TJDF APC - 942500-20140111730947APC
CONSUMIDOR. CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO COMPENSATÓRIA POR DANOS MORAIS. ACADEMIA DE GINÁSTICA. ALUNA MATRICULADA NAS AULAS DE GINÁSTICA ARTÍSTICA. ALEGAÇÃO DE OFENSAS REITERADAS POR PARTE DA PROFESSORA. BULLYING. NÃO DEMONSTRAÇÃO. ÔNUS DA PROVA DA AUTORA. CPC/73, ART. 333, I. RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA. PRESSUPOSTOS AUSENTES. DANO MORAL. DESCABIMENTO. RECURSO DESPROVIDO. SENTENÇA MANTIDA. 1. Segundo o Enunciado Administrativo n. 2 do STJ, aos recursos interpostos com fundamento no CPC/1973 (relativos a decisões publicadas até 17 de março de 2016), como é o caso dos autos, devem ser exigidos os requisitos de admissibilidade na forma nele prevista, com as interpretações dadas, até então, pela jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça. 2. A controvérsia cinge-se a presença ou não dos pressupostos da responsabilidade civil, tendo em vista a alegação da autora de bullying nas aulas de ginástica artística ministradas nas dependências da academia de ginástica ré, por parte da professora responsável, para fins de danos morais. 3. A responsabilidade civil dos fornecedores de serviços, a cujo conceito se amolda a academia ré, é objetiva, fundada no risco da atividade desenvolvida, conforme arts. 14 do CDC, 5º da Lei n. 13.185/2015 e 186, 187, 927, 932, III e 943 do CC, não se fazendo necessário perquirir acerca da existência de culpa. Basta, pois, a comprovação do liame de causalidade entre o defeito do serviço e o evento danoso experimentado pelo consumidor, cuja responsabilidade somente poderá ser afastada/minorada nas hipóteses de caso fortuito/força maior (CC, art. 393), inexistência do defeito (CDC, art. 14, § 3º, I) e culpa exclusiva do ofendido e de terceiros (CDC, art. 14, § 3º, II). 4. À luz dos arts. 1º, § 1º, da Lei n. 13.185/15 (instituiu o Programa de Combate à intimidação sistemática - Bullying) e art. 2º da Lei Distrital n. 4.837/12 (dispõe sobre a instituição da política de conscientização, prevenção e combate ao bullying nos estabelecimentos da rede pública e privada de ensino do Distrito Federal), entende-se por bullying todas as atitudes agressivas, intencionais, repetitivas e sistemáticas, sem aparente motivação, adotadas por uma pessoa, ou grupo delas, em desfavor de outra ou outras, causando dor física ou psicológica, angustia, sofrimento, depressão, estabelecendo uma relação desigual de poder sobre a vítima, que não consegue defender-se com eficácia. Para as vítimas, dependendo de sua estrutura psíquica, da forma e da intensidade dos ataques, as consequências mais comuns são o baixo rendimento escolar e o desinteresse pelos estudos, a evasão escolar, problemas psicossomáticos e comportamentais, transtorno do pânico e alterações extremas de humor, anorexia e bulimia, fobias, stress, cefaléia, insônia e tremores. Sentem-se rejeitadas e infelizes (MADALENO, Rolf.; BARBOSA, Eduardo. (coord.). Responsabilidade civil no direito de família. São Paulo: Atlas, 2015, pp. 436 e 440). 4.1. Esse tipo de intimidação gratuita, reiterada e agressiva pode ocorrer em qualquer contexto (na escola, no trabalho, no clube, na vizinhança etc.), afrontando a dignidade da pessoa humana e refletindo verdadeiro dano moral (CF, arts. 1º, III; 5º, II, X, XV, XLI e XLII). 5. No particular, não quedou comprovado nos autos o momento em que a suposta conduta agressiva da professora de ginástica artística se iniciou e a sua reiteração, tampouco eventual fobia social, queda de rendimento escolar sofrida pela aluna, pois sequer foi juntado aos autos seu histórico escolar ou laudo psicológico que demonstrasse o abalo a direitos da personalidade descrito na inicial. A prova oral produzida é uníssona quanto à ausência de conduta agressiva por parte da professora de ginástica artística, notadamente porque as aulas são ministradas no mesmo espaço aberto, razão pela qual seria possível ouvir eventual agressão. Os depoimentos explicitam, inclusive, que, por várias vezes, a aluna se recusou a realizar determinados exercícios, além de não gostar de ser corrigida, ocasião em que a professora passou a ficar ao seu lado, cobrando a realização da atividade, sem que fossem proferidas palavras humilhantes. 5.1. Não se afasta a possibilidade de um comportamento mais enérgico da professora em face da aluna, o que não caracterizada qualquer conduta ilícita. Isso porque, a criança se inscreveu para as aulas de ginástica artística, esporte este que, como os demais, requer disciplina e dedicação, devendo ser coibida pelo instrutor atitudes desordeiras e indisciplinares, assim como aquelas realizadas incorretamente. Nesse panorama, é aceitável e esperada a correção realizada pela professora em face da aluna que está aprendendo e evoluindo no esporte, apontando as falhas e equívocos, buscando sempre o aprimoramento, sem que isso configure bullying. 5.2. Não tendo sido demonstradas as repetidas atitudes agressivas da professora, afasta-se a configuração da prática de bullying e, conseguintemente, o dever de compensação por danos morais. 6. O art. 333 do CPC/73 distribui o ônus da prova de acordo com a natureza da alegação fática a ser comprovada. Nesse passo, ao autor cabe provar as alegações concernentes ao fato constitutivo do direito afirmado, ao passo que ao réu cumpre demonstrar os fatos negativos, extintivos e modificativos da pretensão deduzida por aquele.Cuida-se de um indicativo para que o juiz se livre do estado de dúvida e decida o meritum causae. Pairando essa incerteza sobre o fato constitutivo do direito postulado, essa deve ser suportada pela parte autora, por meio da improcedência dos pedidos deduzidos na inicial (CPC/73, art. 333, I). 7. A inversão do ônus probatório prevista no Código de Defesa do Consumidor (art. 6º, VIII) não tem o condão de afastar a autora do dever de produção de prova minimamente condizente com o direito vindicado, notadamente quando as alegações não se mostram verossímeis, tampouco há dificuldade na produção da prova. 8. Recurso conhecido e desprovido. Sentença mantida.
Ementa
CONSUMIDOR. CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO COMPENSATÓRIA POR DANOS MORAIS. ACADEMIA DE GINÁSTICA. ALUNA MATRICULADA NAS AULAS DE GINÁSTICA ARTÍSTICA. ALEGAÇÃO DE OFENSAS REITERADAS POR PARTE DA PROFESSORA. BULLYING. NÃO DEMONSTRAÇÃO. ÔNUS DA PROVA DA AUTORA. CPC/73, ART. 333, I. RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA. PRESSUPOSTOS AUSENTES. DANO MORAL. DESCABIMENTO. RECURSO DESPROVIDO. SENTENÇA MANTIDA. 1. Segundo o Enunciado Administrativo n. 2 do STJ, aos recursos interpostos com fundamento no CPC/1973 (relativos a decisões publicadas até 17 de março de 2016), como é o caso dos autos, devem ser exigidos os requisitos de admissibilidade na forma nele prevista, com as interpretações dadas, até então, pela jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça. 2. A controvérsia cinge-se a presença ou não dos pressupostos da responsabilidade civil, tendo em vista a alegação da autora de bullying nas aulas de ginástica artística ministradas nas dependências da academia de ginástica ré, por parte da professora responsável, para fins de danos morais. 3. A responsabilidade civil dos fornecedores de serviços, a cujo conceito se amolda a academia ré, é objetiva, fundada no risco da atividade desenvolvida, conforme arts. 14 do CDC, 5º da Lei n. 13.185/2015 e 186, 187, 927, 932, III e 943 do CC, não se fazendo necessário perquirir acerca da existência de culpa. Basta, pois, a comprovação do liame de causalidade entre o defeito do serviço e o evento danoso experimentado pelo consumidor, cuja responsabilidade somente poderá ser afastada/minorada nas hipóteses de caso fortuito/força maior (CC, art. 393), inexistência do defeito (CDC, art. 14, § 3º, I) e culpa exclusiva do ofendido e de terceiros (CDC, art. 14, § 3º, II). 4. À luz dos arts. 1º, § 1º, da Lei n. 13.185/15 (instituiu o Programa de Combate à intimidação sistemática - Bullying) e art. 2º da Lei Distrital n. 4.837/12 (dispõe sobre a instituição da política de conscientização, prevenção e combate ao bullying nos estabelecimentos da rede pública e privada de ensino do Distrito Federal), entende-se por bullying todas as atitudes agressivas, intencionais, repetitivas e sistemáticas, sem aparente motivação, adotadas por uma pessoa, ou grupo delas, em desfavor de outra ou outras, causando dor física ou psicológica, angustia, sofrimento, depressão, estabelecendo uma relação desigual de poder sobre a vítima, que não consegue defender-se com eficácia. Para as vítimas, dependendo de sua estrutura psíquica, da forma e da intensidade dos ataques, as consequências mais comuns são o baixo rendimento escolar e o desinteresse pelos estudos, a evasão escolar, problemas psicossomáticos e comportamentais, transtorno do pânico e alterações extremas de humor, anorexia e bulimia, fobias, stress, cefaléia, insônia e tremores. Sentem-se rejeitadas e infelizes (MADALENO, Rolf.; BARBOSA, Eduardo. (coord.). Responsabilidade civil no direito de família. São Paulo: Atlas, 2015, pp. 436 e 440). 4.1. Esse tipo de intimidação gratuita, reiterada e agressiva pode ocorrer em qualquer contexto (na escola, no trabalho, no clube, na vizinhança etc.), afrontando a dignidade da pessoa humana e refletindo verdadeiro dano moral (CF, arts. 1º, III; 5º, II, X, XV, XLI e XLII). 5. No particular, não quedou comprovado nos autos o momento em que a suposta conduta agressiva da professora de ginástica artística se iniciou e a sua reiteração, tampouco eventual fobia social, queda de rendimento escolar sofrida pela aluna, pois sequer foi juntado aos autos seu histórico escolar ou laudo psicológico que demonstrasse o abalo a direitos da personalidade descrito na inicial. A prova oral produzida é uníssona quanto à ausência de conduta agressiva por parte da professora de ginástica artística, notadamente porque as aulas são ministradas no mesmo espaço aberto, razão pela qual seria possível ouvir eventual agressão. Os depoimentos explicitam, inclusive, que, por várias vezes, a aluna se recusou a realizar determinados exercícios, além de não gostar de ser corrigida, ocasião em que a professora passou a ficar ao seu lado, cobrando a realização da atividade, sem que fossem proferidas palavras humilhantes. 5.1. Não se afasta a possibilidade de um comportamento mais enérgico da professora em face da aluna, o que não caracterizada qualquer conduta ilícita. Isso porque, a criança se inscreveu para as aulas de ginástica artística, esporte este que, como os demais, requer disciplina e dedicação, devendo ser coibida pelo instrutor atitudes desordeiras e indisciplinares, assim como aquelas realizadas incorretamente. Nesse panorama, é aceitável e esperada a correção realizada pela professora em face da aluna que está aprendendo e evoluindo no esporte, apontando as falhas e equívocos, buscando sempre o aprimoramento, sem que isso configure bullying. 5.2. Não tendo sido demonstradas as repetidas atitudes agressivas da professora, afasta-se a configuração da prática de bullying e, conseguintemente, o dever de compensação por danos morais. 6. O art. 333 do CPC/73 distribui o ônus da prova de acordo com a natureza da alegação fática a ser comprovada. Nesse passo, ao autor cabe provar as alegações concernentes ao fato constitutivo do direito afirmado, ao passo que ao réu cumpre demonstrar os fatos negativos, extintivos e modificativos da pretensão deduzida por aquele.Cuida-se de um indicativo para que o juiz se livre do estado de dúvida e decida o meritum causae. Pairando essa incerteza sobre o fato constitutivo do direito postulado, essa deve ser suportada pela parte autora, por meio da improcedência dos pedidos deduzidos na inicial (CPC/73, art. 333, I). 7. A inversão do ônus probatório prevista no Código de Defesa do Consumidor (art. 6º, VIII) não tem o condão de afastar a autora do dever de produção de prova minimamente condizente com o direito vindicado, notadamente quando as alegações não se mostram verossímeis, tampouco há dificuldade na produção da prova. 8. Recurso conhecido e desprovido. Sentença mantida.
Data do Julgamento
:
18/05/2016
Data da Publicação
:
31/05/2016
Órgão Julgador
:
1ª TURMA CÍVEL
Relator(a)
:
ALFEU MACHADO
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