos a decisões publicadas até 17 de março de 2016), como é o caso dos autos, devem ser exigidos os requisitos de admissibilidade na forma nele prevista, com as interpretações dadas, até então, pela jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça. 2. Não se pode conhecer do recurso de apelação do autor quanto ao pedido de condenação do réu ao pagamento de 50% da despesa com a construção de muro limítrofe, nos termos do art. 1.297 do CC, porquanto tal matéria não foi suscitada em 1º Grau, tratando-se de inovação recursal. 3. Para que haja o dever de reparação (CC, arts. 186, 187 e 927), faz-se necessária a presença dos pressupostos da responsabilidade civil subjetiva/aquiliana, a saber: ato ilícito; culpa; nexo causal; e dano. Presentes esses requisitos, impõe-se o dever de indenizar. 4. A situação dos autos se reporta à complexa relação entre vizinhos, tendo em vista divergências na convivência (comunicação de crime e barulho, para fins de dano moral) e na utilização de muro divisório (construção apoiada em muro e possível relação com rachaduras, mofos e infiltrações, para fins de dano material e moral), o que, por vezes, resulta em desentendimentos que ultrapassam o limite do aceitável. A harmonização dessa coexistência não é um exercício simples, notadamente em razão dos conflitos de interesses dos moradores. 5. O critério para o ressarcimento dos prejuízos materiais encontra-se nos arts. 402 e 403 do CC, que compreende os danos emergentes (diminuição patrimonial ocasionada à vítima) e os lucros cessantes (frustração da expectativa de um lucro esperado), sendo necessária a comprovação da efetiva perda patrimonial. 5.1. O art. 1.297 do CC disciplina o direito de tapagem, como forma de garantir ou tornar efetiva a exclusividade do domínio pelo proprietário, por meio de ato material tendente a impedir o acesso de estranhos à coisa. Nessa situação, o muro divisório pertence a ambos os proprietários confinantes, os quais se obrigam proporcionalmente a arcar com o dever de conservação. Embora a lei se refira expressamente a proprietário, é razoável e lícito que os possuidores, com o fito de preservar a segurança, o sossego e a privacidade, também exerçam o direito de tapagem (PELUSO, Cezar. Coordenador. Código civil comentado: doutrina e jurisprudência. 6. ed. rev. e atual. Barueri, SP: Manole, 2012, p. 1.309). 5.2. No particular, o Laudo de Avaliação Estrutural que acompanha a inicial denota quea estrutura do muro germinado, por ser mais antiga, não suportaria qualquer tipo de pressão, seja por serviços de aterramento e ou por compactação do solo e que as deformações estruturais em toda a parte longitudinal da parede da casa do autor que faz divisa com o muro germinado são provenientes de pressão exercida por meio de aterros e compactações de solo. O referido laudo também registra que o movimento do portão e o trânsito de veículos no terreno do réu agravam o abalo na estrutura da casa do autor, sem ser, todavia, a origem do problema, levando em conta a fragilidade da estrutura do marco divisório dos terrenos, no qual se apoia a edificação do autor. 5.3. Diante da inexistência de qualquer uso ilegal, abusivo ou irregular do marco divisório entre os terrenos das partes, cuja fragilidade lhe é ínsita, não há falar em reparação de danos materiais. 6. O dano moral se relaciona diretamente com os prejuízos ocasionados a direitos da personalidade, cuja violação afeta diretamente a dignidade do indivíduo e constitui motivação suficiente para fundamentar uma ação compensatória dessa natureza. (CF, art. 5º, V e X). O mero dissabor/aborrecimento/irritação, por fazer parte do dia a dia da população, não é capaz de romper o equilíbrio psicológico do indivíduo, para fins de configuração do dano moral. 6.1. A irregularidade na utilização do muro divisório por parte do réu não foi demonstrada, não havendo falar em dano moral com base nessa situação fática, ante a ausência de ato ilícito. 6.2. Nos termos do art. 5º, II e § 3º, do CPP e do art. 5º, XXXIV, a, da CF, qualquer pessoa do povo pode comunicar às autoridades policias a prática de supostas infrações penais. Tal situação, via de regra, não configura ilícito civil capaz de ensejar danos morais, haja vista caracterizar exercício regular de um direito (CC, art. 188, I). Para fins de reparação de danos, só assume relevância, sob a ótica subjetiva, caso se comprove a intenção, a leviandade, a malícia em acusar, sabendo não ser verdadeiro o fato ou que o apontado não é seu autor. 6.2.1. In casu, diante da animosidade existente entre as partes, verifica-se que o réu se sentiu ameaçado pelo autor, situação fática esta que foi levada a conhecimento da polícia, inexistindo abusividade nessa conduta. 6.3. Não obstante a decretação da revelia, consoante regra de experiência comum do que ordinariamente acontece (CPC/73, art. 335), ainda que o portão do réu fizesse muito barulho a ponto de incomodar seu vizinho (autor), essa situação não se reveste de fato passível de condenação a título de danos morais. Isso porque o aborrecimento advindo do barulho desagradável do portão do vizinho, por si só, não traz em seu bojo lesividade a direitos da personalidade. 6.4. Pelas provas dos autos, depreende-se que há flagrante animosidade entre os litigantes, na qualidade de vizinhos. Essa situação é natural da vida em sociedade, de modo que o bom senso e as regras sociais de convivência devem ser observados para se poder viver em tranquilidade, cada qual em respeito ao direito do outro, sendo desnecessária a imposição de danos morais, que somente reforçaria esse atrito (Acórdão n. 718213, 20130410041397ACJ, Relator: ALVARO LUIZ CHAN JORGE, 1ª Turma Recursal dos Juizados Especiais do Distrito Federal, Data de Julgamento: 17/09/2013, Publicado no DJE: 03/10/2013. Pág.: 246). 7. Recurso do autor parcialmente conhecido, em razão de inovação recursal, e desprovido. Recurso do réu conhecido e provido para afastar a condenação por danos morais. Sentença reformada.
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CIVIL. PROCESSUAL CIVIL.AÇÃO REPARATÓRIA DE DANOS. DIREITO DE VIZINHANÇA. PRELIMINAR: INOVAÇÃO RECURSAL. OCORRÊNCIA. RECURSO DO AUTOR PARCIALMENTE CONHECIDO. MÉRITO: UTILIZAÇÃO DE MURO DIVISÓRIO. AUSÊNCIA DE ABUSIVIDADE. DANO MATERIAL AFASTADO. COMUNICAÇÃO DE CRIME. INSTAURAÇÃO DE INQUÉRITO POLICIAL. EXERCÍCIO REGULAR DE DIREITO. BARULHO PRODUZIDO PELO PORTÃO DA GARAGEM. MERO DISSABOR DA VIDA EM SOCIEDADE. INEXISTÊNCIA DE DANOS MORAIS. RECURSO DO AUTOR DESPROVIDO. RECURSO DO RÉU PROVIDO. SENTENÇA REFORMADA. 1. Segundo o Enunciado Administrativo n. 2 do STJ, aos recursos interpostos com fundamento no CPC/1973 (relativos a decisões publicadas até 17 de março de 2016), como é o caso dos autos, devem ser exigidos os requisitos de admissibilidade na forma nele prevista, com as interpretações dadas, até então, pela jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça. 2. Não se pode conhecer do recurso de apelação do autor quanto ao pedido de condenação do réu ao pagamento de 50% da despesa com a construção de muro limítrofe, nos termos do art. 1.297 do CC, porquanto tal matéria não foi suscitada em 1º Grau, tratando-se de inovação recursal. 3. Para que haja o dever de reparação (CC, arts. 186, 187 e 927), faz-se necessária a presença dos pressupostos da responsabilidade civil subjetiva/aquiliana, a saber: ato ilícito; culpa; nexo causal; e dano. Presentes esses requisitos, impõe-se o dever de indenizar. 4. A situação dos autos se reporta à complexa relação entre vizinhos, tendo em vista divergências na convivência (comunicação de crime e barulho, para fins de dano moral) e na utilização de muro divisório (construção apoiada em muro e possível relação com rachaduras, mofos e infiltrações, para fins de dano material e moral), o que, por vezes, resulta em desentendimentos que ultrapassam o limite do aceitável. A harmonização dessa coexistência não é um exercício simples, notadamente em razão dos conflitos de interesses dos moradores. 5. O critério para o ressarcimento dos prejuízos materiais encontra-se nos arts. 402 e 403 do CC, que compreende os danos emergentes (diminuição patrimonial ocasionada à vítima) e os lucros cessantes (frustração da expectativa de um lucro esperado), sendo necessária a comprovação da efetiva perda patrimonial. 5.1. O art. 1.297 do CC disciplina o direito de tapagem, como forma de garantir ou tornar efetiva a exclusividade do domínio pelo proprietário, por meio de ato material tendente a impedir o acesso de estranhos à coisa. Nessa situação, o muro divisório pertence a ambos os proprietários confinantes, os quais se obrigam proporcionalmente a arcar com o dever de conservação. Embora a lei se refira expressamente a proprietário, é razoável e lícito que os possuidores, com o fito de preservar a segurança, o sossego e a privacidade, também exerçam o direito de tapagem (PELUSO, Cezar. Coordenador. Código civil comentado: doutrina e jurisprudência. 6. ed. rev. e atual. Barueri, SP: Manole, 2012, p. 1.309). 5.2. No particular, o Laudo de Avaliação Estrutural que acompanha a inicial denota quea estrutura do muro germinado, por ser mais antiga, não suportaria qualquer tipo de pressão, seja por serviços de aterramento e ou por compactação do solo e que as deformações estruturais em toda a parte longitudinal da parede da casa do autor que faz divisa com o muro germinado são provenientes de pressão exercida por meio de aterros e compactações de solo. O referido laudo também registra que o movimento do portão e o trânsito de veículos no terreno do réu agravam o abalo na estrutura da casa do autor, sem ser, todavia, a origem do problema, levando em conta a fragilidade da estrutura do marco divisório dos terrenos, no qual se apoia a edificação do autor. 5.3. Diante da inexistência de qualquer uso ilegal, abusivo ou irregular do marco divisório entre os terrenos das partes, cuja fragilidade lhe é ínsita, não há falar em reparação de danos materiais. 6. O dano moral se relaciona diretamente com os prejuízos ocasionados a direitos da personalidade, cuja violação afeta diretamente a dignidade do indivíduo e constitui motivação suficiente para fundamentar uma ação compensatória dessa natureza. (CF, art. 5º, V e X). O mero dissabor/aborrecimento/irritação, por fazer parte do dia a dia da população, não é capaz de romper o equilíbrio psicológico do indivíduo, para fins de configuração do dano moral. 6.1. A irregularidade na utilização do muro divisório por parte do réu não foi demonstrada, não havendo falar em dano moral com base nessa situação fática, ante a ausência de ato ilícito. 6.2. Nos termos do art. 5º, II e § 3º, do CPP e do art. 5º, XXXIV, a, da CF, qualquer pessoa do povo pode comunicar às autoridades policias a prática de supostas infrações penais. Tal situação, via de regra, não configura ilícito civil capaz de ensejar danos morais, haja vista caracterizar exercício regular de um direito (CC, art. 188, I). Para fins de reparação de danos, só assume relevância, sob a ótica subjetiva, caso se comprove a intenção, a leviandade, a malícia em acusar, sabendo não ser verdadeiro o fato ou que o apontado não é seu autor. 6.2.1. In casu, diante da animosidade existente entre as partes, verifica-se que o réu se sentiu ameaçado pelo autor, situação fática esta que foi levada a conhecimento da polícia, inexistindo abusividade nessa conduta. 6.3. Não obstante a decretação da revelia, consoante regra de experiência comum do que ordinariamente acontece (CPC/73, art. 335), ainda que o portão do réu fizesse muito barulho a ponto de incomodar seu vizinho (autor), essa situação não se reveste de fato passível de condenação a título de danos morais. Isso porque o aborrecimento advindo do barulho desagradável do portão do vizinho, por si só, não traz em seu bojo lesividade a direitos da personalidade. 6.4. Pelas provas dos autos, depreende-se que há flagrante animosidade entre os litigantes, na qualidade de vizinhos. Essa situação é natural da vida em sociedade, de modo que o bom senso e as regras sociais de convivência devem ser observados para se poder viver em tranquilidade, cada qual em respeito ao direito do outro, sendo desnecessária a imposição de danos morais, que somente reforçaria esse atrito (Acórdão n. 718213, 20130410041397ACJ, Relator: ALVARO LUIZ CHAN JORGE, 1ª Turma Recursal dos Juizados Especiais do Distrito Federal, Data de Julgamento: 17/09/2013, Publicado no DJE: 03/10/2013. Pág.: 246). 7. Recurso do autor parcialmente conhecido, em razão de inovação recursal, e desprovido. Recurso do réu conhecido e provido para afastar a condenação por danos morais. Sentença reformada.
Data do Julgamento
:
19/05/2016
Data da Publicação
:
30/05/2016
Órgão Julgador
:
1ª TURMA CÍVEL
Relator(a)
:
ALFEU MACHADO
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